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No plano do imaginário, as estrelas são seres divinos, heróis, deuses que são considerados seres mitológicos. Elas brilham no “céu”, um céu que podemos associar ao espaço infinito da imaginação humana. Barthes (2006) defende que mito é uma fala que só é construída com o passar do tempo, principalmente, quando contamos e recontamos uma estória. Já Morin (1989, p. 26) acredita que “mito é um conjunto de condutas e situações imaginárias” e

que o fenômeno das estrelas é considerado como algo estético, mágico e religioso, uma vez que as pessoas as cultuam como se cultuam seres divinos, estabelecendo-se com elas um sentido próximo do religioso. As pessoas as idolatram, as amam e as imitam.

A estrela é o ator, ou a atriz, que absorve parte da essência heroica – isto é, divinizada e mítica – dos heróis dos filmes, e que reciprocamente, enriquece essa essência com uma contribuição que lhe é própria. Quando se fala em mito da estrela, trata-se, portanto, em primeiro lugar do processo de divinização a que é submetido o ator de cinema, e que faz dele ídolo das multidões. (op. cit. 1989, p. 26)

Esse processo de divinização e fabricação das estrelas não se dá mesma forma para todas. Há vários tipos de estrelas como as do heroísmo, do amor e da aventura (1989, p. 26). Na campanha Core Values, identificamos vários tipos de estrelas que classificamos da seguinte forma:

Estrelas Nº da peça Temática

Mikhail Gorbachev 01 Heroísmo

André Agassi e Steffi

Graf 02 Amor

Catherine Deneuve 03 Beleza

Francis Coppola e Sofia 04 Sucesso artístico

Keith Richards 05 Rebeldia

Sean Connery 06 Heroísmo

Sally Ride Buzz Aldrin Jim Lovell 07 Descoberta e exploração científica Maradona, Pelé e Zidane 08 Esporte

Annie Leibovitz e Mikhail

baryshnikov 09 Sucesso artístico

Bonno Vox e Ali Hewson 10 Sucesso artístico e

comercial

Angelina Jolie 11 Beleza

Muhammad Ali 12 Esporte

Latynina e Phelps 13 Esporte

Morin, em sua crítica à cultura de massas, afirma que “o nascimento de uma estrela é o acontecimento mais faustoso da indústria cinematográfica”. (op. cit., 1989, p. XIV) e é o bem mais valioso e importante dos grandes filmes, das revistas, das rádios, desde o início do século XX porque é um símbolo que fascina e instiga o imaginário da humanidade em todo o mundo.

Vejamos primeiro, como o mito das estrelas aconteceu? “A vida urbana e a burguesia suscitou e levou adiante o mito das estrelas”, segundo Morin (1989, p. XI). Este mito foi fabricado por aquilo que se convencionou chamar de

star system, que é um fenômeno ligado ao capitalismo e significa fabricação de

“estrelas”. Este termo foi utilizado por Carl Laemmle – que podemos considerar como o inventor das estrelas de cinema. (op.cit., 1989, p. 75). Assim, o star

system se intensificou e se transformou com a fabricação industrial e com a

propagação das técnicas de difusão das imagens e dos sonhos. Morin (2011, p. 04) estabelece uma comparação: “antigamente suspiros de fantasmas, cochichos de fadas, anões e duendes, palavras de gênios e de deuses, hoje em dia músicas, palavras, filmes levados através das ondas”. Com isso, a cultura com suas regras, normas, princípios, símbolos, mitos e imagens invade e penetra a intimidade das pessoas e norteia as suas emoções. Há um intercâmbio mental de projeção e de identificação representados pelos elementos da cultura, relacionados tanto no âmbito do sonho quanto da realidade. Mas, como isso acontece? Morin (2011, p. 73), defende que:

Uma cultura, afinal de contas, constitui uma espécie de sistema neurovegetativo que irriga, segundo seus entrelaçamentos, a vida real de imaginário, e o imaginário de vida real. Essa irrigação se efetua segundo o duplo movimento de projeção e de identificação (...).

Esse movimento de projeção-identificação acontece com as pessoas individual e coletivamente. A partir do início do século XX, a estrela passa a ser considerada um produto da civilização capitalista, então, nasce um mito que muitos irão admirar, copiar, idolatrar, amar e talvez odiar. Como exemplo, em 1913, as estrelas Francesca Bertini (italiana) e Théda Bara (americana) aparecem nas telas do cinema e, em 1918, Cecil B. de Mille lança a mulher

sex-appeal, assim, impõe um novo estereótipo a partir do arquétipo da mulher

sexualmente atraente. No mesmo ano, surgem as primeiras estrelas masculinas tais como Douglas Fairbanks e Tom Mix, ambos famosos pelos saltos e pelas cavalgadas. Assim, Randazzo (1996, p. 101) aborda que vivemos em um mundo onde se criam mitos que podem ser culturais ou publicitários. Na verdade, as estrelas criadas pela publicidade são sempre embasadas em mitos da cultura. Como exemplo, podemos citar o homem da Marlboro, o “caubói” criado pela publicidade no século passado. Esse caubói representava a virilidade, a masculinidade, a independência e a bravura do homem que, nos Estados Unidos da América, enfrentou a dura realidade da conquista do Oeste e lá se estabeleceu, cuidando de forma solitária, em meio ao deserto, de guardar e conduzir o gado. Esse forte símbolo da realidade norte-americana e de um tipo de homem foi apropriado pela marca de cigarros Marlboro na construção de sua imagem de marca: o cigarro Marlboro, fumado por esse homem viril, masculino e independente que é o caubói. Um símbolo que conquistou homens e mulheres no mundo ocidental e capitalista (KELLNER, 2001, p. 318).

Por isso, em 1919, “o conteúdo, a direção e a publicidade dos filmes gravitam ao redor da estrela”, (MORIN, 1989, p. 08). É importante citar que a partir de 1920 o mundo viveu momentos de glória com as estrelas e muitos arquétipos foram reatualizados através de novos estereótipos e retratados nas grandes telas, como por exemplo, no âmbito do feminino, a “virgem inocente, a mulher rebelde, a mulher fatal e a mulher divina”. Já, as estrelas masculinas passaram a ser mais cômicas, mais ousadas, mas, sempre usando o arquétipo do herói do amor. Esta estrela era jovem, fatal e com um olhar avassalador. Nesta época, todas as estrelas eram excêntricas e mandavam construir palacetes, mansões, estradas, entre outros produtos de luxo para provarem ao mundo que viviam acima das pessoas comuns, tais quais deuses. Eles viviam momentos extraordinários e cheios de glamour. Morin (1989, p. XV) destaca ainda que todas as estrelas eram desde esta época “o bem mais precioso” e,

por isso, desde o século passado, elas têm cachês altíssimos, se comparados aos de outros atores.

Esses estereótipos retratados na década de 20 ainda são bem atuais, pois cada estrela tem a sua identidade criada ao longo da sua carreira e fortalecida pela cultura de massa em torno desses mitos arraigados na tradição. No caso das estrelas da campanha Core Values, identificamos na peça 01, com Mikhail Gorbachev, o heroísmo; na peça 02, com André Agassi e a sua esposa Steffi Graf, o amor; na peça 03, com a atriz Catherine Deneuve, a beleza; na peça 04, com a família Coppola o sucesso através da arte; na peça 05, com Keith Richards, o rebelde e assim por diante. Todas essas estrelas brilham há um longo tempo no imaginário mitológico da humanidade, muitas brilham há décadas nas suas profissões, mas brilham também nos vários meios de comunicação como na imprensa, nas revistas, na televisão e, principalmente na publicidade com as campanhas testemunhais.

Em 1930, o cinema e as estrelas vivem momentos de mudanças, pois os filmes passam a ser mais realistas e mais alegres, porém, mais complexos de serem feitos. Esta mudança aconteceu como uma solução para maximizar os lucros, aumentar as receitas e também para atender a todas as exigências do público que passa a ter todas as idades e camadas sociais. Outra mudança importante foi que as pessoas comuns (espectadores) passaram a assimilar as necessidades e os desejos burgueses, instigadas pela cultura de massa e,

consequentemente, pelos mesmos meios de comunicação, como a imprensa, as revistas e a televisão que são controlados pela burguesia ao redor do mundo ocidental e capitalista. Assim, podemos dizer junto com Morin (1989, p. 12) que: “o aburguesamento do imaginário cinematográfico corresponde ao aburguesamento da psicologia popular”. Aplicando esse raciocínio ao nosso objeto, podemos dizer que a maioria das pessoas da classe média que tem acesso à marca Louis Vuitton tem o desejo de consumir esse produto considerado como luxo acessível, devido ao aburguesamento do imaginário mediático.

A partir de 1950, o mundo assiste nas salas de cinema, na TV, em revistas e em outras mídias, as estrelas, Brigitte Bardot e Marilyn Monroe. Ambas “tornaram-se mulheres totais, multidimensionais; deusas da tela e moças simples resplandecendo sexo e alma”. Morin (1989, p. 19) ainda escreve que “o mito das estrelas da era de 1930-1960 brilha nelas”. Neste período, a estrela passa a ter vida pública, e uma vida parecida com a das pessoas comuns. Ela se torna mais acessível, mais terna, mais real, consequentemente, passa a ser mais amada. A atriz Angelina Jolie corresponde a essa estrela, pois desde que ela adotou o seu primeiro filho, Maddox, no Camboja, a sua imagem de mulher fatal foi ampliada e passou a ser vista também como a de uma mulher maternal e fraterna, que compartilha e se preocupa com os problemas sociais do mundo.

As estrelas femininas são atrizes que passam a se confundir com os seus personagens e tiram proveito dos poderes de divas que representam, principalmente, quando mostram e usam o belo corpo e o rosto sublime. Estes são os dois suportes míticos mais importantes de uma estrela, visto que, a indústria das mídias sempre primou por lançar estrelas belas, deslumbrantes e famosas, assim como eram belos e deslumbrantes os deuses e heróis gregos e romanos. (MORIN, 1989, p. 37). Nota-se que “a estrela cede beleza à personagem e recebe dela virtudes morais”. Suas maquiagens valorizam o rosto impecável, as roupas são perfeitas, principalmente, por elas serem vestidas pelas melhores marcas. Morin (1989) ainda conta que a estrela é forçada a ter uma vida cinematográfica. Uma vida esplendorosa, ostentatória e cheia de luxo. E, toda estrela tem que estar associada a um público e a uma produção cultural. A sua relação com o público pode parecer familiar, pessoal, e, principalmente, espontânea, mas é resultado de um trabalho sério realizado pelos intermediários culturais que são os “agentes, publicitários, pessoal de marketing, promotores, fotógrafos (...) assistentes pessoais”, segundo Rojek (2008, p. 11-12). Assim, a estrela pertence aos seus fãs. Tal como acontecia com os “reis e os deuses, a estrela pertence mais aos fãs - admiradores - do que estes a ela”, conforme Morin (1989, p. 40). Este defende que os fãs

sempre esperam que as estrelas sejam simples como elas (identificação) e esplendorosas como em seus sonhos (projeção). Que estejam cercadas de cerimônias, espetáculos e que tenham uma vida de sonhos. Que vivam sobre o luxo e o consumo. Que tenham uma vida sem fronteiras e lúdica. (op. cit., 1989, p. 40). Com isso, a estrela torna-se parte do sistema mercadológico, passa a ter, ela mesma, um valor de mercado. É importante citar ainda que o espectador vive a vida da estrela e identifica-se com ela e, consequentemente, cria-se uma relação de oferta e demanda do produto estrela.

A vida privada-pública das estrelas tem sempre eficácia comercial, ou seja, publicitária. Além disso, a estrela não é apenas sujeito, mas também objeto de publicidade: ela apresenta perfumes, sabonetes etc., multiplicando-se assim sua utilidade comercial. A estrela é uma mercadoria total: não há um centímetro de seu corpo, uma fibra de sua alma ou uma recordação de sua vida que não possa ser lançada no mercado (...). A estrela é mercadoria de série, objeto de luxo e capital fonte de valor. (op. cit., 1989, p. 75)

O mercado transformou a estrela em um bem de consumo já que elas humanizam todo o processo de consumo dos produtos. Por isso, a estrela guia os consumidores de estrelas ao consumismo imitativo como cita Rojek (2008, p. 38). Essas estrelas são ao mesmo tempo “mercadoria de série, objeto de luxo e capital fonte de valor”, conforme Morin (1989, p. 76). Mas, o autor afirma ainda que “ouro e estrelas são duas potências míticas que atraem febrilmente e fixam todas as ambições humanas”. (op. cit., 1989, p. 76). Por este motivo, as estrelas são usadas como estratégia nas campanhas publicitárias das marcas. Nota-se que é bastante comum a utilização de estrelas nas propagandas televisivas e em peças impressas de um jornal, catálogos, revistas, entre outros meios de comunicação de massa. Que motivo leva as marcas a utilizar estrelas nas suas campanhas publicitárias? Trata-se de uma estratégia publicitária que utiliza a imagem da estrela e se vale do imaginário mítico relacionado a ela para criar entre os consumidores um conceito associado ao mundo do luxo, da riqueza, do poder, da sofisticação, agregando maior credibilidade à marca.

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