• Nenhum resultado encontrado

4 APRENDIZADO, INOVAÇÃO E COOPERAÇÃO EM VINÍCOLAS DA

interior do arranjo, pretendeu-se compreender se tal interação gerou vínculos cooperativos, e quais seriam estes.

Neste trabalho, o método empregado para a consecução dos seus objetivos foi do tipo pesquisa survey, descritiva, com amostragem não-probabilística. A survey foi precedida por um conjunto de entrevistas em profundidade, que foram realizadas entre os meses de agosto e outubro de 2009, com especialistas do setor, bem como representantes de instituições de ensino e pesquisa (EMBRAPA e IFRS) e órgãos de representação e apoio (IBRAVIN e Sebrae/RS). Tais entrevistas serviram para adequar o instrumento de coleta de dados aos objetivos específicos da pesquisa. A aplicação do questionário (ver Apêndice A) em campo foi realizada durante os meses de janeiro e fevereiro de 2010.

Antes, porém, ocorreu uma etapa em que se realizaram oito entrevistas em profundidade, seguindo um roteiro de orientação (ver Apêndice B). Tais entrevistas tiveram por objetivo conhecer as ações das principais instituições, bem como suas opiniões acerca da organização do arranjo e os fatores de competitividade das empresas.

Para a fase de investigação de campo, junto às vinícolas, utilizou-se como estrutura básica do questionário a mesma base conceitual e metodológica desenvolvida nos diversos trabalhos da REDESIST sobre os APLs, sendo este questionário aplicado nas pesquisas de campo realizadas pela referida Rede. Ocorreram algumas adaptações, necessárias para compreender as particularidades das vinícolas. Além disso, foi necessário incluir algumas questões que não se fazem presentes na versão original do questionário da Rede. Tais adaptações basearam-se nos dados secundários coletados ao longo da pesquisa, bem como no resultado das entrevistas em profundidade.

O questionário foi aplicado junto a vinte vinícolas inseridas no arranjo em estudo. Essas vinte empresas correspondem à produção de 21% do total da produção de vinhos do RS, no ano de 200933. A amostra, ainda que seja não-probabilística, apresenta um grau de representatividade considerável, não apenas por representar 1/5 da produção vinícola do RS (e por conseqüência do Brasil), mas por retratar a realidade das principais produtoras do Brasil. Por ser o segmento mais importante do APL, concentrou-se os esforços da pesquisa no levantamento de informações junto às vinícolas.

Optou-se pela aplicação presencial de todos os questionários. Tal estratégia foi adotada em virtude da extensão do instrumento de pesquisa, bem como pela complexidade e profundidade das informações requeridas. Por essa razão, todos os respondentes ocupavam cargos de alta administração das empresas (Diretor, Gerente ou Enólogo).

O questionário é estruturado em cinco blocos. O primeiro pretende descrever algumas características básicas da firma entrevistada, como porte e número de empregados. O segundo bloco discute alguns aspectos do processo produtivo e da qualificação da mão-de-obra. O terceiro bloco visa observar os principais aspectos relativos ao processo inovativo, cooperação e aprendizado entre as firmas do arranjo. O quarto bloco analisa as fontes de externalidades no ambiente local. Por último, um bloco que avalia o impacto de políticas públicas sobre o desempenho das firmas nos arranjos produtivos locais.

Pela delimitação da pesquisa, o terceiro bloco teve maior relevância para o presente projeto. Esse bloco de questões avaliou a origem da informação para o

33 As vinte empresas juntas totalizaram uma produção, em 2009, de 70,5 milhões de litros de vinhos (finos e comuns). Dados do IBRAVIN, em entrevista, apontaram que a produção, no mesmo ano, das vinícolas do RS foi de 342 milhões de litros.

processo inovativo, se esta fonte é interna ou externa à firma. Avaliou, também, a forma, a intensidade e com quem a cooperação ocorre (se ocorre), além de verificar se a firma interage mais dentro ou fora do arranjo. As questões do questionário REDESIST, neste bloco de análise, sofreram as devidas adaptações, para se adequarem às peculiaridades do setor vitivinícola, além de atender aos pontos levantados pelos especialistas, quando da realização das entrevistas em profundidade.

Assim, o instrumento de coleta de dados utilizado na pesquisa possui 48 questões, divididas em cinco blocos, que são: a) identificação da empresa; b) produção, mercados e emprego; c) inovação, cooperação e aprendizado; d) estrutura, governança e vantagens associadas ao ambiente local; e) ações de promoção.

É importante destacar que o intervalo temporal de análise das diversas questões presentes no instrumento de pesquisa foi dos últimos três anos (2007 a 2009). Ainda, grande parte das questões foi estruturada solicitando que os respondentes identificassem graus de importância, que variavam de baixa importância a muita importância, além da possibilidade de indicar se a questão era irrelevante para a empresa. Assim, justifica-se o porquê de muitas das análises que se seguirão, se somadas, totalizam valores acima de 100%, uma vez que muitas dessas questões eram de múltipla escolha.

Cabe-nos concordar com Tatsch (2008) quando argumenta que temas como aprendizado, conhecimento e inovação fazem parte de uma agenda de estudos em construção, necessitando de uma massa crítica de pesquisas ainda maior, afim de que se possam levantar outras variáveis (além das utilizadas aqui) para a melhor compreensão de tais questões. A que se levar em conta, também, a complexidade inerente ao estudo de temas como a cooperação entre empresas, e destas com outras instituições.

Feitas essas observações, importa mencionar algumas características da amostra, composta por empresas vinícolas inseridas no APL vitivinícola da Serra gaúcha.

4.1.1 Perfil da amostra

Inicialmente, é importante traçar um perfil das vinícolas investigadas no presente estudo, partindo-se da relação das empresas entrevistadas com sua localização no APL vitivinícola da Serra gaúcha. Todas as vinte empresas investigadas são nacionais e independentes, ou seja, não existem outras empresas no controle acionário/societário delas. Nisso se assemelham em muito a grande maioria das vinícolas brasileiras.

A Tabela 8 demonstra que quanto a localização das empresas entrevistadas há maior concentração em Bento Gonçalves (50%), seguida por Garibaldi (20%), Farroupilha (10%) e Flores da Cunha (10%). Duas empresas estão localizadas nos municípios de Cotiporã e São Marcos, ambos pertencentes ao APL vitivinícola da Serra.

Tal distribuição é facilmente explicada pelo predomínio da produção e do número de firmas nos municípios de Bento Gonçalves e Garibaldi, respectivamente o maior produtor de vinhos e o maior produtor de espumantes do Brasil.

Tabela 8 – Distribuição das empresas entrevistadas no APL por Municípios

Município Freqüência %

Bento Gonçalves 10 50,0

Cotiporã 1 5,0

Farroupilha 2 10,0

Flores da Cunha 2 10,0

Garibaldi 4 20,0

São Marcos 1 5,0

Total 20 100,0

Fonte: pesquisa de campo (2010)

Outra característica importante da amostra é sua segmentação por porte. Por uma particularidade na produção de vinhos, a classificação usual de empresas levando-se em consideração o número de funcionários, torna-se inapropriada, visto que o tipo de vinho (comum ou fino) e a preocupação com o posicionamento da marca no mercado (especialmente associado ao volume de produção) afetam diretamente o número de contratações necessárias. Em geral, vinhos finos requerem mais mão-de-obra que vinhos comuns.

Assim, optou-se por determinar o porte das empresas da amostra a partir da estimativa de seus faturamentos34. No questionário, as questões 11, 12 e 13 solicitavam que a empresa informasse a produção total de vinhos finos, comuns e suco de uva, no ano de 2009, expressos em litros. Com esses dados, buscou-se os preços médios desses produtos junto ao IBRAVIN. Com isso, estimou-se o faturamento das empresas, segmentando-as, posteriormente, conforme a classificação de empresas utilizada pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Social (BNDES)35. É evidente que tal estimativa carece de precisão, uma vez que não considera as possíveis práticas de sonegação fiscal36.

34Das empresas entrevistadas, apenas as duas de porte médio, aceitaram informar seu faturamento. Isso porque ambas são Sociedades Anônimas, e publicam seus balanços anualmente. As demais empresas se negaram a fornecer esse dado. Em entrevista com o IBRAVIN, houve o relato de que a organização, ainda que representante das vinícolas brasileiras, não conseguiam junto as menores empresas essa informação, o que leva a organização a estimar, também o faturamento do setor.

35O BNDES estipula o porte das empresas conforme seu faturamento anual: Microempresa (até R$ 2.400.000,00);

Pequena (de R$ 2.400.000,00 a R$ 10.500.000,00); Média (de R$ 10.500.000,00 a R$ 60.000.000,00) e Grande (acima de R$ 60.000.000,00). Poder-se-ia perfeitamente enquadrar, em circunstância do perfil das empresas que compõem o setor, estabelecer que empresas que faturam entre R$ 10,5 milhões e R$ 60 milhões como grandes empresas, porém, preferiu-se seguir à risca o esquema utilizado pelo BNDES.

36 Durante as entrevistas com empresários, muitos afirmaram que existe uma prática recorrente de sonegação de impostos, principalmente entre aquelas que produzem grandes volumes de vinho comum. Para muitos desses empresários essa prática garante a sobrevivência dessas firmas, dada a pesada carga tributária incidente sobre o produto final (vinho), bem como sobre os seus insumos, provocando efeitos em cascata que impossibilitam, segundo eles, a plena regularidade das empresas.

Tabela 9 – Distribuição das empresas da amostra por porte.

Porte Freqüência % % Válidos

micro 10 50,0 50,0

pequena 8 40,0 40,0

média 2 10,0 10,0

Total 20 100,0 100,0

Fonte: pesquisa de campo (2010)

A Tabela 9 apresenta a distribuição da amostra, segundo seu porte. Chama a atenção a inexistência de empresas de grande porte. O fato de 90% das empresas entrevistadas serem de micro e pequeno porte reforça as características do APL já apontadas nos capítulos anteriores. Na Tabela 10, observa-se a relação entre os municípios-sede das empresas da amostra, segundo seu porte.

Tabela 10 – Municípios X Distribuição da empresas da amostra (por porte).

Municípios

Porte

Total

micro pequena média

Bento Gonçalves 4 4 2 10

Cotiporã 0 1 0 1

Farroupilha 1 1 0 2

Flores da Cunha 1 1 0 2

Garibaldi 4 0 0 4

São Marcos 0 1 0 1

Total 10 8 2 20

Fonte: pesquisa de campo (2010)

Com relação ao número de funcionários, as empresas entrevistadas apresentaram, em média, 19 funcionários, incluindo entre esses os empregados das vinícolas e das unidades produtoras de uvas. Com relação a estas últimas, há uma quantidade significativa de mão-de-obra sazonal, empregada principalmente no período da safra (janeiro a março), que foram contabilizados. Apenas uma empresa da amostra afirmou possuir cinco funcionários, e duas empresas informaram possuir mais de cem funcionários (sendo que uma delas possui mais de quatrocentos empregados diretos).

Como já apontado anteriormente, o emprego (maior ou menor) de funcionários se estabelece de forma mais nítida, se se considerar a opção produtiva da empresa. Se optar por concentrar a produção nos vinhos finos, possivelmente ocupará mais mão-de-obra se optasse pela elaboração de vinhos comuns. Tal situação está vinculada ao fato da elaboração de vinhos finos e espumantes possuírem um maior número de etapas de produção37.

Entre as vinícolas participantes da pesquisa, observa-se uma concentração com relação ao ano de fundação das empresas. Os dados da Tabela 11 apontam para o surgimento de 10% da amostra antes de 1959; outros 10% nasceram na década de 60, enquanto que 65% das empresas iniciaram suas atividades vinícolas entre as décadas de 70 e 80. Apenas 15% das empresas informaram ter iniciado suas atividades após 1990.

Tabela 11 – Distribuição de empresas da amostra por período de fundação.

Período Freqüência %

antes de 1959 2 10,0

entre 1960 e 1969 2 10,0

entre 1970 e 1979 7 35,0

entre 1980 e 1989 6 30,0

depois de 1990 3 15,0

Total 20 100,0

Fonte: pesquisa de campo (2010)

As informações com relação ao ano de fundação das empresas corroboram a importância de se perceber a consolidação do APL vitivinícola da Serra gaúcha a partir de um olhar histórico-institucional. O fato de 65% das empresas terem surgido entre as décadas de 70 e 80 confirmam a leitura de que neste período ocorreu um intenso movimento no sentido de se ampliar a profissionalização e a industrialização do vinho nacional. Neste período, como já foi mencionado, ocorreu um grande esforço no sentido de profissionalizar a produção, tendo por objetivo a ampliação da oferta e do consumo

37Observa-se isso na Figura 1 dessa dissertação.

de vinhos no Brasil. Em especial, a década de 70 apresentou-se como o período de maior oportunidade às empresas do setor (nacionais ou estrangeiras sediadas no país), dado o significativo aumento do poder aquisitivo da classe média, fruto das políticas expansionistas orquestradas pelos governos militares.

Tal período se assemelha em muito ao atual momento em que vive o país, agora ancorado não apenas na estabilidade do poder de compra, mas na ascensão de camadas inferiores da sociedade que, ano após ano, tem ampliado seu poder aquisitivo, por conta, dentre outros fatores, da continuidade das políticas de garantia de renda às populações menos assistidas. Tais vinícolas, surgidas nesse período, investiram na diversificação, iniciando uma produção mista de vinhos comuns e finos. É o aumento do poder aquisitivo e a dimensão do mercado interno que estimulam o surgimento de vinhos de maior qualidade.

As empresas que surgiram após a década de 90 apresentam uma característica distinta, pois trabalham exclusivamente com vinhos finos e espumantes. Das empresas entrevistadas, cinco iniciaram suas atividades ao longo dos anos 90, em especial após a implantação do Plano Real. Essas empresas têm se especializado em vinhos de qualidade, buscando controlar a quantidade produzida como forma de garantir ao consumidor o fornecimento de um produto exclusivo. Estas empresas têm aproveitado o ambiente de valorização do consumo de vinhos, ainda que esta valorização, no Brasil, represente, também, a ampliação do consumo de produtos estrangeiros.

Outra informação relevante para se compreender a dinâmica recente das empresas vinícolas desse APL diz respeito ao tempo em que estas vêm trabalhando com vinhos finos. Das vinte empresas pesquisadas, apenas uma informou não trabalhar com vinhos finos, apenas com vinhos comuns. Isso demonstra que a grande maioria das

empresas tem adotado a produção de vinhos finos como uma estratégia de mercado, seja de permanência, seja de ampliação destes. Tal informação foi corroborada por uma série de entrevistados, bem como pelos especialistas ouvidos. Os dados da Tabela 12 indicam que 63% das empresas trabalham com vinhos finos em um período não superior a dez anos. Isso confirma a informação de que na última década as empresas têm acentuado seus esforços no sentido de produzirem cada vez mais vinhos de melhor qualidade.

Entre esses esforços ganha especial atenção o levantamento da indicação de procedência e a busca pela obtenção da denominação de origem (ambas no Vale dos Vinhedos). As que produzem vinhos finos a mais de onze anos representam 37% das empresas, coincidindo com o fato de terem iniciado suas operações na década de 80.

Tabela 12 – Experiência na produção de vinhos finos.

Período Freqüência %

até 4 anos 1 5,0

de 5 a 10 anos 11 55,0

de 11 a 20 anos 3 15,0

mais de 20 anos 4 20,0

Total 19 95,0

Não Resposta 1 5,0

Total 20 100,0 Fonte: pesquisa de campo (2010)

A heterogeneidade no setor vinícola não se expressa apenas na produção de diversos produtos, mas também no emprego de diversos canais de comercialização.

Questionadas sobre os principais canais de comercialização utilizados para o escoamento da produção vinícola, 65% das empresas da amostra apontaram ser de alta importância o atendimento de pedidos sob encomenda, em consonância ao fato de várias dessas empresas atuarem, independentemente do volume, com vinhos finos, que tem nesse canal sua principal forma de distribuição.

Nesta mesma direção, de valorização dos vinhos finos produzidos, 56% das empresas afirmam ser muito importante a existência de lojas próprias, geralmente

vinculadas às unidades produtivas. A adoção deste canal é uma estratégia adotada pelas empresas para dar visibilidade, a um custo reduzido, a variedade de produtos ofertados, em geral vendidos com preços diferenciados (abaixo dos preços praticados no mercado para o mesmo produto), além da oferta de outros utensílios, tais como taças, saca-rolhas, baldes de gelo etc., bem como de uma série de produtos promocionais, vendidos em embalagens e combinações especiais. Durante a realização das entrevistas, quatro das vinte empresas estavam investindo na ampliação de suas lojas próprias (quinze das vinte empresas possuem lojas próprias).

Questionadas sobre a importância do comércio varejista, em especial os supermercados, enquanto canal de distribuição de vinhos, não houve consenso entre os entrevistados. Para 35% das empresas da amostra, os supermercados não se apresentam como canal de preferência, enquanto para 53% delas, esse é o principal meio de comercialização de seus produtos38. Essa informação é importante, pois demonstra o elevado grau de desconfiança que está instalado entre as vinícolas e o setor varejista.

Segundo pesquisa realizada pelo IBRAVIN, cerca de 70% do todo o vinho comercializado no país (nacional e importado) é feito através das gôndolas dos supermercados. O crescente processo de oligopolização do setor varejista nacional, aliado ao elevado número de marcas e ao baixo estímulo à ampliação do consumo de vinhos, faz com que somente as empresas de maior porte do setor possam disputar nesse canal. Não é sem motivos que 82% dos respondentes atribuem elevada importância para a comercialização que é feita através dos distribuidores e representantes de venda, que geralmente atuam em seus mercados locais/regionais via varejos de menor porte, o que

38Cabe relembrar que grande parte das questões era de múltipla escolha, e tinham o objetivo de levantar o grau de importância atribuído as mesmas, pelos respondentes. Por isso, num grande número de casos, o somatório das respostas excede a 100%.

possibilita, além da expansão dos horizontes de atuação da vinícola, uma ampliação dos ganhos e do poder de barganha com as redes varejistas.

Com relação às vendas de produtos nos últimos três anos (2007 a 2009), a grande diversidade de linhas de produtos existentes dificultou as empresas a apresentarem valores precisos com relação a esta informação. Dessa forma, estes números representam a média das estimativas feitas pelas empresas, pensando em seus produtos de forma genérica. Assim, as empresas investigadas concentram, em média, 15% de suas vendas nos municípios da região da Serra gaúcha, 20% para outros municípios do RS, 63% para os demais estados do país, e apenas 2% do total comercializado se destina à exportação.

Quando questionados sobre a origem dos principais insumos e matérias-primas utilizadas no processo produtivo, a quase totalidade das empresas (19 vinícolas) apontou que tais recursos são adquiridos de empresas presentes na região. A única exceção se dá com relação à compra de garrafas, que são adquiridas de uma única empresa produtora, localizada em Campo Bom, cerca de 100 quilômetros de Bento Gonçalves. Outra característica é a presença de empresas multinacionais e importadoras de insumos enológicos na região. Praticamente todo o insumo utilizado, seja nas parreiras, seja na elaboração do vinho, provêem de outros países.

Com relação à origem dos equipamentos utilizados no processo de produção, a totalidade dos entrevistados informou que é possível, hoje em dia, montar uma vinícola utilizando-se apenas equipamentos nacionais. Os principais pólos produtores de máquinas e equipamentos, segundo as vinícolas, são a região da Serra gaúcha e São Paulo, sendo que neste último ocorre grande parte da fabricação de equipamentos que são utilizados pela indústria de bebidas de modo geral (lavadores de garrafas,

engarrafadoras etc.). No entanto, apesar do país ser auto-suficiente na produção desses equipamentos, é comum entre as empresas, independente do porte, a aquisição de equipamentos importados, principalmente centrais de engarrafamento (equipamentos responsáveis pelo envase, rolhamento e etiquetagem dos produtos), geralmente adquiridas da Itália. Na região da Serra gaúcha, estão concentradas as empresas fabricantes de equipamentos mais focadas na produção de vinhos e espumantes, tais como filtros, tanques de inox, prensas etc.

Questionou-se ainda aos respondentes acerca dos fatores determinantes para manter a capacidade competitiva da empresa em sua principal linha de produtos. Por ordem dos fatores mais citados, para as vinte empresas, os que merecem a sua máxima atenção e maior atribuição de importância são: qualidade do produto, capacidade de atendimento de pedidos (em volume e prazos), e a localização (o fato de estarem presentes no APL vitivinícola da Serra gaúcha). Mais uma vez, a partir da avaliação dessas respostas, pode-se perceber que, ao menos para as empresas da amostra, está ocorrendo um movimento de qualificação da oferta de vinhos, que passa necessariamente pela migração gradativa de produtos (de vinhos comuns para finos).

Em seguida, para 95% dos respondentes, o maior atributo determinante da competitividade está associado à qualidade da matéria-prima e de outros insumos. E é novamente na ampliação da oferta de vinhos finos que se explica esse resultado.

Posteriormente, os fatores com maior importância para a competitividade das vinícolas são: capacidade de introdução de novos produtos e processos, custo da mão-de-obra e adoção de novas estratégias de comercialização. Mudanças de embalagens e qualidade da mão-de-obra apresentam-se como os fatores com o menor nível de importância para a manutenção da competitividade das empresas.

Com base nessa caracterização inicial das empresas que compuseram a amostra da pesquisa, é possível apresentar a opinião dessas com respeito à inovação, à cooperação e ao processo de aprendizado, presente na próxima seção desse capítulo.

4.2 Inovação, Aprendizado e Cooperação

Na presente seção, pretende-se apresentar os dados obtidos em pesquisa de campo, procurando mapear as atividades de inovação e cooperação, e suas relações com o processo de aprendizagem que se desenvolve no interior do APL vitivinícola da Serra gaúcha.

A totalidade das empresas investigadas informou ter introduzido alguma inovação (de produto, processo ou organizacional)39 nos últimos três anos (2007 a 2009). Apesar de apresentar uma elevada taxa de inovação, se comparado com a média da indústria nacional40, percebeu-se que nenhuma das empresas investigadas introduziu alguma inovação inédita para o setor, seja nacional ou internacional. As inovações implementadas eram todas de caráter incremental, em grande parte reproduzindo melhorias (de produtos e processos) realizadas por empresas líderes, seja no mercado nacional, seja internacional.

39Utilizou-se aqui a mesma definição expressa na PINTEC (2002), que classifica: Inovações de produto – são produtos tecnologicamente novos, cujas características fundamentais (especificações técnicas, usos pretendidos, software ou outro componente imaterial incorporado) diferem significativamente de todos os produtos previamente produzidos pela empresa. A inovação de produto também pode ser progressiva, através de um significativo aperfeiçoamento tecnológico de produto previamente existente, cujo desempenho foi substancialmente aumentado ou aprimorado. Desta definição são excluídas: as mudanças puramente estéticas ou de estilo e a comercialização de produtos novos integralmente desenvolvidos, e produzidos por outra empresa; Inovação tecnológica de processo - refere-se a processo tecnologicamente novo ou substancialmente aprimorado, que envolve a introdução de tecnologia de produção nova ou significativamente aperfeiçoada, assim como de métodos novos ou substancialmente aprimorados de manuseio e entrega de produtos (acondicionamento e preservação). Estes novos métodos podem envolver mudanças nas máquinas e equipamentos e/ou na organização produtiva (desde que acompanhada de mudanças no processo técnico de transformação do produto).

40Ver PINTEC (2002).

Inquiridas sobre qual agente teve a principal responsabilidade pelo desenvolvimento da inovação de produto, 19 empresas da amostra informaram ser de sua própria autoria o desenvolvimento das etapas de inovação de produto. Apenas uma empresa informou ter desenvolvido tal inovação em cooperação com outras empresas ou institutos. Em grande parte as empresas apresentavam como inovação de produto a introdução de um novo vinho varietal, ou ainda um vinho fino resultante da combinação de várias uvas varietais. Muitas empresas, também, informaram que neste período investiram no desenvolvimento de espumantes; e é, nesse caso específico, que surgem as atividades de cooperação para desenvolvimento do produto. Isso se justifica pelo fato da elaboração de um bom espumante requerer um “vinho de base” de boa qualidade, que passe pela segunda fermentação e resulte em um espumante estruturado. Ocorre que muitas empresas, em especial as de micro e pequeno porte, ou não possuem o “vinho de base”, ou ainda não possuem os equipamentos necessários para a elaboração do espumante (no caso desse ser elaborado pelo método charmat). Isso implica no uso compartilhado de equipamentos e máquinas, em especial os tanques de resfriamento, que por seu elevado custo, ainda não está popularizado, principalmente entre as micro e pequenas empresas.

Essa significativa participação das empresas no desenvolvimento de inovação de produto está intimamente vinculada ao acelerado processo de diversificação de produtos que vem vivenciando o setor. Essa diversificação ocorre no sentido de se intensificar a produção de vinhos finos e espumantes, em qualidade cada vez maior. Também, segundo informação dada pelo Diretor-Executivo do IBRAVIN, uma das inovações de produto mais significativas dos últimos anos consiste na valorização e ampliação da produção de sucos de uva, em suas diversas formas (concentrado, adoçado, orgânico etc.). Dados do IBRAVIN apontam que nos últimos dois anos o crescimento na