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CAPÍTULO I UMA LENTE SOBRE A CULTURA, AS ORGANIZAÇÕES, A

1.2 AS ORGANIZAÇÕES E A TEORIA ORGANIZACIONAL

Diversos estudiosos, em diferentes épocas, vêm conceituando as organizações a partir da importação de modelos biológicos, ecológicos, psicológicos e de economia, entre outros, para os estudos organizacionais (CLEGG & HARDY, 1998), fornecendo, então, diversos olhares sobre este tema.

Katz & Kahn (1978) possuem a compreensão de que a organização é um sistema social aberto e baseiam sua assertiva na questão biológica. Já Etzioni (1999) aborda as organizações como unidades sociais estruturadas e constituídas intencionalmente de modo a atingir objetivos específicos. Para Mintzberg (1995, p. 17), as “organizações são estruturas para apreender e dirigir sistemas de fluxos e determinar as inter-relações das diferentes partes”.

Morgan (1996, p. 116) cita que as organizações são observadas como realidades construídas socialmente e decorrentes do conjunto de idéias, valores, normas, rituais e crenças, além de outros padrões de significados compartilhados por seus membros, que norteiam a vida das organizações. Para o autor, as organizações são, em si mesmas, “um fenômeno cultural que varia de acordo com o estágio de desenvolvimento da sociedade”. No mesmo curso, para Morgan, as

organizações não possuem uma cultura e, sim, constituem-se em uma cultura.

Clegg & Hardy (1998, p. 30) mencionam que não existe uma certeza acerca daquilo que são organizações, nem o modo como estas devem ser estudadas, bem como “a posição do pesquisador, o papel da metodologia, a natureza da teoria”. Isto ocorre porque as organizações são objetos empíricos e cada pessoa possui uma visão diferente acerca do objeto “organização”. Mesmo assim, estes autores oferecem seu entendimento de organizações como

[...] locais de ação social, mais ou menos abertas a conhecimentos de disciplinas formais e explicitamente organizadas com marketing, produção e assim por diante. Estão também relativamente abertas às práticas de conversação sobre temas que permeiam o amplo tecido social, como gênero, etnia, e outras relações sociais culturalmente definidas, todos eles assuntos potenciais para conhecimentos disciplinares formalmente organizados, como antropologia, sociologia ou, mesmo, estudos organizacionais (CLEGG; HARDY, op. cit., p. 32).

Coadunando-se com algumas destas idéias, Lourau (1995) identifica as organizações ou instituições como formas sociais visíveis, que possuem uma unidade, um caráter específico produzido por sua finalidade oficial, sua função. Neste rumo, as organizações não só prestam serviços, mas produzem modelos de comportamento, mantém normas sociais, além de integrarem seus usuários no sistema local e reproduzirem a intencionalidade do sistema político e econômico na qual estão inseridas.

As organizações já estavam presentes nas civilizações mais antigas como a grega, a chinesa e a indiana, mas somente nas sociedades modernas industrializadas encontra-se um maior número destas executando tarefas diferenciadas. Assim, às atribuições das antigas organizações militares, de administração pública e de coleta de impostos, foram adicionadas outras tarefas como pesquisa, socialização de jovens e adultos (escolas e universidades), ressocialização (prisões e hospitais psiquiátricos), segurança e proteção individual, preservação da cultura (bibliotecas, museus), comunicação, recreação, entre outras tantas que servem para atender às necessidades sociais (SCOTT, 1998).

Entre as grandes descobertas mesopotâmicas e egípcias está a invenção das ciências das organizações. Entretanto, as técnicas de coordenação coletivas,

empreendidas nas primeiras cidades da Mesopotâmia, estavam baseadas no bom senso e na experiência, sem que proporcionassem aumento na produtividade e na eficiência (DE MASI, 2003). De qualquer forma, muitos conceitos relativos à

business schools utilizados no século XX, bem como a divisão do trabalho já

estavam presentes na Antigüidade:

[...] a criteriosa combinação da força de trabalho abstrata com a força de trabalho concreta, a solução dos conflitos, o controle da motivação dos homens, a valorização do trabalho intelectual, a estrutura hierárquica, a rede de organizações interligadas, a interação entre sistema e ambiente, o relacionamento entre staff e

line, a planificação estratégica, o controle financeiro da gestão, o

cuidado com a imagem e, de certa forma, a publicidade são todos invenções sociológicas realizadas entre os anos 3500 e 2500 a.C., ou conduzidas naquele período até as formas de surpreendente sofisticação (DE MASI, op. cit., p. 121).

Reed (1985) entende que os estudos organizacionais têm suas raízes históricas fundadas em alguns escritos que, a partir da segunda metade do século XIX, anteviram a vitória da ciência e da ordem e do progresso, sobre a política e a “recalcitrância e irracionalidade humana”, respectivamente. Já Scott (1981) refere que é impossível determinar quando surgiram os estudos organizacionais como uma investigação dentro da disciplina de sociologia e como centro de interesse em expansão de pesquisas multidisciplinares e de treinamento. Mas, tem-se idéia de que antes de 1940 as organizações não existiam como um campo distinto da pesquisa sociológica, havendo apenas alguns estudos empíricos sobre prisões, fábricas e sindicatos.

Reed (1999, p. 61) menciona que Saint-Simon foi um dos pensadores que tentou “antecipar e interpretar as nascentes transformações ideológicas e estruturais geradas pelo capitalismo industrial”. Ele estabeleceu a organização como forma de poder, uma vez que esta seria regida por princípios científicos baseados na natureza das coisas, independente da vontade humana, transformando as irracionalidades humanas em comportamentos racionais. Saint-Simon também estudou a influência dos agentes externos sobre a organização e publicou suas reflexões no livro intitulado “Fisiologia social”, além de introduzir o conceito de função na análise das instituições (LOURAU, 1995).

Europa e na América, durante o período da expansão econômica ocasionado pela Revolução Industrial. Desde então, elas não só aumentaram rapidamente em número e na amplitude de suas aplicações como também provocaram uma transformação em suas estruturas, passando de arranjos baseados em laços familiares para um contrato entre indivíduos sem parentesco (SCOTT, 1981).

Desde meados do século XIX, pela difusão do modo industrial de produção, as ciências organizacionais vêm se tornando objeto de pesquisas tanto teóricas quanto práticas. Pelo seu impacto, chegam a ser consideradas causadoras de uma revolução científica, que se iniciou quando Theodore Vail introduziu em sua empresa a padronização dos procedimentos e a otimização de fluxos de trabalho, e quando Stewart, em 1925, inaugurou o primeiro armazém com venda a preço fixo. A partir desta época, muitos estudos são desenvolvidos na perspectiva de lançar modos de organizar o trabalho de grupo com vistas à produção, que acabam por gerar modelos de vida da sociedade industrial e pós-industrial (DE MASI, 2003).

No início do século XX, teoristas gerenciais e administrativos como Taylor (1911), Fayol (1949) e Gulick e Urwick (1937) concentraram-se nos princípios gerais relativos aos arranjos administrativos. Todavia, eles estavam mais interessados em determinar qual a forma adequada para a máxima eficiência e eficácia do que examinar e explanar as relações existentes nas organizações. Na sociologia, a emergência do campo das organizações data aproximadamente da tradução das obras sobre burocracia de Weber (1946; 1947) e de Michel (1949) para o inglês. Um pouco depois destas clássicas publicações ficarem acessíveis aos sociólogos americanos, Robert Merton e seus alunos da Universidade de Columbia tentaram esboçar as bases deste novo campo de pesquisa, compilando procedimentos empíricos e teóricos de vários aspectos das organizações. Mais ou menos ao mesmo tempo, o estudo das organizações teve um importante desenvolvimento interdisciplinar no Carnegie Institute of Technology, através de Herbert Simon, que estudou os procedimentos de tomada de decisões e escolha nas organizações. A partir de então, foi identificada uma nova área de estudos - as organizações -, com um nível de abstração suficientemente geral para chamar a atenção de diferentes áreas de atividade, pelas similaridades em forma e função, e com diversidade e complexidade suficiente para encorajar e premiar a investigação empírica (SCOTT, 1981).

Atualmente, a teoria em estudos organizacionais pode ser entendida como uma atividade intelectual que está envolvida com o contexto sociohistórico em que ela é criada e recriada (REED, 1999).

O estudo da teoria das organizações teve influências de disciplinas como Estudos de Cultura, Teoria Literária, Teoria Pós-estruturalista, Arquitetura Pós- moderna, Lingüística, Semiótica, Folclore, Antropologia Cultural, Antropologia Social, Sociologia Industrial, Biologia-Ecologia, Ciência Política, Sociologia, Engenharia e Economia. Os maiores representantes destas disciplinas foram, na perspectiva clássica, Adam Smith (1776), Karl Marx (1867), Emile Durkheim (1893), F. W. Taylor (1911), Henri Fayol (1919), Max Weber (1924) e Chester Barnard (1938). Já no modernismo, pode-se citar os nomes de Herbert Simon (1945, 1958), Talcott Parsons (1951), Alfred Gouldner (1954), James March (1958), MelvilleDalton (1959), Ludwig von Bertalanfly (1968). Alfred Schutz (1932), Philip Setznick (1948), Peter Berger (1966), Thomas Luckmann (1966), Clifford Geertz (1973), Erving Goffman (1971), William Foote Whyte (1943), Paul Ricoeur (1981), Vladimir Propp (1828), Roland Barthes (1972), Ferdinand de Saussure (1959) e Kenneth Burke (1954) são os representantes do movimento simbólico-interpretativo; e Michel Foucault (1972, 1973), Charles Jencks (1977), Jacques Derrida (1978, 1980), Mikhail Bakhtin (1981), Jean-François Lyotard (1984), Richard Rorty (1989) e Jean Baudrillard (1988) os do pós-modernismo (HATCH, 1997).

Estas quatro perspectivas - clássica, moderna, simbólico-interpretativa e pós-moderna - representam uma classificação da diversidade oferecida pela teoria das organizações, pois cada qual possui seus postulados, vocabulários e, em alguma extensão, seus teoristas. Portanto, estas perspectivas oferecem a compreensão do trabalho extraordinário de como novas influências no campo atraem novas teorias que serão alinhadas nos grupos de idéias que se parecem. Embora haja uma seqüência temporal no desenvolvimento destas perspectivas, seria um engano pensar que as novas substituem as velhas, pois na teoria das organizações as perspectivas são acumuladas, oferecendo outras idéias. A interação destas perspectivas também produz contínuas mudanças, o que é uma das razões pela qual é tão difícil estabelecer uma maneira particular de pensar na teoria das organizações. Desta forma, os conceitos e teorias da organização não são completos, podendo haver uma combinação de vários (HATCH, 1997).

O objeto/foco do estudo organizacional do período clássico era verificar o efeito das organizações na sociedade (sociologicamente) e procurar meios de tornar as organizações mais eficientes e mais efetivas (administrativamente). Em relação ao método, a abordagem clássica utilizava-se da observação e da análise histórica, além da reflexão pessoal, tendo como resultados tipologias e estruturas teóricas. Neste período, os gerentes sentiam-se chamados a partilhar a sabedoria que haviam obtido como práticos e era notório que aqueles com autoridade (donos e administradores de organizações) possuíam o direito de falar e influenciar os outros. No período modernista, sob a epistemologia objetivista, a organização passou a ser vista como um objeto com dimensões que podiam ser fidedignamente medidas. Já como método para o estudo das organizações, o modernismo utilizava a avaliação descritiva e a correlação entre medidas estandartizadas, obtendo como resultados estudos comparativos e análises estatísticas multivariadas. O alemão Ludwig von Bertalanffy e a teoria dos sistemas foi um dos principais representantes desta época (HATCH, 1997).

A perspectiva pós-moderna tem seu foco/objeto voltado para a pesquisa ou a prática que tentam conhecer a organização tal como ela se apresenta. Para isto, se utiliza da desconstrução e da crítica às práticas de teorização, tendo como resultado a reflexividade e as narrativas reflexivas (HATCH, 1997). As concepções pós-modernistas questionam a existência da grande teoria, a centralidade do sujeito e o status ontológico do mundo social. Possuem uma visão das humanidades, que oferece uma contribuição aos estudos organizacionais, a partir do momento em que proporcionam uma tensão criativa (CLEGG; HARDY, 1999).

Parker (1992) menciona que a entrada do pós-modernismo na área da análise organizacional tem levado a mesma a tomar certa distância de tipologias tipicamente gerencialistas, fazendo com que conceitos desenvolvidos em outras searas do conhecimento sejam considerados. Refere, também, que o desenvolvimento do pensamento pós-modernista, no estudo das organizações, deu- se na mesma proporção em que começaram a surgir as investigações sobre a cultura das organizações, a partir da década de 1980.

Fragmentação é um dos temas favoritos entre muitos pós-modernistas, que relacionam este conceito ao colapso pós-industrial na família, na comunidade e na sociedade. Para estes estudiosos, o fenômeno da fragmentação promove ameaças

à auto-identidade produzidas quando os indivíduos são chamados a desempenhar múltiplos papéis com uma pequena separação temporal e espacial entre eles. A fragmentação do conhecimento do mundo, da mesma forma, repercute com a quebra de fronteiras entre as nações e seus povos, resultando em uma dispersão e mistura de culturas, políticas e religiões, que tiveram seus limites mantidos e bem separados durante a era industrial. A desconstrução, também característica própria do pós-modernismo, em termos simples, implica em reduzir um argumento em suas assunções básicas, rejeitando estas assunções pela afirmação de suas negações, e considerando o que isto implica sobre o argumento original. A asserção pós- modernista é de que as desconstruções executadas serão independentes de seu juízo anterior e permitem uma distância crítica da maneira com que o mundo é visto, a partir de formas culturais e sociais definidas (HATCH, 1997).

Um dos aspectos mais compelidos do pós-modernismo é a sua notável similaridade com a sociedade e a organização pós-moderna. Predições são de que o futuro irá encontrar as pessoas ocupando organizações menores, mais descentralizadas e informais; e organizações flexíveis, que estarão predominantemente orientadas para serviços ou informações e que irão utilizar estratégias de produção automatizadas e tecnologia baseada em computação (HATCH, 1997).

A perspectiva simbólico-interpretativa no contexto das organizações, por se configurar em parte do Referencial Teórico deste estudo, será abordada especialmente no Capítulo II.