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CAPÍTULO 1- “A Guarda de Honra dos antigos reis”: hegemonia e fragilidades do

1.2. Os “gabinetes financeiros”: hegemonia e fragilidades do Partido Conservador

1.2.2. Fragilidades na Câmara dos Deputados

Um mês após as divergências entre os conservadores do Rio Grande do Sul se avultarem na Corte, os dissídios entre setores distintos do Partido tornaram a conduzir os debates da Câmara. Em 19 de julho entrava em segunda discussão o projeto do orçamento do Império referente ao exercício 1859-1860. Nesta oportunidade, a tentativa de prolongamento da política de Conciliação do gabinete Olinda foi duramente criticada por um correligionário,

128 DORATIOTO, Francisco. General Osório: a espada liberal do Império. São Paulo: Companhia das Letras,

2008. p.115.

129 PANIAGUA, Edson Romário Monteiro. A construção da ordem fonteiriça: grupos de poder e estratégias

eleitorais na Campanha Sul-rio-grandense (1852-1867). 2012. 414 f. Tese (Doutorado) - Programa de Pós- graduação em História, Universidade do Vale do Rio dos Sinos, São Leopoldo, 2012. p.39.

130 Sobre a historiografia gaúcha acerca da organização dos partidos da província no Brasil Imperial ver: VARGAS,

Jonas Moreira. A política rio-grandense no Segundo Império: um balanço historiográfico. In: DOMINGOS, Charles Sidarta Marchado et al. Capítulos de História Política: fontes, objetos e abordagens. São Leopoldo: Oikos, 2018.

131 Muitos dos envolvidos nas contendas do Rio Grande do Sul foram importantes personagens da Liga nacional

da década seguinte, a exemplo do barão de Porto Alegre, indicado como ministro no gabinete dos “Anjinhos” (24 de maio de 1862) e Francisco de Araújo Brusque, ministro da Marinha e da Guerra no gabinete 15 de janeiro de 1864.

Joaquim Otávio Nébias, que apontou divergências políticas dos membros do ministério e uma tentativa de retorno ao exclusivismo partidário.

O Sr. Nébias: [...] Se do ministério desço para diversos membros que compõem a maioria que o sustenta, vejo a mesma divergência, os mesmos protestos. Quando o honrado Sr. ministro da marinha protestava em uma das sessões passadas que conservava-se sempre conservador, o ilustre deputado por Vassouras declarava como em represália, e de modo significativo, que sempre seria também liberal.

O Sr. Martinho Campos: - Sempre fui, sou, e hei de ser.

O Sr. Nébias: - Assim, pois, me parece que não é possível dar-se entre religiões tão diferentes o casamento misto (Risadas).

[...] Os nobres deputados tenham a bondade de ouvir-me; depois tirem as conclusões. Se eu considero as manifestações especiais de alguns Srs. Ministros, ainda temo que a conciliação seja uma falsa bandeira. Não há muito tempo que o nobre Sr. ministro da justiça disse no senado, creio que parodiando até as palavras do Sr. Thiers: - Quem não está conosco é contra nós - ... 132

A insinuação de Nébias de que a política dita “conciliatória” já não assentava mais as decisões do gabinete não foi bem vista pelos ministerialistas que, de pronto, interpelaram o orador com uma série de apartes. Para ele, o ministério havia concedido muitos privilégios “as hosanas dos seus amigos”. Assim, o debate entre Nébias e o deputado do Maranhão, Cândido Mendes de Almeida demonstra com primazia o ponto de desacordo entre as frações conservadoras na Câmara. Enquanto o primeiro afirmava que a Conciliação já não se fazia presente pelas divergências entre os membros do gabinete, o segundo entendia que a maioria se via representar plenamente pela composição ministerial “conciliada”.

O Sr. Nébias: Senhores, quando considero a marcha do governo começada pelo desacordo de seus dignos membros, eu tenho meus receios de que a

política generosa da conciliação seja desnaturada, que a conciliação assim compreendida e verificada no país seja antes uma bandeira de paz com estragos de guerra, um pretexto para um exclusivismo novo. (Apoiados).

Não se é possível casar as opiniões políticas dos membros do ministério, que outrora se achavam em divergência política...

O Sr. Mendes de Almeida: - Hoje estão casados até civilmente. (Risadas). O Sr. Nébias: O honrado Sr. ministro da Marinha [José Antônio Saraiva] diz- nos que há de sustentar os princípios conservadores, ao passo que o honrado Sr. ministro da Fazenda [Bernardo de Souza Franco] protesta em sentido contrário...133

A discussão dos deputados revela que apesar de tentar dar prosseguimento à política de Conciliação inaugurada por Paraná, os gabinetes posteriores a essa administração se viram mais distantes da moderação partidária que se costuma atribuir a esse gabinete. Ainda quando

132 ACD. (t.3). Sessão de 19 de julho de 1858. p. 187-188, grifo nosso. 133 Ibid., p.189.

o conjunto do ministério congregasse políticos de distintas orientações, a ideia de “pureza” das legendas parecia retornar com força, mesmo a contragosto dos que ansiavam perpetuar o arrefecimento das rivalidades. A formação de uma fração oposicionista e seu embate com o gabinete aventa assim, para o acirramento das rivalidades entre os grupos conservadores discordantes que acreditavam ou não na sobrevivência da Conciliação: a ala de conservadores “puros”, menos flexível e a de conservadores “moderados” ou “conciliados”, de maior diálogo entre os distintos setores políticos.

Apoiado por parlamentares contrários ao gabinete, a exemplo do pelotense Jacinto de Mendonça, que ainda se via incomodado com perda de privilégios em sua região em virtude da competição com a carne do Uruguai, Nébias adensou suas críticas. Recorreu a discordâncias emergentes na discussão da Câmara naquele ano, a exemplo da polêmica protagonizada por Oliveira Belo e Silva Ferraz, que no mês anterior havia causado desconforto pelas críticas da bancada de conservadores gaúchos. Em defesa do ministério houve poucas manifestações, a julgar pelas tímidas frases trocadas por Nébias com o ministro da Marinha, José Antônio Saraiva, que se encontrava no plenário. Para Nébias, a questão provincial havia sido deixada a sorte dos desmandos dos presidentes de províncias, que faziam “política pessoal por sua própria conta”, o que em sua acepção se assemelhava às atuais atividades do Parlamento.

O Sr. Nébias: - As administrações das diferentes províncias são deixadas ao arbítrio de seus administradores; e se lá acontece o mesmo que no Parlamento geral, se aparece uma oposição, por mais leve que seja, aos governos provinciais, eles fazem a política por sua conta. (Apoiados da oposição). Se por ventura os diferentes partidos chegam a ter tal ou qual contato, a proceder com tal ou qual moderação, ainda bem; mas se aparece uma

oposição ainda muito benévola, muito preventiva, os presidentes tratam de considerar logo como adversários aqueles que tem a ousadia de lhes dirigir algumas advertências, e não estarem em tudo e por tudo às suas ordens.134

Se na Câmara, a oposição ao ministério crescia, em novembro o Diário do Rio de

Janeiro já evocava pela saída do gabinete e pela agilidade do Imperador em resolver a questão,

que segundo o jornal se alongara demasiadamente. Em suas palavras: “Qual é pois a ideia do gabinete atual? Como não compreende que há muito soou a hora em que deve o país libertar dessa pesada e estéril direção que ele lhe dá?”135 O periódico prossegue, e sugere ainda conflitos

no seio do próprio ministério: “O Sr. ministro da guerra136 insiste pela sua demissão, mas seus

134 Ibid., p.190, grifo nosso.

135 FBN. Diário do Rio de Janeiro. 27 de novembro de 1858. p.1.

136 Em 11 de julho de 1858, o ministro da Guerra, Jerônimo Francisco Coelho, foi substituído interinamente pelo

ministro da Marinha, José Antônio Saraiva. Cf. BOULANGER, Luiz Aleixo (Org.). Demonstração das mudanças

colegas, vendo nessa retirada uma inevitável queda, o forçam a continuar num cargo que tanto vexa e incomoda a S. Ex.”.137

Como se nota, tais discordâncias entre frações conservadoras se sobressaíram na Câmara de 1858 e no próprio ministério dificultando a administração Olinda, ainda que a oposição não se constituísse enquanto maioria. Este cenário contrariou os desejos da Fala do

Trono daquele ano, na qual o Imperador discorreu: “Graças ao Todo Poderoso, o Império tem

gozado de paz e tranquilidade. O espírito de concórdia e moderação, que tem presidido a política do meu governo, continua a produzir salutares efeitos”.138 Apesar do otimismo do

Monarca, seriam justamente as dissonâncias evocadas no Parlamento que levariam à retirada do gabinete em dezembro.139 Como explicou Nébias,

uma oposição qualquer, ainda muito branda e desinteressada, não agrada a governo nenhum do mundo, nem ao governo santo da conciliação, quer seja uma oposição pessoal, quer uma oposição oficial tendente a combater abusos, e menos uma oposição de rivalidade tendente a substituir o governo.140

Em substituição a Olinda, o “convertido conservador” Antônio Paulino Limpo de Abreu, visconde de Abaeté,141 foi convidado a compor o ministério (12 de dezembro de 1858),

cuja tarefa também não foi fácil diante da herança que recebeu de seus antecessores. As principais questões se relacionavam ao interregno financeiro, como a autorização da “emissão bancária (42.036:00$ em 1857), com pluralidade emissora, levada a cabo pelo ministro da Fazenda de Olinda, Souza Franco (4 de maio de 1857 a 12 de dezembro de 1858)”142, visando

atender à crescente demanda por dinheiro existente no Império.

Como explica Carlos Gabriel Guimarães, a política emissionista de Bernardo de Souza Franco “coincidiu com a crise econômica mundial de 1857. A notícia da retomada das exportações russas de cereais, que eclodiu em Nova York com uma espetacular queda dos

137 FBN. Diário do Rio de Janeiro. 27 de novembro de 1858. p.1.

138 BRASIL. Fallas do Throno desde o ano de 1823 até o anno de 1889 acompanhadas dos respectivos Votos de Graças da CamaraTemporaria. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1889. p.521.

139 IGLÉSIAS, 2004, p.88.

140 ACD. (t.3). Sessão de 19 de julho de 1858, p.190, grifo nosso.

141 Bruno de Almeida Magalhães, explica que a adesão de Limpo de Abreu a política de Conciliação e aos gabinetes

conservadores que se seguiram, deu-se por sua adaptação a nova “contingência política”. Nos termos do autor, “tendo assistindo à formação de dois tradicionais partidos monárquicos e compartilhado das lutas entre eles travadas; conhecendo os motivos determinantes de seu aparecimento e os fatores que lhe alimentavam a existência, chegou a conclusão da desnecessidade da permanência dos mesmos, e tornou-se um adepto entusiasta da anistia partidária a bem do interesse nacional”. Cf. MAGALHÃES, Bruno de Almeida. O visconde de Abaeté. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1939. p.254.

preços, repercutiu em cadeia pela Europa Ocidental atingindo bancos e bolsas”.143 Assim, as

recomendações do Imperador ao novo presidente sobre estes problemas eram muito claras: Quanto à questão financeira, entendo que se deve proteger a instituição do Banco do Brasil mas, se se fizer lei regulando o estabelecimento das associações comerciais deve ficar livre a aprovação do governo, quando a natureza da Sociedade o exigir, relativamente ao número e lugar.144

Se as condições econômicas deixadas por Olinda a Abaeté não eram as melhores, no tocante a governabilidade não era diferente, pois muitos políticos ficaram receosos em relação à estabilidade do novo gabinete. Assim, poucos meses após assumir a presidência do Conselho, além de lidar com as finanças públicas, Limpo de Abreu sofreu com baixas nos governos provinciais. Nos primeiros meses de sua administração quatro presidentes solicitaram a saída do cargo. Em 19 de fevereiro pediram exoneração os presidentes do Paraná, Francisco Liberato de Matos, da Paraíba, Henrique de Beaurepaire Rohan e de Alagoas, Ângelo Tomás do Amaral. Em 12 de abril foi a vez de Saraiva, então presidente de Pernambuco, que justificou sua retirada em decorrência da crise ministerial que atingia o governo.145 Não bastasse os

desarranjos regionais, neste mesmo mês, os resumos das Conferências Ministeriais apontam para dificuldades do ministério em outras nomeações, a exemplo da carta do presidente do Rio Grande do Sul, Conselheiro Ferraz146, que negou a assunção ao cargo de Inspetor da Alfândega

da Corte.147

143 GUIMARÃES, Carlos Gabriel. O Banco Mauá & Cia. (1854-1878): um Banco no Brasil do século XIX. In:

SZMRECSÁNYI, Tamás; MARANHÃO, Ricardo. História de Empresas e Desenvolvimento Econômico. São Paulo: Hucitec; Abphe; Edusp; Imprensa Oficial, 2002. p. 304.

144 Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (doravante IHGB). Acréscimos às Biografias de D. Pedro I e D. Pedro II (Parte II). Série Produção Intelectual de Hélio Vianna. DL 1361.014. Também disponível no Jornal do Comércio. 12 de junho de 1964. p.4.

145 As alterações nas presidências de províncias realmente efetuadas foras as seguintes: Francisco Liberato de

Mattos foi nomeado em 11 de novembro de 1857 e substituído por José Francisco Cardoso em 2 de maio de 1859. Henrique de Beaureapaire Rohan, depois visconde de Beaurepaire Rohan, assumiu a presidência da Paraíba em 9 de dezembro de 1857 e foi substituído por Ambrósio Leitão da Cunha, depois barão de Mamoré, em 4 de junho de 1859. Em Alagoas, Ângelo Thomaz do Amaral assumiu em 19 de dezembro de 1857 e foi substituído por Agostinho Luís da Gama em 16 de abril de 1859. José Antônio Saraiva foi nomeado em Pernambuco em 27 de janeiro de 1859 e substituído por Luís Barbalho Muniz Fiuza, depois barão do Bom Jardim, em 15 de outubro de 1859. Cf. BRASIL. Câmara dos Deputados. Organisações e programmas ministeriaes desde 1822 a 1889: notas explicativas sobre moções de confiança, com alguns dos mais importantes Decretos e Leis, resumo historico sobre a discussão do Acto Addicional, Lei de Interpretação, Codigo Criminal, do Processo e Commercial, lei de terras, etc., etc., com varios esclarecimentos e quadros estatísticos. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1889.

146 Na análise das Conferências Ministeriais observa-se a preocupação com a nomeação do cargo de Inspetor da

Alfândega da Corte. Em 4 de fevereiro, o primeiro item de discussão referia-se a negativa do Conselho Ferraz para a função e a exposição de seus motivos. Em 18 de fevereiro, o assunto retorna a pauta. Apresentam-se então, para a escolha do imperador, os nomes do Conselheiro Herculano Ferreira Pereira, Paulino José Soares de Souza, Jerônimo José Teixeira Júnior, Conselheiro José Pedro Dias de Carvalho e Francisco de Paula Negreiros Saião Lobato. Cf. Arquivo Histórico do Museu Imperial (doravante AHMI). Resumo de Conferências Ministeriais do

ano de 1859. Coleção da Casa Imperial do Brasil (CIB). Maço 128, Documento 6329.

147 AHMI. Resumo de Conferências Ministeriais do ano de 1859. Coleção da Casa Imperial do Brasil (CIB). Maço

Apesar de uma perda progressiva de prestígio, a ação deste gabinete foi a de colocar em andamento alterações na política econômica de Olinda, agora sob comando do ministro da fazenda Sales Torres Homem. Como discorre Sérgio Buarque de Holanda, “tinha Sales ideias próprias sobre a questão financeira, que se opunham em tudo às de Souza Franco, e deixou transparece-las nas críticas que da tribuna lhe dirige”.148 O novo ministro, era ex-liberal149 e,

também “convertido” ao conservadorismo. Principal opositor de Souza Franco, era defensor do monometalismo e da centralização bancária. Neste sentido, a principal medida proposta por ele foi a reforma bancária, projeto de lei nº 50, apresentado à Câmara em 15 de junho de 1859, que “reafirmava os postulados do padrão-ouro e insistia no retorno do monopólio de emissão do Banco do Brasil”.150

Levada a plenário para primeira discussão em 8 de junho, os debates se alongaram e salientaram as intervenções do barão de Mauá, que via prejuízo aos seus negócios em franca ascensão, porquanto “a partir da década de 1850, além da atividade industrial, a ação de Irineu Evangelista de Souza foi guiada pelo binômio banco-serviços”151. Sua amizade com o antigo

ministro Souza Franco, com quem partilhava a ideia de que “somente a proliferação de bancos emissores facilitaria o crédito a longo prazo, canalizando os recursos ociosos do setor produtivo”152, agora não era bem vista por uma parcela de políticos.

Neste sentido, um dos principais aspectos que incendiaram as discussões referia-se ao papel do Poder Legislativo na aprovação dos bancos de emissão. Sales Torres havia firmado “o princípio de que só ao legislativo competia autorizar novos bancos emissores ou prorrogar o prazo dado àqueles que já existissem, enquanto a lei não marcasse regras que o executivo deveria seguir no exercício dessa faculdade”.153 Nesta lógica, as compreensões díspares da fala

148 HOLANDA, 2010, p.64.

149 Segundo Sacramento Blake, Francisco de Sales Torres Homem, “tendo pugnado em favor da conciliação dos

partidos políticos, inaugurada pelo marquês de Paraná, na propaganda dessa política, e sendo nomeado chefe de uma das diretorias do tesouro nacional, os liberais o agrediram com veemência por ter ele aceitado o cargo. Molestado por censuras e doestos que lhe atiravam, ao tempo que tivera uma divergência em matéria de finanças com o conselheiro Bernardo de Souza Franco, um dos chefes liberais, ostentando-se ele em favor da escola restritiva, de que era representante no Brasil o visconde de Itaboraí, um dos chefes conservadores, e quando era afagado pelos conservadores que o elegeram deputado pelo Rio de Janeiro, em 1857, aliou-se então com estes, e fez parte do ministério presidido pelo visconde de Abaeté em 1858 com a pasta da Fazenda”. Cf. BLAKE, Augusto Victorino Alves Sacramento. Diccionario bibliographico brasileiro. Rio de Janeiro: Typographia Nacional, 1883- 1902. (v.3). p.115.

150 GUIMARÃES, Carlos Gabriel. A presença inglesa nas finanças e no comércio no Brasil Imperial: os casos da

Sociedade Bancária Mauá, MacGregor & Cia. (1854-1866) e da firma inglesa Samuel Phillips & Cia (1808-1840). São Paulo: Alameda, 2012. p.194.

151 MOMESSO, Beatriz Piva. Mauá: um empresário na sociedade escravista. In: CAMPOS, Pedro Henrique

Pedreira; BRANDÃO, Rafael Vaz da Motta. Os Donos do Capital: a trajetória das principais famílias empresariais do capitalismo brasileiro. Rio de Janeiro: Autografia, 2017. p.30.

152 GUIMARÃES, 2002, p.304. 153 HOLANDA, 2010, p.64.

do ministro foram o mote de discussão deste dia, indicando certas preferências dos deputados no tocante ao caminho das finanças públicas. A este exemplo, a insinuação do conservador Teixeira Júnior indica pejorativamente a aproximação de Mauá com Souza Franco e os benefícios que este havia tido com a política econômica adotada pelo antigo ministro da Fazenda.154

O Sr. Teixeira Júnior: [...] – Voto pelo projeto, porque vedando ao poder executivo a prática abusiva de prodigalizar a faculdade de emissão...

O Sr. Carrão: – O poder executivo está no seu direito procedendo assim. O Sr. Teixeira Júnior: – Está no seu direito?

O Sr. Carrão: – Sim, senhor, porque o poder legislativo autorizou isso pelo seu silêncio.

O Sr. Barão de Mauá: – Abra o código do comércio.

O Sr. Teixeira Júnior: – É justamente no código do comercio que se fundou o chefe da escola a que pertencem os nobres deputados para proibir o uso desse pretendido direito: é na constituição política que o Sr. conselheiro Souza Franco se baseou para demonstrar que a aprovação de bancos de emissão só pode ser dada pelo poder legislativo. (Apoiados). 155

Apesar das tentativas de engavetar o projeto do governo, a matéria foi a votação nominal no fim desta sessão, sagrando-se aprovada por uma diferença de apenas onze votos, 61 a 50, demonstrando certa inabilidade do gabinete no encaminhamento de propostas polêmicas. Em carta confidencial de Abaeté remetida ao Imperador no dia seguinte, este comentou a dificuldade em consagrar a questão na Câmara.

Não houve meio, a que não recorrem a coligação dos interesses particulares para sobrepor-se aos tais princípios da ciência econômica, para conservar a posse de pretendidos direitos, que prejudicariam gravemente os interesses públicos, para desvairar a opinião do país, e para alucinar a inteligência da Câmara.

Todos estes meios foram baldados, e a Câmara dos Srs. Deputados acaba de dar mais uma prova irrefragável de sua ilustração e firmeza sancionando com seu voto a medida a que refiro.156

Não obstante a vitória na votação, que contou com a desaprovação de muitos conservadores, como Saraiva e Sá e Albuquerque, uma minuta de carta do presidente do Conselho ao Monarca, datada de alguns dias após a discussão da Câmara, torna a discorrer sobre as dificuldades encontradas pela medida fora do Parlamento, em especial a conjuntura de oposição que se formatava nas províncias.

Os adversários que o projeto encontra fora das Câmaras tem envidado todos os meios para contrariá-lo, para [aparentar] que a opinião do país o repele.

154 As relações entre o barão de Mauá e Bernardo de Souza Franco são explicadas no capítulo 3. 155 ACD. (v.3). Sessão de 8 de julho de 1859. p.74.

156 AHMI. Carta de Antônio Paulino Limpo de Abreu (visconde de Abaeté) à d. Pedro II, 9 de julho de 1859.

Para este fim esforçam-se por obter em algumas províncias representações de diferentes Corporações, e cidadãos, e alguns tem sido já apresentadas à ambas as Câmaras Legislativas.157

As missivas nos dão a tônica das atribulações encontradas por Abaeté em colocar em execução as propostas do governo, pressionado pelos setores financeiros prejudicados com o retorno ao exclusivismo de emissão. Da mesma maneira, indicam sua preocupação em