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EDUCAÇÃO E ENTRETENIMENTO NA MAIOR EMISSORA DE TELEVISÃO DO

CAPÍTULO 2: O MERCHANDISING SOCIAL NA REDE GLOBO DE TELEVISÃO

2.1 EDUCAÇÃO E ENTRETENIMENTO NA MAIOR EMISSORA DE TELEVISÃO DO

Na aparente intersecção entre educação e entretenimento situa-se o

merchandising social, objeto de análise desta pesquisa. Presente atualmente em todas as

telenovelas da maior emissora de televisão do Brasil – a Rede Globo3 de Televisão – o

merchandising social é apresentado como um importante instrumento de difusão de

comportamentos ditos socialmente desejáveis, ligados a “questões sociais”, incluindo temas como sexualidade, consumo de drogas, exclusão social de minorias, entre outros.

Para uma primeira aproximação de nosso objeto de estudo, apresentaremos, ainda que de maneira breve, alguns elementos históricos ligados à sua gênese e à trajetória da própria emissora.

Segundo Bolaño (2005), a Rede Globo possui a “vantagem histórica fundamental” da “adequação da estrutura do Estado e do instrumental regulatório em matéria de comunicação da nação brasileira a seus interesses de empresa líder desse setor estratégico da política numa sociedade de massas” (p.20). O autor reitera as análises de Adorno em

3 As Organizações Globo são um conglomerado de empresas brasileiras concentradas especificamente na área

de mídia e comunicação, com cobertura de 99, 84% do território nacional, mas incluindo também bancos, mercado imobiliário e indústria alimentícia (BRITTOS & BOLAÑO, 2005).

relação à indústria cultural como um todo, mas as direcionando especificamente à televisão. Assim, não deixa dúvidas de que o objeto dessa indústria (a Rede Globo) é o público e a audiência, seu capital, ou seja:

Tudo se explica pelas necessidades que têm o capital individual e o Estado de comunicar-se com o público, com as massas de eleitores e consumidores, e conquistar-lhes corações e mentes. Infantil pensar o contrário. Há uma trinca de sujeitos, portanto, que deve ser contentada no modelo de regulação, mas os interesses de cada um são diferentes e assimétricos. Ao capital interessa o dinheiro; ao Estado, o poder; e ao público, diversão no sentido de Brecht, a função natural da arte (BOLAÑO, 2005, p.20).

De acordo com Castro (2005), a Rede Globo conseguiu o raro feito de obter lucro com programas educativos, como os telecursos, ainda que tais programas sejam veiculados em horário considerado pouco lucrativo. Destaque ao Canal Futura, que também pertence à Fundação Roberto Marinho (além de possuir financiamento do governo e da iniciativa privada), cuja programação tem como propósito declarado auxiliar o sistema de ensino regular e capacitar para determinadas profissões, como as das áreas técnicas.

A autora prossegue dizendo que “a categoria educação (...) pode ser dividida em diversos gêneros: educativo, instrucional, seriado, infantil, formação complementar, profissionalizante e técnico etc., como, por exemplo, o Telecurso 2000” (CASTRO, 2005, p.245). Acaba ocorrendo uma “hibridização” (p.246) de educação e entretenimento, cujos produtos se tornam viáveis graças ao bem-sucedido uso “das técnicas próprias desses formatos voltadas para a questão educativa” (p.246).

A preocupação com a dimensão educativa da programação televisiva, segundo Schiavo (2006), faria parte da própria filosofia da Rede Globo:

Com efeito, é importante ressaltar que a ação educativa é parte da filosofia de produção da Rede Globo de Televisão. Isto é: desenvolveu-se na Emissora, uma cultura de abordagem das questões sociais em todos os níveis da programação sempre com uma clara intencionalidade educativa.( p 2). Na década de 1970, a Rede Globo, além de se associar com o grupo norte- americano “Time Life”, atuou como a grande propagandista das idéias do regime militar,

quando do auge de seu recrudescimento. Nesse mesmo período, surgiu o que viria a ser conhecido como “padrão globo de qualidade” e surgiu também o primeiro programa que “hibridiza” educação e entretenimento infantil, Topo Gigio Especial que, segundo Castro (2005), fez muito sucesso na época junto a este público.

Depois disso, outros programas infantis que se valeram deste imbricar de educação e entretenimento continuaram a fazer muito sucesso, com destaque para o Sítio do

Pica-pau Amarelo considerado pela Unesco como um dos melhores programas infantis do

mundo (CASTRO, 2005).

Na década de 1980, ainda segundo Castro (2005), há “uma descoberta das crianças como mercado consumidor pela indústria cultural” (p.249). Nesta época surgem inúmeros programas voltados ao público (mercado) infantil, incluindo as telenovelas. Nesse período também houve uma maior erotização ou sexualização dirigida ao consumo do público infantil quando, por exemplo, “a dança perde o caráter lúdico original para dar lugar ao corpo, ao sexual, como ocorreu nos programas [...] como Xuxa e Sérgio Malandro, na Globo [...]” (idem, p.251).

Castro (2005) relata então que a Fundação Roberto Marinho, criada em 1977 pelo presidente das organizações Globo, originariamente sem fins lucrativos, passa a receber verbas públicas para projetos de teleducação produzidos pela própria Globo chamados de “Telecurso”. Estes, por sua vez, abriram portas ao campo da educação à distância para a Rede Globo, permitindo a esta emissora abater impostos com a atividade educativa, captando recursos do governo federal e do mercado.

A proposta do Telecurso, segundo a autora, é prover conhecimento baseado no currículo do ensino fundamental e médio por meio da televisão. De acordo com Castro (2005), pesquisa realizada no ano 2000 revelou que 7 milhões de brasileiros assistem

semanalmente ao programa, dos quais 400 mil planejam conseguir o diploma de 1º. e 2º. graus:

Mas a grande maioria dos telespectadores procura o chamado edutainment (educação com entretenimento), ou seja, uma forma divertida de se educar. Esse público é composto predominante por telespectadores com formação de nível superior. Segundo Matarelli4 há também uma parcela do público que assiste ao Telecurso 2000 por gostar de programas educativos e como forma de reciclagem (p.256).

Castro (2005) diz ainda que o êxito do Telecurso fomentou o surgimento da Globo Vídeo e do Canal Futura, de modo que sua relação com a educação foi adquirindo cada vez mais importância.

Ao assumir a tarefa de implementar o Telecurso 2º. Grau, a Rede Globo ampliou ainda mais seu poder perante o governo e a sociedade. Sua ação, que antes era voltada ao campo do entretenimento e possibilitava à população uma educação não-formal, passou ao campo formal da educação e da cultura. Competindo com as emissoras de TV públicas no papel de produzir programas de cunho educativo e muitas vezes substituindo-as, a Globo passou a representar institucionalmente as propostas educativas do Ministério da Educação e Cultura (MEC). Em outras palavras, no plano simbólico, a Globo passou a significar, para a maior parte da população brasileira, o espaço da educação e cultura nacionais (p.256).

No México, a emissora de televisão TELEVISA obtém grande aceitação do público com a produção de telenovelas educativas denominadas por Schiavo (1995) de

Entertainment education. Isso inspira a Rede Globo cada vez mais a ter a sua marca associada

à educação e para tanto esta emissora se valerá do sucesso comercial obtido com o

merchandising comercial nas telenovelas para criar o seu merchandising social. Convém que

entendamos, então, a conceituação e as diferenças entre os mecanismos de marketing e

merchandising para então nos aprofundarmos em nosso objeto de estudo, o merchandising

social.

4 Renato Matarelli é gerente de projetos da área de teleducação da Fundação Roberto Marinho. (CASTRO, 2005,