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7 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS

7.1 A ESCOLHA INICIAL

7.4.1 A arte e o bem-estar

Em seu livro O Mal estar na Civilização Freud (1974) argumentou que a felicidade plena não possível de se alcançar, apesar de passarmos a vida buscando-a.

Nesse mesmo livro, Freud explora os sentimentos dos seres humanos e explica que usamos três dispositivos paliativos para driblar as agruras da vida, que seriam: extraímos do sofrimento uma luz, a fim de minimizar o desprazer; adotamos satisfações substitutivas, ou nos tornamos insensíveis à realidade, muitas vezes, recorrendo a atitudes ou a substâncias como as drogas.

A visão de Freud é precisa, mesmo que possamos abordar a arte por outro viés. Acreditamos que, em algum caso, ela esteja no sentido por ele proposto, pois não podemos negar que, para algumas das professoras, a arte entra em suas vidas como uma satisfação substitutiva. Assim, Freud explica:

115 A vida tal como a encontramos, é árdua demais para nós; proporciona-nos muito sofrimento, decepção e tarefas impossíveis. A fim de suportá-la, não podemos dispensar as medidas paliativas. [...] As satisfações substitutivas, tal como as oferecidas pela arte, são ilusões, em contraste com a realidade; nem por isso, contudo, se revelam menos eficazes psiquicamente, graças ao papel que a fantasia assumiu na vida mental [...] (1974, p.31).

Margarida, em sua fala, remete-se ao que o texto de Freud alude: “Com a arte, consigo perceber o extravasamento de alguns sentimentos ‘policiados’, a organização das minhas coisas, a tranqüilidade proporcionada e a sensação de bem-estar”.

As pessoas procuram ir à direção do sentimento de felicidade e vencer a sensação de desprazer e, em relação a isso, Líria comenta:

O fazer artístico é a melhor estratégia para vencer rapidamente o mal-estar. Através desse fazer, nós expressamos exatamente aquilo que queremos. Ousamos expressar, libertar não sabemos bem o quê. Sinto isso depois de um dia estressante de sala de aula, quando chego em casa e vou para o atelier [...] O resultado é maravilhoso.

Líria, ao se referir ao papel da arte em sua vida, fala:

E a arte entra pra me ajudar a organizar a casa por dentro. Nessas horas, os problemas se transformam. Não é que somem, mas eu fico trabalhando e digerindo as idéias. Quando vejo, os problemas parecem melhores, como se eu os visse por outro ângulo.

Mas Líria também relaciona a arte com a capacidade de observação e de expressão dos seus medos e desejos, como se fosse uma outra voz. Ela profere: “A arte auxilia na melhoria da qualidade de vida, pois propicia um aumento de capacidade de observar, da atenção, de ousar a expressar sem medo nossos desejos, nossas lutas”.

Novamente, nos remeteremos a Freud (1974) quando este explica que os homens, através de seu comportamento, mostram o propósito e a intenção de suas vidas. E o autor citado elabora a questão: “O que podem eles da vida e o que desejam nela realizar?”. Ele continua explicando que os homens se esforçam para obter felicidade, pois querem ser felizes e assim permanecer. E continua Freud:

116 [...] Essa empresa apresenta dois aspectos: uma meta positiva e uma meta negativa. Por um lado, visa a uma ausência de sofrimento e de desprazer; por outro, à experiência de intensos sentimentos de prazer. Em seu sentido mais restrito, a palavra ‘felicidade’ só se relaciona a esses últimos. Em conformidade a essa dicotomia de objetivos, a atividade do homem se desenvolve em duas direções, segundo busque realizar – de modo geral ou mesmo exclusivamente – um outro desses objetivos (1974, p.32-33).

Como podemos entender a partir dessa citação, o propósito da vida, para Freud, é o princípio do prazer.

Para Líria, o estresse da sala de aula lhe causa desprazer, que é compensado através da produção artística. Essa atitude vai ao encontro do que Freud explicava. Mas, podemos relacionar a produção artística como uma estratégia de coping, ou seja, escolhas para minimizar o estresse. No nosso entender, somente toma tal atitude quem tem uma característica resiliente. Também nos remetemos a Jesus (2007, p. 26), quando este explica que o bem-estar está relacionado a um conceito geral que é o bem-estar subjetivo.

Sendo assim, entendemos que o bem-estar e mal-estar se direcionam na geração de prazer e evitação do desprazer, pois o mal-estar pode ser evitado ou revertido. O bem-estar pode ser adquirido com práticas de si, como por exemplo, o fazer artístico. O mal-estar poderá ser evitado ou diminuído, porém nunca extinto da vida humana.

Para evitar o mal-estar, podem ser usadas estratégias de coping, como no caso das professoras que têm uma atividade artística e vivenciam experiências de bem-estar, e da minimização do estresse gerado no trabalho e até mesmo fora dele. Estratégias de coping são aquelas que, quando um indivíduo se depara com acontecimentos que ele avalia como perturbadores, fazem com que seu organismo reaja fazendo com que ele tente gerir esses acontecimentos e se ajuste a eles. Um sujeito com características resilientes vai reagir mais rapidamente aos acontecimentos de desprazer e buscará soluções positivas ao seu organismo. A atividade artística é uma estratégia de coping desenvolvida por professoras com características resilientes.

Podemos caracterizar que essas professoras desenvolveram técnicas de vida, retomando Foucault (2004a), que estão relacionadas ao cuidado de si. Mas, nesse cuidado consigo mesmo, deverá estar a preocupação com o outro, isto é, o fazer da sua vida uma obra de arte, relacionada a uma estética de vida que esteja

117 ligada a uma ética de existência. Dessa forma, tendo uma atitude ética, o respeito ao outro é uma prerrogativa necessária.

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