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CAPÍTULO II – PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

2.5 As entrevistas com os alunos

As entrevistas com os alunos tinham como objetivo identificar as características da professora que os alunos valorizavam e perceber se eles estavam entendendo a Matemática que estavam aprendendo. Pretendia ouvir as impressões deles sobre Sara e sobre o seu relacionamento com ela, sem formular uma pergunta direta. Minha expectativa era de que, ao falar sobre a Matemática que estava sendo ensinada, os alunos se referissem à professora e à sua forma de atuar em sala de aula. Ao comentar as entrevistas, veremos que as coisas não se passaram dessa forma. Elas foram realizadas em uma sala de aula do colégio, que se encontrava vazia no momento e foram gravadas em áudio.

Fiz duas entrevistas com alguns alunos de Sara, sendo a primeira com 10 alunos da 6ª série e a segunda com quatro alunos da 5ª série. Desde a primeira entrevista que tive com ela, avisei que gostaria de entrevistar alguns alunos e pedi que me indicasse os que considerasse como ‘fortes’, ‘medianos’ e ‘fracos’ em Matemática. De fato, havia pensado em conversar com os alunos individualmente, solicitando que cada um justificasse sua resposta às minhas perguntas investindo, assim, numa proximidade maior com os mesmos, o que me permitiria maior liberdade de obter as informações que me interessavam e evitar um número muito grande de respostas repetitivas. Entrevistar todos os alunos seria uma tarefa difícil do ponto de vista prático, considerando que teria que fazer isto fora do horário das aulas. Entretanto as entrevistas com os alunos não aconteceram dessa forma, e eles foram informados sobre elas no momento das mesmas. Esses alunos foram escolhidos por Sara, e eu não tive nenhum encontro com eles antes, fora dos horários de acompanhamento das aulas, quando também não havia conversado com eles. Isto é, o critério de escolha não foi meu, e os alunos não estavam sabendo do porquê dessas entrevistas.

A análise das entrevistas com os alunos acrescentou pouca informação sobre a prática de Sara, mas, a partir delas, pode-se inferir o tipo de aprendizagem que decorre dessa prática. Há evidências, também, nas soluções apresentadas por eles às questões teóricas, que esses alunos aprenderam o que ela ensinou.

2.5.1 Entrevista com 10 alunos da 6ª série

Embora eu tivesse planejado entrevistar oito alunos, Sara enviou dez para a entrevista, em função da disponibilidade dos mesmos naquele momento. Eles estavam fazendo uma prova de Matemática e, à medida que iam acabando, a professora os mandava para a entrevista. Os oito primeiros chegaram mais ou menos no mesmo horário, e os outros dois quando eu já havia começado. Essa forma de selecionar os alunos para a entrevista, por si só, já acarretou uma mudança no procedimento programado. Em vez de entrevistá-los individualmente, como eu havia planejado, entrevistei-os todos juntos, formando uma roda e propondo coletivamente as questões a que eles deveriam responder.

Entreguei a cada aluno uma folha de papel com três perguntas que deveriam ser respondidas oralmente e cinco questões sobre o conteúdo de Matemática que eles estavam estudando a serem respondidas por escrito. Os alunos estavam visivelmente constrangidos, e as respostas às três primeiras perguntas — “Vocês gostam de Matemática? Do que foi estudado este ano, o que vocês mais gostaram? Do que foi estudado este ano, o que vocês não gostaram?” — foram do tipo telegráfico: “adoro”, “sim”, seguido do nome do tópico de Matemática de que eles gostaram ou não gostaram. Nessas respostas, nenhum deles se referiu à professora.

Nas questões sobre o conteúdo, tomei o cuidado de modificar ligeiramente os enunciados com os quais eles estavam acostumados. Por exemplo, em vez de dar uma soma já indicada (– 4) + (+ 7), pedi para “somar o número −4 com o número

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+ ”. Com essas questões, queria verificar se os alunos usariam o mesmo esquema de solução ensinado por Sara em sala de aula ou se tentariam estratégias diferentes.

Numa das questões, proponho que encontrem a solução da equação 9

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2x+ = ; duas outras questões trazem problemas do primeiro grau bastante fáceis: “O dobro de um número somado com quatro dá dez. Qual é o número? e “A soma de dois números é 10 e seu produto é 21. Quais são os números?” Tanto a equação quanto os problemas poderiam ser resolvidos, facilmente, de cabeça. A análise das respostas será aprofundada no final do Capítulo III.

Convém lembrar que o número de alunos entrevistados foi pequeno e que eles não constituíam uma amostra representativa dos alunos da turma, uma vez que foram os que primeiro terminaram a prova. Mas achei interessante e digno de nota que os que participaram da entrevista tinham mostrado que a repetição dos conceitos e das regras em sala de aula, observada pela própria Sara em entrevista, está levando a um certo nível de compreensão desses conceitos e regras, como veremos mais adiante.

2.5.2 Entrevista com 04 alunos da 5ª série

Fiz uma segunda entrevista com quatro alunos, agora da 5ª série, com o objetivo de saber se eles estavam gostando das aulas de Matemática e da professora e se eles estavam entendendo o que ela dizia em sala de aula. Novamente tentei evitar uma pergunta direta sobre o que eles achavam da professora, perguntando se eles gostavam das aulas de Matemática. A entrevista foi gravada em áudio.

A escolha dos alunos para a entrevista foi feita pela professora. No dia combinado, aqueles que haviam ficado em recuperação foram para a aula de recuperação, e, entre os que não iam fazer recuperação, Sara escolheu quatro para participar da entrevista. Mais uma vez, foi a professora que selecionou os alunos que seriam entrevistados, e a amostra não era representativa dos alunos da sala. Só um dos alunos, M., teria sido também escolhido por mim, por se destacar nas aulas, respondendo, de pronto, quase sempre, ao que Sara perguntava.

Entreguei a cada aluno uma folha com quatro perguntas sobre a relação deles com a Matemática em geral e também com a Matemática que eles estavam aprendendo na 5ª série. Essas perguntas deveriam ser respondidas oralmente em uma roda que organizamos para esse fim.

“Você gosta de Matemática? Por quê? Sempre gostou? Você gosta das aulas de Matemática? Por quê?

O que você está achando da Matemática da 5a série?

O que você aprendeu de Matemática na 5a série? Do que você aprendeu na 5a série, o que você mais gostou? Por quê? O que você menos gostou? Por quê?”

As outras cinco questões versavam sobre o conhecimento específico da Matemática que eles estavam aprendendo e foram respondidas por escrito. Eram

questões mais ligadas aos conceitos, do que ao cálculo com os números naturais e as frações.

“1 – O que são os números naturais? Para que eles servem? 2 – O que é o conjunto N?

3 – O que são frações? Para que elas servem? 4 – O que é o conjunto Q?

5 – Para somar e subtrair frações, você precisou calcular o Mínimo Múltiplo Comum (mmc) dos denominadores das frações. O que é o mmc de dois números? Se você quiser, pode explicar dando exemplos.”

Com essas questões, queria saber se os alunos associavam o símbolo N ao conjunto dos números naturais e o símbolo Q ao conjunto dos números racionais e se eles atribuíam significado a cada um desses conjuntos numéricos, ao conceito de frações e de mínimo múltiplo comum. Meu interesse explica-se porque, em sala de aula, Sara se referia na maioria das vezes ao “conjunto N”, quando queria se referir aos números naturais, “adição em N”, “subtração em N”, “desigualdade em N”, “x pertence a N”. Por outro lado, ela se refere pouco ao conjunto Q, dos números racionais usando, na maioria das vezes, as expressões “adição de frações”, “subtração de frações”.

A 5ª questão foi incluída porque era meu objetivo saber se os alunos haviam entendido o conceito de Mínimo Múltiplo Comum. Em quase todos os exercícios sobre adição e subtração de frações, os denominadores eram primos entre si e, portanto, o mínimo múltiplo comum dos números, era o produto deles.

Meu objetivo com essa entrevista não foi plenamente alcançado. Os alunos, em número reduzido, não falaram sobre a professora. Muito novos e tímidos, visivelmente pouco à vontade, eles simplesmente foram nomeando os tópicos que aprenderam de Matemática, fazendo referência àqueles de que gostaram ou não gostaram, mas não houve troca de idéias de uns com os outros. Os conjuntos foram associados corretamente aos seus respectivos elementos, o conjunto N aos números naturais e o conjunto Q às frações. Um aluno associou o Mínimo Múltiplo Comum de dois números ao “menor múltiplo comum deles” e os outros três deram dois números e calcularam o MMC deles, sem explicação. Pelas respostas, não dá para perceber se eles atribuíram sentido ao conceito.