• Nenhum resultado encontrado

1. A FORMAÇÃO DO ADMINISTRADOR E A NOVA LEGISLAÇÃO

1.2. As Escolas de Administração no Brasil

Os conteúdos de administração não são novidades no ensino brasileiro, de acordo com Nicolini (2003, p. 45), “Os primeiros cursos de que se tem notícia no Brasil datam de 1902, quando passam a ministrar o estudo da Administração em duas escolas particulares: no Rio de Janeiro, na Academia de Comércio5, e em São

5 A Academia de Comércio foi criada pelo Conde Cândido Mendes de Almeida em 1902, que em 1919, também cria a Faculdade de Ciências Econômicas do Rio de Janeiro. Estas duas instituições são as que estão na origem da Universidade Cândido Mendes. Sobre este assunto ver: apresentação da UCAM. Disponível em www.ucam.edu.br/institucional. Acesso em 26/02/2010.

Paulo, na Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado”. No entanto, como assinala este mesmo autor, não se tratava de ensino em nível de terceiro grau.

Os Cursos de Graduação em Administração, da maneira como são entendidos atualmente, só são introduzidos no sistema de ensino brasileiro a partir da década de 19306, quando o Brasil alinha-se de maneira gradual, porém progressiva, com os Estados Unidos da América. Depois de um período de ambivalência, entra na Segunda Guerra Mundial ao lado dos aliados e o Chanceler Brasileiro – Oswaldo Aranha – é o primeiro Secretário Geral da ONU – Organização das Nações Unidas – quando esta se instala em São Francisco, no estado americano da Califórnia. Como explica Bertero (2006, p. 4), “não resta dúvida de que a administração chega ao Brasil em um momento de expansão da influência norte- americana, seja diretamente, seja pela capacidade norte-americana de influenciar, às vezes decisivamente, os organismos internacionais”.

A nova ordem estabelecida nos anos de 1930 implicava tanto em “modernizar” o aparato administrativo público como o mundo empresarial privado.

Estas condições propiciaram a criação da ESAN – Escola Superior de Administração e Negócio, na cidade de São Paulo, fundada pelo Padre Jesuíta Roberto Sabóia de Medeiros, a partir dos seus contatos nos Estados Unidos e tendo como modelo a Harvard Business School (BERTERO, 2006). Atualmente, essa escola tem como mantenedora a Fundação de Ciência Aplicada que, além do curso de graduação em Administração, oferece cursos na área de engenharia e ciência da computação.

6 Nos anos de 1930 ocorre a denominada “A Revolução de 1930”, um movimento político-militar que substituiu a Primeira República e inicia um processo de modernização da economia brasileira, que até então era baseada em uma agricultura voltada para a exportação, que deveria ser transformada em economia industrial e no fortalecimento do mercado interno. Sobre este assunto ver Fausto (1975).

Entretanto, a referência mais citada sobre o início da formação de profissionais em administração é a criação da EBAP - Escola Brasileira de Administração Pública - pela Fundação Getúlio Vargas, em meados da década de 1940, no Rio de Janeiro, então Capital Federal, como parte do projeto de modernização da administração pública do governo de Getúlio Vargas. Posteriormente, essa escola passa a ministrar, também, o curso de Administração de Empresas e muda a sua denominação para EBAPE – Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas (BERTERO, 2006).

Em 1954, a Fundação Getúlio Vargas implanta na cidade de São Paulo a EAESP - Escola de Administração de Empresas de São Paulo e inicia as atividades de ensino voltadas para o gerenciamento de organizações privadas ou de negócios.

A criação da EAESP foi resultado de um convênio assinado entre o governo Brasileiro e a FGV, de um lado, e o dos Estados Unidos da América e a Michigan State University, do outro lado. Para a execução deste convênio, a universidade norte-americana enviou ao Brasil uma missão que permaneceu durante dez anos instalando a nova escola. Inicialmente, implantou o programa de educação executiva e, em seguida, o curso de Graduação em Administração, cuja primeira turma se graduou no inicio dos anos de 1960 (BERTERO, 2006).

No final dos anos de 1950, a USP – Universidade de São Paulo - toma a decisão de reforçar a área de administração da Faculdade de Ciências Econômicas, Administrativas e Contábeis, fundada na década de 1940, criando as condições necessárias para iniciar o funcionamento do Curso de Graduação em Administração. A coordenação deste projeto ficou a cargo de dois professores originários da Escola Politécnica – Ruy Aguiar da Silva Leme e Sérgio Batista Zacarelli – que também buscam referências para o novo curso nas instituições norte-americanas, pois de

acordo com Bertero (2006, p. 8), “o projeto da USP foi abrangente em termos de conteúdo e não muito diverso do da EAESP”.

Nesses primeiros cursos, a estrutura curricular estava baseada em dois grandes eixos: o primeiro estava voltado para o embasamento nas ciências sociais com a inclusão de conteúdos de economia, sociologia, antropologia, ciência política, psicologia e alguns ramos do direito. Com isso, queria-se evitar, de acordo com Bertero (2006, p. 9), “que o curso de graduação em administração se tornasse pura instrumentalidade, ou apenas um conjunto de técnicas vinculadas às diversas áreas funcionais, sem a consciência da importância da atividade e da profissão de administrador para o país”. O segundo grande eixo - o profissional - girava em torno do entendimento da administração como profissão modernizadora, com os conteúdos relativos a diferentes áreas funcionais da administração: finanças, marketing, contabilidade gerencial, administração de pessoal, vendas, produção, entre outros.

Na organização curricular, nos dois primeiros anos concentravam-se as disciplinas das ciências sociais, que deveriam fornecer o referencial no interior do qual o administrador deveria centrar a sua formação e a sua atuação futura. Os dois anos finais eram reservados prioritariamente aos conteúdos profissionalizantes.

É essa estrutura curricular que foi utilizada como referência para elaboração do currículo mínimo para este curso, aprovado pelo Parecer No. 307 do Conselho Federal de Educação, de 08.07.1966, e que, portanto, orientou os demais cursos criados no país a partir dessa data.

Essa regra legal permanece até 1993, quando é aprovado o Parecer 433/93, que reorganiza o currículo mínimo para esse curso, permanecendo 68% da carga horária com os conteúdos definidos pelas autoridades de ensino, mas autoriza a

inclusão no projeto pedagógico de um conjunto de Disciplinas Complementares, que podem chegar a 32% da carga horária total do curso, ou seja, 960 horas, que serão definidas pelas IES.

Esta modificação permitiu a criação de cursos de Graduação em Administração com ênfase em uma das áreas funcionais que eram registradas nos diplomas emitidos pelas IES como habilitações. Deste modo se explica a multiplicação desse curso com diversas habilitações. Era comum uma mesma IES obter autorização dos órgãos competentes para instalar cursos de Administração com mais de uma habilitação, sendo autorizado um determinado número de vagas para cada uma dessas habilitações.

Essa trajetória evidencia que os cursos de Graduação em Administração criados no Brasil têm a sua origem no modelo norte-americano. No entanto, como as instituições de ensino daquele país, utilizadas como referência, só atuam com programas em nível de pós-graduação - os MBAs -, que possuem uma duração, em média, de quatro semestres letivos, houve a necessidade de fazer um ajuste para adequá-los ao nível de graduação e à realidade do ensino brasileiro. A solução foi a criação de dois anos de ensino propedêutico, utilizados para o desenvolvimento dos conteúdos das ciências sociais e dos de formação básica, com a inclusão dos conteúdos de métodos quantitativos e contabilidade básica. Assim, no nível de graduação, este curso passou a ter uma duração de oito semestres letivos ou quatro anos.

É este o modelo de curso de Graduação em Administração que, com a política de ampliação do acesso ao ensino superior, por meio de autorização para criação de novas IES, se transformou naquele que atrai o maior número de

estudantes brasileiros concentrando, aproximadamente, 16% do total das matrículas deste nível de ensino, ultrapassando inclusive o tradicional curso de Direito.

De acordo com os dados do Censo do Ensino Superior de 2007 (INEP, 2009), as matrículas no curso de Graduação em Administração apresentaram um crescimento de 310% em relação ao número de matriculados em 1998, passando de 257.408 matrículas naquele ano, para 798.755 em 2007, distribuídas nos mais de 1.700 cursos reconhecidos ou autorizados a funcionar pelo MEC.

Foi assim que esse curso, que surgiu como resposta à demanda das organizações privadas para formar pessoal especializado para dirigi-las e, que nas primeiras turmas de alunos da FGV e da USP encontravam-se matriculados os herdeiros dos grandes empresários nacionais, tornou-se um curso de massa (BERTERO, 2006).

Uma das consequências deste crescimento no número de matrículas pode ser percebida como perda da qualidade do ensino ministrado nesses cursos. Os dados referentes ao desempenho dos alunos de 744 cursos de Administração avaliados, no ano de 2003, no Quadro 2, mostram que 239 foram avaliados com conceitos D e E, que, pelos critérios adotados pelas autoridades de ensino, são considerados como de baixa qualidade.

Quadro 2: comparativo entre os conceitos relativos e absolutos no ENC Conceitos relativos Conceitos absolutos

Conceito Nº de cursos Nº relativo Conceito Nº de cursos Nº relativo

A e B 196 26,4 % A e B 6 0,8 %

C 309 41,5 % C 315 42,3 %

D e E 239 32,1 % D e E 423 56,9 %

Total 744 100,0 % Total 744 100,0 %

Fonte: Adaptado do Relatório do Exame Nacional de Cursos 2003 – Volume 1

Esta situação fica mais preocupante quando se observa o resultado desse exame considerando-se, o conceito absoluto, ou seja, considerando-se as questões acertadas pelos alunos, sem tratamento estatístico dos resultados. Por este critério, o número de cursos com tais conceitos sobe para 423, ou seja, mais de 56% dos cursos avaliados.

Considerar os dados referentes ao ENC de 2003 torna-se relevante, pois foram os últimos números oficiais publicados antes das mudanças na legislação que substituíram os Currículos Mínimos pelas Diretrizes Curriculares Nacionais para os Cursos de Graduação em Administração.

Não é fora de propósito considerar que, apesar da mudança da legislação fazer parte de um projeto mais amplo de reforma do ensino superior, os dados relativos às avaliações desse nível de ensino tenham sido considerados, pelas autoridades de ensino, no diagnóstico que orientou a elaboração do novo marco legal.