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As interações na sala laranja: do acolhimento à livre iniciativa da criança

Capítulo III. Estágio Final no Infantário Rainha Santa Isabel

3.5. Intervenção Pedagógica na Sala Laranja: Dinâmicas e Atividades Desenvolvidas e

3.5.2. Atividades Orientadas e as Áreas de Conteúdo das OCEPE

3.5.2.2. As interações na sala laranja: do acolhimento à livre iniciativa da criança

competências e conhecimentos obtidos na formação académica, mas sobretudo poder estar numa comunidade rica em conhecimentos, curiosidade, questionamento, vivências, interações e desenvolvimento.

Ao longo das oito semanas de prática, o estar em grupo interagindo foi uma constante, onde o diálogo assumiu um papel fundamental no acolhimento, na abordagem a novas temáticas e na compreensão do bem-estar do grupo.

Pela manhã cada criança chegava à sala pelas mãos de um familiar, com um sorriso na cara, com algo novo a contar sobre uma vivência passada no fim de semana, na tarde do dia anterior ou algum programa visualizado na televisão. Assim, estava explícito a comunicação como um facto inato e necessário da criança expressar-se, referido no capítulo I, como fruto

do contacto com a língua e das interações nos sistemas onde está inserida. A acrescentar à comunicação, estão os afetos, a separação dos familiares, um beijinho, um sorriso de bom dia, seguindo-se a vontade de brincar e representar o seu mundo.

O acolhimento foi e é o verdadeiro espaço de partilha de vivências e representação do que se sente, do que se vê, do que se observa e se interpreta do mundo. Na sala laranja, ocorria o acolhimento de todas as crianças da instituição até por volta das 08h30, quando as educadoras de infância chegavam, indo cada grupo para a sua sala preparando o acolhimento das crianças que ainda estavam por chegar e para os momentos de exploração espontânea da criança.

Normalmente na sala laranja, o grupo quando chegava procurava as áreas do seu interesse, sendo os jogos, a garagem e a casinha as áreas prediletas e de eleição deste, acontecendo mesmo as crianças transportarem objetos de uma área para a outra, dando-lhes novos papéis. Ainda foi possível ver algumas crianças com preferência para estar no tapete a folhear um livro, a interpretar as imagens e criando a sua própria história e outras que esperavam a educadora chegar, sentar-se junto a ela e observá-la, uma ação natural do ser humano como observador e aprendiz pela imitação dos modelos (pais, educadores e demais indivíduos) que estão na sua vida.

Além desta experimentação e livre iniciativa da criança, essencial para que comece a escolher, tomar decisões e assumi-las como suas, desenvolvem-se competências pessoais e sociais como a resolução de situações de conflito na partilha de materiais, o diálogo e a convivência em grande grupo.

Na sala laranja, o tapete era uma rotina mediadora do diálogo e convivência, onde se escutavam histórias, em que a imaginação antecipava o seu desenvolvimento e/ ou criava um novo final, interligando-o com as vivências do grupo, mimando-as ou cantando músicas, representativas das mesmas e temáticas faladas em grande grupo.

Com o acolhimento terminado às 09h30, seguia-se a higienização e o reforço matinal, dois momentos em que podemos compreender a progressão da autonomia da criança no manuseio da sua roupa, higiene e dos talheres, sendo capaz de comer ao seu ritmo e respeitando os ritmos dos seus pares. Nestes momentos de higiene e alimentação, a comunicação e a brincadeira foi uma característica visível pela curiosidade da criança face ao outro, às diferenças físicas do género feminino e masculino, à observação do outro como o meio para percecionar o funcionamento do seu corpo, da forma de estar nos diferentes locais e dos novos papéis que os alimentos podiam ter. Esta curiosidade e brincadeira espontânea da criança é a sua forma de desenvolver o conhecimento do mundo e dar azo à sua criatividade, de uma forma prazerosa e inconsciente.

Inicialmente, quando cheguei à sala laranja, o registo das presenças com a tentativa de imitação da primeira letra do nome ocorria após o cântico dos bons dias e anteriormente a qualquer atividade orientada. Este momento do registo de presenças era marcado por diferentes reações das crianças, ora timidez e inibição, ora vontade de mostrar a todos os amigos como sabia escrever a letra do seu nome. Dado que este registo demorava algum tempo devido às diferentes reações, em conversação com a educadora cooperante a sua dinâmica passou para o acolhimento, em que cada criança efetuava a sua presença quando chegava à sala.

Ao longo das semanas compreendi que neste momento a criança tem a privacidade e segurança para procurar, identificar a sua fotografia e marcar a presença como ela entende, sem estereótipos definidos ou algum colega a dizer-lhe que não é assim.

É importante que não nos esqueçamos que a criança aprende por imitação, mas também com o cunho do que conhece do mundo e a sua predisposição para aprender. Por essa razão deverá ser tido em conta o desenvolvimento da criança, ser dado espaço para ela observar e contatar com a escrita, com materiais como histórias, folhetos e plano de tarefas, tendo a hipótese de exercitar o que vê, primeiramente com rabiscos até aproximação da forma gráfica da letra, deixando-a mostrar, no tempo que achar correto, fazê-lo à frente do seu grupo. Tendo por base Mata (2008) são vários os momentos em que a criança procura registar o que viu, através do desenho e das tentativas de imitação da escrita, com o propósito de utilizar o registo e a linguagem escrita para funções e fins concretos de comunicação.

É num ambiente democrático, incentivador e respeitador das necessidades individuais de cada criança, onde as interações são constantes e promotoras de conforto para os seus intervenientes, que podemos desenvolver crianças seguras das suas competências e com propensão para a comunicação e exposição das suas dúvidas, ideias e vivências de conhecimento do mundo.

É de destacar que este desenvolvimento da comunicação deverá ser proporcionado pelo educador com um vocabulário simples, de carácter familiar, sendo explicitados todos os novos conceitos, bem como repetidas e reformuladas ideias, frases e palavras, para que todo o grupo tenha acesso à compreensão da informação concedida.

Em todos as atividades e rotinas da manhã foi passível a compreensão das mesmas como um momento de oportunidade para a iniciativa, intenção, execução de planos e satisfação da criança (Hohmann & Weikart, 2004), estando a linguagem sempre presente, patente nas imagens da Figura 30, a nível escrito ou verbal, na partilha de vivências e conhecimentos, como por exemplo o sabor ou a cor de um alimento, em grande ou pequeno grupo.

Figura 30. Momentos de rotina da sala laranja: marcação das presenças, as interações em grupo e alimentação

Neste sentido, ao longo da minha prática tive consciência e tirei partido dos diferentes momentos para apreender as relações que se estabeleciam entre as crianças, o seu desenvolvimento, a sua facilidade em partilhar ou não os objetos e utilizar a linguagem verbal, não-verbal ou escrita, com a incentivação do diálogo sobre algo que a criança quisesse partilhar, não interrompendo as conversas e interações entre pares. Já que Katz (2006) realça a existência de interações significativas para os pares, seja qual for o seu teor, afirmando “O conteúdo da interacção não necessita ser divertido, entreter ou ser exótico, tem de ser importante e ser de interesse para os participantes.” (p. 13).

Todos estes momentos de rotina permitem que a criança esteja e se sinta parte de um grupo, reconhecendo e antecedendo a organização do seu dia, revelando-se e permitindo ao educador depreender diversas informações que não consegue na observação das atividades orientadas.

Assim, todos estes momentos, anteriormente referidos, tiveram e tem significado para a minha prática, pois partindo deles pude conhecer alguma coisa do grupo que me acolheu, tendo bases para detetar o mal-estar de alguma criança.