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Por meio dos itens que se seguem desejamos demonstrar a fragilidade que os mediadores culturais apresentam para o ser humano na contemporaneidade. Situação que é debatida pelos grandes debatedores deste momento. Dos enquadramentos rígidos de ontem, o mundo pós-moderno vinha flexibilizando a tal ponto esses enquadres que as pessoas, sobretudo as novas gerações, sentem-se sem parâmetros e sentem angústia na dificuldade de se enredar na teia simbólica já existente.

Entre alteridade e narcisismo

O autocentramento narcísico está sempre em voga na fala dos autores aqui evocados, talvez, por ser uma marca do humano com a qual a sociedade mais duela no sentido de garantir a sua existência. Do lugar de historiador, temos a nítida impressão de que a caminhada humana é a da luta entre o polo narcísico e o alteritário, conforme defendeu Freud ao longo de sua obra, especialmente a partir de 1914. A modernidade apresentou um projeto que, assim como Habermas (1984), consideramos que ainda não foi possível concretizar, não obstante todos os ajustes que ainda teremos que fazer no diálogo entre a idealização do projeto e a possibilidade real.

O que se segue é dito pelos debatedores da pós-modernidade como caraterísticas comuns da condição humana na pós-modernidade e nós acrescentamos que essas marcas são ainda mais visíveis nos adolescentes, haja vista sua condição de revivência do narcisismo primário ante o desamparo da adolescência reforçado e do contexto cultural e pela maior vulnerabilidade ante as imposições da indústria do marketing, para quem ela, especialmente se dirige.

Como muitos dos conceitos psicanalíticos que foram incorporados pelo senso comum, o narcisismo vem sendo utilizado por inúmeros teóricos, por vezes, de forma equivocada. Tanto é utilizado para se referir a um autoinvestimento libídico (no próprio Ego) com uma maior ou menor indiferenciação entre o eu e o objeto, seja pelo momento comum do processo constitutivo ou por falhas do ambiente em remanejar o narcisismo por meio da castração. É enquadrado dentro do espectro das patologias narcísicas quando perpetua características do narcisismo primário mesmo após a dissolução do Édipo, desdobrando-se em prejuízo para o funcionamento do sujeito na intersubjetividade. Como fiel da balança, o autor do termo (FREUD, 2010/1914) definiu o narcisismo como o deslocamento dos investimentos libidinais para o eu do sujeito como tentativa de manejar as frustrações da onipotência ou as feridas narcísicas.

Em A Cultura do Narcisismo, Lasch (1983) defende a tese de que ante as fragilidades dos suportes culturais apresentados pelo pós-guerra, o sujeito estadunidense - e ante a difusão planetária do life american way - tenta refugiar-se em si mesmo, fenômeno que foi usado pela indústria do marketing para movimentar

o consumo, seja de bens materiais, seja das meias-verdades da tecnocracia. O autor compreende, portanto, a personalidade narcisista no final do século XX como uma metáfora da condição humana, e a cultura narcisista como um movimento que se utiliza do slogan de conscientização para, de fato, invadir o eu pelo social por meio de um imperativo de interiorização dos sujeitos, com severos prejuízos para a coletividade.

Vivemos cercados de espelhos. “Neles, procuramos impressionar outras pessoas, ansiosamente procurando por manchas que possam prejudicar a aparência que desejamos projetar” (LASCH, 1983, p. 124). A publicidade alicia e reforça isso. Sennett (2009) aponta que o século XVIII acentuou elementos comuns à natureza humana, enquanto o século XIX deu ênfase ao ímpar e às idiossincrasias, o detalhe torna o emblema e as relações tornam-se mais superficiais.

Ao longo de toda a sua obra, apesar de evocar a importância dos elementos internos (inconscientes), destaca sempre a importância do meio. Para ele, as “novas formas sociais requerem novas formas de personalidade, novos modos de ser e de organizar a experiência” (LASCH, 1983, p. 76). Para o autor, ocorre ainda que “cada época desenvolva suas próprias formas particulares de patologia, que exprimem de forma exagerada sua estrutura de caráter subjacente” (LASCH, 1983, p. 66). Enquanto no momento de Freud era a neurose, em nossos dias é o narcisismo, do qual o capitalismo se utiliza por meio de uma burocracia que tem como aliada a indústria da publicidade e a sociedade do espetáculo, as quais tanto aliciam o narcisismo quanto o reforçam.

Percebe-se, pois, que o autor não apresenta o narcisismo como um modelo determinista, mas resposta a esse tempo.

O narcisismo parece realisticamente representar a melhor maneira de lutar em igualdade de condições com as tensões e ansiedades da vida moderna, e as condições sociais predominantes tendem, em consequência, a fazer aflorar os traços narcisistas presentes em vários graus, em todos nós (LASCH, 1983, p. 76).

Para defender sua tese, Lasch transita por temas, muitos dos quais, ainda extremamente atuais, outros com ranços da historicidade do autor. As múltiplas escolas da psicanálise consensuam que a socialização da psiquê transita do narcisismo primário para o secundário. Para melhor compreensão dos termos, o

historiador freudo-marxista esclarece o que compreende por narcisismo primário e secundário, tendo o primário como o momento da indiferenciação entre a necessidade (interna) e a satisfação (externa) e o secundário como o produto da castração imposta pelo Édipo, sendo a defesa contra as frustrações da satisfação pelo objeto. O patológico, é, portanto, a regressão ou a fixação no primário. O autor também diferencia o narcisismo, que precisa do outro (plateia) para afirmar-se, do narcisista que vive no deserto.

Numa discussão mais aprofundada sobre a questão, Szpacenkopf defende que a passagem do narcisismo primário para o secundário ocorre numa lógica de (des/re)territorialização para o sujeito, na qual o outro como território tem importância capital. Também do lugar da psicossociologia, ainda que não se anuncie daí, o autor nos lembra que, no atual contexto, “[…] a passagem do investimento narcísico para o investimento objetal fica modificada, se não prejudicada” (2011, p. 79). Compreendemos o conceito de território com o auxílio de Deleuze e Guatarri (1992), os quais buscam a etologia para demonstrar que o outro é um território para o animal, assim como a família o é para o humano e que não há territorialização sem saída para uma desterritorialização e a possibilidade de reterritorialização.

Lasch (1983) propõe ainda a diferenciação entre narcisismo e auto-amor, visto que para Freud a autoestima advém do narcisismo primário, momento de onipotência que comumente é corroborado pela experiência e pela satisfação da libido objetal.

A autoestima por um lado é definida como um resíduo do narcisismo infantil, por outro decorre da onipotência que é corroborada pela experiência (a realização do ideal de ego), enquanto uma terceira parte provém da satisfação da libido objetal” (FREUD, 2010/1914, p. 118).

Também o psicossociólogo Sennett (1993) compreende o auto-amor como o justo-oposto do amor próprio, visto ser muito mais um falso-self (WINNICOTT, 2005a), uma montagem reativa de onipotência ante a impotência imposta pelo Édipo por meio do complexo de castração ou pelo contexto. Essa distinção é muito apropriada, haja vista que o auto-amor é vendido como a solução para todos os problemas e a alteridade é desconsiderada.

Na pós-modernidade, o que importa é a exaltação gloriosa do eu (LASCH, 1983). Contudo, como a auto-exaltação não é bem aceita pelos valores ainda

influentes, é feita por meio de subterfúgios, dentre os quais a exaltação da estética e os auto-cuidados excessivos que fazem do corpo um espetáculo, o que Birman nomeia como “polimentos intermináveis para alcançar o brilho social.” (2007, p.167). Esse fenômeno se insere na cultura do espetáculo (DEBORD, 1997), da interpretação, na qual a exibição é lema essencial da existência como exigência infinita de performance.

Nessa performance, marcada pelo narcisismo funesto em seus menores detalhes, o que importa é que o eu seja glorificado, em extensão e em intenção. Com isso, o eu se transforma numa majestade permanente, iluminado que é o tempo todo no palco da cena social […]. Psicopatologia da pós-modernidade […] é sempre o fracasso do indivíduo em realizar a glorificação do eu e a estetização da existência que está em pauta (BIRMAN, 2007, p. 168).

Esse quadro encontra eco nos fronteiriços e nos adolescentes, haja vista o 18 abandono do teatro da neurose, a dificuldade comum desses com o tempo e a consequente integração de todos os tempos no agora. De modo a polir e aperfeiçoar o papel que escolheu para si, o novo narciso olha para seu próprio reflexo, não tanto por admiração, mas por um incessante processo de imperfeições, sinais de fadiga, decadência (LASCH, 1983, p. 123).

Rassial (1997a, 1997b e 1999) com o qual já dialogamos no capítulo anterior, associa a adolescência aos fronteiriços. Goffman (1974), que tão bem descreveu o eu atuante, elucida com seus estudos que, apesar de sermos seres de impulsos variáveis e de conflito, somos exigidos como uma homogeneidade. A autoconsciência é buscada como alternativa ao descrédito do mundo externo. “Para o eu atuante, a única realidade é a identidade que ela pode construir a partir de materiais fornecidos pela publicidade e pela cultura de massa” (LASCH, 1983, p. 123). Consideremos então os reflexos deste tempo especialmente para a vulnerabilidade adolescente.

O narcisista patológico desenvolve um senso de identidade caricato comum em nossos dias especialmente entre os jovens, depende excessivamente da validação do outro a quem admira/aprecia o que o impõe um auto-escrutínio ansioso, pois resta seu eu como mercadoria importante. A ironia e o cinismo apresentam-se como uma forma de pairar acima das limitações do mundo, pela qual

Modos de funcionamentos psíquico próprio de sujeitos que não transitaram devidamente do narci

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distanciam-se da rotina e, ante a desvalorização das meta-narrativas, refugiam-se nas ideias fixas, nas compulsões neuróticas, nas sublimes objeções a qualquer coisa.

Não se trata apenas do incremento na quantidade de narcisistas, mas de terem eles se destacado ao ponto de impor o tom a uma multidão que almeja ser admirada. O resultado é uma sociedade que se exibe pela celebridade, mingua a autoridade dificulta o crescimento e cria variadas dependências burocráticas.

Belpoliti (2010) afirma que,

A crescente insegurança a respeito da identidade que é típica da sociedade pós-moderna e as constantes humilhações a que nossa autoimagem é submetida causam o que Alain Ehrenber chamou de “o peso de ser eu mesmo”. Passamos de uma sociedade baseada na obediência e na disciplina a uma sociedade que valoriza e promove de modo incomum a crença de que, em todos os níveis, tudo é possível. Édipo, o símbolo da sociedade patriarcal, e do sentimento tipicamente burguês de culpa, é substituído pela vaidade, isto é, por Narciso e seu fascínio pelo espelho. Narciso traz a liberdade, mas também um crescente sentimento de vacuidade e impotência. (BELPOLITI 2010, p. 22, apud BAUMAN, 2013, p. 123.)

Lasch (1983) enumera características do caráter narcísico (e nós acrescentamos, do adolescente), que para ele apresenta uma pseudo auto- percepção reativa à autodepreciação que tenta camuflar até de si mesmo por meio de um Ego inflado. É, portanto, reativo, e funciona por meio de uma superficialidade protetora de sua autoimagem e com receio da privação oral pré-edípica. Por isso, é fronteiriço, hábil e atento às impressões que transmite, pelo fato de ser ávido por admiração.

Para tanto, o caráter narcísico seduz calculadamente e revela desdém por aqueles que manipula; é performático e inautêntico, em decorrência do vazio existencial que experimenta; sequioso por emoções fortes e aferrado à imagem; aterroriza-se com o envelhecimento e a morte, haja vista o investimento que faz no externo em decorrência da auto-descrença velada de si mesmo; possui pouca capacidade de sublimação; pode ocorrer de buscar a promiscuidade como mecanismo de defesa do apego e por vezes é pansexual. Percebamos o quanto essas são característica estigmatizadas para os adolescentes, talvez por camuflarem menos que os adultos as marcas deste tempo pós-moderno.

Nas dimensões culturais o caráter narcísico (e diríamos, do adolescente pós-moderno) possui um senso de tempo alterado, marcado por um presentismo;

fascina-se pelas celebridades, de quem busca proximidade mimética e as quais descarta no primeiro desapontamento; teme a competição, afasta-se do lúdico, onde a culpa cede lugar à ansiedade, “exalta o respeito às regras na crença secreta de que não se aplica a ele” (LASCH, 1983, p. 15). O autor aponta que grandes referências da psicanálise pós-freudiana reconhecem a existência de um novo modelo de funcionamento com características orais (pré-edípicas).

Também discutindo o que caracteriza o narcisismo, Costa (1998a) lembra que resta do “narcisismo em tempos sombrios” nessa “cultura narcísica da violência” três características básicas: uma visão cínica do mundo, pela qual se busca fazer da realidade que temos a instância normativa de uma realidade ideal, utilizando-se, para este fim, dos porta-vozes eruditos da moral e do desespero. A abordagem teórica sobre a violência é uma ilustração desse fenômeno.

Uma segunda característica é a desmoralização da lei e dos ideais sociais decorrentes desse elogio irresponsável da violência que favorece uma cultura da infracionalidade em uma alternância ambivalente entre onipotência e impotência. E a terceira, ante esse quadro, é que no lugar que outrora pertencera à autoridade, surgem as miragens midiáticas dos Egos ideais (com prejuízo para o Ideal de Ego) e a arrogância onipotente decorrente da falência dos ideais que acenam para o colapso narcísico, desequilibrando a economia psíquica e comprometendo, seriamente, o bem-estar do sujeito e da sociedade.

Consideremos essas três características especialmente para os adolescentes para comprovarmos o quanto são marcas muito fortes dos sujeitos que adolescem na contemporaneidade. Não só deles, é claro, mas apontadas e atuadas especialmente por eles.

A psicanálise, ao tempo em que foi pioneira na denúncia da conspiração entre o narcisismo e o laço social, também trouxe à discussão importantes causas para esse fenômeno. A primeira e, em nossa forma de ver, a mais importante delas é a falência da função paterna. Ante a fragilização da castração simbólica da onipotência infantil pela qual um terceiro retirava os neófitos humanos da condição de ser o falo para tê-lo, assistimos a uma diluição das diferenças, da 19 intersubjetividade, da alteridade, do limite, da lei. Na atual conjuntura prevalece a onipotência e não o reconhecimento da potência do outro como tônica das relações.

Para Freud está muito associado à ideia de potência. Para Lacan, o significante do desejo. 19

Na ausência ou fragilização do Édipo, ocorre uma fragilização do superego, enquanto herdeiro desse complexo, ante um contexto que privilegia as posições narcísicas do Ego ideal (narcisismo primário), em detrimento do Ideal de ego (modelo ideal que o norteará, oriundo da ordem simbólica externa) e do superego. Consequentemente, na cultura narcísica do pleno gozo e da usufruição do outro, a lei e a justiça perdem os significados propostos desde a revolução iluminista. Importante considerar com os conhecimentos do capítulo anterior que a visão psicanalítica da adolescência à qual nos afiliamos considera esse momento de (re)edição do desamparo, do Édipo e das identificações, exigindo uma função paterna que seja suporte e continência de suas angústias e conteúdos do palco interno.

Birman (2007) destaca ainda a importância do Ideal de Ego como forma de retirar o sujeito da fixação no Ego Ideal. Todavia, além da fragilização do primeiro, a flexibilização dos limites e fronteiras, tão próprias de nosso tempo, redundou numa grande confusão entre as dimensões do dentro e do fora, do eu e o outro, e que a lógica do consumo e da lei do mercado, associados ao declínio do simbólico do nome do pai, redunda em uma crise para as subjetividades, especialmente as que se encontram em momento peculiar de construção, como é o caso dos adolescentes, que se constituem a partir de uma equação entre fatores internos e externos.

Lasch (1983) apresenta como uma das causas do narcisismo a transmissão transgeracional de mães narcísicas que regridem à fusionalidade arcaica, o que também acirra o inflacionamento do superego dos filhos. Isso interage com um contexto que substituiu o império do Superego, tão comum no autodomínio imposto pela modernidade, por um império do Id, como auto-identidade tão defendida na pós-modernidade. O autor dialoga com grandes nomes da psicanálise para apresentar o narcisismo como uma resposta ao esfriamento afetivo de mães normalmente narcisistas, que ofertam atenção excessiva como resposta ao esfriamento que percebem do mundo para com elas. Trata-se de uma relação duplo- vincular.

O narcisista, assim como o esquizofrênico, costuma ser monumento de um ausente. Essas famílias são fruto da patologia individual e das condições sociais, visto que quanto mais o mundo mostra-se ameaçador, mais a família protege-se em

si: nega as tensões internas e cria uma ilusão de normalidade. Essa ressalva é importante para não cairmos numa culpabilização do feminino, tão bem denunciada por Zanello (2018). Contudo, é preciso considerar que, ainda que injusto, o patriarcalismo conduziu as coisas assim. Voltaremos a essa questão.

Lasch (1983 e 1991) discorre pormenorizadamente sobre novos hábitos de cinismo que são incorporados pelo ambiente doméstico. “As mudanças sociais que dificultam às crianças interiorizar a autoridade parental não aboliram o superego, mas simplesmente fortaleceram a aliança entre este e o thanatos” (LASCH, 1983, p. 220). Na ausência de uma lei externa forte, resta à criança inflar seu superego com elementos orais agressivo-destrutivos. Essa discussão é também elaborada por Winnicott (2005a).

Outro fator que, segundo Lasch (1983; 1991/1977) dá origem a desejos orais vorazes manifestados como raiva sem limites contra quem os deixa de gratificá-los é a mecanicidade do cuidado parental. Todavia, a sociedade burocrática não oferece espaço para a expressão da agressividade, restando o recalque pelo Ego e seu exílio no superego.

O historiador psicanalista compreende ainda por narcisismo a patologia do ser que, ante a fragilidade dos suportes parentais arcaicos, constitui um superego tirânico que faz frente aos fantasmáticos e perigosos impulsos de um Id que não encontrou no mundo a possibilidade de refreamento. O autor retoma Klein, para descrever um superego tirânico como decorrente da introjeção do ódio e da imagem de pais maus, que a criança identifica como sendo sua própria identidade.

Caso o contexto não oferte espaços de reedição, permanecem as experiências arcaicas agressivas. Acentua-se, assim, a necessidade da defesa contra si próprio por meio de um superego tirânico. Predominam sentimentos de medo e culpa com relação aos sentimentos que identifica em si. Destaca-se a onipotência como reação a um ambiente que não lhe oferta a segurança que necessita.

As chamadas patologias narcísicas dominaram a pauta da psicopatologia dos últimos anos dessa virada de século, com ênfase no biológico, do qual a mente é vista como mero epifenômeno, financiado por poderosa indústria farmacológica. “O que se define por psicopatologia é o destaque conferido a quadros clínicos fundados

sempre no fracasso da participação do sujeito na cultura do narcisismo” (LASCH, 1983, p. 169).

Discutindo a psicopatologia contemporânea, Birman (2007) nos chama a refletir que, apesar da possível armadilha, o que caracteriza a cultura do espetáculo é a exterioridade e o simulacro como um paradoxo da pós-modernidade: o fora-de-si (metáfora da qual o autor se utiliza para falar dos que perderam o domínio de si, mesmo sendo inscritos nas nosologias se dá por um autocentramento em si e que, diferentemente de ontem, não é excluído, antes, é exaltado, o que ele denomina como fora-de-si de colarinho branco.

O caminho para o equacionamento desse desafio é apresentado por Benjamin (1995) que, com auxílio de Lacan e Winnicott, nos lembra que o que se opõe ao narcisismo é a libido objetal. A autora defende, portanto, a negociação entre os polos narcísicos e objetais, de forma a manejar a onipotência. Quando a onipotência passa à condição de estratégia de ação é porque essa negociação não foi bem sucedida. Assim, os vínculos sociais são fragilizados e marcados pelo utilitarismo.

Tendo em vista o objeto deste estudo, mais uma vez evocamos a consideração do que seria o fenômeno do narcisismo na adolescência, momento ímpar de reedição do narcisismo arcaico que deveria encontrar no mundo adulto a sua dispersão, o que não vem ocorrendo pelas questões já expressas, como discute Pinheiro (2001), o que não ocorre em razão, segundo Khel (2004), da vacuidade do lugar de adulto.

Outra face da moeda do narcisismo, diferente forma de ver o mesmo fenômeno, é a alteridade. A fragilização do laço social é a crítica comum com status de centralidade a todos os teóricos com os quais dialogamos que discutem a pós- modernidade.

A psicanálise compreende um lugar especial ao outro em nossas vidas. Para tanto, destaca que Freud sempre frisou a dependência arcaica ao outro, dada a condição de desadaptação do bebê humano. Já Lacan percebe o outro como objeto de desejo e de rivalidade (desejo do inconsciente e desejo do desejo do outro). Além desses autores, Winnicott sempre salientou a importância da mãe em adaptar-se às necessidades do bebê, assim como de sua sobrevivência aos ataques do bebê, em uma relação em que é, a um só tempo, a mãe-objeto e a mãe-ambiente e dos

objetos (transicionais) que instrumentalizarão a transição entre a dependência e a independência. Todos esses autores destacam a importância das figuras parentais (outro) desde os períodos mais arcaicos, sejam como os braços que amparam,