• Nenhum resultado encontrado

2 O OBJETO DA PESQUISA: A EXPERIÊNCIA DA CASA DO MENOR TRABALHADOR

2.2 AS OFICINAS DE TRABALHO DA CASA DO MENOR TRABALHADOR

As oficinas de trabalho surgiram da preocupação com a atividade ocupacional para os alunos. Foram pensadas a partir da constatação de que quando os alunos saíam da escola ficavam nas ruas, se envolviam com traficantes e iniciavam precocemente a vida sexual.

Outro aspecto importante foi a preocupação com a inserção dos alunos no mercado de trabalho, dadas as precárias oportunidades oferecidas pela sociedade. Assim, a Casa do Menor Trabalhador procurou conciliar o interesse do aluno com as possibilidades do mercado, de forma a proporcionar uma maior garantia de trabalho e o anseio de conseguir um vínculo empregatício.

A primeira das oficinas foi a marcenaria, na qual os educandos começaram trabalhando a talha, vindo em seguida a fabricação de mesas, tamboretes e a comercialização desses produtos nas feiras livres, cujo dinheiro arrecadado era revertido para o sustento da CMT. Atualmente, esta oficina faz pequenas peças (alguns brinquedos, porta-guardanapo, tamboretes) que são vendidos nas barracas que ficam na Catedral durante a festa da padroeira de Natal. Em seguida, é organizado um bazar com as peças que não foram vendidas. Este bazar é realizado na própria CMT e conta com doações de outros itens: roupas, calçados, bijuterias. A receita obtida é compartilhada com os educandos e investida na aquisição de matéria-prima.

Os alunos na Marcenaria têm direito de ficar com uma peça produzida por eles e as demais são vendidas. No bazar que já nos referimos, elas são vendidas muito barato e os próprios alunos da instituição compram algumas. O dinheiro arrecadado neste momento também financia parte da festa de formatura dos alunos do 9º ano, já que suas famílias não possuem condições de assumir os gastos com a festa.

Outra oficina que passou a funcionar foi a de picolé, pensada a partir da realidade dos meninos, pois muitos vendiam picolés nas ruas. Dos primeiros seis meses a um ano, ela obteve muito êxito. Os meninos fabricavam e vendiam o picolé, mas o dinheiro que se arrecadava não era investido no processo de produção e manutenção das máquinas. Aliado a isso, emergiu a dificuldade de locomoção para se vender o picolé nas praias nos finais de semana, o que levou ao fechamento da oficina.

Logo em seguida foi iniciada a oficina de vassouras, que teve boa aceitação e eram vendidas pelos alunos nas feiras livres e no próprio bairro, sendo outra parte comprada por uma rede de supermercados e uma loja de material de construção. Contudo, essa oficina foi fechada, em razão dos poucos recursos disponibilizados.

A oficina seguinte foi a de panificação, pensada a partir da necessidade de alimentação dos alunos que passam o dia na escola. A diretora conseguiu as máquinas e o instrutor, que já havia sido aluno da instituição, fez o curso de panificação, promovido por técnicos do SENAC na própria Casa do Menor Trabalhador e os pães começaram então a ser produzidos e se destinavam ao consumo dos alunos e funcionários.

A instituição já teve também uma oficina de tecelagem, que iniciou com um tear manual, mas ganhou ampliação com a ação conjunta de Ir. Lúcia e o empresário Fernando Bezerra, na época presidente da Federação das Indústrias (FIERN), conseguindo um tear elétrico. Essa oficina tinha uma produção anual em torno de 2000 redes que eram compradas por um grupo de italianos, e às vezes, pela Companhia de Serviços Elétricos do Rio Grande do Norte (COSERN), mas há dois anos foi desativada em virtude da falta de recursos.

Outra oficina que já não funciona mais é a de serigrafia que produzia pintura de pano de prato e de conjunto de banheiro, peças de macramê (que consiste em criar e entrelaçar nós) e fuxico (retalhos de panos costurados em forma de flor), além de pintura de todas as redes que eram fabricadas na oficina de tecelagem. O

material produzido era vendido em feiras de artesanato e exposições, onde tinham boa aceitação pelo público consumidor.

Como forma de oferecer uma oficina que proporcionasse maiores possibilidades de inserção no mercado de trabalho, foi articulada a oficina de montagem e manutenção de microcomputadores, que contou com o apoio do Banco Nacional de Desenvolvimento Social (BNDES), enquanto financiador do laboratório com dez computadores. Esta oficina foi ampliada e hoje conta com dezesseis computadores. Os conhecimentos ligados à informática compõem, atualmente, um módulo do curso que foi ampliado para Auxiliar Administrativo tendo um bom índice de encaminhamento de jovens ao mercado de trabalho. Segundo dados fornecidos pelo coordenador Jorge de Medeiros, foram 584 jovens inseridos como estagiários, dos quais cerca de 44 atualmente são funcionários contratados por algumas das 64 empresas parceiras da Casa do Menor.

No concernente às matérias-primas que são utilizadas, a madeira em sua maior parte é proveniente do Pará. Por ser uma matéria-prima cara, é comprada de atravessador, por existir benefícios na entrega da matéria, que de certa forma “compensam” o gasto em relação ao valor por unidade. Na panificação, a farinha de trigo era inicialmente produzida em um moinho de propriedade da Casa do Menor no bairro das Rocas, mas depois de seu fechamento passou a ser comprada na Paraíba ou no Recife, por ter menor custo.

As oficinas fazem uso de tecnologias simples, bem como as técnicas utilizadas na produção que são quase rudimentares, em virtude principalmente das condições materiais da Casa do Menor Trabalhador e do nível de escolaridade dos instrutores, pois a grande maioria tem o Ensino Fundamental incompleto. Em consequência, não existe uma sistematização da produção. Eles realizam cada parcela de trabalho a partir de uma determinada sequência, mas atuam com base no que a própria prática lhes ensinou.

Pela percepção que tivemos quanto à realidade experienciada na Casa do Menor Trabalhador, somos impulsionados a estabelecer uma distinção que já é objeto de discussão de alguns teóricos da educação: a distinção entre instrutor e professor. Nesta instituição, fazemos menção aos profissionais das oficinas como instrutores, pois estes não têm uma formação pedagógica. Ensinam as habilidades práticas e mesmo teóricas, muito mais com base em conhecimentos empíricos.

Nesse contexto, tratamos por professor o profissional da educação habilitado a exercer atividades docentes como dispõe o artigo 317 da CLT ao citar que o exercício docente exige habilitação legal. Eis um motivo importante que nos leva a fazer tal distinção, ao falarmos nos profissionais das oficinas de trabalho da Casa do Menor, uma vez que alguns destes têm ainda poucos anos de escolarização.