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3 AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E OS ESTUDOS DE ESTRATÉGIA COMO

3.1 As críticas construcionistas e as posições na TRS

A abordagem da TRS adotada nesta tese assume uma série de críticas sobre o campo como contribuições a serem reconhecidas em sua aplicação, o que inclui as autocríticas dos adeptos do campo e as críticas dos que se inserem fora dele. O estudo de Spink (1996) está inserido neste último grupo. Ao discutir o estado da arte dos estudos sobre representações sociais, a autora apresentou argumentos que, segundo ela, legitimam seu afastamento do campo da TRS na direção da chamada “abordagem construcionista”. Spink (1996, p. 181)

polariza a discussão ao generalizar aspectos básicos do construcionismo, sua nova opção, e do construtivismo, que seria a opção da TRS:

[o construcionismo é caracterizado] [...] como uma modalidade de epistemologia pós-moderna radicalmente anti-representacionista; [e o construtivismo como] [...] mescla de anti-determinismo (e portanto a crença na atividade construtiva do sujeito) e de historicismo (e portanto o reconhecimento da natureza histórica e cultural dos fenômenos sociais).

Essas duas concepções acabam simplificando algo muito mais complexo: a gênese epistemológica comum que envolve o construtivismo e o construcionismo; e as diversas correntes dentro das duas abordagens, que para alguns são apenas divisões a partir e dentro do desenvolvimento do construtivismo (DINIZ NETO, 2005). O próprio Gergen (1985), reconhecido como um dos precursores da abordagem construcionista na psicologia social, afirma que o uso do termo construtivismo para identificar a abordagem por ele defendida é comum, mas ele optou pelo termo construcionismo para evitar confusões com o uso do termo anterior em diversos campos.

De qualquer maneira, se, por um lado, as diferenças atribuídas por Spink (1996) às distinções entre cada vertente têm certo sentido, por outro lado, a partir do desenvolvimento dos estudos surgem correntes distintas que aproximam as duas vertentes. Nesse sentido, Rey (2003) destaca compatibilidades e incompatibilidades entre cada vertente e se opõe a uma generalização simplista que indique a existência de um “construtivismo” e de um “construcionismo”. Isso mostra os obstáculos para tentar classificar abordagens que se aproximam, como pode ser ilustrado ao se observar as distinções de Arendt (2003, p. 8) sobre cada vertente:

Os dois paradigmas são contrastados a partir de uma dicotomia: de um lado [construtivista] teorias, objetos, sujeitos que executam procedimentos e refletem sobre coisas a partir de seus interesses, representando a realidade, confiando nas

próprias experiências como forma de compreender o mundo, investigando baseados em fundamentos considerados legítimos; do outro [construcionista], práticas, atividades, sujeitos que negociam a coordenação de ações sociais com outros no fluxo cotidiano, em função de interesses compartilhados, questionando os processos de "construção social" da realidade, atuando com modos de investigação que aceitam o erro e encontram suas garantias em situações localmente constituídas.

Para afastar a TRS do segundo e situá-la no primeiro, Spink (1996) foca o representacionismo da abordagem, mas os problemas da classificação se apresentam quando adeptos da TRS, como Arruda (2003), explicam que há uma confusão, inclusive interna ao campo, sobre o que é representação para a TRS e para o próprio Moscovici (1978), seu precursor: o sentido não é o de representar um objeto concreto como em um espelho, mas construir algo a partir de uma construção anterior. Essa visão aproxima a TRS do construcionismo, como defende o próprio Moscovici (1997) em uma reposta direcionada aos críticos construcionistas da TRS. Isso não indica um pleno equívoco de Spink (1993; 1996), pois muitos adeptos do campo da TRS, como defendem e mostram Nascimento- Schulze e Camargo (2000), assumem uma postura representacionista e uma visão do discurso diametralmente oposta aos desenvolvimentos do construtivismo na direção do chamado “construcionismo”, apresentados por Arendt (2003). Nesta tese, considera-se um equívoco apenas generalizar as críticas para todo o campo e assumir a complexa decisão da incomensurabilidade paradigmática, uma opção comum em muitos campos do conhecimento, que, para os que discutem o tema, tem contornos tanto epistemológicos quanto políticos (BURREL; MORGAN, 1979; BURREL, 1999; CLEGG; HARDY, 1999).

A intenção aqui não é realizar um aprofundamento nas motivações relacionadas com a generalização e a decretação da incomensurabilidade dentre construcionistas, como Spink (1996) e Gergen (1985), mas expor as críticas desse grupo direcionadas à TRS, buscando oferecer contribuições. Isso implica a ruptura com a generalização e com a

incomensurabilidade paradigmática, bem como o delineamento de uma abordagem inserida na TRS, mas influenciada pelas críticas dos construcionistas. Um exemplo disso são as críticas de Spink (1996, p. 180-181) que focam as inserções epistemológicas da TRS, as quais dão destaque às implicações em relação à “natureza da atividade construtiva do sujeito” e à base dessa natureza, o “compromisso com o representacionismo”. Segundo a autora, os problemas epistemológicos da TRS são envolvidos por escolhas teóricas e metodológicas marcadas pela imprecisão e pela falta de clareza.

Diversos pesquisadores, como Medrado (1998) e Ibañez (1992), concordam com essas críticas e advogam um direcionamento para o construcionismo. Outros pesquisadores, como Räty e Snellman (1992), Voelklein e Howarth (2005) e Arruda (2003), concordam com algumas das críticas, mas destacam que elas são contribuições para o campo da TRS, pois a partir delas surgem propostas teórico-metodológicas opostas, distintas ou complementares às existentes no campo, sem exigir um afastamento dele, ampliando seu potencial para lidar com fenômenos sociais. Esta última posição é assumida nesta tese, segundo o entendimento de que não há uma ruptura que exija a passagem para uma “nova” abordagem, mas o reconhecimento de que na origem da TRS há espaço para abarcar as contribuições dos críticos internos e externos. O próprio Mocovici (1997) deixa claro que há espaço para a aproximação entre a TRS e aspectos do construcionismo, estranhando a postura de autores que ignoram essa abertura ou se opõem a ela promovendo uma suposta incompatibilidade, como Gergen (1985), Ibañez (1992), Spink (1996) e Medrado (1998).

Como ressalta Spink (1996), as críticas mais intensas à TRS são realizadas por pesquisadores britânicos e norte-americanos, como Gergen (1985) e Potter e Edwards (1999), em uma inserção na chamada “abordagem construcionista”. Mas isso é paradoxal,

pois esses autores estão abertos a metodologias interdisciplinares e a estudos que não se limitam à experimentação, e assim como Moscovici (1978) e Jodelet (2005), dentre muitos outros adeptos da TRS, eles também se opõem à visão convencional da psicologia na qual predominam os modelos positivistas com ênfase individualista (ROSA, 2006). Potter e Edwards (1999), inclusive destacam como aspectos positivos da TRS a preocupação com o processo de construção das versões de mundo, com os conteúdos no cotidiano das pessoas e com a comunicação, e as relações nela baseada. A despeito do reconhecimento desses aspectos, poucos autores, como Billig (1993), posicionam-se no sentido de assumir possíveis contribuições da TRS para os construcionistas. Comumente, os esforços estão direcionados à crítica da TRS (DUVEEN, 2003). De outro lado, os autores que advogam a favor da TRS, geralmente, estão dispostos ao diálogo com os construcionistas e a buscar neles contribuições para a TRS. Räty e Snellman (1992), Arruda (2003), Voelklein e Howarth (2005) e Rosa (2006) defendem essa postura. E, ao assumi-la nesta tese, busca-se esclarecer as críticas, respondê-las e destacar aquilo que elas oferecem de contribuição para a TRS.

A crítica de Spink (1996) sobre a maneira como a TRS lida com o sujeito e sua atividade construtiva se relaciona com uma visão na qual para a TRS a construção seria uma maneira de reproduzir objetos de uma realidade substantiva. Entretanto, Duveen (1998, p. 446) destaca que a construção na TRS envolve um engajamento ativo

[...] que considera a cultura como um padrão estruturado de significados, sustentado por formas de relações e práticas sociais. [...] [Ela envolve e não impede] o processo pelo qual são geradas novas formas de compreensão, e é este o sentido de “construção” que mais se aproxima com o fenômeno das representações sociais.

De acordo com o autor acima mencionado, na TRS as representações construídas se distinguem por umas serem relativamente estáticas, compondo padrões de significados estáveis, e outras serem mais dinâmicas, marcando um processo construtivo do qual surgem novos significados no mundo social. Os que criticam a TRS, como Spink (1996) e Medrado (1998), enfatizam que ela está centrada na estabilidade e que o dinamismo estaria apenas nas maneiras dos sujeitos apresentarem objetos inseridos na estabilidade social, o que remeteria à idéia de representação desses objetos.

Esses críticos advogam que o uso do termo representação seria um equívoco no âmbito de uma proposta que reconhece o conhecimento como produto da construção social. Para eles a idéia de representação por si só remeteria a um “objetivismo” implícito, pois pressupõe a existência de um objeto anterior, a ser representado (MEDRADO, 1998; SPINK, 1996). Ao discordar desse ponto, é necessário destacar que o argumento em parte têm coerência, não no tocante à necessidade de um objeto anterior que preexiste independente do sujeito, mas na necessidade de se reconhecer uma anterioridade, histórica, que demarca um passado de origem das representações que continua no presente, em um eterno processo de demarcação que envolve a dimensão temporal na construção social do conhecimento – o objeto em si é um corte nessa dimensão. Como explica Marková (2000, p. 430) é necessário reconhecer a diferença “[…] entre a definição de objetos estáticos e monolíticos versus a definição de um fenômeno dinâmico e relacional”. A segunda definição marca a posição da TRS, em oposição à primeira, que marca a tradição positivista.

Quando se coloca na TRS que a representação é de um sujeito sobre um objeto, este objeto é uma delimitação proposta pelo pesquisador ou oferecida pelos sujeitos, 10 para que exista um foco na análise das mediações e construções que ocorrem nesse cotidiano, no decorrer da investigação realizada pelo pesquisador. A importância da definição do objeto no estudo das representações sociais não vem de sua concepção como uma referência objetiva ou real, mas do fato de este objeto delimitar o contexto social em que se expressa a representação social (REY, 2003). Sem isso o que se tem é o infinito de relações sociais impossíveis de serem tratadas pelo pesquisador. Não cabe aqui discutir a necessidade das delimitações em qualquer estudo, mas é importante deixar claro os caminhos para se chegar a essas delimitações. No caso da TRS, segundo a abordagem aqui adotada, o objeto é o meio para essa delimitação, de uma realidade socialmente construída. Portanto, ele não é a realidade e tampouco a representação é o reflexo desse objeto.

Para Moscovici (1978), o termo representação não é sinônimo de reprodução, mas de uma nova produção, na qual os objetos, ao contrário de serem parcial e mentalmente reproduzidos pelo indivíduo, são produzidos e “vividos” em um processo sociocognitivo daqueles que interagem com eles e que os insere em contextos históricos e culturais (HOWARTH, 2002; VOELKLEIN; HOWARTH, 2005). Arruda (2003, p. 349; tradução nossa) explica que para a TRS “[...] a realidade é socialmente construída;

10

O pesquisador, como na abordagem adotada nesta tese, pode buscar esse foco nas próprias manifestações dos sujeitos, pois os sujeitos delimitam objetos por conta própria em suas interações cotidianas, e revelam construções sociais associadas a esses objetos (o que inclui as representações sociais). Comumente, para direcionar e facilitar a coleta e o tratamento dos dados, o pesquisador oferece um foco (objeto) para o sujeito se manifestar a respeito, o que oferece oportunidade para as críticas em que haveria ênfase numa relação simplista de oposição entre sujeito e objeto.

conseqüentemente, ela obscurece os limites entre sujeito e objeto”. Ou seja, uma separação simplista é inviável e incoerente.

Wagner (1998, p. 309, tradução nossa) esclarece que Moscovici (1978) raramente utiliza o termo construção social em seus primeiros estudos “[...] seu termo preferido, ‘représentation’, em francês, tem um âmbito dinâmico e construtivo. O termo inglês e germânico representation tem um âmbito mais estático de reprodução, por exemplo, uma fotografia ou um mapa”. Essa distinção explica parte das críticas que associam de maneira generalizada a TRS a uma visão estática de uma realidade objetivada (VOELKLEIN; HOWARTH, 2005), ignorando estudos em posições totalmente distintas (WAGNER, 1998). Ainda, Rey (2003) destaca que, diferentemente dos construcionistas, Moscovici (1978) não descarta uma ontologia da realidade, mas se aproxima deles ao associar essa ontologia às relações sociais. Ou seja, a realidade existe a partir das delimitações do sujeito, não como algo nato, pois a ontologia que define a suposta realidade comum é uma construção dos sujeitos.

Nesse sentido, a TRS não se insere numa visão objetivista da realidade e tampouco na plena relativização contextual defendida pelo construcionistas. Ao discutir essa questão, Guareschi (2003) discorda da posição de total relativização defendida pelos construcionistas. O argumento do autor se justifica pelo entendimento de que a centralidade na plena relativização e contextualização é contraditória, uma vez que a proposição da plena relativização passa a ser assumida como uma verdade absoluta, não relativa, contrariando o próprio argumento (ROSA, 2006). Para Guareschi (2003), a contingência e a relativização, que caracterizam os discursos nas análises construcionistas, também devem ser assumidas no tocante ao entendimento da produção teórica e nos resultados das investigações dos construcionistas, o que deve incluir as críticas

à TRS. Isso remeteria à existência de espaço dentre os construcionistas para a visão da realidade defendida pela TRS e destacada por Arruda (2003): uma realidade socialmente construída com base em processos de comunicação e interação permeados por formas de conhecimento distintas, que permitem ao sujeito criar e lidar com a diferença e a novidade (heterogeneidade), sem, necessariamente, a eliminar, o que envolve seus interesses, valores e idéias.

Para a autora, esses aspectos norteiam a discussão que parte dos construcionistas sobre a existência ou não da realidade e a maneira como a TRS lida com ela. A autora explica ainda que a questão central em torno dessa temática é o fato de que para a TRS “[...] a representação de algo também é a representação da pessoa que o construiu [...] A ‘pessoa que construiu’ baseia sua construção no domínio do simbolismo e da experiência de vida que fornecem as bases de sua leitura do mundo” (ARRUDA, 2003, p. 349). A criatividade e a novidade não são eliminadas; pelo contrário, elas vêm dessa base, também responsável pela relatividade da realidade como algo que é construído por pessoas, mas uma relatividade que não é plena, pois as próprias construções anteriores das pessoas impõem limites simbólicos a essa relatividade (HOWARTH, 2002). Aparentemente, em relação à questão da relatividade da realidade, o ponto de confronto entre os construcionistas e os adeptos da TRS é a aceitação desses limites simbólicos por parte dos últimos, uma referência que permite a existência de representações. Sem o simbólico e seus limites não existiriam representações sociais.

Guareschi (2003) destaca que nas propostas construcionistas os discursos assumem o papel dos limites simbólicos e da atuação do sujeito, uma abordagem com a qual o autor discorda, pois implica que o sujeito deixa de ser o produtor dos discursos influenciados por diversos

aspectos da interação e contextualização social para ser primordialmente produzido por discursos que ele mesmo reproduz a partir de uma contextualização também discursiva, e por isso considerada social. Assim como defendido nesta tese, o autor não nega a condição social do discurso. O que ele questiona é a exclusividade ou prioridade do social a partir do discurso em detrimento das outras manifestações sociais. Além de ser considerado um produto associado a uma situação interativa específica, o próprio discurso é visto como reprodutor de discursos mais amplos, presentes na esfera social, chamados, por exemplo, de “repertórios interpretativos” (GUARESCHI, 2003; ROSA, 2006). Rosa (2006) explica que, para os construcionistas, por meio desses repertórios ocorreria a ligação entre o indivíduo e a esfera social, com o primeiro buscando seus objetivos por meio do uso de estruturas discursivas presentes na linguagem e que emergem da relação interpessoal. O sujeito construtor da realidade, como na TRS, passa a ser uma “[...] construção da realidade [...] de sujeito falante é transformado em sujeito constantemente falado pelos microdiscursos contextualmente variáveis” (ROSA, 2006, p. 173). Rosa e Farr (2001) corroboram com esse argumento ao destacarem que a conseqüência dessa visão é ter o discurso, a realidade e os sujeitos identificados entre si de maneira tautológica no próprio discurso.

A crítica ao radicalismo dessa visão do discurso não significa que a TRS se opõe ao discurso ou ao seu estudo. Muito pelo contrário, o problema é a reificação do discurso, assim como a TRS é acusada de reificar as representações. Portanto, o alerta sobre os aspectos negativos da reificação, destacados também pelos construcionistas, serve para ambos. As representações e os discursos devem ser tratados dentro de um corte que se oponha a uma reificação simplista, na direção do reconhecimento de uma constituição dinâmica e socialmente construída. Dessa maneira, o discurso, base do processo de comunicação, relaciona-se de maneira indissociável com as representações, compondo seu

processo de transformação, por meio do qual, segundo Arruda (2003), as representações de um sujeito se entrosam com as de outros grupos.

Essa ligação entre a TRS e o discurso justifica os interesses de Rosa e Farr (2001) em aproximar as proposições teóricas e metodológicas da Análise do Discurso com a TRS, o que só é possível ao se opor à reificação, seja do discurso, seja das representações. Os autores destacam que

Se na espécie humana a palavra é um canal privilegiado para definir, objetivar e construir realidade, não obstante a realidade não pode ser definida exclusivamente por meio da palavra: imagens, sons, condutas, ritos... são outros modos de gerar e comunicar aspectos "multiformes" (não necessariamente complementares e, em alguns casos, antagônicos) de representações sociais (ROSA; FARR, 2001, p. 238; tradução nossa)

Nesta tese, ao se assumir essa posição, buscou-se um caminho que permite focar aspectos distintos das práticas sociais e dos sujeitos em suas inserções contextuais. A Análise dos Discursos acompanha o estudo de práticas e manifestações diversas por meio de observações no cotidiano dos sujeitos. Por esse caminho se revelam as Representações Sociais, com ênfase em seus dinamismos mais ou menos estáveis que envolvem tanto a heterogeneidade quanto o compartilhamento, à medida que ocorre o entrosamento dos sujeitos em uma infinidade de grupos sociais.

Outra crítica dos construcionistas à TRS se refere à problemática da delimitação do grupo de sujeitos de pesquisa e à associação desse grupo como um todo a uma determinada representação social. Defendendo esse argumento, Medrado (1998, p. 10-11) alerta para as limitações da TRS nas pesquisas empíricas, pois

[...] aquilo que define um grupo social a ser investigado seriam as representações por eles compartilhadas, ou seja, aquilo que só será alcançado no final do trabalho.

[...] Assim, nos trabalhos de Moscovici, é circular e tautológico o critério utilizado para se identificar um grupo, resultando numa confusão conceitual, na medida em que o grupo é definido a partir daquilo mesmo que define as representações, a saber, sua natureza social.

Novamente, a delimitação de uma dimensão da abordagem empírica é colocada em questão, mas os críticos reconhecem apenas a primeira etapa da delimitação dos sujeitos; a decisão inicial da escolha é do pesquisador e de seus critérios. A TRS mantém essa condição, mas o equívoco dos críticos está em não reconhecer a segunda etapa que envolve os estudos. O argumento de Medrado (1998) remete ao entendimento de que àquele grupo, inicialmente definido, será atribuída determinada representação, de maneira simplista e direta, mas na TRS cabe ao sujeito a palavra final sobre suas relações sociais. Ou seja, o pesquisador pode incluir os sujeitos que bem entender. Mas, ao analisar as relações entre eles com base na TRS, surge o papel dos sujeitos na demarcação dos espaços de suas relações sociais, e os membros do grupo escolhidos pelo pesquisador podem não se confirmar como aqueles que interagem entre si, em torno dos temas também escolhidos pelo pesquisador. Sá (1998) reconhece que essa característica da TRS é ignorada em estudos dentro do próprio campo. Considera uma falha daqueles que a adotam, ignorando o rigor necessário para evitar que o pesquisador defina arbitrariamente as relações sociais em torno das representações, sem oferecer espaço aos sujeitos de pesquisa, como defende a TRS.

Essa característica foi um dos principais motivos da inserção da TRS nesta tese: uma base para que o sujeito ofereça contribuições ao se estudar a estratégia como prática social, no sentido de suprir as limitações dos pesquisadores do campo na escolha das delimitações do escopo adequado para investigar as infinitas relações sociais que podem envolver as práticas na estratégia. A circularidade mencionada – o grupo de sujeitos remete às representações sociais que remetem ao grupo de sujeitos – ignora que o primeiro grupo não é igual ao segundo. O primeiro, quem define é o pesquisador; o segundo grupo interessa à TRS, pois é

a construção dos próprios sujeitos que rejeita, confirma ou reconstrói as escolhas do pesquisador, o que faz parte da análise das construções dos sujeitos.

Rosa (2006) destaca que a solução proposta pelos construcionistas demarca uma diferença básica em relação à TRS. Os primeiros vão adotar uma concepção na qual o discurso é o