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CAPÍTULO 3- “O temporal nos altos poderes”: embates e estilhaçamentos na Liga

3.1.1. As propostas de navegação entre o Brasil e os Estados Unidos

Como pontuaram os periódicos, os debates acerca da navegação comercial no Império, em especial o estabelecimento da linha entre o Brasil e os Estados Unidos, foram o ponto nevrálgico para a queda do gabinete de 15 de janeiro.

A navegação subvencionada, desde a criação da Secretaria de Estado dos Negócios da Agricultura, Comércio e Obras públicas – decreto nº 1067 de 28 de julho de 1860 – passava a ser responsabilidade do ministro da Agricultura e não mais do dos Negócios do Império. Deste modo, para a compreensão do que se estabeleceu na Câmara em 1864 e a exoneração do gabinete Zacarias, o entendimento das atribuições e a atuação dos que chefiaram a pasta é salutar.

Neste sentido, segundo Louise Glaber,

Os negócios relativos a iluminação pública da Corte, telégrafos, o serviço da extinção dos incêndios e companhias de bombeiros, vieram do Ministério da Justiça. As atribuições originárias da pasta do Império eram mais numerosas, tais como os assuntos relativos ao comércio, à indústria e à agricultura, e também os seus meios de fomento, desenvolvimento e ensino, introdução e aclimação de espécies, os jardins botânicos e passeios públicos, os institutos agrícolas, assim como a Sociedade Auxiliadora da Indústria Nacional e quais quer outras que se propusessem aos mesmos fins, os assuntos relativos à mineração, a autorização para incorporação de companhias ou sociedades relativas aos ramos da indústria, a concessão de patentes e prêmios pela introdução de indústria estrangeira, os negócios concernentes ao registro de terras, a colonização, a catequese e civilização dos índios, as missões e aldeamentos, as obras públicas gerais no município da Corte e nas províncias e as repartições encarregadas de sua execução e inspeção, as estradas de ferro, de rodagem e quaisquer outras, bem como as companhias ou empresas

encarregadas de sua construção, conservação e custeio, a navegação fluvial,

os paquetes e os correios terrestres e marítimos. 497

Apesar da citação ser longa, ela explica fundamentalmente as atividades desempenhadas pelo novo ministério e, sobretudo, o desafogo de ocupações até então conferidas aos Negócios do Império. Quanto às concessões firmadas entre o governo e particulares, a secretaria da Agricultura passou a administrar todos os acordos. Abundantes nas atividades do ministério do Império na década anterior – se observarmos os números de concessões e subsídios fornecidos – a nova pasta era agora visada pelos “capitalistas” e industriais interessados em negociar com o Império. Entre os principais beneficiários, destaca- se o barão de Mauá, que nos anos 1850 conseguiu administrar nada menos que treze empreendimentos,498 figurando, assim, entre os mais favorecidos pelos gabinetes

conservadores, mesmo sendo filiado ao Partido Liberal.

No ano seguinte a criação do ministério da Agricultura, uma normativa organizou e regulou o funcionamento da pasta. Segundo o artigo 1º do decreto nº 2748 de 16 de fevereiro de 1861, a secretaria seria composta por quatro repartições: 1º Diretoria Central e dos Negócios da Agricultura, Comércio e Indústria; 2º Diretoria de Obras Públicas e Navegação; 3º Diretoria das Terras Públicas e Colonização; e 4º Diretoria dos Correios.499

Acerca da Diretoria de Obras Públicas e Navegação, o decreto, em seu artigo 10º, indica de maneira genérica suas atribuições: o § 3º simplesmente cita “os negócios relativos à navegação fluvial e aos paquetes”. Apesar do indistinto papel conferido pela legislação, esta seção ministerial era de extrema importância e evocada nos discursos no Parlamento como determinante ao andamento de projetos relacionados à navegação comercial.

Os relatórios apresentados com certa periodicidade à Câmara dos Deputados pelos ministros eram abundantemente mencionados na apresentação de proposituras, seja pelos argumentos do governo neles contidos, seja pelos dados de seus quadros e tabelas que apontavam as estimativas de possíveis ganhos e perdas e os balanços financeiros. A navegação subvencionada era assunto obrigatório nestes relatórios. Os ministros deveriam assinalar as condições das concessões em atividade, a necessidade de reforma ou revisão dos contratos, bem como noticiar novas propostas e os termos oferecidos ao governo brasileiro. Criado ainda no

497 GLABER, Louise. A Secretaria de Estado dos Negócios da Agricultura, Comércio e Obras Públicas e a modernização do Império (1860-1891). Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 2012. p.10-11. grifo nosso.

498 A evolução dos empreendimentos de Mauá pode ser observada no Quadro 5 (p.174).

499 BRASIL. Coleção de Leis do Império do Brasil. (tomo XXIV, parte II). Rio de Janeiro: Typ. Nacional, 1861.

gabinete Caxias-Paranhos, o ministério contou com uma rotatividade expressiva na chefia, mesmo após a ascensão do grupo progressista. Como nota-se no quadro abaixo, durante seus primeiros oito anos de vida a pasta contou com onze ministros, o que em média, restringe a passagem de cada um por menos de um ano.

Quadro 4. Ministros e Secretários da Agricultura (1861-1868)

Ministro e Secretário Entrada Saída Gabinete Presidente do

Conselho

Joaquim José Inácio 02/03/1861 21/04/1861

02 de março de 1861

Luís Alves de Lima e Silva, marquês de

Caxias Manuel Felizardo de Souza

e Melo

21/04/1861 24/05/1862 Antônio Coelho de Sá e

Albuquerque

24/05/1862 30/05/1862 24 de maio de 1862 Zacarias de Góes e Vasconcellos João Lins Vieira Cansansão

de Sinimbu

30/05/1862 09/02/1863

30 de maio de 1862 Pedro de Araújo Lima, marquês de Olinda Pedro de Alcântara

Bellegarde

09/02/1863 15/01/1864

Domiciano Leite Ribeiro 15/01/1864 20/07/1864 15 de janeiro de 1864 Zacarias de Góes e Vasconcellos João Pedro Dias Vieira 20/07/1864 31/08/1864

Jesuíno Marcondes de Oliveira e Sá

31/08/1864 26/10/1864

31 de agosto de 1864 Francisco José Furtado José Liberato de Barroso 26/10/1864 12/05/1864

Antônio Francisco de Paula e Souza

12/05/1864 03/08/1866 12 de maio de 1865 Pedro de Araújo Lima, marquês de Olinda Manuel Pinto de Souza

Dantas

03/08/1866 16/07/1868 03 de agosto de 1866 Zacarias de Góes e Vasconcellos Elaborado a partir de: GLABER, Louise. A Secretaria de Estado dos Negócios da Agricultura, Comércio e Obras

Públicas e a modernização do Império (1860-1891). Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 2012. p.111.

Se a criação do ministério da Agricultura e de uma diretoria dedicada exclusivamente à navegação significou um passo importante para os debates sobre a abertura dos rios brasileiros e o estabelecimento ou/e estreitamento de relações comercias com outras “nações amigas”, a questão que levou “pelos mares” os planos de Zacarias chefiar um gabinete mais duradouro que o dos “Anjinhos” teve suas raízes fincadas na extinta administração do marquês de Olinda, especialmente em três proposições herdadas do último relatório do ministro Pedro de Alcântara Bellegarde.

O ponto inicial foi um requerimento apresentado em 29 de janeiro de 1864 pelo deputado da província do Amazonas, Antônio José Moreira, que solicitou “à comissão competente dar ela seu parecer a respeito, [d]as três propostas de navegação a vapor entre o Brasil e os Estados Unidos, anexas ao relatório do ministério da Agricultura”.500 Naquela

circunstância, Alcântara Bellegarde, no tópico Navegação Subvencionada discorrera sobre as três propostas que haviam sido apresentadas ao governo, duas norte-americanas e uma brasileira:

Tenho em meu poder três propostas para o estabelecimento de uma linha de vapores entre a Corte e a cidade de New-York com escalas por algumas províncias do Império.

Pertence a primeira ao ministro plenipotenciário dos Estados Unidos, o honrado Sr. General Webb, que em setembro do ano findo [1863?] se propôs a organizar uma companhia para tomar a si aquele serviço. [...]

O governo a recomenda à vossa consideração.

Posteriormente recebi uma do dr. Bealy, dos Estados Unidos, e outra da Companhia Brasileira de Paquetes por vapor. [...]

Estou convencido da alta conveniência de se estabelecer relações diretas, entre estes dois pontos, ainda com sacrifício do Tesouro público; porém não me acho de todo preparado para resolver de pronto este negócio.

Trato, pois, de o estudar e de coligir os meios de levar a efeito esta empresa, cujos efeitos para as relações internacionais dos dois países são de evidente vantagem.501

O teor das propostas foi transcrito na íntegra nos anexos do relatório. A primeira delas foi colocada pelo diplomata James Watson Webb, procurador de Robert S. Webb. A principal justificativa deste projeto residia na aproximação das duas Américas por intermédio de “carreira de vapores”, uma necessidade “palpitante e indispensável, e ainda mais, uma como

garantia à estabilidade das relações comerciais, e de amizade, que existem entre elas”.502

A linha inicial previa escalas na Bahia, Pernambuco, Pará e ilhas das Índias Ocidentais, além de seus portos de embarque e desembarque: o Rio de Janeiro e Nova Iorque. E deixava a disposição do Brasil, desde que o governo retribuísse de maneira “razoável e liberal” o serviço extraordinário, a designação de outras localidades onde as embarcações pudessem aportar com segurança. O programa de concessão apresentado por Webb era composto de oito artigos, que disponha as condições do acordo. O governo brasileiro deveria pagar ao concessionário da linha transatlântica

no fim de cada viagem redonda, pela chegada de um dos vapores mensais de Nova Iorque, a quantia de £ 6.000 durante os primeiros cinco anos: a de £ 5.000 de cada viagem redonda, nos termos declarados, durante cinco anos seguintes; e a de £ 4.000 durante o terceiro período de cinco anos, época em que cessará a concessão, ficando por conseguinte entendido que é feita pelo tempo de quinze anos, que começarão a contar do dia em que o vapor da linha proposta sair do Rio de Janeiro, devendo os pagamentos sempre ser feitos sobre Londres a dez dias de vista, ou no Rio de Janeiro ao câmbio do dia.503

501 BRASIL. Ministério da Agricultura. Relatório apresentado à Assembleia Geral Legislativa na primeira sessão da décima segunda legislatura pelo ministro e secretário de Estado do Negócios da Agricultura, Comércio e Obras Públicas. Rio de janeiro: Typographia Perseverança, 1864. p.36-37.

502 Ibid. Anexo D- 4ª Diretoria. grifo nosso. 503 Id.

Ademais, o programa previa o transporte de documentos oficiais entre os dois países e o tempo empregado para efetuar a viagem, que não deveria exceder “25 dias de 24 horas”. Webb também propunha que os produtos relacionados ao abastecimento dos vapores fossem isentos de taxas:

importar no Brasil, livres de direito, não somente o carvão e outros fornecimentos e provisões necessárias ao consumo de seus vapores, como também as provisões necessárias ao consumo de seus vapores e qualquer fornecimento para uso e consumo dos passageiros e empregados. E os seus vapores ficarão isentos de todas as despesas do porto e da alfândega nos portos do Brasil.504

A segunda proposta para a linha Brasil-Estados Unidos também veio de norte- americanos, chegando ao conhecimento do governo brasileiro em 6 de outubro de 1863 pela Legação Imperial do Brasil nos Estados Unidos. Efetivamente começou a ser analisada pelo ministério da Agricultura em 19 de novembro.

Diferentemente do itinerário da primeira proposta, o alvitre do dr. J. C. Beales e M. Cornelius Garisson previa o estabelecimento de uma linha de vapores entre Nova Iorque e o Pará, com apenas uma escala em São Tomás, no Caribe. Miguel Maria Lisboa, depois barão de Japurá, como ministro plenipotenciário da Coroa, foi o responsável pelas negociações na Legação. Demonstrou, este último, interesse na oferta, que em seus termos libertava o Brasil “da espécie de tutela da Grã-Bretanha, em que está o nosso comércio com os Estados Unidos por não haver correspondência entre os dois países, senão dispendioso e tardio circuito de Southampton ou Bordéus”.505

Distanciando-se da primeira propositura, a encabeçada por Beales e Garisson apresentava-se de maneira descerimoniosa, em três missivas, e prometia solicitar apenas uma “módica subvenção” ao governo brasileiro. Como bom estrategista, Maria Lisboa não garantiu que a subvenção fosse aceita aqui, sobretudo, pela dificuldade do governo fazer passar pelas Câmaras a proposta enquanto outras empresas que operavam no Brasil também a reclamavam. Na versão oficial enviada ao Brasil, a concepção da dupla norte-americana se modificou: a linha partia de Nova Iorque, passava pelo Pará e aportava no Rio. O contrato seria de dez anos, com os mesmos privilégios fornecidos a linha britânica de vapores. A questão do subsídio aparece no artigo 5º da missiva nº 2 como lacuna, o que sugeria uma posterior negociação de valores e também da tonelagem a ser transportada.506

504 Id. 505 Id. 506 Cf. Id.

A terceira proposta foi a única de iniciativa nacional, empenhada pela Companhia Brasileira de Paquetes à vapor, em novembro de 1863 por seu gerente, Francisco Rocha Miranda. O apelo inicial fundamentou-se a questão comercial:

Uma das principais fontes de nossa riqueza, o café, encontra grande e pronto consumo nas praças da América do Norte, mas da falta de notícias transmitidas com rapidez e de comunicações certas e em épocas sabidas, podem resultar, como efetivamente resultam, grandes prejuízos ao comércio e lavoura nacionais prejuízos que vão influir na renda pública.507

A justificativa era de que as relações comerciais com os ingleses e franceses estava consolidada e era necessário o estreitamento com as nações da América que pudessem adquirir nossos produtos, melhorando, assim, a situação das receitas, que como indicamos no capítulo anterior, se deterioraram na administração do marquês de Olinda. Ademais, a proposta da Companhia Brasileira de Paquetes à vapor foi a mais incisiva ao destacar a questão nacional, atacando as anteriores e proferindo vários questionamentos pertinentes, a exemplo de: “Quem

deve fazer esse serviço? Nacionais ou estrangeiros?”.508

Como última a se pronunciar e fornecer uma proposta ao governo brasileiro, a Companhia tinha conhecimento das ofertas anteriores. Neste sentido, seus argumentos fundamentavam-se basilarmente nas perdas que a Companhia nacional estaria sujeita, bem como a dificuldade de “controle” de uma iniciativa estrangeira:

A um país como o Brasil, que podemos dize-lo com orgulho e ufania, marcha nas sendas do progresso e civilização, convém entregar a estrangeiros todas as linhas de navegação à vapor?

A um país que encerra em si os recursos e meios necessários para o estabelecimento da linha de que me ocupo, convém dar capitais à estrangeiros, em lugar de conserva-los em si, e assim aumentar sua riqueza?

O estabelecimento de uma linha estrangeira que, tocando em nossos principais portos, inclusive o Pará, não arruinará em parte a companhia brasileira, que tantos sacrifícios tem custado, quer ao Estado, quer aos particulares?

Se estabelecer-se essa companhia, não terá talvez a brasileira de entrar em liquidação forçada? 509

Desta maneira, ofereceu uma linha que partisse da Corte duas vezes ao mês. Em uma das viagens, à escolha do governo, tocaria nos portos da Bahia, Pernambuco, Maranhão, Pará, Barbados, São Tomás, Charleston e Nova Iorque. Em contrapartida, indicava que a subvenção brasileira deveria ser de 50:000$000.

507 Id.

508 Id. grifo do autor. 509 Id.

Na Câmara, o Regimento Interno, em seu artigo 36, determinava que a temática fosse submetida à Comissão de Comércio, Agricultura, Indústria e Artes.510 A resposta do

requerimento de 29 de janeiro, do deputado Antônio José Moreira acerca das propostas que detalhamos acima, retornou à pauta da Casa em 22 de abril. O parecer da Comissão foi elaborado pelos deputados Aureliano Cândido Tavares Bastos e Jesuíno Marcondes de Oliveira e Sá.

O texto preparado pela Comissão retomou, inicialmente, com detalhes, o teor das três propostas anexadas ao relatório do ministério da Agricultura. Acerca da primeira nenhum ponto de insatisfação foi relatado pelos pareceristas. Já sobre a segunda, destacaram suas lacunas, como a ausência do valor da subvenção, a capacidade dos paquetes, o número de viagens e o prazo do contrato. Na encaminhada pela Companhia Brasileira de Paquetes à Vapor, salientaram o aumento da subvenção que o dito empreendimento já recebia do governo para operar suas linhas no Brasil e ressalta a ausência de maiores dados sobre a proposta da linha internacional.

Tavares Bastos e Jesuíno Marcondes justificaram que “cumpre lembrar que entre o Brasil e os Estados Unidos não se trata de criar relações novas; trata-se de servir às vastas

relações já existentes entre os dois países”.511 Pelo indicativo dos parlamentares, a ligação entre

os Estados Unidos e o Brasil sem intermédio da Grã-Bretanha facilitaria e expandiria as relações entre as nações “amigas” e dava alternativa para os negócios brasileiros após o rompimento das relações diplomáticas com os ingleses em razão da “Questão Christie”. Argumentam que o saldo

entre a nossa exportação e a importação norte-americana é pago pelos Estados Unidos em ouro. Mas o ouro não vem ao Brasil; é remetido para a Grã- Bretanha aos comerciantes ingleses, que são hoje os intermediários forçados do negócio entre os dois países. Não valeria mais que os paquetes nos trouxessem diretamente o ouro federal? Mas o nosso prejuízo atualmente é ainda muito maior; porquanto, não sendo geralmente diretas as transações entre os dois povos americanos [pela ausência de conexão direta de vapores], não havendo o Brasil número suficiente das casas filiais diretas de estabelecimentos norte-americanos, resulta que o ouro remetido para a Grã-

Bretanha fica nos bancos ingleses, e em lugar dele recebemos mercadorias inglesas, ou mesmo norte-americanas reexportadas da Europa, enquanto podíamos receber idênticas dos Estados Unidos diretamente.512

Assim, a plausibilidade da proposta se respaldou pela crítica dos pareceristas sobre à intermediação dos comerciantes ingleses e as grandes perdas desta prática à economia

510 BRASIL, 1857, p.7.

511 ACD. Sessão de 22 de abril de 1864. p.244. grifo nosso. 512 Ibid. Id. grifo nosso.

brasileira. Justificaram o pedido de conexão direta com a América do Norte por meio de uma série de comparações de balanços de importações, exportações e os valores pagos à Companhia Inglesa. Tavares Bastos e Jesuíno Marcondes recomendaram ao colegiado de deputados:

Que, na lei do orçamento do Império para o exercício próximo seguinte, se inclua na verba do § 17 (subvenção às companhias de navegação à vapor) do art. 8º (Ministério da Agricultura, Comércio e Obras Públicas) a soma de 600:000$, ficando o governo autorizado para prestar essa quantia anualmente à empresa que estabelecer uma linha direta de paquetes à vapor entre o Rio de Janeiro e Nova Iorque, com escala pelos portos que o mesmo governo designar.513

O interessante deste indicativo se registra em dois pontos: além de avalizar a possibilidade da linha e inclui-la junto as demais subvenções relacionadas a navegação comercial, denota a evidente preferência dos dois deputados pelas propostas dos estadunidenses, em especial pela de Webb, e na justificação do impedimento da Companhia brasileira de operar a linha:

Um serviço regular de navegação à vapor, como a que se trata, não existirá nunca sem um impulso forte, uma direção de habilidade, paquetes vastos e rápidos, grande pontualidade e perfeita segurança. Isso tudo exige uma larga subvenção; e não é natural que o governo dos Estados-Unidos haja de presta- la a uma companhia brasileira.

Para que uma companhia nacional pudesse desempenhar a tarefa, fôra pois, mister que a Assembleia geral a coadjuvasse com alguns milhares de contos; ora isto é impraticável.514

Observando a argumentação disposta no parecer, esperava-se que o governo dos Estados Unidos subvencionasse uma quantia superior a que o Brasil estava disposto a oferecer, possibilitando a efetividade do negócio. Nesta perspectiva, a proposta de Beales e Garisson se mostrava comprometida por não mencionar valores, deixados para negociação posterior. E a da Companhia Brasileira de Paquetes à Vapor, inviável, pela necessidade de investimento extra do governo brasileiro ao que o empreendimento já recebia.

Sendo assim, para Tavares Bastos e Jesuíno Marcondes a linha fornecia um meio de abertura aos empreendimentos estatais à iniciativa internacional, do mesmo modo que possibilitava o estreitamento de relações com a nação que mais rapidamente havia se “desenvolvido” na América, possibilitando uma melhora substancial ao problema financeiro do Brasil, já que os Estados Unidos importavam mais mercadorias do que exportavam para o Império. Era o início e um instrumento para edificar outras “liberdades”, como a de navegação, em especial a do Amazonas, de quem Tavares Bastos era o principal propagandista.

513 Ibid., p.246. 514 Ibid., p.245.

Em uma perspectiva que leva em consideração apenas o teor formal das propostas apresentadas ao governo brasileiro, a de Webb se apresentava completa e com todas as cláusulas contratuais pré-estabelecidas. Beales e Garisson, diferentemente, se mostravam abertos ao diálogo com as autoridades nacionais, parecendo-nos que o alvitre era apenas um indicativo de interesse, até mesmo pela maneira de apresentação: repleto de lacunas. Já a da Companhia Brasileira sustentou a necessidade de manter controlada as operações de navegação às empresas nacionais e a possibilidade de atender, com suas embarcações, o dito percurso. Para tanto, solicitava um acréscimo substancioso a subvenção que já recebia do governo para operar em território nacional. Sobre esta última, as negociações para a reforma do contrato inicial também figuraram na Câmara em 1864, como nota-se no Gráfico 2 (p.151). Tratava-se então de mais um aditivo aos gastos, o que parece não ter sido bem visto.

Acerca dos responsáveis pelo parecer, Jesuíno Marcondes, deputado liberal pela