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AS CONCEPÇÕES DE “EDUCAÇÃO” QUE ORIGINARAM O MERCHANDISING

CAPÍTULO 2: O MERCHANDISING SOCIAL NA REDE GLOBO DE TELEVISÃO

2.5 AS CONCEPÇÕES DE “EDUCAÇÃO” QUE ORIGINARAM O MERCHANDISING

MERCHANDISING SOCIAL

Sabemos que uma das principais finalidades do merchandising social é influenciar a aceitabilidade de idéias. O elemento “educação” é relevante para dar acabamento ao conceito. No entanto, Schiavo não acha necessário estudar em profundidade o que seria

uma verdadeira Teoria da Educação, bastando a referência genérica às bases que sustentarão o instrumento pretensamente educativo voltado às massas.

Ao mencionar a existência de inúmeros conceitos de educação, Schiavo privilegiará o de Foulquié (1995 apud SCHIAVO; FOULQUIÉ, 1971, p.135 et seq.) que, segundo o autor, classifica a educação em concepções teocêntrica ou religiosa, sociocêntrica ou antropocêntrica. Schiavo não tira desta classificação nenhum argumento ou idéia para discutir o que seja educar. Elementos do pensamento de Foulquié como os meios autônomos ou heterônomos de educação, a existência de diferentes metodologias ou os domínios da educação são elencados de maneira meramente enciclopédica, prestando-se à exibição de “erudição” mais do que à explicitação de uma posição do autor sobre o tema.

Enfatiza, contudo, a educação informal, que implicitamente tem a ver com o merchandising social, afirmando que, nos dias de hoje, os meios de comunicação de massa, sobretudo a televisão, têm importância crucial no processo educativo. Assim, haja vista a importância da educação informal na vida do sujeito, Schiavo (1995) começa a valorizar o que chamará de “auto-determinação” do sujeito, capaz de fazer com o indivíduo reflita criticamente sobre as informações que recebe:

Contra esse processo, a única defesa que tem o indivíduo é a sua capacidade crítica, o que lhe permite pensar e refletir sobre as informações e os conhecimentos que recebe; desfazer-se dos conceitos e orientações duvidosas ou que vão sendo superados no tempo pela dinâmica sócio- cultural; apreender novos conceitos e idéias; enfim, fazer evoluir seus valores e transformar, positivamente, suas atitudes, comportamentos e práticas individuais. É pois, a auto-determinação que confere ao indivíduo personalidade e autenticidade como cidadão, sujeito de relações sócio- culturais. Os estímulos lhe chegam em estado bruto ou – como dizia Michelângelo, para explicar a sua arte – como um bloco de mármore do qual, retirando-se o desnecessário, tem-se a escultura (SCHIAVO, 1995, p.13).

Há uma alusão de que o merchandising social seja capaz de orientar criticamente o sujeito no mundo. Quando se posiciona, é para dizer que “o verdadeiro fundamento da educação” não se encontra “na escolarização ou na docência”, e sim, no “saber

social – que pode ser conceituado como “o conjunto de conhecimentos, práticas e hábitos, habilidades, tradições, valores, ritos e mitos pelos quais uma sociedade consegue sobreviver, conviver e projetar-se para o futuro” (Apud. SCHIAVO, 1995, p. 13; TORO, 1994, p. 9).

Sendo o “saber social” um produto para o autor, posto que é criação humana, ele necessita de estratégias para sua transmissão. Tais estratégias aludem às técnicas de aprendizagem embasadas em estímulos e respostas ou, em outras palavras, na modelagem do comportamento. Produzir o saber, permitir a sua acumulação e preservação, difundi-lo ou democratizá-lo e reproduzi-lo (o que é feito pelo processo educativo) são tarefas para a técnica.

Segundo Schiavo, dos quatro tópicos supracitados, o mais relevante para o

merchandising social é o último, ou seja, reprodução do saber.

Afirma que a existência da educação se dá como “sistema e ação requerida para poder garantir a reprodução do melhor saber acumulado por uma determinada sociedade”. Assim, privilegiando a reprodução do saber, o autor dará ênfase à educação “como um problema de produtividade em relação ao saber e, depois, como problema pedagógico ou de docência”.

Dando enlevo à educação informal e atestando a ineficiência do processo de ensino formal, não só no Brasil como em toda a América Latina, o autor procura mostrar que o merchandising social encontrará brechas nessa ineficiência para promover a melhoria da qualidade de vida das pessoas.

A importância do caráter preventivo de problemas, assim como a da produtividade e do modelo de desenvolvimento sócio-econômico também serão citados como importantes para a “eficiência” do processo educativo.

Como na prática, continua Schiavo (1995), “os sistemas educacionais são como ‘abstrações’, que falam da realidade como se esta fosse algo estático, compartimentado,

linear e perfeitamente organizada”, os “conteúdos didáticos” acabam entrando em dissonância “com o ambiente sócio-econômico, político, ético e cultural em que vivem os diferentes atores do processo educativo (educadores e educandos)” e com “as experiências por eles vivenciadas”. Na mesma passagem, conclui:

Isto faz com que, no conjunto, uma grande parcela dos educandos brasileiros acabem (sic) por encontrar na educação informal e cotidiana, a fonte de onde retiram uma aprendizagem transformadora – fonte esta que, por vezes, torna- se exclusiva. Além disso, quando o objeto da educação é a sexualidade humana, resultam exacerbadas as limitações do sistema educativo formal. Com efeito, até o momento, a sexualidade somente logrou ocupar espaços marginais e alternativos junto à comunidade de ensino. As raras – e, comumente, passageiras – experiências de educação sexual nas escolas são exceções que confirmam a regra (SCHIAVO, 1995, p. 18).

Após considerar a educação informal como lugar privilegiado, o autor apontará como “limitações intrínsecas” do atual sistema educacional brasileiro o fato do sistema educacional brasileiro, nos diferentes níveis, não estar vinculado a um projeto de nação clara e consensualmente definido e, seguindo esta linha conservadora, o autor aponta para a inexistência de compreensão da complexidade da questão educacional, o que faz com que a educação seja vista apenas em sua forma escolarizada. O autor continua mencionando a perspectiva setorial e corporativista que tende a caracterizar a educação como um tema afeto unicamente aos educadores (docentes), desvinculado da realidade cotidiana dos educandos e restrito à oferta de serviços, relegando a demanda a plano secundário.

E como “limitações extrínsecas”, essas menos graves em relação àquelas, na sua visão, por se referirem a “problemas de ordem conjuntural”, o autor aponta, por exemplo, a questão dos baixos salários que poderia acarretar “baixo prestígio social da profissão; a evasão dos profissionais mais capacitados e/ou mais experientes; a sobrecarga dos docentes” (SCHIAVO, 1995, p.20).

Assim, construindo a sua lógica de ênfase à educação informal (que favorece o merchandising social) e apontando tais “limitações”, o autor acaba por sugerir que o meio televisivo é e será fundamental (e talvez mais competente que o sistema educacional)

no enfrentamento dos desafios brasileiros na entrada do novo século: sua inserção plena, de maneira competitiva e tecnologicamente sustentável, numa economia mundial globalizada; a completa erradicação das desigualdades sociais do país e o aumento da participação da população na vida nacional em todos os níveis e pleno exercício dos direitos fundamentais.

Não é explicado como o merchandising social poderia ser eficiente, sobretudo no que tange às desigualdades sociais e na emancipação política da população. Mas, a despeito da lacuna, o autor defende a expansão do atual sistema educacional brasileiro concomitante a um novo enfoque da educação, voltado a um “projeto ético de construção da nacionalidade e cidadania” capaz de situar a educação “no âmbito da reprodução do saber social” e que esse “não se restrinja à sua versão formal e escolarizada”, que por sua vez “não identifique o educador exclusivamente com o profissional da docência”. E, na seqüência, conclui:

Em suma, um enfoque que tenha como objetivo propiciar maior e melhor contribuição da educação e dos educadores (inclusive e, principalmente, dos docentes) à construção da modernidade e da democracia; que ofereça as condições necessárias para a apropriação dos saberes pertinentes ao modelo nacional de desenvolvimento sócio-econômico; que propicie a todos os cidadãos, sem exceção, maiores e melhores oportunidades para o crescimento e aprimoramento pessoal (SCHIAVO, 1995, p. 19).

Tal expansão do sistema educacional não se daria apenas com o aumento do número de escolas, mas sim, em suas palavras, transformando a maneira de organizar e utilizar os recursos (escolas, salas de aula, docentes) disponíveis. Isso “exigiria mudanças tanto no significado quanto nos objetivos e no modo de operação do sistema formal de educação”. Além do mais, seria necessário “agregar os demais recursos sociais disponíveis (novos atores) – sejam eles individuais ou comunitários, pessoais ou institucionais – para atuar como forças-motrizes do processo educativo, ou seja, como EDUCADORES (sic) latu

sensu” (SCHIAVO, 1995, p. 20).

Por fim, em relação à educação, o autor procura reiterar que o sistema formal não é capaz de, sozinho, “fazer frente à magnitude de sua missão e funções”, o que

justifica a busca por “novas alianças e novas parcerias, integrando novos atores sociais ao processo educativo”. Isso com vistas a transformar a educação em um “projeto ético de reprodução do saber social”, o que requer “MOBILIZAÇÃO” dos diferentes segmentos sociais. Isto exigiria uma “estratégia de comunicação social”(SCHIAVO, 1995,p.21), conforme veremos a seguir, o que também explicitará a tríade funcional de educação para Schiavo, a saber, “reprodução” do saber, “transmissão” do saber e, implicitamente, “adaptação”.

2.6 AS “ESTRATÉGIAS” DE COMUNICAÇÃO SOCIAL INERENTES AO