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3 CARACTERIZAÇÃO DO APL DA VITIVINICULTURA DA SERRA

3.4. Periodização do ciclo da industrialização do vinho brasileiro

Montes e Alto Douro, de Portugal; Università degli Studi di Udine e Università degli Studi di Padova, da Itália e com o Liceu de Ensino Geral e Tecnológico Agrícola de Blanquefort, da França.

O campus Bento Gonçalves se constitui no maior centro formador de profissionais para a indústria vitivinícola do país. A quase totalidade dos técnicos e enólogos do APL é formada pela instituição, que por suas crenças e procedimentos pedagógicos, acaba por influenciando o “fazer” do vinho em seu cotidiano.

produção em maior escala de vinhos varietais; d) a partir dos anos 2000, a tecnologia se disseminou entre o setor vitivinícola gaúcho, chegando até as pequenas vinícolas, que começaram a controlar as fermentações, a utilizar leveduras e enzimas e usar tanques de aço inoxidável, que ampliou drasticamente a qualidade e competitividade das firmas gaúchas, inserindo parte da produção vinícola gaúcha no mercado internacional – ainda que por via de poucas e específicas empresas (EMBRAPA, 1982; TONIETTO;

MELLO, 2001; TONIETTO; MILAN, 2003; FARIAS; CAMPREGHER, 2008). Os ganhos com a exportação dos produtos vinícolas da Serra gaúcha ainda são muito reduzidos, porém, a experiência junto aos mercados internacionais tem produzido ganhos de conhecimento e expertise significativos às empresas que têm participado desse tipo de movimento. Tal situação pode ser visualizada na Figura 2, abaixo.

Figura 2 – Períodos Evolutivos da Vitivinicultura do Brasil

Fonte: Tonietto; Mello (2001:05)

Vale destacar que este corte temporal não pretende expressar que tais ciclos evolutivos se deram da mesma forma para todas as empresas da região. Tais movimentos são percebidos inicialmente pelas empresas de maior porte e pelas cooperativas. As empresas de menor porte, que se constituem ao longo dos anos a maioria das empresas da região, adotaram tais estratégias buscando a manutenção de suas posições de mercado. O mesmo pode-se afirmar acerca da ampliação das vendas para os mercados estrangeiros. Na verdade, como será abordado mais à frente nesse trabalho, a opção pelas exportações não está relacionada apenas a questão do porte das empresas, mas principalmente a uma estratégia de ampliação e valorização dos produtos e marcas no mercado interno.

Essa periodização é importante para se perceber o caráter evolutivo da vitivinicultura no Brasil (ainda que o predomínio das ocorrências em cada período se perceba no RS). Cada período compreende uma fase do ciclo de industrialização que ocorreu (e vem ocorrendo) com a vitivinicultura brasileira. No primeiro período, como já foi mencionado na primeira seção deste capítulo, ainda que se constate a presença de produção de uva e vinhos na região das Missões (1726) e em regiões de colonização portuguesa litorânea (Rio Grande e Pelotas, a partir de 1732), é com a chegada do imigrante italiano, a partir de 1875, que ocorre o primeiro grande salto da vitivinicultura gaúcha, quando da implantação dos primeiros vinhedos utilizando-se o sistema de latadas (PESAVENTO, 1983).

O surgimento da produção de vinhos está vinculado ao atendimento da demanda local e regional, mas à medida que a produção cresce, tais mercados se tornaram insuficientes para absorver a totalidade da oferta, conduzindo as empresas coloniais da Serra gaúcha a buscarem novas estruturas de produção e distribuição, “introduzindo uma nova dinâmica empresarial em torno desta atividade” (VARGAS, 2002: 185).

Vargas (2002) destaca que o desenvolvimento inicial do arranjo vinculado à produção de vinho está respaldado pela existência externalidades regionais, tais como:

a) estrutura fundiária baseada em pequenas propriedades, com uso de trabalho familiar;

b) mão-de-obra especializada nas técnicas de plantio e colheita de uvas; e c) infraestrutura incipiente de produção e distribuição, estabelecida nuclearmente em poucas empresas nacionais localizadas regionalmente.

Ainda neste primeiro período, o ciclo de industrialização foi marcado pelo surgimento das primeiras cooperativas, além do término das obras de construção da estrada de ferro que ligou Caxias do Sul à Montenegro, possibilitando uma rápida ampliação dos mercados, bem como uma maior integração da cadeia produtiva vitivinícola no RS.

Entre as décadas de 1930 e 1960, não se verifica grandes modificações nos processos produtivos e tecnológicos das vinícolas. Neste período, a única grande estratégia das empresas foi iniciar a implementação de um processo gradual de diversificação da produção, via introdução de cepas híbridas, além das americanas já amplamente exploradas na Serra gaúcha. A diversificação passou também pela ampliação do número de produtos derivados do vinho, como é o caso da graspa, do brandy e da sangria.

A partir de década 1970, inicia-se uma nova etapa do ciclo de industrialização da vitivinicultura, tendo por finalidade a melhoria da qualidade dos produtos oriundos do arranjo vitivinícola da Serra gaúcha, através de investimentos na modernização do parque industrial local e na expansão da produção vitícola, alicerçada na importação de mudas européias que garantiram uma maior adaptação ao clima da região (VARGAS, 2002).

Neste mesmo período (década de 70), inicia-se o ingresso de inúmeras empresas de capital estrangeiro no Brasil, se instalando em sua totalidade na Serra gaúcha. Fica evidente a intenção destas empresas em aproveitar o crescimento do mercado interno brasileiro no período. Esse crescimento foi sustentado pela ampliação do poder aquisitivo da classe média urbana, possibilitando o surgimento, pela primeira vez, de um genuíno mercado nacional de vinhos finos nacionais, em substituição aos produtos importados. Nesse momento, a indústria vitivinícola acompanha as movimentações estruturais que ocorrem no Brasil, nos setores mais diversos.

Para Vargas (2002), as empresas locais, em especial as com maior capacidade produtiva, foram capazes de absorver as mudanças tecnológicas necessárias nesse processo de reorganização e modernização da produção vinícola. Assim, entrada de capital externo no arranjo se deu através do estabelecimento de alianças estratégicas entre empresas nacionais e grupos estrangeiros (VARGAS, 2002: 188).

O último período de modificação da vitivinicultura brasileira é caracterizado por uma intensificação dos investimentos em tecnologia e na melhoria da qualidade dos produtos, através da consolidação de regiões determinadas e identificadas para a produção de vinhos finos específicos. Esse representa o maior salto de investimento tecnológico feito pelas empresas do arranjo, desde o melhoramento genético de cultivares até o desenvolvimento de novos processos de elaboração de vinhos e espumantes.

Fica evidente que o processo de formação e consolidação deste APL está intimamente vinculado aos contextos históricos e culturais, se confundindo com a própria trajetória de construção das identidades regionais (COOKE et al., 1997;

VARGAS, 2002). Assim, a conformação histórica, cultural e institucional da região da

Serra gaúcha impactou diretamente a organização e consolidação da indústria vinícola do RS e do Brasil, de maneira geral.

Com base nessa caracterização do APL pretende-se, no próximo capítulo, apresentar os principais resultados da pesquisa de campo, que teve por finalidade perceber, pela ótica dos empresários e das instituições, o papel da cooperação, dos processos de aprendizagem e da inovação no APL da vitivinicultura da Serra gaúcha.

4 APRENDIZADO, INOVAÇÃO E COOPERAÇÃO EM VINÍCOLAS DA