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Apropriabilidade do lucro com a inovação

No documento FATORES DETERMINANTES DA INOVAÇÃO DISRUPTIVA (páginas 110-117)

1 INTRODUÇÃO

2.7 Apropriabilidade do lucro com a inovação

Quais são as razões para que determinadas empresas emergentes e com tecnologias potencialmente disruptivas deixem de se apropriar dos ganhos dessa inovação? Por vezes, fatores como a acumulação criativa e outros recursos pré- existentes podem ser decisivos nisso (BERGEK et al., 2013). Assim, o estudo da apropriabilidade pelos inovadores merece atenção. Mas faltam bons indicadores nesse sentido, pois diferenças no tamanho da firma e na concentração de mercado são insuficientes (DOSI, 2006). Deve-se considerar também se o regime de apropriabilidade é fraco ou forte, conforme o grau de proteção da tecnologia. Quanto

aos recursos, depende se são genéricos, especializados ou coespecializados. A decisão se tais recursos devem ser contratados ou integrados também é importante. Portanto os governos precisam atentar também para a infraestrutura subjacente a esses recursos (TEECE, 1986). Conforme Assink (2006), o novo produto com potencial disruptivo tem que ter as condições para ser atualizado com rapidez, bem como ter sua comercialização, atendimento e serviço com custo competitivo.

Produtos de potencial disruptivo como as microturbinas e os automóveis elétricos não foram bem-sucedidos em desafiar as firmas estabelecidas. Em vez disso, as empresas tradicionais ganharam a maior parte da nova onda de interesse por veículos elétricos, iniciada nos anos de 1990. A mesma situação ocorreu com as microturbinas. Duas características principais da acumulação criativa contribuem para entender o motivo de os novos entrantes terem falhado nas microturbinas e nos veículos elétricos. Primeiro, nas indústrias caracterizadas pela acumulação criativa, a necessidade de alcançar desempenho suficiente em atributos relevantes implica uma barreira efetiva para a entrada nos mercados principais. Os atacantes não podem se equiparar ao conhecimento e experiência acumulados pelas empresas tradicionais e tendem a achar muito difícil desenvolver e fabricar produtos competitivos para os mercados principais (BERGEK et al., 2013).

Os exemplos citados estão em linha com a sugestão da literatura prévia de que os recursos pré-existentes desempenham um papel importante na explicação do sucesso, ao se entrar em novos campos. Empresas com perfis de recursos que correspondem às exigências de uma indústria, por exemplo, com um gap de recurso menor, são mais prováveis de entrarem em um novo campo (HELFAT & LIEBERMAN, 2002, apud BERGEK et al., 2013). A necessidade de combinar tecnologias estabelecidas, mas envolvidas com novo conhecimento e para competir com desempenho melhorado ao longo do critério de desempenho estabelecido, também explica a falta de atacantes externos nos motores híbridos e nas turbinas a gás de ciclo - microturbinas (BERGEK et al., 2013).

Dada a predominância de "D" na P&D industrial (três quartos do gasto total na Grã-Bretanha e em outros lugares ocorriam no desenvolvimento), a especificidade (produtos e processos de produção específicos) constitui um aspecto fundamental das inovações nas empresas, tanto no sentido da aplicação funcional quanto no da

apropriabilidade do conhecimento importante pelas firmas inovadoras. Nelson (1981, apud Pavitt, 1984) pontua três aspectos relativos ao direcionamento e à taxa da mudança tecnológica na economia ocidental: (1) as fontes de tecnologia, (2) a natureza das necessidades dos usuários e (3) a apropriabilidade pelos inovadores de parte dos benefícios resultantes de seus esforços, em grau suficiente para justificar os gastos envolvidos (PAVITT, 1984).

Nos dez primeiros anos da história dos semicondutores, o conjunto das empresas que iniciaram as inovações diferia sobremaneira daquele formado pelas organizações que as exploraram com sucesso. Parece existir a possibilidade de a pesquisa básica apresentar uma característica geral em que o inovador deixa de se apropriar totalmente dos ganhos financeiros envolvidos. Os estímulos à inovação conduzida pelas empresas se vinculam aos benefícios econômicos ou ao seguro contra possíveis perdas pela apropriação da inovação por outras empresas. Assim, entende-se que os benefícios econômicos devem ser proporcionais ao nível de apropriabilidade de cada inovação. A oportunidade, embora necessária, não define o quanto as empresas se comprometem com a inovação. Esse comprometimento ocorre conforme a apropriabilidade. Faltam bons indicadores sobre as diferenças de apropriabilidade, havendo uma tendência em, erradamente, se restringir tais assimetrias apenas ao tamanho das empresas e à sua concentração no mercado. Além disso, faltam bons indicadores para as oportunidades de inovação (DOSI, 2006).

Nesse sentido, denomina-se regime de apropriabilidade os fatores relativos à capacidade de captura dos resultados proporcionados pela inovação, exceto a estrutura da firma e do mercado. Assim, consideram-se duas dimensões principais para o regime de apropriabilidade: a natureza da tecnologia e a eficácia dos mecanismos legais de proteção. Identificam-se, grosso modo, dois tipos de regime de apropriabilidade: o "forte" e o "fraco". O primeiro se refere ao regime em que a tecnologia é relativamente fácil de proteger. O regime "fraco" diz respeito àquela tecnologia quase impossível de ser protegida (TEECE, 1986).

Outro ponto importante a ser observado refere-se ao momento de introdução da inovação no mercado. Por exemplo, um novo tipo de equipamento consiste, simplesmente, em um elo dentro de uma cadeia de melhorias. Desse modo, ele

pode ficar obsoleto. Então, investir em cada elo dessa cadeia pode se mostrar irracional e gerar perdas. Faz-se necessária uma avaliação e certa espera para o entendimento sobre o comportamento da cadeia (SCHUMPETER, 1942).

Muitas vezes, os inovadores mais ágeis no passado podem acomodar-se aos equipamentos menos atualizados (embora ainda viáveis) em vez de àqueles utilizados pelos novos entrantes. Se considerado apenas esse aspecto da questão, isso representa uma vantagem das novas empresas sobre as antigas e confere um caráter temporário às posições de oligopólio (DOSI, 2006).

Sobre o momento adequado da inovação, existem duas fases: o estágio pré- paradigmático e o estágio paradigmático. A primeira fase é aquela em que ainda não existe um padrão dominante no mercado com base na tecnologia em questão. Nesse período, os processos são ajustados livremente, e o foco está no projeto, no desenvolvimento da tecnologia em si. Quanto ao estágio paradigmático, ele ocorre quando emerge um projeto dominante. Nesse momento, o foco passa para a redução de custos, uma vez que a competição passa a se dar mais pelo preço (UTTERBACK, apud TEECE, 1986). Assim, "a existência de um projeto dominante reveste-se de um grande significado para a distribuição dos lucros entre o inovador e o seguidor" (TEECE, 1986, p. 288).

Em um levantamento que abrangeu cem empresas, a rapidez da imitação é representada já pelo prazo em que novos produtos de P&D normalmente são conhecidos pela concorrência: 12 a 18 meses, sendo que, em 20% dos casos, tal ocorrência se deu em aproximadamente seis meses após o início do desenvolvimento (MANSFIELD, apud SCHNAARS, 1997).

O terceiro e último "bloco de construção" sobre a apropriabilidade dos resultados da inovação diz respeito ao que se denomina como "recursos complementares". Trata-se daqueles recursos que viabilizam serviços estratégicos normalmente fundamentais para a comercialização do objeto da inovação. Entre essas ações, citam-se marketing, fabricação competitiva e suporte pós-venda. Os recursos complementares para tais serviços seriam especializados. Elencam-se ainda outros dois tipos de recursos que podem ser necessários à produção e à comercialização dos produtos inovadores. Assim, classificam-se os recursos complementares em genéricos, especializados ou coespecializados (TEECE, 1986).

Como genéricos entende-se aqueles recursos que, apesar de necessários à inovação, não se prestam especificamente a ela. Um exemplo são as máquinas que, em uma indústria de tênis, servem para a fabricação das solas utilizadas em vários tipos desse calçado. Muitas vezes, a inovação se dá em outras partes dos tênis que são específicas para cada modelo. Os recursos especializados implicam, por sua vez, "dependência unilateral entre a inovação e o recurso complementar" (tradução livre) (TEECE, 1986, p. 289). Isso quer dizer que o recurso especializado é exclusivo para que a concretização da entrada da inovação no mercado aconteça. Por exemplo, determinado hardware pode somente encontrar aplicação se for desenvolvido um software exclusivo para ele (TEECE, 1986).

Os recursos coespecializados implicam dependência bilateral. Cita-se o exemplo da utilização de contêineres, que depende de recursos coespecializados, tanto no embarque marítimo quanto nos terminais de carga. No entanto as transportadoras por caminhões dependem menos do embarque marítimo nesse caso do que o contrário, haja vista que elas podem adaptar suas carrocerias para contêineres a um custo menor. Existem vantagens óbvias para o inovador contratar os recursos complementares: redução de riscos e de investimentos necessários, por exemplo. No entanto alerta-se para o problema similar àquele associado à atração de capital de risco: o inovador tem que convencer o sócio detentor dos recursos complementares de que o risco vale a pena. Por outro lado, deve-se considerar a probabilidade de abusos oportunistas dos dois lados. O inovador pode querer supervalorizar a inovação, e o fornecedor pode almejar "roubar" a tecnologia (TEECE, 1986).

A outra opção refere-se à integração. A integração se verifica quando o inovador adquire ou desenvolve a fonte dos recursos e capacidades complementares necessários, em vez de contratá-los de terceiros. Isso pode ser mais requerido no caso de o regime de apropriabilidade ser fraco, ou seja, se o grau de proteção for pequeno, facilitando a imitação. Para esse caso, enfatiza-se que o controle das capacidades complementares pode tornar-se um fator chave de sucesso. Normalmente, os chamados "gargalos" encontram-se nas competências de distribuição e fabricação especializadas. Mesmo quando as firmas perseguem a estratégia ótima, outras indústrias participantes podem ter as "cartas na mão", no

jogo da inovação. Tal possibilidade é baixa quando a propriedade intelectual em questão é fortemente protegida. Entretanto, quando a proteção da propriedade intelectual é fraca,

[...] é bastante claro que o inovador frequentemente perderá para os imitadores e/ou possuidores de recursos, mesmo quando o inovador perseguir a estratégia apropriada [...] Claramente, estratégias incorretas podem compor problemas. (TEECE, 1986, p. 297. Tradução livre)

Esses problemas podem resultar em vultosos investimentos desnecessários e na exposição a maiores perdas, por um lado, ou por outro, simplesmente o próprio possuidor de recursos e capacidades especializados vir a se tornar um imitador que se aproprie do mercado e carregue até todos os benefícios da inovação. Os governos não devem focar apenas a Pesquisa e Desenvolvimento (P&D), mas também os recursos complementares que "tendem a ser especializados ou coespecializados para a inovação" (tradução livre) (TEECE, 1986, p. 304). A infraestrutura subjacente a esses recursos também deve ser objeto da preocupação dos governos. O assunto ganha dimensão de estratégia competitiva nacional, uma vez que as firmas detentoras dos recursos complementares especializados podem se encontrar fora das fronteiras nacionais. Isso traz implicações para a distribuição dos resultados entre as nações. Assim, não se trata apenas de incentivar a pesquisa, mas de estimular e proteger o seu uso internamente (TEECE, 1986).

Em uma visão de processo, tem-se que a lucratividade de um novo produto pode erodir rapidamente se ele não for projetado para ser atualizado com rapidez e se ele não for comercializado e atendido em serviço com efetividade de custo. Sandberg (2002, apud Assink, 2006) advoga em favor de uma cooperação próxima e proativa entre as equipes de marketing e de desenvolvimento dos novos produtos radicais. Existe uma grande necessidade de educar o mercado sobre os novos produtos radicais para criar uma consciência oportuna sobre o novo conceito ou visão, mesmo na fase pré-introdução (ASSINK, 2006).

Os mesmos tipos de fatores que em geral inibem a ID por parte das firmas tradicionais – como experiência e maior comprometimento em termos de recursos (CHRISTENSEN, 1997) – podem ser imprescindíveis para que as empresas que desenvolvem tecnologias disruptivas tenham sucesso na apropriação dos

resultados, o que está coerente com o pensamento de Bergek et al. (2013). A solução para esse paradoxo pode estar no momento e na dosagem da “injeção” desses ingredientes. Nesse raciocínio de investimento variável e crescente, a única constante seria o regime de apropriabilidade (TEECE, 1986). Desse modo, as condições institucionais e legais de proteção da nova tecnologia precisam ser dadas; as demais, dosadas ao longo do tempo de cada processo disruptivo.

No documento FATORES DETERMINANTES DA INOVAÇÃO DISRUPTIVA (páginas 110-117)