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Aspectos a Considerar no Processo do Envelhecimento

2.2 2 Envelhecimento e Políticas Públicas no Brasil

3.4 Aspectos a Considerar no Processo do Envelhecimento

Os estudos sobre o processo do envelhecimento abordam a temática a partir da ótica de teorias que enfocam predominantemente uma determinada área (biológica, psicológica e social), embora, entre estes aspectos, o caráter biológico do envelhecimento seja o que se destaque por se mostrar mais visível(108). Juntamente com a preocupação com a autonomia e sua manutenção, o

40 processo de envelhecimento apresenta desafios quanto às variáveis que se destacam nos campos biológico e social (Apêndice 3).

Partindo-se da premissa de que o processo de envelhecimento está circunscrito a três categorias de fatores principais, biológicos, psicológicos e sociais, as teorias relacionadas a estes fatores e aos vários aspectos do processo de envelhecimento cumprem o papel de estabelecer bases conceituais para o entendimento, visualização e explicação dos fenômenos do envelhecimento(109-111).

As teorias genéticas (participação dos genes) e estocásticas (perda da funcionalidade e declínio fisiológico progressivo) estão entre no rol das teorias que destacam o aspecto biológico do envelhecimento e que, pela diversidade e segmentação de seus componentes, são descritas e elaboradas com enfoque no sistema biológico do corpo humano(108, 112).

As teorias psicológicas do envelhecimento emergiram como parte da psicologia do desenvolvimento, no intuito de estudar/descrever as necessidades do ser humano em processo de envelhecimento, no que se refere às mudanças. Têm como objetivo otimizar os processos adaptativos, explicar formas de enfrentamento dos problemas e descrever as estratégias de enfrentamento, de acordo com a realidade das pessoas em processo de envelhecimento, assim como de suas famílias e de seu contexto social(113, 114).

As teorias sociais do envelhecimento, no intuito de entender as observações e descobertas decorrentes do processo de envelhecimento, permitem que os resultados científicos das investigações empíricas forneçam uma base conceitual para explicar os fenômenos sociais do envelhecimento com o objetivo de entendê-los, compreendê-los e explicá-los.

Examinando os aspectos individuais e relacionais do envelhecimento, as principais teorias sociais do envelhecimento (Apêndice 3), formuladas pelos enquadramentos epistemológicos positivistas ou interpretativos, originam-se a partir da primeira metade do século passado e, pela especificidade e contexto histórico de cada uma delas, se complementam e permitem interpretar aspectos do processo de envelhecimento(26, 115-117).

A partir de uma visão prioritariamente biogerontológica(146)

―o envelhecimento é conceituado como um processo dinâmico e progressivo, no qual há modificações morfológicas, funcionais, bioquímicas e psicológicas que determinam perda da capacidade de adaptação do indivíduo ao meio ambiente, ocasionando maior vulnerabilidade e maior incidência de processos patológicos que terminam por levá-lo à morte‖)(7).

O surgimento de doenças crônico-degenerativas, de incapacidade funcional, a diminuição da capacidade cognitiva, entre outros fatores, oportunizam o aparecimento de fragilidades que são

41 percebidas: pelos idosos como um acúmulo de perdas. São exemplo de causas de perdas percebidas: alteração no peso corporal em decorrência da perda de massa muscular; diminuição na capacidade aeróbia e anaeróbia; diminuição na força dos membros; diminuição na amplitude e na velocidade da passada; diminuição na capacidade de concentração e atenção ao executar atividades motoras; diminuição da mobilidade, equilíbrio e coordenação e diminuição da acuidade visual e auditiva(118-121).

O processo de transição epidemiológica(42, 122) que oportunizou o aumento da expectativa de

vida trouxe como consequência a convivência de pessoas na sociedade com uma nova realidade pessoal na qual as doenças crônicas emergem.

Entre as principais doenças crônicas que afetam os idosos, estão: doenças cardiovasculares, hipertensão arterial, diabetes, câncer, doença pulmonar obstrutiva crônica- DPOC, doenças musculoesqueléticas (artrite e osteoporose), doenças mentais (demência e depressão), cegueira e diminuição da visão. No Brasil, temos a estimativa de a ocorrência de 58,5% das mortes terem associação com as doenças crônicas não transmissíveis, bem como da associação direta com fatores de risco como inatividade física, excesso de peso, tabagismo, alcoolismo e alimentação inadequada(4, 123, 124).

A presença das doenças crônicas, aliada às próprias características do processo do envelhecimento e ao uso de fármacos, é fator limitante ou que repercute sobre a autonomia e/ou situações que requerem do idoso a utilização e a intensificação do uso de mecanismos de coping(155). Daí a importância de, numa abordagem multidisciplinar, se obterem informações a cerca

das condições subjetivas de saúde com os próprios idosos, tendo em vista que esta é uma das variáveis que sinaliza para o impacto percebido do processo de envelhecimento sobre as condições de da pessoa idosa(125).

A desvinculação das pessoas com 60 anos de idade ou mais de suas atividades laborais, em que o marco principal é a aposentadoria, é o momento desencadeador de situações peculiares para os idosos, a saber: 1) o surgimento de uma lacuna de tempo na programação de seu dia e a necessidade de preenchimento desta lacuna com outras atividades; 2) a perda de renda no orçamento familiar, uma vez que a condição de não pertencer mais à faixa etária economicamente ativa da população reduz os vencimentos dos aposentados; 3) o aumento de gastos com a saúde, em locais onde o modelo de atendimento é baseado na medicalização e na hospitalização do atendimento; 4) a falta de preparo para vivência do processo de envelhecimento por parte das pessoas; 5) o deslocamento da posição de chefe de família e de provedor financeiro do grupo cuja

42 atuação é assumida por outro(s) membro(s) da família que emerge(m) e assume(m) esta função nuclear e 6) a não valorização da promoção da saúde em etapas de vida anteriores.

Considerando que a pirâmide etária mundial sinaliza para a feminização do envelhecimento, o processo do envelhecimento favorece a intensificação da dicotomia entre as oportunidades de homens e mulheres dependendo da cultura em que eles estão inseridos. Aquelas mulheres que convivem com a dupla jornada, ou seja, conciliam as atividades profissionais com a gerência das atividades do lar, ao se aposentarem, encontram nas atividades do lar um lócus de referência para redimensionarem seu tempo(34, 39).

As causas intervenientes que influenciam na maior sobrevida de mulheres em idades de envelhecimento em relação aos homens podem ser sintetizadas pelas diferenças de exposição aos riscos ocupacionais; maiores taxas de mortalidade por causas externas entre os homens, principalmente na faixa etária dos 14 aos 24 anos; as diferenças no consumo de álcool (teor alcoólico) e tabaco (quantidade e teor de nicotina) e diferenças de atitudes em relação às doenças, ou seja, as mulheres utilizam os serviços de saúde com mais frequência e participam mais das atividades de prevenção e controle das doenças(40, 125).

O processo do envelhecimento tem também desencadeado alterações na estruturação do núcleo familiar, a saber: 1) quando o idoso perde sua autonomia e o núcleo familiar não dispõe de tempo para supri-lo (nestes casos, o núcleo familiar, para prover a demanda de autocuidado contínuo, insere um cuidador ou um profissional em sua estrutura para obter a prestação do cuidado, quer ele seja dispensado no domicilio ou em serviços ambulatoriais); 2) quando, por processos patológicos, há necessidade de vigilância contínua do idoso ou provimento de cuidados especializados, neste caso, a desvinculação do núcleo familiar ocorre por incapacidade de a família compatibilizar horários e/ou prover os mesmos; 3) quando o nível de interação interpessoal do idoso está deteriorado; neste caso, a desvinculação familiar tende a ocorrer pela diferença de necessidades do grupo; 4) quando o idoso perde o contato com seus contemporâneos, a desvinculação familiar tende a ocorrer pela insustentabilidade da sobrecarga emocional que recai sobre poucas pessoas dentro do núcleo familiar (polarização das atenções e do atendimento das necessidades); 5) pela lentidão de pensamento e ações que são intensificadas com o decorrer do processo de envelhecimento, a desvinculação do núcleo familiar tende a ocorrer pela dicotomia entre o tempo utilizado e o oferecido pelos membros do núcleo familiar na convivência(125, 126).

Nos casos anteriormente mencionados, a busca de alternativas ou o desfecho adotado pela família para conciliar o atendimento das necessidades de autocuidado do idoso são, entre outros: 1) a acomodação do idoso dentro da estrutura familiar, proporcionando-lhe reduzida estimulação e/ou

43 comprometendo o resgate da autonomia do mesmo para as atividades que possui independência; 2) o deslocamento do idoso para casas de apoio com o objetivo de assegurar aos familiares a independência para ações pessoais; 3) a busca de suplementação de cuidados no próprio domicílio; 4) a tendência em justificar a necessidade de internação do idoso em instituições hospitalares em situações em que o atendimento domiciliar seria compatível com a demanda e/ou com a ação terapêutica indicada; 5) o provimento integral dos cuidados do idoso com deslocamento do núcleo familiar em função de suas demandas (o que desencadeia em médio e longo prazos a doença do cuidador) e 6) o provimento dos cuidados do idoso e a suplementação por cuidador e/ou profissional em casos de necessidade com integração e revezamento do núcleo familiar no provimento desses cuidados.

Na abordagem do processo do envelhecimento, há necessidade de utilização de terminologias e concepções capazes de traduzir a individualidade de como o processo é vivido pelas pessoas com 60 anos de idade ou mais.

O índice de Katz(126), ao mensurar a inserção das pessoas nas atividades da vida diária,

possibilita caracterizar o grau de (in)dependência das pessoas com 60 anos de idade. Isso porque permite identificar se uma pessoa possui capacidade de realizar algo com seus próprios meios e possui autonomia. A autonomia, neste contexto, será traduzida pela capacidade da pessoas com mais de 60 anos de idade para tomar decisões, comandar o direcionamento de ações e acontecimentos e fazer suas próprias escolhas. O termo autonomia pressupõe principalmente a liberdade, a independência ou diminuição do grau de dependência e a decisão individual em realizar determinada tarefa, relacionando-se com a locomoção e com a mobilidade e, consequentemente, com a execução das AVDs(127, 128).

O conjunto de atividades realizadas na vida diária retrata, na execução cotidiana da atividade ou do movimento corporal, um componente da manutenção da saúde, da mobilidade, da autonomia, da funcionalidade, agindo como prevenção às possíveis limitações progressivas da capacidade funcional dos indivíduos, com repercussões sobre a realização das AVDs e da vida quotidiana.

O impacto da não realização de atividade física, no aspecto do sistema corporal como um todo ou de grupos articulares e musculares, em qualquer idade, desencadeia declínio e/ou dificuldade sobre a execução de determinado movimento corporal, gerando um ciclo vicioso autoalimentado de restrições e impossibilidades progressivas(129, 130). Um exemplo é a não adesão à

44 inadaptação física, psíquica e social do indivíduo,(80, 131) que tem contribuído para a incidência e a

prevalência de quedas entre os idosos.

As quedas, evento frequente que atinge também os idosos relativamente saudáveis, possuem múltiplos fatores de risco capazes de crescer exponencialmente à medida que a idade e o nível de fragilidade aumentam.

Além de favorecer a ocorrência de fraturas e de lesões que requerem longo período para recuperação e de ser fator interveniente para a morte entre idosos, a queda constitui um indicador de fragilidade, sendo responsável pelo aparecimento do medo de cair novamente, pela ocorrência de depressão e pela perda de confiança e da capacidade funcional para executar atividades básicas da vida diária(132-135).

As intervenções para prevenção de quedas têm exigido a conciliação entre conhecimento, política e ações, a exemplo de: modificação e adaptação ambiental; avaliação sistemática dos cuidados de saúde; incremento de pesquisa de novas drogas; avaliação das prescrições medicamentosas; adoção de estilos de vida saudáveis; capacidade de mobilidade e treinamento de flexibilidade.

Contemplar o respeito pela individualidade biológica, cumprir as etapas de adaptação aos níveis de sobrecarga (progressão e especificidade) e possuir frequência na execução das atividades são componentes a serem considerados na abordagem gerontológica do processo de envelhecimento(136-138).

Na abordagem sociológica ou psicológica, a avaliação das formas de enfrentar acontecimentos reais, probabilísticos ou imaginários possibilita captar não somente indícios do comportamento e atitude dos idosos, como também constitui autoavaliação que os idosos fazem a respeito desta etapa de vida(139).