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Aspectos gerais dos Direitos de Propriedade Intelectual

PROPRIEDADE INTELECTUAL E SISTEMA DE MARCAS

2.1 Aspectos gerais dos Direitos de Propriedade Intelectual

Em termos gerais, a “propriedade” pode ser sistematizada como material e imaterial. A “propriedade material” consubstancia-se nas coisas presentes no mundo físico (concretas), distinguindo-se da “propriedade imaterial” (que caracteriza-se por seu caráter abstrato), estando ou não presentes no mundo físico; esta modalidade é oriunda da personalidade ou do intelecto humano.

Neste raciocínio, a propriedade intelectual, é espécie do gênero propriedade imaterial, que por sua vez integra a classe das propriedades. Neste aspecto, o Direito protege a situação real que vincula o originador – criador ou inventor – à sua obra ou invento, tutelando as atividades intelectuais criativas ou inventivas.

O direito à propriedade está visivelmente previsto na Carta Federal de 1988, em seu artigo 5º, que propugna, todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à propriedade.

A previsão da propriedade como direito fundamental abrange as diversas manifestações que essas possam ter, superando as antigas concepções adotadas no direito privado. Neste sentido, consiste o sentido amplíssimo que a terminologia propriedade, que

deve corresponder no texto constitucional, extrapolando as definições constantes do direito privado97.

No entendimento de Gilmar Mendes, observando a disciplina no direito alemão, não somente bens móveis ou imóveis estão protegidos, mas também outros valores patrimoniais. Articula que outros direitos estão inclusos no conceito de propriedade, como os direitos de marca.98

Portanto, não somente os direitos de propriedade inerentes aos bens materiais, mas o direito de propriedade relativos aos bens imateriais, necessitam de instrumentos jurídicos que o protejam.

Vislumbrando este cenário atual dos direitos, uma leitura contemporânea elenca a propriedade intelectual como direito fundamental, encontrando expresso amparo constitucional, no art. 5º, incisos XXVII, XVIII e XVIX da presente Carta Republicana: “aos autores pertence o direito exclusivo de utilização, publicação ou reprodução de suas obras, transmissível aos herdeiros pelo tempo que a lei fixar”; “são assegurados, nos termos da lei, a proteção às participações individuais em obras coletivas e à reprodução da imagem e voz humanas, inclusive nas atividades desportivas, e o direito de fiscalização do aproveitamento econômico das obras que criarem ou de que participarem aos criadores, aos intérpretes e às respectivas representações sindicais e associativas”; e “a lei assegurará aos autores de inventos industriais privilégio temporário para sua utilização, bem como proteção às criações industriais, à propriedade das marcas, aos nomes de empresas e a outros signos distintivos, tendo em vista o interesse social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do País”.

Desta feita sustenta-se que o direito de propriedade intelectual tem designação fundamental, visto que garante tanto ao originador, ou àquele titular do direito, quanto à sociedade a possibilidade de proteção e acesso ao resultado da produção intelectual.

Em sentido igual, a Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948 indica em seu artigo 27º que:

toda a pessoa tem o direito de tomar parte livremente na vida cultural da comunidade, de fruir das artes e de participar do progresso científico e nos benefícios que deste resultam; todos tem direito à proteção dos interesses morais e materiais ligados a qualquer produção científica, literária ou artística da sua autoria.

97 MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de

Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 468 - 469.

98 MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de

Importa expor uma relevante questão: direito do originador ou direito da sociedade, qual prepondera sobre a bem imaterial?

Respondendo, Denis Borges Barbosa e Karin Grau-Kuntz afirmam haver tendências de prevalência tanto para o originador quanto para a sociedade, concluindo que “a individualidade e universalidade e interdependência dos direitos humanos entre si.”99

É salutar destacar que o direito fundamental à propriedade intelectual não se limita ao bem já dotado de exclusividade, seja qual for o mecanismo que o conferiu exclusividade100. Portanto, “ninguém é menos protegido pelos direitos humanos ou fundamentais pelo fato de, tendo criado, ainda não depositou o pedido de patente.”101

As concessões de direitos de propriedade intelectual limitam a livre concorrência, reflexamente limitando a livre iniciativa, isto porque concede direitos de exclusividade sobre determinados bens imateriais ao titular da propriedade intelectual. A exclusividade da exploração destes direitos e de defesa dos mesmos contra atos ilícitos, não somente protegem direitos individuais, mas regulam, paralelamente, uma harmonia nos empreendimentos no âmbito econômico e social.

Destarte, se por uma perspectiva há a restrição da livre concorrência, face à proteção dos direitos de exclusividade conferidos a determinada propriedade intelectual, por outra há a conformação desse direito de exclusividade a determinados objetivos aos quais a propriedade industrial deve obedecer, quais sejam: interesse social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do país.

Na égide do direito fundamental à proteção da propriedade intelectual, não existem apenas concessões ou restrições impostas àquele que se pretende portador, mas partindo da emissão de normas de conformação de direitos fundamentais102, existe também a busca da concretização desse direito frente a sociedade. Esta concretização, ou adaptação à vida real, torna-se possível a partir do momento que o público e o privado obedecem o

99 BARBOSA, Denis Borges; GRAU-KUNTZ, Karin. Ensaios sobre o Direito Imaterial: estudos dedicados a

Newton Silveira. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009. p. 395.

100 A proteção jurídica da Propriedade Intelectual não está restrita à titularidade jurídica almejada via processos administrativos ou judiciais. Esta proteção não se configura somente pela concessão do título, incluem-se, também, a possibilidade de produção e o acesso ao resultado da produção intelectual.

101 BARBOSA, Denis Borges; GRAU-KUNTZ, Karin. Ensaios sobre o Direito Imaterial: estudos dedicados a

Newton Silveira. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009. p. 396.

102 Neste sentido, Alexandre Reis Siqueira Freire (2004), afirma que as norma de conformação – ou configuração – referentes aos direitos fundamentais complementam, concretizam, definem o conteúdo de proteção do direito fundamental, dando-lhe precisão.

conselho de respeito à função social e ao desenvolvimento tecnológico e econômico, previsto do texto constitucional.

Assim, consoante ao afirmado, cabe perfeitamente os preceitos normativos dos arts. 218 e 219 da Constituição Federal, sendo esses, que “o Estado promoverá e incentivará o desenvolvimento científico, a pesquisa e a capacitação tecnológicas”, e que “o mercado interno integra o patrimônio nacional e será incentivado de modo a viabilizar o desenvolvimento cultural e socioeconômico, o bem-estar da população e a autonomia tecnológica do País, nos termos de lei federal”.

Destaque ao Código Civil no art. 1.228, a advertência que o direito de propriedade constitui-se o poder do proprietário, de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.

Nesse sentido, consoante ao que afirma Pontes de Miranda103, o direito da propriedade pntelectual preexiste à proteção buscada por meio desta, e ainda, que o conteúdo do Direito da Propriedade Intelectual é a exploração, seja qual for sua manifestação. Ensina, o referido autor, que “o conteúdo do direito é a exploração, o usus, o fructus, a que se junte o abusus”.104

Portanto, decorre dessas considerações a idéia de que: a propriedade intelectual é uma modalidade de propriedade sobre o bem imaterial; o bem neste caso é imaterial, pois a tutela jurídica recai sobre coisa incorpórea, abstrata; esta coisa incorpórea é tratada como bem na medida em que lhe é atribuído, naquele momento e território, determinado valor, mensurado por sua raridade, originalidade ou utilidade por um interessado.

Após aludir-se sobre a previsão do direito a propriedade intelectual no diploma constitucional, assim como realçado alguns tópicos referentes o direito a propriedade em sua acepção ampla, salutar é o destaque da definição daquele direito na Convenção do OMPI105, assim redigindo106:

103 PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcante. Tratado de Direito Privado, vol. 7. Parte Especial. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1983. p. 252.

104 PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcante. Tratado de Direito Privado, vol. 7. Parte Especial. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1983. p. 252.

105 O OMPI (Organização Mundial da Propriedade Intelectual) ou, em inglês, WIPO (World Intellectual

Property Organization) definiu o conceito de propriedade intelectual após a consolidação da discussão acerca

do tema em diversas convenções, como a Convenção de Paris, em 1883, e a Convenção de Berna, em 1886, assim como a de outras convenções e tratados. O OMPI figura, atualmente, como órgão autônomo integrante do sistema das Nações Unidas, ao passo que discute e delibera sobre assuntos que envolvam propriedade intelectual. 106 The Convention Establishing the World Intellectual Property Organization (1967) gives the following list of subject matter protected by intellectual property rights: literary, artistic and scientific works; performances of performing artists, phonograms, and broadcasts; inventions in all fields of human endeavor; scientific discoveries; industrial designs; trademarks, service marks, and commercial names and designations; protection

a soma dos direitos relativos às obras literárias, artísticas e científicas, às interpretações dos artistas intérpretes e às execuções dos artistas executantes, aos fonogramas e às emissões de radiodifusão, às invenções em todos os domínios da atividade humana, às descobertas científicas, aos desenhos e modelos industriais, às marcas industriais, comerciais e de serviço, bem como às firmas comerciais e denominações comerciais, à proteção contra a concorrência desleal e todos os outros direitos inerentes à atividade intelectual nos domínios industrial, científico, literário e artístico.107

Destarte, uma vez apresentados estes aspectos, conclui-se que compreendendo as características dos bens imateriais, além da proteção presente no direito substantivo, faz-se necessário a utilização de técnicas processuais efetivas para a proteção da propriedade intelectual.