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2.2. Desenvolvimento Urbano e Sustentabilidade – Uma síntese retrospectiva

2.2.1. As Cidades-Jardim de Howard (1902) como exemplo

No século XIX, o arquitecto inglês Ebenezer Howard desenvolve o Movimento das Cidades-Jardim, com o intuito de criar cidades planeadas, auto-suficientes, envolvidas por uma cintura verde que contivessem no interior áreas residenciais, industriais e agrícolas (Figura 9).

“…a sustentabilidade urbana passa por voltar à vivência urbana que desapareceu em Portugal… houve uma dispersão urbana para as zonas envolventes, o que conduziu ao núcleo urbano despovoado, morreu o conceito de bairro, morreu o conceito de vivência da rua e, portanto, destruiu-se a sustentabilidade.”

As cidades estariam, então, repartidas em seis segmentos ou unidades de vizinhança rudimentares. Howard publicou Tomorrow: a Peaceful Path to Real Reform (1898) e, cinco anos depois, Garden Cities of Tomorrow. Neste último é descrito o modelo de uma Cidade- Jardim: deveria acolher 32.000 pessoas em 24 Km2, espaços abertos e parques públicos, distribuídos num padrão concêntrico com seis radiais a partir do centro. Quando a cidade atingisse a sua capacidade populacional máxima deveria ser construída outra nas proximidades como cidades-satélites da primeira, ligadas por estrada e comboio. Com este modelo, Howard pretendia evitar o crescimento das cidades pela expansão das suas periferias, mas sim através da criação de novas áreas (Barcellos, 2001, 5).

Figura 9 - A ideia de Cidade-Jardim de Ebenezer Howard Fonte - Howard, Garden Cities of Tomorrow (1898, 52–53)

Cap. II – Cidades Sustentáveis – Dos Princípios à Acção

Duas cidades viriam a representar o movimento das Cidades-Jardim no Reino Unido: Letchworth e Welwyn. Lucey (1973) apresenta o exemplo de Letchworth (Figura 10). Planeada em 1903, por Unwin e Parker, era constituída por uma área de 1.250 hectares para servir 30.000 residentes, reservando 2.500 hectares como cintura rural. Unwin sublinha que a ideia dos promotores da Cidade-Jardim não era construir uma cidade artística mas, primeiro, proporcionar aos cidadãos habitações dignas. Lucey refere que a tónica comum entre estas novas cidades seria o seu estilo medieval, associado aos

chalés, com telhados íngremes de duas águas e com janelas no sótão, rodeadas de espaços verdes, contrariando os modelos das ruas

cheias de casas, com as fachadas próximas potenciando a sujidade e falta de luminosidade. Estes aspectos e outros encontram-se presentes no livro de Unwin “Town Planning in Practice: Na Introducion to the Art of Designing Cities and Suburbs” (1909). O arquitecto afirma que os eixos principais da cidade se devem às restrições do local.

A partir das contribuições de Howard, Perry, Stein, Wright, Mumford e Fisher no que toca ao planeamento sustentável, Choguill (2007, 44) sintetiza alguns pressupostos a ter em consideração:

Sustentabilidade Económica – para a redução dos custos de transporte e infra- estruturas o bairro deve ser limitado geograficamente mas com uma densidade populacional elevada; a possibilidade da deslocação pedonal para qualquer ponto do bairro (p.ex. escolas) é a base para a definição do bairro bem como possibilita a eliminação do transporte quotidiano motorizado; as crianças devem ter acesso pedonal ao bairro a menos de 500 metros de distância, sugerindo que o bairro deve ter um quilómetro de diâmetro no máximo (onde uma comunidade de 3000 a 4000 pessoas já justifica a existência de uma escola). O bairro deve ter população suficiente para a existência de comércio (que permitem a existência de postos de emprego dentro do bairro bem como a interacção social da comunidade).

Figura 10 - Cidade-Jardim de Letchworth, de Unwin e Parker (1903)

Sustentabilidade Social – o número de habitantes deve ser pequeno o suficiente para permitir interacção entre os membros da comunidade, relevante também para que a comunidade participe activamente nas tomadas de decisão públicas.

Sustentabilidade Técnica – o bairro deve ter delimitações bem definidas, por exemplo por estradas, facilitando a interacção social dentro do bairro, reduzindo o número de estradas que cruzem o bairro.

Sustentabilidade Ambiental – a existência de parques e espaços verdes dentro do bairro, e de preferência próximo de outros equipamentos sociais, servem de espaço de encontro para a comunidade.

Modelo Autor Ano “Cidade sustentável…

Cidade-Jardim Howard

1902

... é uma cidade-jardim que integra a cidade e o campo.”

Cidade Neotécnica Geddes

1915

... possui a forma vital da cidade medieval.”

"Broadacre city" Wright

1935

... tem uma forma mais próxima possível da orgânica.”

Cidade Biotécnica Mumford 1938; 1961

... eleva a função materna, de alimentação e cuidado.”

Wright, Cadman e Payne

1958,

1990 ... é uma cidade viva." Cidade projetada com a

natureza McHarg 1969 ... foi projectada com a natureza.” Permacultura Mollison 1978 ... é um permacultura.”

"Villages Homes" Corbett and Corbett 1984

... caracterizada pelo planeamento projectado pelo sol, drenagem natural e paisagem alimentar.”

Livro Verde CEC

1990

... é compacta e regeneradora dos limites abandonados do território.”

Gordon 1990 ... é uma cidade "verde".” Civilização em ilhas Nash

1991

... é compacta para permitir que o redor cresça.”

Metabolismo circular Girardet 1992 ... tem um metabolismo circular.” Cidade de design

sustentável McDonough 1992 ... não produz desperdícios, atenta na biodiversidade, depende do sol.” "Prototype Symbiotic

Community" Canfield 1993

... não excede a capacidade de carga da natureza.”

Planeamento

Neotradicional das cidades Calthorpe 1993 ... utiliza o desenvolvimento orientado para controlar o crescimento.” Cidade Sustentável dentro

de uma vertente Sustentável

McDonald

1994

... é holística e diversificada, fractal e evolutiva.”

"Infra-estrutura verde" Lyle 1994 ... é composta de infra-estruturas verdes.” Berkebile 1994 ... é uma cidade utópica."

Fonte - Basiago (1996, 153)

Cap. II – Cidades Sustentáveis – Dos Princípios à Acção

Para terminar esta breve resenha sobre as formas urbanas do Século XX relacionadas com os pressupostos sustentáveis da actualidade, podemos analisar as várias definições de “Cidade Sustentável” congregadas por Basiago (1996, 153) (Quadro 1). Neste conjunto de definições surgem domínios diversos mas que se agrupam essencialmente em duas linhas: a referência à relação cidade-campo, à natureza ou a elementos naturais específicos, e por outro lado, ao paralelismo da cidade a um organismo, tanto na sua forma como nas funções que deve incluir.