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APRENDER E ENSINAR O ENVELHECER NA FORMAÇÃO INICIAL EM ENFERMAGEM

Andreia Ferreri Cerqueira

Escola Superior de Saúde do Instituto Politécnico de Setúbal Centro de Investigação Interdisciplinar em Saúde (CIIS) UCP

andreia.cerqueira@ess.ips.pt Lucília Nunes

Escola Superior de Saúde do Instituto Politécnico de Setúbal

lucilia.nunes@ess.ips.pt

Resumo

No presente artigo apresentamos o desenho da nossa investigação “A Educação em Enfermagem na pessoa ao envelhecer: Contributos de uma Matriz Referencial”, que tem como objetivos: (1) analisar o currículo nos cursos nacionais de formação pré-graduada de

Enfermagem na pessoa ao envelhecer e (2) sistematizar como se processa e se perspetiva o desenvolvimento curricular no sentido de propiciar os referenciais de conhecimento e a aquisição de competências promotoras do cuidar em Enfermagem na pessoa ao envelhecer. Assenta em

matrizes teóricas, acolhendo autores das áreas da Filosofia, da Educação e da Enfermagem, que nos guiam em reflexões sobre a experiência da pessoa ao envelhecer e a educação, particularmente no contexto da formação inicial em Enfermagem.

Integra três etapas metodológicas que procuram responder aos objetivos delineados: (1) elegemos (na primeira etapa) a investigação documental, procedendo à pesquisa e análise documental dos Decretos-leis dos planos de estudo dos cursos de licenciatura em enfermagem portugueses; (2) desenhámos (na segunda etapa) um questionário online destinado a todos os professores responsáveis pela coordenação dos cursos de licenciatura em enfermagem (CLE) portugueses, procedendo à análise estatística descritiva simples e à análise categorial temática e; (3) estamos a desenvolver (na terceira etapa) uma entrevista destinada a peritos na área em estudo, onde prevemos recorrer à análise crítica de discurso.

Os achados serão integrados numa Matriz Referencial nesta área do conhecimento, oferecendo orientações para a formação de enfermeiros capazes de atender às necessidades das pessoas ao envelhecer, assente numa perspetiva multidimensional e pluridisciplinar.

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Introdução

Aprender e ensinar o envelhecer na formação inicial em Enfermagem constituiu o tema da

comunicação apresentada no Seminário Internacional Entre a Teoria, os Dados e o

Conhecimento: Investigar práticas em contexto, organizado pela Escola Superior de Educação do

Instituto Politécnico de Setúbal e que agora toma a forma de artigo. Porque escolhemos este tema?

Aprender e ensinar, porque como enfermeiras e docentes de enfermagem, estamos

preocupadas com a aprendizagem da pessoa, estudante de enfermagem, futuro enfermeiro de cuidados gerais; o envelhecer, porque a Enfermagem e a Educação em Enfermagem não podem ficar alheias às mudanças sociais e demográficas que se têm feito sentir nos últimos tempos, sendo importante referir que as pessoas idosas são, atualmente, as principais utilizadoras dos cuidados de saúde; na formação inicial em Enfermagem porque é neste percurso inicial que o estudante de Enfermagem aprende a ser enfermeiro, esperando-se que o mesmo adquira as competências espelhadas no quadro de referência da profissão.

Assenta num pano de fundo intitulado “A Educação em Enfermagem na pessoa ao envelhecer: Contributos de uma Matriz Referencial” uma tese de Doutoramento em Enfermagem5 que tem

como objetivos: (1) analisar o currículo nos cursos nacionais de formação pré-graduada de

Enfermagem na pessoa ao envelhecer e (2) sistematizar como se processa e se perspetiva o desenvolvimento curricular no sentido de propiciar os referenciais de conhecimento e a aquisição de competências promotoras do cuidar em Enfermagem na pessoa ao envelhecer.

O grau de doutor em Enfermagem pressupõe a elaboração e defesa de uma tese original e produtora de conhecimento novo e útil à Enfermagem. Os espaços formativos e de discussão, como foi exemplo este Seminário, potenciam sinergias, questões e reflexões que contribuem para o sucesso da tese6, constituindo também excelentes meios de divulgação do trabalho

realizado.

5 Que estamos a desenvolver na Universidade Católica Portuguesa Lisboa, Instituto de Ciências da Saúde, na área de especialização Educação em Enfermagem.

6 Como nos diz Guy Le Boterf “responder a uma questão não é, ou é-o muito poucas vezes, tirar uma resposta já pronta de uma gaveta. Construindo respostas, avançamos e descobrimos. Explicitando um ponto de vista, enriquecemo-lo e fazemo-lo progredir. As boas questões põem à prova as hipóteses de trabalho” (Boterf, 2005, p. 5).

81 Tendo em conta estes pressupostos, decidimos apresentar o desenho da nossa investigação, selecionando algumas das suas principais particularidades.

Para atingir o objetivo proposto estruturámos o pensamento em quatro dimensões: a problemática, as referências teóricas, as fases da investigação e as considerações finais. Na problemática referir-nos-emos a três conceitos introdutórios e contextualizadores da investigação, justificando a pertinência do estudo; nas referências teóricas, daremos a conhecer os principais autores que guiam as nossas reflexões; nas fases da investigação esquematizaremos as questões e os objetivos específicos e a sua relação com as metodologias adotadas; nas considerações finais faremos um ponto de situação, focando essencialmente a discussão gerada no final da apresentação e os principais contributos para o desenvolvimento da tese.

A problemática

Na apresentação, referimo-nos a três conceitos introdutórios e contextualizadores da investigação: o envelhecer, as transições e os discursos, sendo agora possível dar-lhes mais alguma atenção.

O envelhecer das populações tem exigido novas respostas económicas, políticas, culturais e sociais. Envelhecer hoje é diferente do que foi no passado e do que há-de ser no futuro, sendo fundamental conhecermos as principais caraterísticas da população idosa atual. Sabemos hoje, que os filhos do fenómeno baby boom, são pessoas mais esclarecidas, com maior literacia em saúde, esperando respostas mais efetivas e adequadas dos cuidados de saúde (Institute of Medicine, 2008). Sabemos ainda que as mulheres tendem a viver mais que os homens, mas experienciam uma maior incapacidade; que a incapacidade é maior nos países subdesenvolvidos; e que as principais causas de morte advêm essencialmente de doenças crónicas, como é exemplo a doença cerebrovascular (World Health Organization, 2012). Estas caraterísticas, entre outras, já estudadas e conhecidas, têm implicações importantes no sistema de saúde, que não está idealmente organizado por forma a dar a melhor resposta às necessidades das pessoas idosas.

Envelhecer corresponde a uma transição desenvolvimental envolta em muitas outras transições, sendo essencial que a pessoa vivencie estes processos de forma satisfatória, sendo capaz de minimizar os aspetos negativos decorrentes de algumas transições, encontrando padrões de resposta adequados, com ou sem ajuda, que permitam reforçar os aspetos positivos, sendo as

82 profissões ligadas à saúde, nomeadamente a enfermagem, relevantes no fortalecimento dos indicadores positivos das transições (Meleis, Schumacker, & Jones, 2010).

Os discursos sobre o envelhecer nem sempre foram assentes numa perspetiva salutogénica, como tem vindo a acontecer nos últimos tempos (Berger & Mailloux-Poirier, 1994). A pessoa idosa, considerada por muitos como uma pessoa incapaz e dependente; o envelhecer associado a aspetos negativos como o aumento dos custos e encargos financeiros; e os cuidados de saúde considerados como elementares, simples e tecnicistas, não contribuíram para uma visão positiva e para um investimento nesta área, nomeadamente ao nível da investigação e da educação. Por todos estes motivos, conhecer e analisar os discursos, torna-se essencial, na medida em que esta reflexão poderá trazer novos achados e novas perspetivas ajudando à clarificação da problemática.

As referências teóricas

O desenho da investigação assenta em matrizes teóricas, acolhendo autores de diferentes áreas, como é o caso da Filosofia, da Educação e da Enfermagem, sendo que os mesmos nos guiam em reflexões sobre a experiência da pessoa ao envelhecer e a educação, particularmente no contexto da formação inicial em Enfermagem.

Entre outros, elegemos três: Afaf Meleis, Thomas Khun e Norman Fairclough, que passamos a apresentar:

Afaf Meleis é acolhida neste trabalho pela sua perspetiva sobre as transições, particularmente a transição envelhecer. A transição é um conceito central em Enfermagem, sendo definida como a passagem ou o movimento de uma condição para outra, sendo que esta passagem pode conduzir a uma maior instabilidade e vulnerabilidade. A autora define a transição de envelhecer como um processo de ganhos e de perdas que requer tempo, integrando diferentes transições que podem decorrer em simultâneo, conferindo complexidade ao processo (Meleis, Schumacker, & Jones, 2010).

Thomas Kuhn reveste-se de particular importância neste trabalho pelo seu conceito de matriz disciplinar, inspirador da matriz referencial que nos propomos a construir e a sistematizar. O autor refere que uma matriz disciplinar corresponde à ordenação de diferentes elementos, cada um deles exigindo especificação ulterior, sendo reveladores do comprometimento de uma determinada disciplina (Kuhn, 2009). Neste trabalho, pretendemos uma matriz referencial multidimensional e pluridisciplinar, que integre diferentes elementos, desde os valores até

83 exemplos concretos de resolução de problemas compartilhados e valorizados por um grupo profissional.

Norman Fairclough surge pela importância dada neste trabalho aos discursos sobre a problemática em questão. O autor reúne, na análise de discurso, a linguística e o pensamento social e político, considerando o discurso como um modo de ação e representação, sendo referenciado em trabalhos de investigação focados, essencialmente, em problemas sociais com um aspeto semiótico. Na sua perspetiva, a análise crítica de discurso deve identificar os obstáculos à abordagem do problema, considerar se a ordem social necessita do problema, identificar caminhos de resolução dos obstáculos e refletir criticamente sobre a análise (Chouliaraki & Fairclough, 1999).

As fases da Investigação

Este estudo, de natureza qualitativa e analítica é caraterizado por três fases, distintas, mas complementares, desenhadas com o intuito de responder às questões e objetivos específicos: A investigação documental, o questionário e a entrevista.

A investigação documental, primeira fase, consistiu na pesquisa e análise documental dos Decretos-leis dos planos de estudo dos cursos de licenciatura em enfermagem portugueses e visou responder à primeira questão Que currículo nos cursos nacionais de formação pré-

graduada de Enfermagem na pessoa ao envelhecer? E alcançar o objetivo correspondente Analisar o currículo nos cursos nacionais de formação pré-graduada de Enfermagem na pessoa ao envelhecer.

A análise documental dos quarenta e um planos de estudo permitiu identificar achados interessantes e uteis às fases seguintes. Apesar da informação constante nestes documentos ser escassa, obtivemos dados sobre as designações das unidades curriculares específicas desta área do conhecimento, a sua distribuição ao longo dos cursos, a tipologia de aulas, créditos dispendidos, entre outros aspetos, mas o mais importante foram as questões que surgiram e para as quais não obtivemos resposta apenas recorrendo a esta metodologia, o que nos levou a ingressar na segunda fase.

Desenhámos, na segunda fase, um questionário online, destinado a todos os professores responsáveis pela coordenação dos cursos de licenciatura em enfermagem (CLE) portugueses e procedemos à análise estatística descritiva simples e à análise categorial temática. O questionário, constituído por nove questões, procurou estudar diferentes variáveis, entre as quais a caraterização do processo de aprender, a investigação realizada e em curso, os

84 conteúdos, as competências, as mudanças curriculares, os valores, os documentos de referência e as principais reflexões sobre o currículo de enfermagem na área do envelhecer. Esta análise, profunda e demorada, permitiu responder de forma mais abrangente e clara à questão e objetivo mencionados e abriu caminho à resposta para uma outra questão Como se processa e

se perspetiva o desenvolvimento curricular no sentido de propiciar os referenciais de conhecimento e a aquisição de competências promotoras do cuidar em Enfermagem na pessoa ao envelhecer? E objetivo correspondente Sistematizar como se processa e se derveia perspetivar o desenvolvimento curricular no sentido de propiciar os referenciais de conhecimento e a aquisição de competências promotoras do cuidar em enfermagem na pessoa ao envelhecer.

Entrámos assim, na terceira fase, onde estamos de momento a desenhar uma entrevista destinada a peritos na área em estudo e onde prevemos recorrer à análise crítica de discurso, sedimentando e alargando os achados anteriores e respondendo de forma mais integradora à segunda questão e objetivo. Esta fase, ainda em bruto, prevê-se que seja o culminar de um processo rigoroso de investigação, sendo os seus achados, em conjunto com os anteriores, integrados na Matriz Referencial que será proposta.

Figura 1: Os objetivos e a sua relação com as metodologias adotadas.

Considerações finais

Neste artigo, procurámos explicitar o tema elegido aprender e ensinar o envelhecer na formação

inicial em Enfermagem, através da apresentação do desenho de investigação de uma Tese de

Doutoramento em Enfermagem intitulada A Educação em Enfermagem na pessoa ao

envelhecer: Contributos de uma matriz referencial.

Nele, aprofundámos alguns conceitos e seus significados e recorremos a autores de referência que norteiam as nossas reflexões sobre a educação, o envelhecer e a Enfermagem. Reportámo-

85 nos às fases da investigação, esquematizando as questões e os objetivos e a sua relação com as metodologias adotadas, chegando o momento de fazer um ponto de situação, focando essencialmente a discussão que se gerou após a apresentação e os seus principais contributos, agradecendo desde já todo o interesse e participação dos diferentes intervenientes7.

A discussão foi rica em alguns tópicos, mas particularmente no que se referiu à pluridisciplinaridade. Pensamos que este tema surgiu devido ao encontro entre estudantes e profissionais de diferentes disciplinas, que acolheram o envelhecer como uma área de interesse e simultaneamente desafiadora para todos aqueles que a aprendem, ensinam e investigam. Concluímos, que é preciso unir esforços, criar sinergias e atender a uma perspetiva pluriprofissional, fugindo à fragmentação do conhecimento e desenvolvendo projetos que permitam complementar e religar os saberes, ideias que pretendemos não esquecer na sistematização da Matriz Referencial.

Referências bibliográficas

Berger, L., & Mailloux-Poirier, D. (1994). Pessoas idosas: Uma abordagem global. Lisboa: Lusodidacta.

Boterf, G. L. (2005). Construir as competências individuais e coletivas. Porto: Edições ASA. Chouliaraki, L., & Fairclough, N. (1999). Discourse in Late Modernity: Rethinking Critical Discourse

Analysis. Edinburgh : Edinburgh University Press.

Institute of Medicine. (2008). Rettoling for an aging america: Building the health care workforce. Institude of Medicine.

Kuhn, T. S. (2009). A estrutura das revoluções científicas. Lisboa: Guerra e Paz.

Meleis, A. I., Schumacker, K. L., & Jones, P. S. (2010). Helping elderly persons in transition: A framework for research and practice. In A. I. Meleis, Transitions Theory Middle-Range

and Situation-Specific Theories in Nursing Research and Practice (pp. 129-144). New

York: Springer Publishing Company.

World Health Organization. (2012). Good health adds life to years: Global brief for world health

day 2012. Obtido de World Health Organization: www.who.int/about/licensing/copyrigh_form/en/index.html

7 Entre eles, professores da área da educação e outras áreas, assim como de estudantes, nomeadamente do Curso de Animação Sociocultural da Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Setúbal.

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PRÁTICAS DE PREPARAÇÃO DE TAREFAS MATEMÁTICAS: UMA REFLEXÃO NO CONTEXTO DA