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TÓPICO 3 – RUPTURA DE UM RELACIONAMENTO

6. As AIE referem

uma pluralidade

indeterminada

• não são textualizadas explicitamente. • são construídas apenas interpretativamente. • possui concordância cognitiva. • congruência pragmática e situacional. • não concordam com

entidades na

cotextualidade.

• resolve-se

inferencialmente.

• não por processos gramaticais, mas por interpretação cognitiva e co(n)textual.

• investe-se

conhecimento de mundo para determinar seus referentes. • a situação discursiva é que decide a determinação dos referentes. • referentes construídos não são de caráter existencial.

• as entidades

discretas não são

identificadas explicitamente.

• referentes construídos não são de caráter existencial.

• a identificação é virtual e não concreta.

• constroem-se entidades discursivas, não entidades discretizadas. • os indivíduos ou entidades referidos

existem, mas não são

designados nessa condição. 7. As AIE introduzem elementos novos como dados: • ao construírem referentes definidos,

embora de certo modo indeterminado, dão-lhes

estatuto de entidades conhecidas. • possui característica peculiar: fazem referência a elementos presentes na memória discursiva ou no contexto cognitivo. • Por já estarem presentes no contexto discursivo, constroem entidades e atualizam- nas no discurso.

Como relatamos, esse tipo de textualização (anáfora pronominal) tem maior produtividade na língua falada. Isso mostra que essas anáforas estabelecem na fala a suposição de uso de conhecimentos partilhados num grau mais elevado do que na escrita. Isso se deve ao fato de os interlocutores estarem em interação face a face, possuindo condições mais favoráveis para identificar os referentes discursivos durante a co-construção do sentido somando a isso os elementos extralinguísticos que facilitam a identificação. Assim, na interlocução, a fala vai sendo negociada por intermédio dos tópicos, e os referentes, identificados sem maiores dificuldades, contribuem para a continuidade referencial e tópica.

Os exemplos aqui analisados são casos específicos e tomam como ponto de partida uma situação de enunciação, apresentada no contexto de fala para construir as relações cognitivas encapsuladas em modelos mentais (frames e scripts) e esquemas cognitivos que representam focos implícitos armazenados em nossa memória de longo prazo enquanto conhecimento de mundo. São exemplos retirados da situação de diálogo número 1, fonte de exemplos para nosso modelo de análise.

Exemplo 1

65 L2 éh Stive você vai estudar esse ano ?

66 L1 eu pretendo né? segundo:: éh :: o pessoal lá da escola ... segundo eles/eles disseram que ia te vaga pra mim se eu fosse no caso amanhã que

eu fui ontem né?... dia 10 / ontem não segunda dia 10 e eles éh:: falaram que era dia 20 dia 20 não dia 13 né? ...

67 L2 ah eu vou fazer o segundo esse ano i:: tava querendo parar já não tô agüentando ir pra escola

e [

68 L1 ah pará não meu cê é doido se pra arrumar emprego hoje ...com estudo tá difícil imagina você sem estudo e no caso tô me ferrrando aí eu tô na sétima tô/ sétima série mas voltando ao assunto éh no caso dia 13 éh:: amanhã o dia que eu vou te que ir lá tentá vê se sobrou alguma vaga fazer ...uma matricula né?

[

69 L2 hum hum [

70 L1 bom segundo dizem eles [

71 L2 éh aonde se vai fazer ? 72 L1 aqui na/ no Maffei Vitta onde que a Tamily estuda

[ 73 L2 sei sei [ 74 L1 eu vou fazer supletivo já estudei [ 75

L2 vou continua no Colombo tava no Matilde do Matilde fui pra lá

[

76 L1 oh Gil mais vem cá mudando de assunto e a loirinha do loja lá hein? da/

Neste exemplo, temos a ativação de um frame: contextos institucionais através do qual entidades possuem identificação genérica ancorada no co-texto por um antecedente não correferencial. O tópico conversado é A importância do estudo contextualizado num frame "escola" – modelo mental que cria o contexto institucional. É nele que está o referente que sustenta a continuidade referencial e tópica. Trata-se de uma anáfora indireta pronominal constituída por eles que remete à entidade ou instituição escola de forma genérica, uma vez que a âncora no co-texto é representada por um termo genérico o pessoal da escola e pode identificar os indivíduos implícitos que compõem tal instituição, permitindo a referenciação e a construção implícita destes. Dessa forma, há uma indução referencial fundada em aspectos do co-texto e em modelos cognitivos, supondo partilhamento entre os adolescentes.

Pelo frame "escola" sabemos então que esses indivíduos se enquadram na instituição escolar, e supomos que sejam: diretor, assistente de diretor, professores, secretária(o), inspetor(a) etc.

Exemplo 2

100 L2 eu sei ... pessoal costumava fazer [

101 L1 o ano passado tinha neguinho que queria sair na mão com o professor ...meu

102 L1 ah o ano passado ano/ ano passado não ano retrasado éh :: eu bati em bastante mulecada lá cara...

103 L2 vixi eu já briguei muito em escola também cara mais quando eu era mais novo agora faz um tempo que não aparece uma briga mais eu também nunca procurei

Neste outro exemplo, temos a ocorrência da anáfora indireta nominal linguisticamente representada por neguinho sem antecedente co-textual,

baseada em inferências ancoradas no mundo textual. A partir de conhecimentos textuais mobilizados e partilhados entre os interlocutores, constroem-se modelos mentais dentro dos quais as estratégias de construção de referentes são aplicadas, neste caso, ativando o referente neguinho. Vê-se que o tópico conversado é Brigas na escola, o que contribui para a associação entre os referentes neguinho e aluno da escola. Assim, a co-construção do antecedente da AIE neguinho é inferido na base dos conhecimentos textuais. Vê-se que outras referentes na progressão tópica contribuem para o enquadre do tópico: professor, ano passado, retrasado, escola etc. (cf. itálicos no texto).

Acerca das anáforas indiretas esquemáticas, cabe destacar alguns aspectos importantes: (1) é provável que nem todos os falantes tenham em mente um referente definido para o pronome eles; (2) em muitos casos de uso é possível que não haja um item lexical que designe tais referentes. As sugestões de determinação referenciais analisadas nos exemplos são flexíveis e podem variar a depender da interpretação de cada falante em contextos diversos.

Marcuschi (2000:235) admite ser uma questão intrigante o fato de a referenciação para os casos da anáfora esquemática em que os pronomes eles são predominantemente coletivos abarcarem sempre vários indivíduos. Por isso, suspeita que tal referenciação constitua uma orientação cognitiva, porque esde tipo de “pronomes plurais”, como vimos, não são identificados de maneira discreta e pontualizada. Dessa forma, para o autor, os pronomes plurais têm uma característica central: não delimitam com precisão seu espaço referencial.

Koch (2004:26) tece algumas observações importantes sobre as estratégias cognitivas. Sempre que executam um "calculo mental" para o processo de compreensão, os interlocutores estão fazendo uso das estratégias cognitivas. Porque, para que as informações processadas sejam interpretadas, faz-se necessário acionar o processo de inferenciação. É por intermédio das inferências que podemos compreender o que nos é dito e, partindo disso, construir sentidos, mediante associações com conhecimentos já programados na nossa mente através dos processos cognitivos e com os conhecimentos que adquirimos nas práticas sociais.

Dessa perspectiva, as inferências permitem a geração de novas informações semânticas, levando em consideração as informações já dadas.

Como em qualquer texto, somente partes das informações de diversos níveis são explicitadas na superfície textual, e grande parte delas fica implícita. Assim, as inferências constituem estratégias mediante as quais o ouvinte, tendo como base as informações veiculadas na superfície e levando em conta o contexto de fala, pode construir novas representações mentais, estabelecendo ou não uma ponte com os segmentos textuais já explicitados.

Assim, todo processo de compreensão comporta atividades no nível da enunciação como um processo ativo e contínuo de construção e re-construção, no qual as unidades de sentido ativadas e reativadas se conectam a elementos adicionais do conhecimento, que advém de um modelo ativado na memória. Por isso, o falante, durante a produção, já presume as inferências para tal enunciação, deixando implícitas partes das informações, uma vez que pressupõe que seu interlocutor venha a preencher essas lacunas sem dificuldades por meio da ativação de seus conhecimentos. Desse modo, um texto só se torna coerente para o ouvinte se ele souber fazer bom uso das inferências.

CAPITULO 6

ANÁLISE DA CONSTITUIÇÃO REFERENCIAL ANAFÓRICA EM