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CAPÍTULO 3 CONFLITO E NEGOCIAÇÃO NAS ORGANIZAÇÕES

3.3 CONCEITO DE NEGOCIAÇÃO

3.3.1 As dimensões do processo de negociação

Na literatura especializada aparece uma diversidade de definições do que pode ser entendido como negociação. Dentre elas começaremos por expor a apresentada por Fisher, Ury e Patton (1994), em um trabalho de considerável impacto nos ambientes acadêmico e empresarial:

A negociação é um meio básico de conseguir o que se quer de outrem. É uma comunicação bidirecional concebida para chegar a um acordo, quando você e o outro lado têm alguns interesses em

Nesta definição podem ser destacados alguns elementos básicos • Partes ou atores do processo.

As partes são as pessoas envolvidas na disputa. A maioria são disputantes - as pessoas que estão mutuamente em conflito. Outras partes - geralmente chamadas de "terceiras partes" - são partes que intervêm na disputa para tentar ajudar os disputantes para resolvê-la. (CONFLICT RESEARCH CONSORTIUM, 1998)

• Comunicação entre as partes, buscando atingir um

• Acordo, que constitui o meio pelo qual as partes tentam atingir seus

• Interesses, ou seja, o que eles querem conseguir dos outros na negociação.

Keeney (1992) apresenta uma definição de negociação desde uma perspectiva da tomada de decisões com participação de múltiplos atores, nos seguintes termos:

Negociações são uma classe evidente de decisões importantes, nas

quais mais de um stakeholder 1 devem concordar em uma alternativa

para ser escolhida. Nesses casos, é naturalmente importante criar alternativas para a sua consideração por parte dos stakeholders. No entanto, é particularmente importante criar alternativas que sejam desejáveis para todos os stakeholders na negociação. A classe de negociações consideradas aqui envolve múltiplos assuntos. Nesses casos, cada stakeholder deve avaliar o valor das compensações respeito a quanto renunciar em termos de um assunto para ganhar uma quantidade determinada de outro assunto. Focar em valores pode contribuir muito nestas situações. (KEENEY, 1992, p. 237)

Nesta definição é introduzida, por meio do conceito de stakeholder, o problema dos limites da negociação, do ponto de vista do seu sistema de atores, ou seja, quem deve ser incluído na mesa de negociação. Este aspecto será analisado

1 Stakeholders são as pessoas que serão afetadas por um conflito, ou pela

resolução desse conflito. Isto inclui os atuais disputantes, e também pessoas que atualmente não estão incluídas no conflito, mas podem vir a ser envolvidos devido a que provavelmente serão afetados em algum momento no futuro pelo conflito ou seu resultado (CONFLICT RESEARCH CONSORTIUM, 1998).

ainda neste capítulo.

Segundo Raiffa (2002), desde a perspectiva do ator individual de uma negociação, devem ser tomadas decisões que incluem as seguintes situações:

• A decisão de negociar;

• O que fazer se a negociação fracassa;

• A decisão de ir ao tribunal ou aceitar um acordo; • Com quem negociar;

• A decisão de usar a ajuda de terceiras partes; • A escolha de um estilo de negociação;

• A decisão de ... (adicione a sua própria) (RAIFFA ET AL, 2002, p. 14-15). Este mesmo autor, tentando uma classificação dos tipos de negociação, apresenta a seguinte série de perguntas a respeito de características importantes das negociações:

• Disputa ou colaboração?

• Mais de duas partes? • As partes são monolíticas? • O jogo é repetitivo?

• Existem efeitos de vinculação com outras negociações? • Mais de um tema?

• É preciso chegar a um acordo? • São possíveis as ameaças?

• Existem restrições de tempo ou custos vinculados ao tempo? • Os contratos são obrigatórios?

• A negociação é pública ou privada? • Quais são as normas do grupo?

• Pode ser usada ajuda externa? (RAIFFA ET AL, 2002, p. 88-95).

Lax e Sebenius chamam a atenção para três dimensões complementares no processo de negociação. (Ver Figura 9) A primeira dimensão corresponde à interação interpessoal estabelecida na mesa de discussão. A segunda dimensão relaciona-se com a busca da geração de valor por meio da cooperação ente as partes. Enquanto estas duas dimensões focam nas táticas adequadas para jogar na mesa, a terceira dimensão coloca o foco na estratégia de desenho do jogo, operando freqüentemente fora da mesa de discussão. Esta última dimensão preocupa-se com a configuração da negociação, em temas como a determinação de quais são as partes que devem estar na mesa, quais as questões a serem tratadas, assim como a seqüência e o momento adequados para sua discussão (LAX E SEBENIUS, 2002, p. 8; 2003, p. 51-52).

Foco Barreiras comuns Abordagem

1D Tática (pessoas e processos)

Questões interpessoais, comunicação deficiente, postura

agressiva

Atuar "à mesa" para melhorar processos e táticas interpessoais

2D Desenho do acordo (valor e

substância)

Ausência de acordos viáveis ou desejáveis

Retornar à "prancheta" para conceber acordos que liberem um valor duradouro

3D Configuração (escopo e seqüência)

Partes, questões, e outros elementos não sustentam um processo viável ou um acordo valioso

Agir "fora da mesa" para criar escopo e seqüência mais favoráveis

FIGURA 9. AS TRÊS DIMENSÕES DA NEGOCIAÇÃO Fonte: Lax e Sebenius (2003:53).

dificuldade de estabelecer com clareza os limites entre o que pertence e o que não pertence a um processo de negociação dado.

Analisando o problema da identificação dos atores em um processo de negociação, Gilespie e Bazerman (1997) introduzem o conceito de integração parasitária.

Integração parasitária ocorre sempre que dois ou mais negociadores

atingem um acordo "Pareto-superior" 2 para eles, mas impõem

custos em outros stakeholders nas negociações. A integração parasitária resulta em uma melhora de Pareto para um subgrupo das partes da negociação, e os seus resultados são descritos com freqüência como negociação integrativa. Sob uma inspeção mais atenta, no entanto, esses acordos parecem depender de extração parasitária de recursos de outras partes. (GILLESPIE E BAZERMAN, 1997, p. 272)

Focando a atenção nos interesses dessas terceiras partes e partes ausentes, o conceito de integração parasitária coloca um tema importante, relacionado as fronteiras da negociação: quem deve integrar a mesa de negociação? Gillespie e Bazerman alertam sobre o perigo de uma regressão infinita de participantes nos casos de problemas de negociação que afetam interesses de múltiplos grupos na sociedade. Os autores citados propõem, no mínimo, a integração dos dirigentes dos grupos afetados (como representantes do governo ou organizações sociais) (GILLESPIE E BAZERMAN, 1997, p. 279). Na medida em que os grupos afetados geralmente não são monolíticos, podem aparecer problemas de legitimidade de difícil resolução.

A identificação dos limites temporais dos processos de negociação, e em particular o momento em que finaliza o processo em um "acordo" entre as partes,

2Um acordo Pareto-superior supõe uma re-alocação de recursos na qual pelo menos uma parte fica em uma situação melhor que a inicial, sem que nenhuma das outras partes fique em uma situação pior (GILLESPIE E BAZERMAN, 1997, p. 281).

também apresentam dificuldades. Segundo Honeyman (2001, p. 7-8), os negociadores tendem a perceber erroneamente o curso esperado dos conflitos. A imagem dominante seria a de um conflito como um “crescendo”, atingindo um pico, onde o acordo é atingido, e depois “todos voltam a casa”. Em contraposição, o autor postula uma imagem do acordo que apresenta um padrão ondulado, composto por uma sucessão de picos de tensão que representam a forma em que o conflito evolui ao longo do tempo na direção do acordo. (ver Figura 10).

A imagem predominante cria expectativas pouco realistas, de modo que o anuncio de um acordo tentativo significa que "já está tudo resolvido", e fracassa na preparação dos participantes para lidar em forma inteligente com o provável ciclo de disputas subsidiárias. (HONEYMAN, 2001, p. 11)

As conseqüências de uma definição deficiente do alcance da negociação pode significar a subestimação dos problemas vinculados à posterior implementação dos acordos. Ertel (2004) alerta sobre o risco de colocar a ênfase exclusivamente no fechamento do acordo nas negociações. Este autor diferencia duas abordagens:

negociador de olho no acordo em contraposição com negociador de olho na implementação. A primeira abordagem seria a ideal em negociações que do tipo da

venda de um ativo que não implique necessidade de colaboração entre as partes. A situação é diferente quando o acordo que fecha a negociação representa um compromisso das partes de trabalhar conjuntamente para gerar valor. Nestes tipos de negociação:

Para ter sucesso, o negociador precisa reconhecer que fechar o contrato é só o início do processo de criação de valor. (...) O verdadeiro desafio não está em garantir pequenas vitórias antes de assinar na linha pontilhada, mas em projetar um acordo que funcione na prática. (ERTEL, 2004, p. 44)

tempo te ns ão Momento do “acordo” tempo te ns ão Momento do “acordo” tempo te ns ão Momento do “acordo”

a) Imagem mental criticada por Honeyman (2001)

tempo ten são Momento do “acordo” tempo ten são Momento do “acordo” tempo ten são Momento do “acordo”

b) Imagem mental proposta por Honeyman (2001) FIGURA 10. IMAGEM MENTAL DO ACORDO

Fonte: Honeyman (2001, p. 8)

A negociação de olho na implementação requer do que o autor denomina como uma "nova mentalidade" do negociador, orientada a gerar compromissos realistas, viáveis e duradouros entre as partes, nos quais os encarregados da implementação sejam capazes de estabelecer relações de trabalho adequadas que conduzam à geração de ganhos conjuntos.

O produto de uma negociação não é um documento, mas o valor produzido depois que as partes cumpriram o que haviam prometido. Um negociador que sabe disso se prepara de modo diverso do

negociador fixado na negociação. Não se pergunta "O que será que eles aceitariam?", mas sim "como criar valor juntos?" (ERTEL, 2004, p. 51)

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