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Aspectos históricos e socioeconômicos da ocupação territorial

4.1 Caracterização socioambiental da região do Vale do Ribeira

4.1.2 Aspectos históricos e socioeconômicos da ocupação territorial

Anteriormente à chegada dos portugueses, o litoral da Baixada do Ribeira era habitado por índios semi-nômades que se dedicavam à caça, pesca e à agricultura itinerante de mandioca36. No século XVI, expedições de colonizadores e exploradores portugueses, em busca de ouro e prata, iniciaram a interiorização da ocupação da região da Baixada do Ribeira, dando origem aos núcleos embrionários das vilas litorâneas de Iguape e Cananéia cuja economia se baseava na lavoura de subsistência e na atividade pesqueira (BRASCONSULT, 196637 apud BRAGA, 1999). Em busca de metais preciosos, os portugueses lançaram-se em expedições à procura de ouro ao longo do rio Ribeira de Iguape (BRASCONSULT, 1966 apud BRAGA, 1999).

No século XVII, intensificou-se a ocupação do interior da região devido à descoberta de ouro na região do Alto Vale e o fluxo fluvial no rio Ribeira de Iguape foi ampliado e suas margens foram sendo colonizadas dando origem, posteriormente, às cidades de Sete Barras, Juquiá, Ribeira, Jacupiranga, entre outras. Durante esta fase, a região esteve ocupada com a

36 Endereço eletrônico: http://www.socioambiental.org/inst/camp/Ribeira/historia. Acesso em: 24/02/2009. 37

agricultura voltada para a produção de alimentos destinados ao contingente da mineração. Devido à articulação fluvial entre Iguape e os núcleos que surgiam rio acima, a cidade adquiriu grande importância estratégica, e seu porto, relevância nacional (BRASCONSULT, 1966 apud BRAGA, 1999). Ainda na metade deste século, deu-se o início do povoamento da região do atual município de Barra do Turvo com a vinda de jesuítas que chegaram para catequisar os índios que ali viviam38.

O município de Iguape se desenvolveu com grande intensidade, destacando-se pela produção de arroz e, conjuntamente com Cananéia, transformou-se em área de construção naval desenvolvendo, ainda, uma série de atividades econômicas decorrentes desse crescimento regional (FIGUEIREDO, 2000). As áreas de acesso ao planalto, Apiaí, Iporanga e Ribeira, apesar de não terem se beneficiado do mesmo impulso de desenvolvimento que Iguape, tiveram um papel importante como única via de comunicação da baixada ao planalto (SANTOS, 2005).

No final do século XVII e início do século XVIII, com a descoberta de ouro nos sertões de Minas Gerais, a mineração no Vale do Ribeira entrou em decadência motivando uma grande migração de sua população para aquela região, fato que contribuiu significativamente para a decadência econômica da região do Alto Vale do Ribeira (BRAGA, 1998).

No início do século XVIII, com a decadência da atividade mineradora, houve o desenvolvimento da agricultura e o Porto de Iguape tornou-se responsável pelo escoamento de produtos agrícolas, assim como, pela ligação econômica da região com o resto do país. Com a utilização de mão-de-obra escrava, o arroz tornou-se o principal produto agrícola da região passando a ser exportado para mercados europeus e latino-americanos (BORN, 2000).

De acordo com Figueiredo (2000), ao longo do século XIX Iguape entra em decadência econômica devido à abolição da escravatura e à concorrência com diversas áreas produtivas do Planalto Paulista que ingressaram na agricultura do arroz e, posteriormente, do café, como consequência do fortalecimento do porto de Santos. Os antigos escravos permaneceram na região do Vale do Ribeira ocupando terras desvalorizadas pelo fim da mineração ou formando comunidades em terras abandonadas pelos antigos senhores.

A economia do Vale do Ribeira regrediu e, da lavoura de exportação, voltou-se novamente para uma agricultura de subsistência. Contudo, certas medidas permitiram surtos isolados de crescimento econômico como a construção da estrada de ferro Santos-Juquiá em 1914

que trouxe certo desenvolvimento a Juquiá e Miracatu, a implantação do núcleo de colonização italiana em Pariquera-Açú e a migração nipônica em Registro em 1920 e 1940 que introduziu a cultura do chá e novos métodos no trato da rizicultura fazendo com que na metade do século, essa região se transformasse no pólo sócio-econômico e cultural mais importante do Vale do Ribeira (BORN, 2000).

Entre 1930 e 1940 o comércio da região reorganiza-se e é incorporado à economia do Estado através da produção de chá e banana, além da exploração da pesca em escala comercial em Cananéia (MÜLLER, 198039 apud BRAGA, 1999).

Deste modo, o Vale do Ribeira que já havia permanecido às margens do império do café devido às suas condições edafoclimáticas, permaneceu também às margens do processo de industrialização, estabelecendo-se como região periférica, “subdesenvolvida”, na órbita da economia paulista moderna, industrializada e desenvolvida (BRAGA, 1999). No final da década de 1950, tal disparidade social e econômica começou a chamar a atenção do governo que passou a investir mais diretamente em políticas de desenvolvimento para a região (BRAGA, 1998).

Na década de 1960, com a construção da rodovia nacional Régis Bittencurt, a BR-116, a região recebeu um novo impulso de crescimento econômico que gerou uma redefinição de sua ocupação espacial, além de um processo de valorização de suas terras. Aliado a esse processo, o Estado começou a intervir na região com obras de infra-estrutura como a abertura de estradas, políticas de incentivos fiscais para investimentos na área e criação de diversos órgãos com função de levar desenvolvimento para a região como a Superintendência de Desenvolvimento do Litoral Paulista (SUDELPA) (BRAGA, 1999).

De acordo com Santos (2005), a redefinição do processo de ocupação espacial aliada a melhorias de infra-estrutura no Vale do Ribeira atraiu o investimento de “forasteiros” na região tendo por conseqüência a formação de grandes latifúndios geralmente ligados à mineração, à pecuária e a empresas imobiliárias. Tal concentração de terras com fins basicamente especulativos, através da grilagem física e jurídica, deu-se de forma violenta provocando conflitos e acarretando na expulsão dos antigos ocupantes da terra, os posseiros. A estes, economicamente impotentes e excluídos das regalias da política agrícola para a região, restaram atividades de subsistência, incluindo o extrativismo da floresta e os subempregos (LEPSCH;

39 MÜLLER, G. Estado, estrutura agrária e população: estagnação e incorporação regional. Cadernos CEBRAP,

SARAIVA; DONZELI; MARINHO; SAKAI; GILLAUMON; PFEIFER; MATTOS; ANDRADE; SILVA, 1990).

Os municípios de Iguape, Cananéia e Ilha Comprida tiveram suas terras retalhadas pela especulação imobiliária acarretando na destruição de florestas e crescente urbanização, fato que aumentou o êxodo da população jovem do meio rural gerando a desestruturação familiar da pequena propriedade e acentuando, ainda mais, o movimento de venda de terras e busca pelas cidades (LINO, 198240 apud SANTOS, 2005).

Ao final da década de 1970 a disparidade de investimentos entre a Baixada e o Alto Vale torna mais aguda a quebra da unidade socioeconômica e cultural da região. Polarizados em torno de Registro (na Baixada) e Apiaí (Alto Vale), os demais municípios passam a compor dois compartimentos isolados que, em comum, mantêm apenas sua posição de periferia em relação à economia central (SANTOS, 2005). Tal fato torna-se oficializado pela divisão do Estado em regiões administrativas que passa a fragmentar o Vale do Ribeira por um meridiano político- econômico, através do qual o Alto Vale passa a pertencer à Região de Sorocaba e a Baixada torna-se um prolongamento subdesenvolvido da Baixada Santista (LINO, 1982 apud SANTOS, 2005).

A partir da década de 1980, com o processo de redemocratização do país há uma mudança do enfoque desenvolvimentista prevalecente até então e um crescimento e institucionalização da questão ambiental que faz com que as atenções se voltem para a região devido aos maiores remanescentes de Mata Atlântica situarem-se em seu território (SANTOS, 2005).

Atualmente, a região do Vale do Ribeira continua sendo uma das regiões menos desenvolvidas do Estado de São Paulo. A questão fundiária é bastante complexa, pois aproximadamente 40% das terras da região não possuem títulos públicos regularizados (BORN, 2000). A agricultura continua sendo a principal atividade econômica e fonte de renda da população local. As culturas que ocupam áreas mais extensas e apresentam comercialmente maior relevância são a banana e o chá preto apesar de enfrentarem diversos problemas como a carência de recursos do próprio sistema produtivo e a baixa qualidade do produto, o que o desvaloriza e dificulta sua comercialização (SANTOS, 2005). Na faixa litorânea, a pesca exerce papel fundamental no sustento e no desenvolvimento econômico das comunidades locais41.

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LINO, C. F. Incorporação de uma área periférica à economia central. In: SIMPÓSIO SOBRE A OCUPAÇÃO TERRITORIAL DO VALE DO RIBEIRA, 1982, São Paulo. Anais... São Paulo: ABGE/SBE, 1982.

De acordo com Born (2000), os indicadores socioeconômicos mostram que os núcleos e bairros rurais do Vale do Ribeira são quase sempre excluídos de programas de assistência e desenvolvimento do Governo do Estado e, consequentemente, enfrentam sérios problemas com a falta de documentação das terras, a falta de saneamento básico, a precariedade das vias de transporte e a deficiência no abastecimento e nos serviços públicos.