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III- O PODER JUDICIÁRIO E OS MEIOS DE COMEDIMENTO DA JUDICIALIZAÇÃO DA SAÚDE

3.2.1 Aspectos gerais

Tal como o Supremo Tribunal Federal e o Conselho Nacional de Justiça, o Superior Tribunal de Justiça, órgão responsável pela tutela da legislação federal brasileira, também intentou um meio para minimizar os aspectos desfavoráveis da judicialização da saúde no que tange à uniformidade de interpretação do direito em âmbito federal.

Utilizou-se para tanto de um mecanismo processual conjectura dos artigos 1.036 a 1.041 do Código de Processo Civil Brasileiro e no artigo 256, I, de seu regimento interno, cujo enfoque é o tratamento isonômico aos jurisdicionados, a preservação da segurança jurídica e a manutenção da integridade e coerência da jurisprudência.

Trata-se daquilo reconhecido pela doutrina processualista, principalmente por Wambier e Talamini em seu Curso Avançado de Processo Civil Vol. 2 Ed. 2016, como julgamento de “recursos por amostragem” ou julgamento de “recursos repetitivos”, técnica que seleciona um conjunto de recursos especiais ou extraordinários que versem sobre a mesma questão de direito reiteradamente discutida, para serem decididos pelo STJ ou STF e o

37 que se decidir em relação a eles seja aplicado aos demais casos que se assemelhem à demanda.

À vista disso, considerando a grande quantidade de demandas judiciais ajuizadas com o prisma no direito à saúde, precipuamente aquelas que versam sobre o fornecimento de medicamentos fora da lista ofertada pelo SUS, o STJ afetou o Recurso Especial n°

1.657.156/RJ, para representar a controvérsia no julgamento pelo sistema dos recursos repetitivos, registrando o tema como repetitivo n° 106/STJ.

O caso concreto do recurso afetado representa cabalmente a controversa questão da obrigatoriedade de o poder público fornecer medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS, no qual figuraram como partes: no polo ativo da demanda, o Estado do Rio de Janeiro e, no polo passivo, a Sra. Fátima Theresa Esteves dos Santos.

A ora recorrida, conforme consta do receituário e do laudo médico acostados aos autos, é portadora de glaucoma crônico, o que alegadamente a compelia a fazer uso contínuo de medicamentos (colírios: azorga5 ml, glaub 5 ml e optive 15 ml), na forma prescrita por profissionais da medicina em atendimento pelo Sistema Único de Saúde.

Ocorre que as medicações prescritas não constituíam os Protocolos Clínicos incorporados ao SUS, fato impeditivo da concessão via administrativa, circunstância que a incitou a movimentar a máquina judiciária em seu favor.

No episódio, os juízos de primeira e segunda instância entenderam que foi devidamente demonstrada a necessidade da ora recorrida em receber a medicação pleiteada, bem como sua ausência de condições financeiras para arcar com os custos do tratamento, condenando o Estado a entregar os fármacos.

A Fazenda Pública do Estado do Rio de Janeiro, por sua vez, descontente com as decisões proferidas e aspirando à possibilidade de substituição do medicamento pleiteado por outros já padronizados e disponibilizados na rede pública, intentou o alcunhado Recurso Especial afetado para julgamento em sede de recursos repetitivos.

A controvérsia foi responsável por suspender, nos termos do artigo 1037, II, do CPC/2015, todos os processos em território nacional que versassem sobre a mesma questão de direito discutida no incidente até que o “caso-piloto” fosse julgado pelo STJ. O aludido julgamento ocorreu no dia 25 de abril de 2018 pela Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e sob a relatoria do ministro Benedito Gonçalves.

Na ocasião, a tese fixada para fins do artigo 1.036 do CPC/2015 testificou que a concessão dos medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS exige a presença

38 cumulativa dos seguintes requisitos: A Comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS; A incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento prescrito; E a existência de registro na ANVISA do medicamento fixando requisitos para que o Poder Judiciário determine a entrega de fármacos fora da lista do Sistema Único de Saúde (SUS).

Neste ínterim, o Recurso Especial de n°1.657.156 interposto pelo Estado do Rio de Janeiro não foi provido, instituindo o dever do poder público de fornecer os medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS, desde que presentes, cumulativamente, os requisitos estabelecidos.

A decisão teve seus efeitos modulados com base no artigo 927, parágrafo 3º, do CPC/2015, circunstância em que o STJ ponderou o seguinte: os critérios fixados somente serão exigidos dos processos que forem distribuídos a partir da conclusão do comentado julgamento, que foi publicado no Diário Justiça Eletrônico no dia 04.05.2018.

O cenário esteado a partir da fixação da tese firmada propiciou aos jurisdicionados maior segurança jurídica no julgamento de demandas com a mesma questão de direito abordada, haja vista a fixação de critérios mínimos para a concessão de medicamentos fora da lista do SUS, que antes do julgamento do feito se dava ao bel prazer dos magistrados e de maneira discrepante.

Isso só foi possível porque a “decisão-quadro” proferida em sede de julgamento de recursos repetitivos reveste-se de força vinculante em sentido estrito, o que significa dizer que deve ser observada por todos os juízes e tribunais que venham a decidir a mesma questão de direito por ela fixada. E no caso de inobservância, permite reclamação ao Tribunal Superior que a proferiu, neste caso, o Superior Tribunal de Justiça, desde que esgotados os recursos ordinários.

A adoção desse mecanismo cerca de maiores garantias o processo, pois viabiliza um contraditório mais adequado, já que permite um tratamento isonômico aos jurisdicionados e a coerência de decisões, sem contar na economia processual, pois a subida de Recursos Extraordinários e Recursos Especiais ficam provisoriamente impedidas no respectivo tribunal de origem.

E em virtude da sua considerável importância será mais bem elucidado em seguida.

39 3.2.2- Procedimento Específico dos Recursos Repetitivos:

Segundo Wambier e Talamini (2016), o procedimento de “recursos por amostragem”

foi introduzido no sistema processual brasileiro pelas leis 11.418/2006 e 11.672/2008 para os casos em que vultosas quantidades de recursos especiais ou extraordinários versassem sobre a mesma questão. O Método também adotado pelo atual Código de Processo Civil - que unificou sua disciplina nos artigos 1.036 a 1.041 e atribuiu uma eficácia mais intensa aos pronunciamentos difundidos nesta circunstância - permite que, hoje em dia, a instauração desse procedimento suspenda todos os processos que versem sobre a questão jurídica repetitiva.

Para os autores, o julgamento dos “recursos por amostragem” supera a ideia de análise de um ou alguns recursos específicos e a respectiva aplicação da decisão aos demais casos de mesma questão de direito. Em um único procedimento é possibilitado dois distintos julgamentos: de um lado, o recurso individualmente considerado, com caso específico e, de outro, um julgamento objetivo com alcance geral acerca da questão que se repete. E esse supradito julgamento ocorre da forma a seguir aduzida.

Identificada à multiplicidade de recursos que tratam da mesma questão jurídica, incumbe ao Presidente ou vice-presidente do Tribunal a quo selecionar dois ou mais recursos representativos da controvérsia, que posteriormente serão encaminhados ao tribunal Superior (STJ ou STF). Os recursos selecionados são denominados como “recursos-amostra” ou

“casos-piloto”. (WAMBIER, TALAMINI, 2016)

Feito isso, o Presidente ou vice-presidente do Tribunal a quo expedirá ordem determinando a suspensão do trâmite de todos os processos pendentes, individuais ou coletivos, no Estado ou Distrito Federal ou na região Federal, conforme disposição contida no artigo 1036, § 1°, do (CPC/2015). Tal suspensão é provisória e somente se confirmará e alcançará todo o território nacional com a decisão de afetação proferida no STJ ou STF.

(WAMBIER, TALAMINI, 2016)

Oportuno frisar que o relator do STJ ou STF não está obrigado a escolher como “caso-piloto” aquele indicado pelo Presidente ou Vice-presidente do Tribunal de segundo grau, podendo selecionar inclusive outros recursos que representem a controvérsia. (WAMBIER, TALAMINI, 2016)

Ainda sim, em todos os casos, os recursos selecionados deverão sempre cumprir todos os pressupostos de admissibilidade e conter abrangente argumentação acerca da questão a ser

40 decidida. Serão analisados, inclusive, a qualidade da petição do recurso e os demais atos processuais que compõem o processo, sem contar no seu contexto processual, em que são avaliados os subsídios instrutórios, sejam eles fáticos ou jurídicos. (WAMBIER, TALAMINI, 2016)

Isso posto, constatada a multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica questão de direito, o relator proferirá decisão de afetação, na qual identifica claramente a questão submetida a julgamento (artigo 1037, I, CPC/2015). Questão que deve ser precisamente identificada para que não sejam suspensos processos que não possuem identidade com a causa. (WAMBIER, TALAMINI, 2016)

Os processos assemelhados à questão debatida ficarão suspensos até que se decida o tema no procedimento de repetitivos. E esse período de suspensão é tanto obscuro, pois não há, tecnicamente, um limite para a suspensão. (WAMBIER, TALAMINI, 2016)

Na redação original do Código de Processo Civil de 2015, havia a previsão de que a suspensão cessaria transcorrido um ano da fixação do procedimento repetitivo e este ainda não fosse decidido. Mas o § 5° do artigo 1037, que continha essa previsão, foi revogado pela lei 13.256/2016. Ainda sim, permanece a regra de que o procedimento de repetitivos deve ser julgado no prazo máximo de um ano, porém nenhuma consequência processual é imputada caso o prazo seja descumprido. (WAMBIER, TALAMINI, 2016)

Ressalta-se que nos termos do artigo 340 do CPC/2015 a suspensão em comento não impedirá a concessão de medidas de tutela urgente. Além disso, há duas hipóteses em que a suspensão pode ser levantada antes mesmo da decisão da questão pelo Tribunal Superior. A primeira concerne aos recursos intempestivos e a segunda aos casos em que o interessado demonstre que a questão discutida em seu recurso não se identifica com aquela que é objeto dos repetitivos. (WAMBIER, TALAMINI, 2016)

Então, conforme as disposições contidas no § 4° do artigo 1037 do Código de Processo Civil de 2015, os recursos afetados devem ser julgados no prazo de 1 ano, tendo preferência sobre todos os demais, exceto os casos que envolvem réu preso e os pedidos de Habeas Corpus. (WAMBIER, TALAMINI, 2016)

No julgamento a ser feito pelo STJ ou STF, os respectivos relatores poderão admitir e até mesmo solicitar a manifestação de terceiros, considerando a relevância da matéria e nos termos de seus respectivos regimentos internos. Além disso, o inciso II do artigo 1.038 do CPC/2015 permite a convocação de audiências públicas, para inquirição de pessoas com conhecimento e experiência na matéria. (WAMBIER, TALAMINI, 2016)

41 Para esses autores, tais medidas são primordiais, pois aprimoram o procedimento de formação dos precedentes, legitimando e qualificando as decisões.

Superada essa fase, o relator requisitará aos Tribunais de segundo grau de todo o país informações acerca da controvérsia e, após isso, chamará o Ministério Público a manifestar-se nos autos (artigo 1.038, inciso III, do CPC/2015). Tanto um quanto o outro terá o prazo sucessivo de 15 dias para apresentar suas manifestações, que serão feitas, preferencialmente, via eletrônica (artigo 1.038, § 1°, do CPC/2015). (WAMBIER, TALAMINI, 2016)

Em seguida o “recurso-amostra” será incluído em pauta para julgamento. A solução da questão de direito repetitiva constituirá a denominada “decisão-quadro”, pronunciamento aplicado a todos os outros casos que versem sobre a mesma questão e que deverá conter todos os fundamentos da tese jurídica por força do artigo 1.038, § 13°, do CPC/2015. (WAMBIER, TALAMINI, 2016)

Em se tratando dos efeitos desse julgamento, que são diversos e sobressaem os recursos sobrestados no próprio tribunal superior ou nos tribunais a quo, Wambier e Talamini (2016) os elucidaram em frentes distintas e da forma a seguir revelada.

Em relação aos recursos sobrestados no respectivo Tribunal Superior, hipóteses do artigo 1.039, do CPC/2015, os autores esclareceram que serão declarados prejudicados se a decisão recorrida estiver de acordo com o entendimento firmado. No caso da decisão recorrida ser contrária ao decidido no julgamento dos repetitivos, explicaram que os recursos, desde que preenchidos os pressupostos de admissibilidade serão decididos em seu mérito para a aplicação da tese fixada na “decisão-quadro”. E em se tratando de recursos extraordinários afetados, informaram que se o STF negar a existência da repercussão geral, os demais recursos de matéria idêntica ficarão automaticamente inadmitidos.

No tocante aos Recursos Extraordinários e Recursos Especiais sobrestados nos tribunais a quo, Wambier e Talamini (2016) explicitaram que cabe ao presidente ou vice-presidente do tribunal de origem negar seguimento aos recursos interpostos contra acórdãos em conformidade com a tese fixada na decisão-quadro, como prevê o artigo 1.040, do CPC/2015, caso em que a negativa de seguimento não será a falta de pressupostos de admissibilidade e sim a ausência de procedência quanto ao mérito.

Em se tratando de acórdão recorrido contrário à tese adotada pela decisão-quadro, os autores registraram que os autos seriam remetidos ao órgão que o prolatou para que fosse realizado o juízo de retratação. Se não houvesse retratação, o recurso seria alçado para o

42 Tribunal Superior para julgamento, desde preenchidos os pressupostos de admissibilidade para tanto.

Tratando-se de processo não sentenciado em 1° grau ou de processo de competência originária, remessa necessária ou recurso ainda não julgado pelo Tribunal de 2° grau, determinar-se-á o prosseguimento do feito para julgamento e aplicação da orientação adotada na “decisão-quadro”. (WAMBIER, TALAMINI, 2016)

Agora, no tocante à força vinculante gerada, Wambier e Talamini (2016) grafam que a decisão-quadro reveste-se de eficácia vinculante qualificada como média, no sentido que autoriza determinadas simplificações procedimentais que se expressam na autorização de julgamento de improcedência liminar de pedidos contrários à tese estabelecida no IRDR; na ausência de remessa necessária da sentença que aplica tal tese; na autorização de provimento e desprovimento monocrático de recursos, respectivamente, favoráveis ou contrários à tese adotada pela decisão-quadro.

Além disso, declaram que a decisão-quadro reveste-se também de força vinculante em sentido estrito, o que significa que deve ser observada por todos os juízes e tribunais que venham a decidir exatamente a mesma questão de direito por ela decida. E em caso de inobservância, caberá reclamação ao Tribunal Superior que proferiu a decisão quadro, desde esgotados os recursos ordinários. (WAMBIER, TALAMINI, 2016)

Os autores lecionam ainda, que há a eventual possibilidade de modulação de efeitos da

“decisão-quadro”, em atenção aos princípios da isonomia, da proteção, da confiança e da segurança jurídica (§3° do artigo 927, do CPC/2015), como ocorreu no julgamento do Recurso Especial de nº 1657156 / RJ. Fato que permite que sejam modulados os efeitos da alteração de jurisprudências dominante do STF e dos tribunais superiores ou daquela firmada dentro dos recursos repetitivos.

3.2.3- Análise de Caso Concreto

Analisando os resultados práticos das medidas adotadas e acima elencadas, deparamo-nos com um caso concreto calhado no município de Lourdes, cidade do interior do Estado de São Paulo, localizada a aproximadamente 65 km de Araçatuba-SP, local de desenvolvimento da presente pesquisa.

Na ocasião, um residente municipal, portador de moléstia grave ajuizou uma ação ordinária de obrigação de fazer cominada com pedido de tutela antecipada em face da

43 Fazenda Pública do Município de Lourdes e solidariamente contra o Estado de São Paulo. O pleito referenciado foi distribuído na 2ª Vara Cível do Foro da Comarca de Buritama-SP em 18 de abril de 2017, recebendo o nº 1000672-98.2017.8.26.0097, sob a alçada do Juiz de Direito, Dr. Eric Douglas Soares Gomes.

Examinando os documentos que integram o processo supracitado foi aferido através das alegações apresentadas na Petição Inicial, que o autor era, sim "era", pois esse veio a falecer durante o trâmite processual, portador de um melanoma maligno metastático com infiltração de osso e metástases para subcutaneode e linfonodos.

Conforme relatório médico incluso, a doença do requerente apresentava-se em estado disseminado, sendo-lhe receitado pelos profissionais médicos o medicamento Pembrolizumabe 2mg/kg (peso de 77 kg), cuja posologia seria uma dose total de 150 mg por via endovenosa a cada 21 dias.

O tempo estimado de uso das medicações seria de 06 meses, prazo que poderia vir a ser postergado em caso de boa resposta ao tratamento. Por isso, o autor almejava a concessão da medicação enquanto durasse a terapia, isto é, por tempo indeterminado.

Declarou nos autos, laconicamente, que não teria condições de arcar com os custos da medicação e por essa razão se dirigiu à Secretaria de Saúde do Município de Lourdes-SP via requerimento formal para o fornecimento dos medicamentos, por ser pessoa pobre sem recursos para comprá-los. Em resposta ao requerimento feito, foi obtida a negativa do órgão público.

À vista disso, dada a recusa administrativa para entrega do medicamento receitado pelos profissionais da saúde, temendo o agravamento do seu estado de saúde ou, até mesmo, a morte - circunstância que acabou acontecendo - e presumivelmente por não possuir condições financeiras para custear o seu tratamento, o autor socorreu-se do Poder Judiciário com o objetivo de que o Estado cumprisse seu bradado mister obrigacional determinado na Carta da República de 1988.

O conjunto de anseios do autor se fundamentou no artigo 6º, da Constituição Federal, que contempla dentre os direitos sociais, a saúde, bem como no artigo 196, da Carta Magna, que estabelece a indigitada expressão “a saúde é direito de todos e dever do Estado”.

Outrossim, buscou fundamento também na legislação infraconstitucional, especificadamente no que preceitua o artigo 2º, da Lei 8.080/90, que assegura o direito à saúde como um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício.

44 Na indicação de legitimidade passiva dos requeridos (Estado de São Paulo e Município de Lourdes) sustentou que a Constituição Federal trata o serviço de saúde como competência comum a todos os entes federados, por isso poderia exigir o fornecimento de medicamentos e insumos de qualquer ente federativo.

E no tocante à solicitação de tutela de urgência, asseverou que a medida se impunha perfeitamente à demanda, haja vista que se trata da efetivação do direito à Saúde, interesse público primário, sendo que aguardar a sentença final para a obtenção da tutela necessitada colocaria em sérios riscos sua integridade física.

O valor da causa estimado pelo requerente foi o de R$ 126.000,00 (cento e vinte e seis mil reais) tomando como base o preço da medicação prescrita, que custava, à época dos fatos, cerca de R$ 21.000,00 (vinte e um mil reais) por dose e o tempo estimado de uso da medicação era inicialmente de 06 meses.

Ante a todo o exposto, o Juiz, Sr. Eric Douglas, recebeu a petição inicial e declarou de imediato o sobrestamento do feito, em razão da determinação de suspensão nacional de todos os processos pendentes, individuais ou coletivos (art. 1037, II, do CPC), decorrente da afetação do recurso especial n. 1.657.156/RJ, para julgamento pelo sistema dos recursos repetitivos (art. 1036, §5º, do CPC e art. 256, I, do regimento interno do STJ), procedimento discutido no tópico anterior deste trabalho.

Incidente que não impediu a apreciação do pedido antecipatório de tutela, autorizando a concessão da medicação pleiteada, prática legítima e ressalvada nos artigos 296, parágrafo único, 314 e 982, §2º, todos do CPC, como já foi reputado.

Todavia, o digno magistrado especificou ainda na decisão que compõe as folhas 33/34 do processo nº 1000672-98.2017.8.26.0097, desacertadas elucubrações sobre o feito e que aquiesceram as discussões tecidas na presente investigação, razão pela qual se fez necessária à transcrição de trecho do referido pronunciamento:

No caso em exame, o autor apresenta receituário dando conta de que somente terá melhora no seu tratamento com os medicamentos ali relacionados, que não deverá ser trocados por genéricos, similares ou manipulados. Embora não haja demonstração documental de tal fato relatado no receituário nem justificativa plausível, não cumpre ao Juízo, leigo no tocante à medicina, discutir a medicação adequada à doença, embora cumpra à parte comprovar tal fato.

Doutro lado, o E. TJSP vem se posicionando no sentido de que a prescrição médica possui idoneidade presumida, a qual deve ser desconstituída pela parte ré, a fim de afastar a necessidade do medicamento indicado e/ou sua substituição.

Assim, demonstrado documentalmente, por meio presumidamente idôneo, que o autor possui a doença descrita na inicial e necessita dos medicamentos prescritos, os quais não foram fornecidos pela ré, restam presentes o fundamento relevante e a possibilidade de ineficácia da medida, caso deferida ao final, razão pela qual CONCEDO A LIMINAR a fim de que a SECRETARIA MUNICIPAL DE SAÚDE

45 DO MUNICIPIO DE LOURDES e o ESTADO DE SAO PAULO forneçam o medicamento Nivolumabe 230 mg na quantidade necessária para o tratamento da impetrante, no prazo máximo de 7 (sete dias) sob pena de multa diária de R$ 200,00 (duzentos reais). (BRASIL, 2017)

É notório que a decisão apresentada só confirma a assimilação arquitetada no desenrolar desta pesquisa, de que nessa tormentosa discussão que permeia o direito à saúde, as pretensões de um indivíduo sobrelevadas ao judiciário, imperam em face do direito à saúde

É notório que a decisão apresentada só confirma a assimilação arquitetada no desenrolar desta pesquisa, de que nessa tormentosa discussão que permeia o direito à saúde, as pretensões de um indivíduo sobrelevadas ao judiciário, imperam em face do direito à saúde

No documento JUDICIALIZAÇÃO DA SAÚDE NO BRASIL: (páginas 36-54)

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