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As soluções do ordenamento jurídico brasileiro na colisão dos princípios da liberdade

No Brasil, o debate acerca da influência que os canais de comunicação exercem no meio jurídico é motivo de preocupação de muitos juristas, e não podia ser diferente. Compartilhamos muitas das discussões vivenciadas pela experiência norte-americana, e, ao mesmo tempo reservamos peculiaridades bem tupiniquins.

Uma pesquisa mais detalhada seria mais prudente para podermos comparar o ativismo jornalístico brasileiro e o norte-americano. O que podemos extrair com clareza do nosso cotidiano é que o ativismo e o poder das empresas de comunicação brasileiras (com destaque as de telecomunicações) são imperativos.

Assim, conforme, veremos no capítulo seguinte, a mídia brasileira, dotada de grande prestígio e inserida em uma lógica capitalista de mercado, enfrenta o desafio de apresentar um jornalismo de qualidade pautado por preceitos éticos de forma que ao mesmo tempo informe sobre às coberturas dos principais eventos e processos criminais e aja de forma coesa às

determinações jurídicas que visam garantir a imparcialidade e o bom andamento dos processos. Muito embora, o caráter preferencial, aqui também ofertado, à liberdade de informação e de expressão.

Por outro lado, o que vem se observando na realidade brasileira, é a ocorrência de dois julgamentos paralelos e, possivelmente, dissonantes. O primeiro muito mais preocupado em apresentar uma verdade em tempo recorde de forma a satisfazer os anseios da sociedade (mídia) e o segundo primando por uma maior cautela (embora flexibilizada em tempos vigentes) na análise de provas, dando ampla margem para teses defensivas (Poder Judiciário) e respeitando os ditames do devido processo legal.

Não é difícil imaginar que estes dois “julgamentos” serão a todo momento comparados. Dessa forma, ao olhar do leigo se observará facilmente a maior eficiência de resposta da mídia na análise dos eventos criminais, o que, sem dúvida importará, em enorme pressão à decisão ainda pendente do Judiciário.

Assim, para coibir toda a problemática da quebra de imparcialidade do juízo, mas ao mesmo tempo garantir o exercício da liberdade de expressão, a aplicação das técnicas de ponderação nos permite afirmar, de acordo com Ana Paula de Barcellos71, que em um primeiro momento deveremos dar prevalência às regras.

Schreiber72 exemplifica essa ideia ao dizer que em uma eventual colisão entre os princípios do julgamento justo e da liberdade de expressão, se verificado a hipótese de veiculação de provas ilícitas, deverá o Magistrado preservar o devido processo legal, uma vez ser a proscrição provas obtidas por meios ilícitos uma regra.

71

BARCELOS, Ana Paula de. Ponderação, racionalidade e atividade jurisdicional. Rio de Janeiro: Renovar, 2005.

72

SCHREIBER, Simone. A Publicidade Opressiva de Julgamentos Criminais. Rio de Janeiro: Renovar, 2008, p. 381

Na ocasião de não se verificar a clara presença de uma regra, deverá o juízo preocupar-se mais com o direito do acusado em ter um julgamento justo, uma vez que, embora a liberdade de expressão seja um direito fundamental que abarca o princípio da dignidade da pessoa humana, entende o Supremo Tribunal Federal que ao afrontar o direito do acusado a ser julgado nos limites do devido processo legal, o Poder Judiciário ferirá mais a dignidade da pessoa humana do que na hipótese de adotar alguma medida restritiva ao exercício do direito de informação ou expressão.

Por óbvio, conforme já exaustivamente tratado ao longo desse trabalho, as técnicas de ponderação esposadas no capítulo primeiro permitem valorar os conceitos e aplica-los da forma mais efetiva possível, rechaçando a ideia de “tudo ou nada” e utilizando-se da proporcionalidade em sentido estrito para avaliar se a restrição à um desses princípios se faz necessária, justificável e suficiente.

Nesse sentido o ordenamento jurídico brasileiro tem buscado adotar soluções para esse conflito que, a exemplo do que é feito nos Estados Unidos, não interferem diretamente na liberdade de expressão, tais como desaforamentos (com redação expressa no artigo 424 do Código de Processo Penal), incomunicabilidade dos jurados (com previsão no artigo 458, §1º do Código de Processo Penal), sequestro do júri, adiamentos do julgamento, vedação de introdução de provas advindas da investigação de jornalistas durante o processo.

Não sendo suficientes tais medidas, o sistema jurídico brasileiro tem se permitido adotar restrições que vão de encontro ao princípio da liberdade de expressão, sob o argumento da maior preservação da dignidade da pessoa humana (direito a um julgamento justo estaria mais atrelado a dignidade da pessoa humana do que a liberdade de expressão).

Dessa forma, adota-se no Brasil mecanismos como o da ampliação do direito de resposta, permitindo retratações às pessoas cujas honras e intimidades foram indevidamente violadas.

Da mesma forma, ordens judiciais que proíbem a divulgação de provas obtidas por meios materialmente ilícitos, tais como interceptações telefônicas sem autorização judicial, depoimentos obtidos por meio de tortura, entre outros; punições, geralmente de cunho

indenizatório dadas a quem propagar manifestações que atingem a honra do acusado ou indiciado; restrições à publicidade do julgamento, conforme disposições dos artigos 5º, LX e 93, IX da Constituição Federal, que conferem a lei a possibilidade de limitar a presença de pessoas nas sessões de julgamento “em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação”73, tais como limitações ao número de jornalistas presentes à sala de audiência e imposições de sigilo a determinados procedimentos de forma a preservar às partes.

73

Constituição da República Federativa do Brasil (1988). Promulgada em 05 de outubro de 1988. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm Acesso em: 14 nov. 2017

3. O PODER DA IMPRENSA BRASILEIRA: INTERESSES ECONÔMICOS E

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