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ASPECTOS GERAIS DA EXECUÇÃO

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CAPÍTULO III – EXECUÇÃO NAS AÇÕES COLETIVAS

3.1 ASPECTOS GERAIS DA EXECUÇÃO

De acordo com a lição de Ada Pellegrini Grinover, a efetividade processual e sua instrumentalidade material são os temas mais caros ao moderno processo brasileiro, uma vez que elas podem transformar o processo em um instrumento envolvido com a realidade social e, desse modo, capaz de solucionar as controvérsias de direito material com efetividade (GRINOVER, 2014b, p. 184).

Com efeito, os fins últimos da jurisdição são assegurados pela técnica processual. Sendo assim, ela deve ser revista constantemente para garantir uma prestação jurisdicional mais célere e eficaz (GRINOVER, 2014b, p. 184). Em matéria de jurisdição coletiva, houve a necessidade de releitura de alguns conceitos e institutos do direito processual civil para aprimorar a técnica processual e torná-la adequada à solução de conflitos de massa. Esse movimento começou na doutrina e inevitavelmente alcançou a legislação (MARTINS, 2014, p. 1216).

Para evitar que o processo cause um resultado ineficaz (uma decisão inútil), inadequado (não existir correspondência entre a pretensão de direito material e a tutela conferida) ou injusto (se limitar ao exercício do contraditório) ou para corrigir o seu trâmite, é imprescindível utilizar os institutos processuais, como as condições da ação. Ressalte-se que essas preocupações devem estar presentes a todo momento para retificar falhas, pois não há preclusão quanto às condições da ação ou às garantias do devido processo legal, as quais devem ser asseguradas de forma ampla às partes (GRINOVER, 2014b, p. 184).

Todas essas inquietações apenas reforçam a ideia de que o acesso à justiça não pode ser uma promessa falsa. Afinal, todo provimento jurisdicional que não tenha utilidade prática é verdadeiro desprestígio para o processo e retrocesso para a garantia constitucional de acesso à justiça, assegurada pelo artigo 5º, LXXVIII. Nesse sentido, facilitar esse acesso por meio de ações coletivas é um grande avanço para o direito processual brasileiro (GRINOVER, 2014b, p. 184).

Ao contrário do que se verifica em outros países, a tendência aqui é a passagem de um processo individual para o processo coletivo e social, o que de certa forma acompanha as mudanças ocorridas no direito material para aproximá-lo da visão constitucional (GRINOVER, 2014b, p. 186).

Barbosa Moreira destaca a informação de que a maioria dos atos economicamente lesivos julgados pelo Poder Judiciário relacionam-se a casos de danos pecuniários produzidos ao patrimônio público, tais como a elevação irregular da remuneração de servidores e de ocupantes de mandatos eletivos, benefícios concedidos ilegalmente a servidores, contratos administrativos celebrados com evidente desvantagem financeira para a administração pública, entre outros (MOREIRA, 2014, p. 87).

A par dessas considerações feitas para ações que envolvem o poder público, muitas das lesões causadas ao interesse coletivo são de fato irreparáveis. Um patrimônio histórico destruído, por exemplo, não pode ser restaurado exatamente como era antes. Por mais que seja fixada uma reparação financeira (indenização), não será capaz de compensar um dano que não pode ser medido por padrões econômicos.

Em virtude disso, ainda mais em relação à tutela coletiva, Barbosa Moreira defende ser necessária uma efetiva tutela repressiva, com a imposição de sanções e execução forçada da condenação. Como o mais importante é evitar a ocorrência do dano, a tutela jurisdicional deve assumir o caráter preventivo (MOREIRA, 2014, p. 89).

Entretanto, deve-se ressaltar que a preferência pelos processos coletivos requer eficácia prática ao menos igual à que seria obtida em processos individuais. Uma sentença coletiva tem de servir para facilitar o acesso à justiça e, se cada titular individual do direito lesionado for obrigado a exercer os mesmos atos processuais de uma ação comum para liquidar e executar uma sentença coletiva, esta teria sido inútil, sem qualquer vantagem para a sociedade (GRINOVER, 2014b, p. 186).

Em suma, o processo coletivo busca uma maior realização concreta, de modo que danos praticados contra centenas, milhares ou milhões de pessoas possam chegar até o Judiciário concentrados apenas em um ou alguns processos, trazendo economia processual e coerência no julgamento de casos semelhantes (MENDES, 2010, p. 287).

Na concepção tradicional, a execução ou o cumprimento de sentença:

(...) consiste no conjunto de atos estatais por meio dos quais, com ou sem o concurso da vontade do devedor, invade-se o seu patrimônio para, à custa dele, realizar-se o resultado prático desejado pelo direito objetivo material. (LEONEL, 2013, p. 408).

Em processos coletivos, a importância da execução é potencializada por vários fatores, como a abrangência dos direitos tutelados, a complexidade dos atos executórios e as dificuldades na execução de obrigações de fazer ou não fazer – a denominada execução imprópria (LEONEL, 2013, p. 408).

O processo civil tradicional não pode ser aplicado às ações coletivas, especialmente na fase de cumprimento de sentença, de modo idêntico ao previsto para ações individuais. Os interesses metaindividuais tem suas características próprias, consoante já demonstrado no decorrer do texto. Assim:

A execução na tutela coletiva, seja em defesa dos direitos difusos e coletivos, seja em defesa dos direitos individuais homogêneos, é instituto que se encontra dentro desse contexto. Os poucos dispositivos trazidos pelo microssistema dos processos coletivos são insuficientes para proporcionar uma defesa adequada, devendo ser aplicado o CPC de forma complementar. Todavia, ao ser aplicado à tutela coletiva, o CPC precisa de correta interpretação, sob pena de incidir em grave erro que tire a eficiência da defesa dos direitos transindividuais. (SILVA, 2009, p. 7).

A respeito de como a jurisprudência trata o tema em questão, vale ressaltar que já houve o reconhecimento de não ser possível a execução das sentenças coletivas da mesma forma utilizada para os processos individuais, uma vez que a fase de cumprimento de sentença contém elevada carga cognitiva. No caso dos direitos individuais homogêneos, por exemplo, deve-se promover a individualização e liquidação do valor indenizatório devido e, ainda, a titularidade do exequente em relação ao próprio direito material (STJ, 1ª Seção, REsp 475566/PR, rel. Min. Teori Albino Zavascki, julgado em 25/08/2004, DJ, 13/09/2004, p. 168). A conclusão exposta acima é reforçada pelo entendimento de Ricardo de Barros Leonel. O autor afirma que o processo coletivo de cognição (a fase de conhecimento da demanda) foi detalhadamente tratado na legislação. Porém, o mesmo não ocorreu com a execução, o que certamente causa alguns tipos de transtornos (LEONEL, 2013, p. 409).

Isso porque o pronunciamento judicial não pode ficar restrito ao simples reconhecimento ou não de que a obrigação deve ser cumprida. Também precisa conferir especial atenção no encaminhamento das medidas executivas, do que pode resultar no sucesso ou no fracasso do cumprimento da sentença coletiva (LEONEL, 2013, p. 410).

O processo sincrético (aquele que suprimiu o intervalo que existia entre o processo de conhecimento e o processo de execução, eximindo o credor de ajuizar um novo processo autônomo apenas para executar a obrigação reconhecida na sentença) foi introduzido no ordenamento pelo artigo 11, da Lei n. 7.347/1985, que criou o regime de tutela específica das obrigações de fazer e não fazer (SILVA, 2009, p. 9). O artigo citado estabelece que o juiz pode determinar o cumprimento da prestação devida ou a paralização da atividade nociva em ações que visem ao cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer. Do contrário, o juiz pode agir de ofício para ordenar a execução específica ou cominar multa diária.

Mais tarde, o artigo 84, do Código de Defesa do Consumidor e “(...) as reformas processuais ocorridas em 1994 e 2002 desenvolveram e expandiram a aplicação dessa técnica.” (SILVA, 2009, p. 9). Segundo o artigo mencionado, o juiz deve conceder a tutela específica das obrigações de fazer e não fazer ou determinar providências que assegurem o resultado prático equivalente. Quanto à conversão da obrigação em perdas e danos, só será admissível se o interessado assim optar ou se for impossível a tutela específica ou a obtenção do resultado prático equivalente. O arbitramento de indenização não impede a aplicação de multa.

Ademais, o juiz pode conceder a tutela requerida liminarmente ou depois da manifestação do réu, atendidos os requisitos legais (relevante fundamento da demanda e justificado receio de ineficácia do provimento final). Pode, ainda, impor multa diária ao réu, de ofício, e determinar medidas necessárias para assegurar a tutela específica ou o resultado prático equivalente, tais como busca e apreensão, remoção de pessoas e coisas, desfazimento de obra, impedimento de atividade nociva e requisição de força policial.

As primeiras modificações no Código de Processo Civil de 1973 ocorreram em relação às obrigações de fazer, não fazer e de entregar, sendo as decisões judiciais autoexecutáveis, nos termos dos artigos 461 e 461-A do aludido Código.37

A execução das obrigações de pagar quantia certa só se tornou uma fase posterior ao processo de conhecimento após a edição da Lei n. 11.232, de 22 de dezembro de 2005, que acrescentou os artigos 475-I e seguintes do Código de Processo Civil de 1973.38

Desse modo, há uma distinção na forma de cumprimento de sentença: as obrigações de fazer, não fazer e entregar seguem o procedimento regulado pelos artigos 461 e 461-A do Código de Processo Civil. Já as obrigações de pagar seguem o disposto nos artigos 475-I e seguintes do mesmo Código. Essas modificações afetam diretamente a tutela coletiva (SILVA, 2009, p. 10).

37 O artigo 461, caput do Código de Processo Civil de 1973 corresponde ao artigo 497 do Novo Código de Processo

Civil (Lei n. 13.105/2015) (BUENO, 2015, p. 331).

O artigo 461, § 1º do Código de Processo Civil de 1973 corresponde ao artigo 499 do Novo Código de Processo Civil (Lei n. 13.105/2015) (BUENO, 2015, p. 332).

O artigo 461, § 2º do Código de Processo Civil de 1973 corresponde ao artigo 500 do Novo Código de Processo Civil (Lei n. 13.105/2015) (BUENO, 2015, p. 332).

O artigo 461-A, caput e § 1º do Código de Processo Civil de 1973 corresponde ao artigo 498 do Novo Código de Processo Civil (Lei n. 13.105/2015); o artigo 461-A também corresponde ao novo artigo 538 (BUENO, 2015, p. 332 e 369).

O artigo 461, caput e §§ 4º e 5º corresponde ao novo artigo 536 do Código de Processo Civil (BUENO, 2015, p. 367).

O artigo 461, §§ 4º a 6º corresponde ao novo artigo 537 do Código de Processo Civil (BUENO, 2015, p. 368).

38 No Novo Código de Processo Civil (Lei n. 13.105/2015), houve completa alteração da ordenação das disposições

contidas nos artigos 475-I e 475-J do Código de Processo Civil de 1973. Assim, o artigo 475-I, caput (atual CPC) corresponde ao artigo 513 (novo CPC); o artigo 475-I, § 2º (atual CPC) corresponde ao artigo 509 (novo CPC); o artigo 475-J (atual CPC) corresponde ao artigo 523 (novo CPC) (BUENO, 2015, p. 340, 338 e 352).

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