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APROXIMAÇÕES DOS FENÔMENOS DA ADOLESCÊNCIA QUE ATUA PELA INFRACIONALIDADE E DA JUSTIÇA JUVENIL

Quem é castigado já não é aquele que realizou o ato. Ele é sempre o bode expiatório.

Frederich Nietzsche.

Breves considerações sobre o ato infracional e as medidas socioeducativas

No presente capítulo buscaremos localizar os leitores nesse fenômeno complexo repleto de neologismos e slogans pomposos de sentidos difusos. Para 4 tanto, explicaremos de forma sucinta a justiça juvenil e a questionaremos com auxílio da criminologia crítica.

Não concordamos com o termo vigente: “adolescente autor de ato infracional”, visto que em psicanálise, conforme demonstraremos, trata-se muito mais de uma atuação/acting out/passagem ao ato. Situações nas quais não há autoria, visto também não haver sujeito. Assim trabalharemos com a expressão: adolescentes que atuam pela infracionalidade.

Também rejeitamos o termo “delinquente” por cometer o equívoco de reduzir o sujeito a um feito, conforme também discutiremos com a ética da complexidade logo em seguida. Utilizaremos os termos infracionalidade e sujeitos que infracionam. Por vezes usaremos os termos atuação infracional/infracionalidade/ seara infracional, como versa o ordenamento jurídico. Delinquente rotula dentro daquilo que compreenderemos com auxílio de algumas correntes criminológicas como etiquetamento e carreiras criminais. Rejeitaremos ainda a palavra delinquência, pelo peso que adquiriu na criminologia ontológica-etiológica- naturalista-determinista-simplificadora.

Assim, por infracionalidade compreendemos momento da “carreira criminal” de alguns adolescentes que praticaram reiteradamente atos infracionais. Elliot e Menard (1996), a definem como classe observável de comportamentos ilegais ou de subjacentes, inobserváveis, individual predisposição construída para o

O termo complexidade, reinventado por Morin de acordo com o termo latino complexus, refere-se ao 4

desvio (potencial infracional), fruto da trajetória de adolescentes que apresentam dificuldade no enlaçamento social, sintomatizando por meio da atuação infracional.

No ordenamento jurídico brasileiro, o adolescente é inimputável. A Constituição Federal é clara em seu artigo 228: “são penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às normas da legislação especial”. A Legislação Especial, lei complementar à Carta Magna, veio com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA - Lei 8.069/1990), que em seu artigo 103 normatiza que “considera-se ato infracional a conduta descrita como crime ou contravenção penal” e no art. 105 esclarece que “o ato infracional praticado por criança corresponderão as medidas previstas no art. 101”, que denominamos “protetivas”. Após uma série de asseguramentos legais, define no art. 108 que “a internação, antes da sentença, pode ser determinada pelo prazo máximo de quarenta e cinco dias.”

Os artigos 110 e 111 definem os procedimentos processuais. Os artigos 112 a 125 discorrem sobre as medidas socioeducativas, que são de advertência, obrigação de reparar o dano, prestação de serviços à comunidade, liberdade assistida, inserção em regime de semi-liberdade, internação em estabelecimento educacional, qualquer uma das previstas no art. 101, I a VI (de proteção). Os artigos 126 a 128 versam sobre a remissão e os artigos 130 versam sobre medidas pertinentes aos pais ou responsáveis pelo adolescente.

Ainda sobre a questão da (in)imputabilidade, o Código Penal Brasileiro assinala no Art. 26 que

É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar- se de acordo com esse entendimento.

No ensinamento de Nucci, a Imputabilidade penal configura-se como:

o conjunto das condições pessoais, envolvendo inteligência e vontade, que permite ao agente ter entendimento do caráter ilícito do fato, comportando- se de acordo com esse entendimento. O binômio necessário para a formação das condições pessoais do imputável consiste em sanidade mental e maturidade (NUCCI, 2013 p. 287).

Assim, o inimputável não comete crime, mas pode ser sancionado penalmente, aplicando-lhe medida de segurança, no caso em questão, socioeducativa. Todavia, o que vimos no Brasil é uma penalização com adaptações

da justiça penal do adulto. Uma penitenciarição do sistema socioeducativo. Versa a Doutrina SINASE (conjunto de normas que versam sobre o atendimento socioeducativo: Resolução 119/2006 - CONANDA; Lei 12.594/2012 e leis já citadas aqui) que a medida socioeducativa tem um caráter sancionatório e centralidade em seu caráter pedagógico. Contudo, não é o que assistimos no Brasil. Prevalece uma concepção de justiça retributiva e punitiva.

Os adolescentes que cumprem medida socioeducativo de internação, como é o caso dos sujeitos desta pesquisa foram sentenciados por muitas reincidências, conforme demonstra a Tabela 13 e gravidade. São poucos os que sejam sentenciados para uma internação socioeducativa sem reincidência, como será o caso de um de nossos sujeitos de pesquisa Guri 15, o que se explica pela gravidade.

Um adolescente que comete um ato infracional é conduzido a uma Delegacia de Polícia Especializada. No caso do DF: Delegacia da Criança e do Adolescente (o DF possui duas dessas delegacias, uma na cidade de Brasília e outra em Taguatinga), de lá é encaminhado para o Núcleo de Atendimento Inicial (NAI) onde é atendido pelas políticas públicas de assistência social, escolarização e saúde e é atendido pela promotoria de justiça, a defensoria pública e por juiz da infância e juventude. De lá é liberado ou encaminhado para uma Internação Provisória ou cautelar (no caso do DF na Unidade de Internação Provisória de São Sebastião e, se do sexo feminino, para a Unidade de Internação de Santa Maria onde realizamos nossa pesquisa). A Vara da Infância e Juventude tem até 45 (quarenta e cinco) dias para julgar o ato. Caso caracterize um ato infracional, o adolescente é sentenciado e passa a cumprir a medida em uma das Unidades de Internação do DF considerando critérios de proximidade da residência e segurança.

Alguns pressupostos sobre o ato infracional

Nossa compreensão sobre fenômeno infracional é complexa. Conforme já sinalizado em alguns momentos desta pesquisa, compreendemos a interlocução entre o psíquico, o social, o biológico e o cultural, num movimento que dialógico e recursivo (MORIN, 1996).

Afiliamo-nos a uma ética complexa. Em poética escrito, Morin (2007) nos lembra que ao tempo em que avançamos na compreensão do estrangeiro e do estranho,

parece termos regredido na compreensão do próximo e a incompreensão produz a vontade de prejudicar que gera incompreensão.

É da incompreensão que se produz culpados.

Defende uma compreensão complexa, como aquela que não reduz o outro a um de seus traços, ou um de seus atos, mas busca compreendê-lo em uma apreensão mais ampla de suas dimensões, inclusive seus contextos.

Para o autor, a intolerância ao erro, a indiferença, a incompreensão de cultura a cultura, o apego às ideias, o egocentrismo, a cegueira por desconhecimento da complexidade e o medo de compreender são grande motivadores da incompreensão.

Esclarece que compreender não é justificar, visto que a compreensão não desculpa nem acusa. Não é que não julgue, mas complexifica esse julgamento. Compreender um sujeito que cometeu um crime não significa tolerar o crime, não é inocentar nem se abster de julgar e de agir, mas reconhecê-los em sua condição humana, sem reduzi-lo à perversidade e ao crime que ele tenha cometido, mas reconhecer suas potencialidades, por vezes dominadas por suas ações destrutivas.

Trata-se de uma ética do perdão, que não é o prêmio pelo arrependimento (como na religião), mas uma postura que antecede o arrependimento. É um crédito conferido ao sujeito, por suas potencialidades, por sua face boa, por sua dimensão de humanidade. É uma aposta ética, uma aposta na possibilidade de transformação, regeneração, conversão daquele que falha. Tem o objetivo de gerar o arrependimento, um processo de reflexão crítica de seus atos; baseia-se na compreensão. Afirma Morin:

A compreensão complexa engloba explicação, compreensão objetiva e compreensão subjetiva. A compreensão complexa é multidimensional; não reduz o outro a somente um dos seus traços, dos seus atos, mas tende a tomar em conjunto as diversas dimensões ou diversos aspectos da sua pessoa. Tende a inserir nos seus contextos e, nesse sentido, simultaneamente, a imaginar as fontes psíquicas e individuais dos atos e das ideias de um outro, suas fontes culturais e sociais, suas condições históricas eventualmente perturbadas e perturbadoras. Via a captar os aspectos singulares e globais (MORIN, 2007b, p. 112-113).

Esse caminho considera a dimensão sapiens/demens da condição humana.

Morin nos lembra que o arrependimento abre caminhos para o perdão, assim como o perdão pode abrir a porta para o arrependimento, pois o verdadeiro

perdão vem antes do arrependimento e é capaz de desencadeá-lo. Portanto, o perdão é um ato de confiança.

Nossa caminhada enquanto e com o ser humano e mais especificamente com a temática infracional juvenil desde o final da década de 1990, nossos caminhos pelos estudos e vivência clínica com a Psicologia não nos permite associação ao discurso comum de uma disposicionalidade criminosa como escolha individual ou patologias que encontrariam na genética ou na psicofisiologia explicações que desconsiderassem o sócio-cultural.

Até podemos considerar com Rolim (2014) uma disposicionalidade violenta como a propensão socialmente legitimada por uma matriz valorativa com exterioridade e generalidade, que se calca em condições sociais objetivas que aumentam a probabilidade de ocorrência e fenômenos independentes da vontade/ consciência dos agentes envolvidos.

Outra questão que convém considerarmos é nossa compreensão de que estamos lidando com “verdades Jurídicas”, segundo Young (2002), produto de uma seleção realizada pelo aparato persecutório do Estado que vai desde a abordagem policial, às limitações estruturais à justiça sobretudo aos pobres e negros com baixa escolarização. Assim, compreendemos os nossos dados não como mera expressão do real, mas também como resultado dessas verdades jurídicas e como sintomas das disfunções do sistema.

Compreendemos com Wacquant (2005) que as ações desses adolescentes ancoram-se também num habitus, por ele compreendido como as disposições duráveis, propensões estruturadas do pensar e do agir, matriz de percepção, apreciação e ação resultante da interação do sujeito com o mundo, interiorização do interior, exteriorização do interior e princípio das escolhas.

O comportamento delinquente não é uma constante na vida dos indivíduos, mas especialmente vinculado à juventude. Inúmeros são os estudos, entre os quais destacamos Flood-Page et al. (2000), que demonstram que os jovens aparecem como os principais atores desse fenômeno. É possível citar algumas correntes de explicação do fenômeno da infracionalidade juvenil: organicista, intrapsíquicas, interacionistas, conforme demonstram Cerqueira e Lobão (2004).

O econometrista Thorneberry (1996) demonstra, a partir de dados empíricos, que os crimes violentos não são uma constante na vida dos indivíduos, mas um ciclo que se inicia na pré-adolescência, atinge seu ápice em torno dos 20 anos de idade e seu esgotamento em torno de 30 anos. Também Legge (2008) atesta esse padrão.

Interessante estudo é feito por Loeber (1996), no qual defende que os problemas comportamentais iniciam-se na primeira infância podendo persistir com agravamento, caso não sejam devidamente administrados – o que é objeto desta pesquisa. Os transtornos de comportamento costumam redundar em perdas escolares, desempoderamento, empoderamento pela indisciplina, formação de novas alianças, isolamento e reforço por parte do ambiente. Todavia, essa porta que se fecha coincide com as portas que se abrem entre os pares ou nos grupos mais organizados para o crime, conforme apresentado aqui em minha memória educativa.

Agregando uma discussão socioeconômica a esse fenômeno, L.Chioda et al. (2015) demonstram a diminuição dos homicídios entre adolescentes de 16 e 17 anos de idade, atendidos pelo Programa Bolsa Família, em contextos de vulnerabilidade. Investigando os canais que poderiam explicar essa causalidade, os autores destacam o aumento da renda e as convivências no ambiente escolar.

Segundo o ordenamento jurídico brasileiro, adolescentes são pessoas entre 12 e 18 anos de idade, delimitação com a qual trabalharemos nesta tese. Pessoas menores de 12 anos de idade são consideradas crianças e maiores de 18 são consideradas adultas.

Ato infracional é a atitude cometida por adolescentes análoga ao que é tipificado pelo Código Penal como crime ou à contravenção penal cometida por adultos. As crianças e os adolescentes são inimputáveis de acordo com o texto legal.

Quando uma criança comete um ato infracional, o Estado implementa o que o ECA denomina como “medidas de proteção” ou “protetivas”. Quando um adolescente é o autor do ato, a questão é tratada no âmbito da justiça juvenil, por meio da qual o adolescente é apreendido pela Política, preferencialmente uma delegacia especializada. A Polícia o leva para o Núcleo de Atendimento Inicial (NAI), onde é apresentado pelo Ministério Público a um juiz (plantonista ou especializado) que, na presença de um defensor público, determina a soltura ou internação cautelar

(ou provisória) em unidade própria – no caso do Distrito Federal a Unidade de Internação Socioeducativa de São Sebastião (UISS) e a Unidade de Internação de Santa Maria (UISM), em caso de adolescentes do sexo feminino – por um período de até 45 (quarenta e cinco) dias, durante o qual seu processo será julgado, podendo resultar em liberação da medida ou encaminhamento para uma medida socioeducativa.

Dessa pequena explicação apresentada, é possível identificar que uma série de disfunções já se mostram em nosso país, visto possuirmos uma legislação muito arrojada, contudo, ainda marcada por uma prática equivocada, chamada pelos ativistas de menorista, punitiva, hiperencarcerizante.

Primeiramente destacamos que a justiça juvenil no Brasil ainda é muito frágil, como demonstra levantamento do próprio Conselho Nacional de Justiça (BRASIL, 2012b), que demonstra a fragilidade do Poder Judiciário no que tange às Varas especializadas de infância e juventude, à especialização do magistrado concernente à psicologia do desenvolvimento adolescente e sobre a Doutrina de Proteção Integral e ao déficit de comarcas e de defensores públicos, especialmente para as áreas da infância e juventude.

Por “Doutrina SINASE”, compreendemos o conjunto de leis que compõem o que Sistema Nacional do Atendimento Socioeducativo (SINASE). São elas o ECA que versa sobre a adolescência e a autoria do ato infracional, inclusive sobre o direito processual desses casos; a Resolução nº 119 de 2006, do Conselho Nacional dos Direitos da Criança (CONANDA), e a lei 12.594, de janeiro de 2014, também conhecida como lei SINASE. Além desses documentos, há recomendações e súmulas do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e a consequente operacionalização em documentos orientadores federais, normalmente emitidos pela Secretaria Nacional de Direitos Humanos, como é o caso do Plano Nacional de Atendimento Socioeducativo ou pelos Ministérios da Educação, do Desenvolvimento Social e da Saúde. Há, ainda, os Planos Estaduais e Municipais e normatizações próprias das Secretarias executoras das medidas.

Se a situação ainda é frágil até mesmo para os juizes titulares das Varas de Infância e Juventude, não fica difícil pensar as implicações negativas para os adolescentes quando a questão é tratada por juízes plantonistas. Como um número muito grande de atos infracionais é cometidos nos fins de semana, noites e feriados,

muitos adolescentes têm o primeiro atendimento por um juiz plantonista, que tendem a determinar a internação para a maioria dos casos, em desacordo, inclusive, com as orientações próprias do poder judiciário, como é o caso da Súmula 492/2006 (BRASIL, 2006).

As medidas socioeducativas previstas em lei são: advertência, reparação do dano, prestação de serviço à comunidade (PSC), liberdade assistida (LA) – todas essas consideradas como medidas de meio aberto e são exatamente o que os nomes sugerem –, semi-liberdade (SL) e internação estrita (essas duas consideradas de restrição de liberdade). Os adolescentes em cumprimento de PSC ou LA são atendidos pelos Centros de Referência Especializados em Assistência Social (CREAS), como parte da Política Nacional de Assistência Social (PNAS), com exceção do Distrito Federal, onde esses adolescentes são atendidos por uma Secretaria específica para a infância e juventude, o que afeta, diretamente, o recebimento de verbas federais para essas importantes políticas.

No Distrito Federal, os adolescentes cumpridores dessas medidas são atendidos pelas Unidades de Atendimento em Meio Aberto (UAMA). No entanto, como faltam servidores para esse serviço, muitos dos adolescentes prescrevem a medida sem que nenhum atendimento seja feito, o que costuma reforçar o sentimento de impunidade. Os adolescentes em cumprimento de PSC e LA devem estar matriculados em escolas e terem sua vida escolar acompanhada. Estas são as políticas que mais eficientes, efetivas e eficazes, quando devidamente implementadas.

A doutrina SINASE sugere que o adolescente, mesmo internado, esteja o mais próximo possível de sua comunidade. Todavia, no Distrito Federal, promoveu- se uma divisão também por faixa etária, separando-se os jovens que se encontram entre 18 (dezoito) e 21 (vinte e um) anos de idade em uma UI específica: a Unidade de Internação do Recanto das Emas (UNIRE). Há, ainda, a Unidade de Saída Sistemática (UNISS), que também fica nessa cidade, o que não tem sido uma boa experiência por juntar em um mesmo espaço conflitos de territorialidade que redundam numa grande evasão.

O adolescente ficará internado por um período de até três anos ou até que complete 21 vinte e um anos. Ocorre que, quando o adolescente comete o ato

infracional próximo aos 18 (dezoito) anos de idade, conclui o cumprimento da sentença ainda no sistema socioeducativo, no caso do DF, na UNIRE.

Em tese, a medida socioeducativa deveria ser uma medida educativa e sancionatória e as UI deveriam ser educandários. No entanto, o que a prática nos mostra é que são uma tentativa mal-sucedida de reprodução do sistema prisional. O resultado é que a reincidência no Brasil e no DF é muito alta para as medidas em meio fechado e, ainda assim, o Distrito Federal faz um investimento muito maior para as medidas de meio fechado e pouco investimento no meio aberto.

Nas medidas socioeducativas, de acordo com a Doutrina SINASE, deve- se sempre observar o princípio da incompletude inconstitucional, pelo qual se reconhece que nenhuma política pública é suficiente se for aplicada isoladamente, razão pela qual se defende um trabalho multidisciplinar, que, na prática, pouco ocorre. Toda UI agremia serviços da Saúde, Educação, Segurança, Justiça e Assistência Social. Logo, em toda UI oferta-se a política de escolarização.

No caso específico do Distrito Federal, essa política é ofertada por um Núcleo de Ensino, que é vinculado a uma escola pública da rede com o intuito de escriturar a documentação escolar dos estudantes sem estigmatizá-los e regularizar a vida profissional dos profissionais da educação.

Ante as constantes denúncias de violações de direitos de crianças e adolescentes associadas ao ato infracional, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) promoveu uma investigação da realidade nas Américas, registrando os resultados no Relatorio sobre los derechos de la Niñez (OEA, 2011).

Não obstante o Brasil ser signatário da Convenção sobre os Direitos da Criança e do Adolescente e do relatório sobre a Condição Jurídica e Direitos Humanos da Criança e do Adolescente, conforme vimos nos transcorrer deste estudo, muitas das pactuações não vêm sendo cumpridas.

O objetivo do ordenamento jurídico sobre a juventude no Brasil é de proteção dos sujeitos que ocupam o status legal de prioridade absoluta, dada sua peculiar condição de desenvolvimento e a notória escassez e fragilidade das políticas públicas para a juventude. Contudo, o que percebemos da observação da realidade, das vozes dos operadores do direito e da execução das medidas socioeducativas, assim como da análise dos dados estatísticos é uma reprodução da ideologia da defesa social com um rigor ainda mais severo no caso dos jovens.

Muitos são os momentos da história humana nos quais se buscaram culpados para os problemas contemporâneos. As bruxas, os hereges, os bárbaros, os infiéis, os sindrômicos, as pessoas com deficiências específicas entre outros. Em nossos dias, temos assistido a uma linear vinculação da violência social à condição de impunidade de uma juventude desregrada.

Do conjunto dessas reflexões, reiteramos o distanciamento entre a letra da lei e a realidade da justiça juvenil no Brasil. A Doutrina SINASE é das leis mais belas com a qual já lidamos, ao passo em que a execução é marcada, como demonstraremos, por distanciamentos abismais. Ocorre que o Direito ainda é demasiadamente ideológico, carente de criticidade sócio-histórica. A justiça juvenil é apenas um dos analisadores dessa realidade. País no qual as contradições são tão 5 patentes e agressivas, esse desalinhamento entre a teoria e a prática dá-se também entre o que o Brasil assina nos acordos internacionais e sua prática na questão. Esperamos poder contribuir com a denúncia-crítica desse modelo. Todavia, uma melhor compreensão das fragilidades do adolescente passa pela construção das subjetividades no tempo atual, temas aos quais nos dedicaremos nos capítulos que se seguem.

Uma visada quantitativa do desamparo juvenil: números da Socioeducação no Brasil e no DF

Sabemos que, ao promovermos esse diálogo com os números, o fazemos na contramão dos estudos em educação, visto percebermos pouco apreço e, por vezes, rejeição pelas ciências estatísticas por parte de alguns acadêmicos da Pedagogia da Universidade de Brasília. Talvez isso ocorra pelo uso equivocado que muitas vezes foi feito, por uma estatística não crítica que demonstra o óbvio ou manipula dados de acordo com os interesses hegemônicos.