• Nenhum resultado encontrado

As Leis de Kepler para o Movimento dos Planetas

No documento 248448733 Mecanica Geral (páginas 165-176)

4 Força Central

4.4 As Leis de Kepler para o Movimento dos Planetas

Durante o transcorrer dos séculos, os povos antigos observaram os cinco planetas visíveis (Mercúrio, Vênus, Marte, Júpiter e Saturno) em seu movimento lento e quase regular através das constelações fixas do zodíaco. Mas ocasionalmente, de tempos em tempos e de forma bastante previsível, estes astros invertiam seu movimento durante um tempo (algumas semanas), para em seguida, avançar retomando a direção inicial do movimento. Este comportamento de avançar e re-

troceder para em seguida avançar recebeu a denominação de movi-

mento retrógrado.

A tentativa de explicar este comportamento dos planetas dentro de um modelo geocêntrico (a Terra como centro do Universo com os planetas e o Sol girando ao redor) surgiu com a teoria dos epiciclos, desenvolvida pelo grego Apolônio (246 a 221 a.C.), a qual mostrava que um arranjo de movimentos circulares podia gerar um movimento elíptico. Posteriormente, Hiparco de Nicéia (130 a.C.) apontou algumas falhas na teoria de epiciclos de Apolônio. Mais tarde, o astrônomo alexandrino Ptolomeu (100 d.C. a 170 d.C) – baseando-se nas observa- ções de Hiparco, bem como nas observações de Aristilo e Timocaris, que foram dois astrônomos de Alexandria, e também nas evidências de dados gregos e babilônicos – desenvolveu uma descrição matemá- tica detalhada, baseada também na teoria dos epiciclos, do movimen- to dos cinco planetas visíveis, do sol e da Lua, que serviu de base para toda a astronomia ocidental durante os quatorze séculos seguintes. Na verdade, o que Ptolomeu conseguiu, de um ponto de vista atual, foi dar aos planetas órbitas ligeiramente elípticas centradas na Terra, junto com uma grande aproximação do movimento variável que eles apresentavam. Somente com Nicolau Copérnico (1473-1543) é que o movimento retrógrado foi explicado como decorrente do movimento relativo entre a Terra e os outros planetas, cada qual se movendo em órbitas heliocêntricas. Entretanto, foi com o trabalho do astrônomo Johannes Kepler (1571-1630) que o movimento planetário foi descrito de modo preciso, usando o modelo heliocêntrico de Copérnico, por meio de leis derivadas das observações astronômicas.

As leis de Kepler do movimento planetário se constituem em um dos marcos da física, tendo sido crucial para que Newton estabelecesse sua lei de gravitação. Após quase vinte anos analisando os dados as- tronômicos - principalmente referentes ao movimento de Marte cuja órbita é altamente elíptica - coletados pelo astrônomo Tycho Brahe (1546-1601), do qual fora assistente, Kepler verificou que existiam im- portantes regularidades nos movimentos dos planetas. A partir daí Kepler estabeleceu três leis empíricas, que descreviam o movimento observado dos planetas (mas sem qualquer explicação teórica). As duas primeiras leis foram publicadas em 1609, e a terceira em 1619. As leis de Kepler são enunciadas como segue:

Leis de Kepler

Lei das Elipses: A órbita de cada planeta é uma elipse com o sol localizado em um dos focos.

Lei das Áreas iguais: O raio vetor do sol ao planeta varre áreas iguais em tempos iguais.

Lei dos Períodos: O quadrado do período de revolução de qualquer planeta é diretamente proporcional ao cubo do semi-eixo maior de sua órbita.

Dos resultados obtidos na seção anterior do movimento sob forças centrais, podemos concluir que a primeira lei de Kepler é decorrente de a força gravitacional depender do inverso do quadrado da distância. A segunda lei decorre da conservação do momento angular, mostran- do que a força gravitacional é uma força central, isto é, a força sobre o planeta é dirigida para o Sol. A terceira lei está relacionada a dois fatos. Primeiro, devido à conservação do momento angular no movi- mento sob força central, para órbitas fechadas existe uma proporcio- nalidade entre a área da órbita e o período (equação 4.30). Segundo, a força gravitacional depende da massa do planeta. Vejamos isto em detalhes. A área de uma elipse é

ab

, onde

a

é o semi-eixo maior e

b

é o semi-eixo menor. Da figura 4.8, vemos que

b a=

1−

2 , de modo que a equação 4.30 torna-se:

(4.60)

T

2m

a

2

1

2

L

=

. Usando as equações 4.58 e 4.59, obtém-se (lembre-se que

E <0

e

0

K <

): (4.61)

T

2

4

2

m

a

3

K

=

. Note que, aparentemente, o período depende da massa

m

, o que iria contrariar a terceira lei de Kepler. Entretanto, para a força gravitacio- nal a constante

K

é

K

= −GmM

s, sendo

m

a massa do planeta e

M

s a massa do Sol. Substituindo

K

na equação 4.61, vem:

(4.62) 2 2

4

3 s

T

a

M G

=

. E, portanto, a constante de proporcionalidade entre

T

2 e

a

3é a mes- ma para todos os planetas, o que concorda com a terceira lei de Ke- pler, deduzida a partir dos dados astronômicos acerca do movimento

dos planetas em nosso sistema solar. O resultado de 4.62 permite de- terminar a massa do Sol, uma vez determinado o valor da constan- te de gravitação

G

. O valor de

G

pode ser obtido em laboratório medindo-se a de maneira extremamente precisa a força gravitacional entre dois corpos de massa conhecidas. Experimentos para se deter- minar o valor da constante de gravitação são difíceis de realizar, pois as forças gravitacionais são extremamente pequenas, motivo pelo qual

G

é uma das constantes físicas conhecidas com menor precisão. Note que todo o nosso conhecimento atual sobre as massas de corpos astronômicos (incluindo a Terra) é baseado no valor da constante de gravitação. Por exemplo, assumindo que a órbita da Terra seja cir- cular de raio

a =1,5x10 m

11 e usando o seu período orbital, a massa do Sol é obtida a partir de

M

s

=4

2 3

a GT/

2

≅2 x10 kg

30 . Da mesma maneira, podemos determinar a massa da Terra a partir do movimen- to orbital da Lua, o que fornece

M ≅

T

5,97 x10 kg

24 . Naturalmente a massa da Terra pode ser obtida do valor medido de

g

e da constante de gravitação,

M

T

=gR G

T2

/

.

No que diz respeito ao nosso sistema solar, a tabela 4.1 apresenta o período, o semi-eixo maior e a excentricidade da órbita dos planetas.

Período Semi-eixo Excentricidade

Planeta T

T

2

a

a

3  Mercúrio 0,241 0,0581 0,387 0,0580 0, 206 Vênus 0,615 0,378 0,723 0,378 0,007 Terra 1,000 1,000 1,000 1,000 0,017 Marte 1,881 3,538 1,524 3,540 0,093 Júpiter 11,86 140,7 5,203 140,8 0,048 Saturno 29, 46 867,9 9,539 868,0 0,056 Urano 84,01

7.058

19,18

7.056

0,047 Netuno 164,8

27.160

30,06

27.160

0,009 Plutão 247,7

61.360

39, 44

61.350

0, 249

Tabela 4.1 Períodos, semi-eixos e excentricidades dos planetas do sistema solar.

os semi-eixos em unidades astronômicas

(1UA =1,50 x10 km)

8 . Neste sistema de unidades, temos que

2

4

1

s

GM =

, e assim

T

2

=a

3,

como você pode verificar na tabela 4.1. Note que os planetas com órbitas mais elípticas são Mercúrio, Marte e Plutão, sendo que os de- mais, principalmente Vênus e Netuno têm órbitas aproximadamen- te circulares. Os cometas, em geral, têm órbitas bastante elípticas. Por exemplo, a velocidade orbital do cometa Halley no periélio é de

1

196.441km/h

v =

e no afélio é apenas

v =

2

3.281km/h

. Chamando

1

/

2

v v

=n

e usando a conservação do momento angular, você deve ser capaz de mostrar que a excentricidade da órbita pode ser obtida a partir de

 =( 1) / (n

n+1)

, o que, no caso do cometa Halley, fornece uma órbita bastante excêntrica,

 ≅0,967

.

Plutão

A partir do fim do século XIX, muitos astrônomos propu- seram a existência de planetas no sistema solar em órbitas mais distantes que a de Netuno. A tarefa monumental de analisar visualmente centenas de placas fotográficas cou- be ao jovem astrônomo Clyde Tombaugh (1906-1997). Ao estudar duas exposições fotográficas feitas em janeiro de 1930, Tombaugh descobriu o nono planeta, que rece- beria o nome de Plutão. Sabe-se agora que o diâmetro de Plutão é de 2320 km (menor que a Lua) e sua massa é apenas 0,2% da massa da Terra. Devido a estas carac- terísticas, a 26a Assembléia Geral da União Astronômica Internacional (IAU), realizada em agosto de 2006, classi- ficou este astro não como um planeta, mas como sendo um dos membros mais internos do cinturão de Kuiper (em homenagem a Gerard Kuiper (1905-1973), que propôs a existência, em 1950, de corpos (cinturão de asteróides) em órbitas em torno do sol mais distantes que Netuno).

A tabela 4.2 mostra a velocidade orbital dos planetas (considerando órbitas circulares), a duração do dia (em termos do dia terrestre), a velocidade rotacional (no equador) e o valor local da aceleração da gravidade (em termos do valor de

g

, na Terra).

Planeta Velocidade orbital

(km/h)

Dia Velocidade rotacional

(km/h)

Valor de g

Mercúrio 172.305,0 58,6 10,9 0, 27 Vênus 126.051,0 24,3 6,6 0,86 Terra 107.206,0 1 1.673,0 1 Marte 86.852,0 1 37 23d min s 867,0 0,37 Júpiter 47.041,0 9 55h m 45.633,0 2,64 Saturno 34.777,0 10 38h m 36.997,0 1,17 Urano 24.602,0 10 42h m 9.313,0 0,92 Netuno 19.715,0 15 48h m 9.656,0 1, 44 Plutão 17.088,0 12,4 49,0

Tabela 4.2 - Velocidades orbitais e rotacionais dos planetas do sistema solar.

Da discussão anterior, você já deve ter concluído que as leis de Kepler são obtidas a partir das leis de movimento de Newton e da lei de gra- vitação. Mas, historicamente, sucedeu-se o inverso. Newton, usando suas leis do movimento, deduziu, a partir das leis de Kepler, a lei de gravitação. Newton publicou sua lei de gravitação universal em sua obra Principia Mathematica, sendo seu enunciado:

Lei da Gravitação Universal

Todo corpo no universo atrai outro com uma força cuja intensidade é proporcional ao produto de suas massas e inversamente proporcional ao quadrado da distância entre eles. Esta força tem a direção da reta suporte que conecta estes dois corpos.

Enunciado que podemos expressar vetorialmente pela equação ij i2 j

ˆ

ij ij

m m

F

G

r

r

=

Sendo

F

ij a força que o corpo de massa

m

i exerce sobre o corpo de massa

m

j. Aqui,

rˆ

ij é um vetor unitário segundo um segmento de reta que une o corpo

j

ao corpo

i

. Como

rˆ

ji

= −rˆ

ij, a força gravitacional entre dois corpos satisfaz a terceira lei do movimento

F

ij

= −F

ji. É importante observar que os corpos são tratados como partículas.

Se desejarmos determinar a força entre dois corpos extensos, deve-se supor cada corpo como constituído de partículas e calcular a força en- tre elas. Com este objetivo, Newton desenvolveu o Cálculo Integral. Vejamos como Newton chegou à lei de gravitação. Durante os anos de 1665-1666, Newton afastou-se da Universidade de Cambridge devido à peste bubônica que assolava Londres. Nesta época, em sua casa em Woolsthorpe, Newton envolveu-se com estudos que o ocupariam pelo resto de sua vida: Matemática, Mecânica, Óptica e Gravitação. A inter- pretação do peso de um corpo como uma força de atração entre ele e a Terra foi uma idéia que ocorreu a Newton e a alguns de seus contempo- râneos, como Robert Hooke (1635-1703) e Edmond Halley (1656-1742). A tradicional imagem de Newton sentado sob uma macieira com uma maçã caindo-lhe na cabeça serve, na realidade, para ilustrar como Newton refletiu acerca da natureza da gravidade, perguntando a si mesmo se a força que causa a queda de um corpo (a maçã) não seria a mesma que mantém a Lua em sua órbita em torno da Terra. Newton foi o primeiro a perceber que a Lua devia ter uma aceleração em seu movimento orbital, uma aceleração dirigida para a Terra, aceleração esta devido a uma força centrípeta.

Ele percebeu que esta força era a mesma com que a Terra atrai os cor- pos em direção a sua superfície, pois o comportamento cinemático da Lua é diferente de um corpo que cai em direção à Terra. A Lua caindo não atinge a superfície da Terra, pois ela tem velocidade tangencial suficiente para que, à medida que cai de uma distância

h

, se afaste da superfície curva da Terra da mesma quantidade, mantendo assim a mesma distância da superfície da Terra, como mostra na figura 4.12.

R

T

R

h

R-h

x

h

Lua

Terra

Ninguém havia suspeitado, até aquela época, que a aceleração centrí- peta da Lua e a aceleração gravitacional de uma maçã caindo na su- perfície da Terra tinham a mesma origem. Newton demonstrou que se uma maçã caindo tivesse uma componente horizontal da velocidade suficientemente grande, seu movimento seria o mesmo que o da Lua. Isto é, a maçã entraria em órbita próxima à superfície da Terra. Obviamente este é um experimento hipotético, onde não haveria a resistência do ar e nem obstáculos. Saiba que a velocidade necessá- ria é extremamente alta. Para uma órbita circular de raio

R

, onde

R

é o raio da Terra, vem

v=2R T/

. Usando a terceira lei de Kepler,

2

(4 /

2

)

3

T

=

MG R

, obtemos

v=

GM R/

≅28.500km/h 8km/s≅

e a maçã daria a volta na Terra em pouco menos de uma hora e meia. Note que usar a terceira lei de Kepler fornece a velocidade de um planeta ou satélite em órbita circular de modo bem simples. Newton raciocinou então que a aceleração centrípeta da maçã em órbita seria igual a sua aceleração gravitacional em queda livre. A questão crítica seria determinar como a força gravitacional exercida pela Terra sobre a Lua e sobre a maçã dependeria da distância.

Newton sabia que a intensidade desta força era proporcional à acelera- ção dos objetos em queda. A aceleração centrípeta

a

c da Lua em dire- ção à Terra é

a

c

=v r

2

/

, onde

v

é sua velocidade e

r

o raio de sua ór- bita assumida como circular. Com a terceira lei de Kepler,

v

2

=GM r/

, de modo que

a

c

=GM r/

2. Logo, a aceleração da Lua (ou da maçã) varia com o inverso do quadrado da distância. Assim, Newton estabe- leceu como hipótese que o valor da aceleração da gravidade variasse dessa maneira, isto é, o valor local de

g

sendo

g GM r=

/

2.

Para confirmar esta hipótese, Newton calculou a aceleração centrípeta da Lua e a comparou com a aceleração

g

de uma maçã caindo, para verificar se a razão entre elas era igual ao inverso do quadrado de suas respectivas distâncias ao centro da Terra. A distância entre a Lua e a Terra é 60 vezes o raio da Terra. Assim, a força sobre a Lua deveria ser 3600 vezes menor do que sobre a maçã. Ou seja, a taxa com que uma maçã cai é 3600 vezes maior do que a taxa com que a Lua cai. Em ou- tras palavras, a distância que uma maçã cai em um segundo deve ser igual à distância que a Lua cai em 1 minuto, com a distância sendo pro- porcional ao quadrado do tempo. Quando Newton realizou este cálculo pela primeira vez, ele cometeu um engano, pois assumiu que o ângu- lo de 1 grau subtendesse um arco de 60 milhas na superfície terrestre

(1milha 1,609km)=

. Esta distância, na realidade, é igual a 60 milhas náuticas

(60 x1,852km)

. Assim, ele calculou que a Lua cairia em um minuto, uma distância de 13 pés

(1pé 0,3048m)=

. Os experimentos de

Galileu, que foram repetidos posteriormente com maior precisão, forne- ciam uma distância de 15 pés em um segundo para um corpo em queda próximo à superfície da Terra. Esta pequena diferença fez Newton aban- donar esta brilhante idéia. Mais tarde, usando o valor correto do arco na superfície da Terra subtendido pelo ângulo de um grau, ele chegou ao valor correto, estabelecendo a lei universal da gravitação.

Newton concluiu que a força gravitacional atuando em um corpo de- veria ser proporcional a sua massa (em oposição, por exemplo, ao quadrado da massa ou alguma outra dependência). Esta conclusão é derivável da segunda lei do movimento e do resultado obtido por Galileu, de que a taxa de queda de todos os corpos é a mesma, inde- pendente do peso ou da forma do corpo.

Assim, se a força gravitacional

F

G sobre um corpo de massa inercial

m

for proporcional a sua massa, então de acordo com a segunda lei do movimento

F

G

=Km r/

2

=ma mg=

, logo,

g K r=

/

2. Portanto, sendo a força gravitacional proporcional à massa inercial do corpo, a aceleração dos corpos em queda só depende da constante

K

e da dis- tância ao centro da Terra. Isto significa uma equivalência entre mas- sa inercial e gravitacional, isto é, não fazemos distinção entre massa gravitacional

m

ge massa inercial

m

i,

m

g

=m m

i

=

. Para Newton, esta equivalência permaneceu como um mistério durante toda sua vida. Newton percebeu que se a força gravitacional sobre um corpo era proporcional à massa do corpo, então ela deveria ser proporcio- nal também à massa do corpo que exerce esta força. Tal exigência nos leva, de forma inevitável, à conclusão de que a lei da gravita- ção seja universal, isto é, cada objeto no universo deve atrair cada um dos outros corpos do universo. Se o corpo 1 atrai o corpo 2 com um a força

F

12

=K m r

1 2

/

2 e o corpo 2 atrai o corpo 1 com uma for- ça

F

21

=K m r

2 1

/

2 e, pela terceira lei do movimento, elas devem ser iguais ( e opostas), vem

K K

1

/

2

=m m

1

/

2. Esta igualdade fica satis- feita se

K Gm

1

=

1 e

K

2

=Gm

2. Mostra-se, assim que a força gravita- cional é proporcional ao produto da massa do corpo que atrai pela massa do corpo que é atraído. Deste modo, Newton estabeleceu a lei de gravitação universal, que foi aplicada de maneira triunfal na des- crição do movimento planetário.

Talvez você tenha percebido que a partir da lei de gravitação, deve- se esperar que os planetas apresentem pequenos desvios das leis de Kepler. Primeiro, porque o problema de força central, resolvido acima nesta seção, admite que o Sol (como o centro de força) permanece

fixo no espaço, o que não é verdade, devido à atração gravitacional que os planetas exercem sobre ele. Como a massa do Sol é muito maior do que a massa de qualquer dos planetas, este efeito é pequeno e pode ser corrigido, como veremos no capítulo 5, quando analisar- mos o problema de dois corpos.

Segundo, porque cada planeta é atraído pela força gravitacional dos outros planetas, assim como pelo Sol. As forças gravitacionais entre os planetas, apesar de serem pequenas, produzem desvios pequenos, porém mensuráveis, das leis de Kepler. Os desvios esperados podem ser calculados por métodos apropriados, e eles concordam com ob- servações astronômicas muito precisas. Por exemplo, um dos primei- ros triunfos, senão o primeiro da mecânica de Newton, deve-se a seu colega Edmond Halley.

Halley percebeu que o aparecimento dos cometas em 1531 e 1607 pa- recia ter alguma ligação com o cometa de 1682. Halley presumiu que era o mesmo cometa e calculou seu regresso para 1758, usando a lei de gravitação de Newton para calcular o retardo devido à atração gravitacional de Júpiter. E, de fato, ele reapareceu na data prevista, embora com o atraso de alguns dias, pois o efeito de Júpiter foi um pouco maior que o calculado por Halley.

Também o planeta Netuno foi descoberto, antes de ser observado, a partir dos efeitos causados na órbita de outros planetas. Observações do planeta Urano, realizadas durante quase sessenta anos após sua descoberta, em 1781, mostraram desvios inexplicáveis em sua órbita prevista, mesmo depois de se incluírem as correções devidas aos efei- tos gravitacionais causados por outros planetas conhecidos.

Por meio de análise matemática cuidadosa e elaborada dos dados dispo- níveis, John Couch Adams (1819-1892) e Urbain Jean Leverrier (1811-1877) foram capazes de demonstrar, por volta de 1846, que os desvios pode- riam ser explicados caso se admitisse a existência de um planeta desco- nhecido, mais afastado do que Urano. Eles calcularam a órbita do plane- ta desconhecido e naquele mesmo ano Leverrier solicitou ao astrônomo Johann Galle (1812-1910), do observatório de Berlim, que examinasse o céu na área provável da localização do planeta desconhecido. Esta ob- servação mostrou que lá estava Netuno, na órbita prevista.

A contínua observação do movimento dos planetas do nosso sistema solar trouxe novos fatos. A observação do planeta Mercúrio, desde 1631, mostrou a precessão do eixo maior de sua órbita, com velocidade angu- lar de 41 segundos de arco por século, além de perturbações atribuídas

aos efeitos gravitacionais dos outros planetas. Pensou-se, anteriormente, que este resultado poderia ser obtido considerando-se os efeitos gravita- cionais causados por poeiras no sistema solar, mas pode-se demonstrar que a quantidade de poeira é muito pequena para produzir tal efeito. Atualmente, acredita-se que o efeito se deve a pequenas correções intro- duzidas na teoria da gravitação, requeridas pela teoria da Relatividade Geral. Mas, o mais importante é que, excluindo-se situações especiais de campos gravitacionais muito intensos ou distâncias extremas que requerem o uso da relatividade geral, a observação de corpos celestes a distâncias incrivelmente grandes tem mostrado que seus comporta- mentos são consistentes com as leis da mecânica newtoniana. Portanto, a dinâmica de corpos celestes é completamente descrita pela mecânica newtoniana, revelando a universalidade da lei de gravitação.

A firme convicção na validade universal da lei de gravitação de Newton pode ser ilustrada pela procura da matéria escura no Universo. Uma das razões para se pensar que uma enorme quantidade de matéria não visível preenche o universo, numa quantidade talvez dez vezes a matéria visível, está na dinâmica das galáxias espirais (aglomerados girantes de mais de cem bilhões de estrelas na forma de um disco). As observações indicam que as velocidades de rotação das estrelas mais afastadas do centro são muito maiores que as previstas pela mecâni- ca de Newton, admitindo-se apenas a existência da matéria visível. Por exemplo, o Sol está a uma distância de 28.000 anos-luz (distância que a luz percorre em um ano) do centro de nossa galáxia e sua ve- locidade orbital em torno do centro é

217km/s 782.000km/h≅

, que é um valor muito superior ao calculado usando-se o resultado obtido, como já vimos, pela terceira lei de Kepler,

v=

GM

gal

/r

, onde

M

gal é a massa da galáxia e

r

o raio da órbita circular do Sol (a distância

No documento 248448733 Mecanica Geral (páginas 165-176)

Documentos relacionados