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As organizações solidárias na atividade econômica

Capítulo 2. Economia Solidária e Cooperativismo

2.1 As organizações solidárias na atividade econômica

As primeiras experiências de organização solidária para realizar atividade econômica aparecem no início do século XIX, e os registros principais dessa época remontam às ações cooperativistas na Inglaterra, França e Alemanha (PINHO, 1966; SINGER, 2002).

A ES pode se manifestar em inúmeras formas de organização social que diferem no formato jurídico e na abrangência das ações, mas que, resumidamente e destacadamente, trazem em si “uma missão social” conforme destacam alguns autores como Cornelius et al. (2008); Dart (2004); Gaiger (2006); Pirvu, Ungureanu e Hagiu (2009). Há outros autores que destacam a missão dupla dos empreendimentos inseridos na economia solidária: de gerar recursos e atender os anseios sociais (CORNELLIUS 2007; DART 2004, LASPROGATA e COTTEN 2003 apud DACIN et al. 2010).

Conforme esclarece Pearce (2003 apud MOIZER e TRACEY, 2010), os empreendimentos sociais diferem dos demais que também têm objetivos sociais, tais como ONGs e entidades de caridade, em dois aspectos centrais. Primeiro, eles têm forte viés econômico e criam receitas substanciais para sua manutenção através da atividade comercial. Segundo, eles possuem uma estrutura democrática que permite o envolvimento de um amplo conjunto de interessados (stakeholders) na gestão da empresa, como por exemplo, o governo, a comunidade, outras entidades e os próprios trabalhadores. Com isso, os autores concluem que o sucesso desses empreendimentos depende da compreensão por parte de seus gestores da simbiose entre esses dois fatores: atividade comercial e estrutura democrática.

Em linha com esse pensamento, Gaiger (1999, p. 5) destaca que “o êxito destas iniciativas econômicas depende de sua capacidade de articular a lógica empresarial, voltada a busca de resultados por meio de uma ação planejada e pela otimização dos fatores produtivos, humanos e materiais – e a lógica solidária de tal maneira que a própria cooperação funciona como vetor da racionalização econômica, produzindo efeitos tangíveis reais [...]”. O autor afirma ainda que “as estratégias de comercialização, técnicas de gerenciamento e de exploração adequada das virtualidades do trabalho cooperado têm grande influência no sucesso dos empreendimentos” (idem).

Um exemplo relevante de empreendimento constituído e gerido sob as premissas da ES é a Corporação Cooperativa de Mondragon (FORCADELL 2005), criada no meio do século XX, a partir da massa falida de uma indústria de fogões, é um caso que desponta como modelo de instituição econômico-solidária. Hoje é o maior complexo cooperativo do mundo com oitenta e cinco mil funcionários, dos quais 85% são cooperados, têm patrimônio líquido superior a 30 bilhões de Euros,

possuem noventa e três filiais produtivas, das quais seis estão no Brasil (MONDRAGON 2012).

No Brasil, segundo explica Singer (2002), as ideias de economia solidária foram trazidas no final do séc. XIX pelos imigrantes europeus, que formaram as primeiras cooperativas agrícolas e de consumo. Contudo, foi nas décadas de 1980 e 1990, em que uma forte crise econômica gerou desemprego e exclusão social, principalmente entre as populações operárias industriais e de classe média, que a ES tomou novo impulso (POCHMANN 2004).

Em 1980, a Caritas, entidade ligada à igreja católica, financiou milhares de projetos comunitários, denominados “PACs”, cujo objetivo era gerar trabalho e renda de forma associada para moradores das periferias pobres. Outra modalidade que surgiu na mesma época foi a recuperação de massas falidas de empresas por seus trabalhadores, que as ressuscitavam como cooperativas autogestionárias. Dessas experiências surge a Associação Nacional dos Trabalhadores em Empresas de Autogestão e Participação Acionária (ANTEAG), associação presente até hoje e que congrega centenas de empreendimentos cooperativos. A União e Solidariedade das Cooperativas do Estado de São Paulo (UNISOL), é outra instituição que surge nessa mesma época, fomentando a transformação de empresas em crise em cooperativas de trabalhadores.

Em 2003 foi criada a Secretaria Nacional da Economia Solidária (SENAES), autarquia do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), com o objetivo de “[...] promover o fortalecimento e a divulgação da economia solidária mediante políticas integradas visando ao desenvolvimento por meio da geração de trabalho e renda com inclusão social” (MTE 2013).

Sobre as formas de organização com que a economia solidária pode se apresentar, o ministério do trabalho coloca em seu texto institucional que “Compreende uma diversidade de práticas econômicas e sociais organizadas sob a forma de cooperativas, associações, clubes de troca, empresas autogestionárias, redes de cooperação, entre outras, que realizam atividades de produção de bens, prestação de serviços, finanças solidárias, trocas, comércio justo e consumo solidário” (MTE 2013).

Segundo os dados do Atlas da Economia Solidária, organizado pela (SENAES, 2007), existem 21.859 empreendimentos econômico-solidários no Brasil.

O Gráfico 1 traz a distribuição desses empreendimentos nas regiões do Brasil, a forma de organização e o segmento econômico em que atuam.

Gráfico 1. Economia solidária no Brasil.

Fonte: Atlas da Economia Solidária (SENAES, 2007)

Todos esses formatos produtivos são constituídos para atuar no mercado de bens e serviços quando seus fundadores compartilham os valores da ES. Embora as

39% 17% 17% 10% 7% 2% 2% 1%2% 1% 0% 2%

Segmentos Econômicos

Prod. Agropecuária, Extrativismo e Pesca Prod. de Artefatos Artesanais Prod.e serviços de Alimentos e Bebidas

Prod. Têxtil e Confecção Prestação de Serviços (diversos)

Serviços de Coleta e Reciclagem de Materiais Produção Industrial (diversos) Produção de Fitoterápicos, Limpeza e Higiene Serviços Diversos

Serviços Relativos a Crédito e Finanças

Produção Mineral (diversa) Não especificado 44% 18% 16% 12% 10%

Distribuição Geográfica

Região Nordeste Região Sudeste Região Sul Região Norte Região Centro-Oeste 52% 10% 36% 1% 1%

Formas de organização

Associação Cooperativas Grupo Informal Outras Formas de Organização Não especificado

associações de trabalhadores sejam numerosas, conforme os dados apresentados, Costa et al. (2012) e Rufino (2005) destacam que dentro da economia solidária as cooperativas são o principal formato de organização de um empreendimento que deseja produzir e comercializar produtos. Para Pinho (1966), as cooperativas têm papel central e fundamental nessa doutrina (ES), pois são a estrutura de modificação de toda a organização social.

Gaiger (2003) explica que há um polimorfismo institucional dos empreendimentos que trazem os princípios da ES, dos quais as cooperativas de produção, de prestação de serviços, de comercialização e de crédito, são as mais comuns. Também Singer (2002) destaca as três categorias básicas de empreendimentos cooperativistas – cooperativas de crédito, cooperativas de consumo e cooperativas de produção – contudo destaca que esta última (produção) provê o formato fundamental para a transformação do sistema produtivo e econômico, já que somente ela realmente transforma o modo das relações entre os agentes.

Portanto, os Empreendimentos Econômico-Solidários (EES) compreendem diversos tipos de empresas e associações que desenvolvem distintas atividades econômicas. Suas formas são diversas, mas compartilham características distintivas aos empreendimentos convencionais, tais como a união solidária entre iguais, a democracia na tomada de decisão e a equidade na distribuição dos ganhos. Essa distinção frente aos empreendimentos convencionais refere-se principalmente à modificação da posse dos meios de produção, assim como à modificação da gestão desses meios e ao destino do resultado alcançado por essa forma diferente de ofertar bens e serviços (RUFINO 2005).