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4.2 Partes envolvidas: dados gerais

4.2.1 Grupo de pequenos produtores rurais

O atual grupo de pequenos produtores rurais envolvido nos acordos comerciais formalizados através de dois CURBs com a empresa Natura é composto por 5 famílias49. Destas, quatro habitam um mesmo bairro rural no município de Barra do Turvo/SP e a família restante é habitante de um bairro rural no município de Registro/SP.

A faixa etária dos entrevistados está entre 27 e 60 anos. Em relação ao histórico de práticas agrícolas, quatro entrevistados de Barra do Turvo/SP desde a infância têm contato com este tipo de prática através de seus ascendentes. Os quais, por sua vez, sempre obtiveram seu sustento por meio desta atividade produtiva conforme relata o Produtor 1: “Meu pai vivia da lavoura e minha mãe também. Nessa época as pessoas não se julgavam donos da terra, falava: eu

49 Para a finalidade deste estudo foram consideradas famílias indivíduos que possuem laços de consangüinidade,

trabalho até ali! Nos anos 60 não tinha INCRA50, nem cartório, mas o povo vivia nessa terra com toda a educação...”.

Além do histórico familiar íntimamente relacionado à agricultura e à lavoura de subsistência, o relato do Produtor 1 acima denota também uma forma de relação no passado com a área cultivada bastante diferente da atual, na qual cada agricultor cuidava da área que conseguia cultivar junto a seus familiares, sem a necessidade de delimitação e documentação da terra na forma de propriedades. Ademais, a dependência da produção agrícola familiar para a subsistência e a dificuldade de acesso a serviços públicos fez com que, no passado, estes agricultores iniciassem o trabalho no campo muito cedo, conforme coloca o Produtor 3: “Ah, eu desde 5 anos de idade trabalho junto com o meu pai com a minha mãe, trabalhando! Desde 5 anos de idade eu tava na roça, nem estudar a gente não teve condições. Aonde a gente morava não tinha escola rural na época era tudo na cidade, então era muito difícil, né?!”

Conforme relata o Produtor 3 acima, devido à necessidade de auxiliar os pais nas tarefas do campo e à distância entre a zona rural e a cidade, apenas dois dos quatro agricultores de Barra do Turvo estudaram até o ensino médio. Contudo, todos foram alfabetizados em algum período da vida. A transmissão dos conhecimentos necessários à sobrevivência no meio rural aconteceu para eles na forma oral e de geração para geração conforme explica o Produtor 1:

Tudo o que ele [o pai] conhecia, ele passava... Como trabalhar a qualidade de uma árvore, de uma casa, do terreno... É aqueles histórico que ele conhecia, a parte de carpinteiro que ele fazia... Ele era um fabricante de monjolo e canoa. Canoa eu nunca fiz, mas o monjolo eu aprendi! Canoa eu não interessei muito, mas monjolo eu gostei, eu sei fazer! (Produtor 1)

Diferentemente desses, o pequeno produtor cuja família vive atualmente em Registro, é nacional da Alemanha. O mesmo viveu neste país até os 28 anos de idade, onde realizou a graduação em Ciências Florestais, e somente iniciou o contato com atividades agrícolas há aproximadamente 18 anos conforme relata: “Ah, foi mais aqui no Brasil, né? Depois... Com plantas e com florestas a partir de 86 como parte da reflorestadora, depois aqui, com agricultura familiar de 92 adiante...” (Produtor 5)

Em relação às atividades produtivas realizadas ao longo da vida, três dos entrevistados sempre obtiveram seu sustento exclusivamente através da prática de atividades agrícolas, conforme esclarece o Produtor 1: “Foi a vida toda quebrando o galho na lavoura mesmo.” Um dos entrevistados obtém o sustento da família através de atividades agrícolas em tempo parcial e “empreitadas”51 como pedreiro e; o entrevistado restante, através de empregos e consultorias.

Para os agricultores de Barra do Turvo o acesso a serviços públicos como saúde, educação e transporte é precário. As estradas de acesso as propriedades costumam se encontrar em péssimo estado e a distância das propriedades à escola costuma dificultar o processo de escolarização. Em relação à saúde também são grandes as dificuldades enfrentadas principalmente pelos moradores da zona rural do município. Tal situação pode ser constatada através das falas do Produtor 1 e do Produtor 3 a seguir:

Tem [hospital], mas em consideração é fraco para o município, é! Uma hora tem dois [médicos], outra hora tem um, mas você vê que falta remédio, falta equipamento e muita gente é transportada à Pariquera-Açú, mas é uma coisa! A gente fica pensando: o estado e o município precisavam melhorar isso daí. Às vezes uma mulher que está ganhando neném aí levava pra lá, uma pessoa machucada... Então, tudo isso é complicado por causa da distância. (Produtor 1)

Aqui, na verdade, agora, por exemplo, tem ônibus escolar, mas no período escolar o transporte vem de dia aqui. Mas só complica um pouco nas férias que tem que chamar táxi. Se tiver uma emergência, alguém doente, aí tem que usar táxi! Nós não tem nenhum transporte coletivo. Tem o transporte escolar, que é até proibido carregar passageiro, mas como não tem outro transporte tem que usar o transporte escolar. (Produtor 3)

Já no município de Registro, segundo o Produtor 5, tais dificuldades mencionadas acima não são enfrentadas, pois de acordo com o mesmo, o acesso a serviços públicos como educação, saúde e transporte “[...] é bom, em Registro está razoável”.

O número de indivíduos adultos por família varia de dois a cinco. Em quatro famílias todos os indivíduos adultos trabalham em atividades dentro da propriedade, sendo necessária a contratação de mão-de-obra externa apenas eventualmente. Na família restante, os indivíduos

adultos trabalham em tempo parcial em atividades dentro da propriedade e, para a realização destas, contam com um empregado permanente.

Em relação às fontes de renda das famílias dos entrevistados, atualmente, duas delas têm como principal fonte de renda a comercialização de folhas desidratadas de maracujá-doce para a Centroflora - que por sua vez, elabora extratos para a empresa Natura - ; outras duas têm como fonte de renda primária a comercialização de hortaliças e produtos provenientes de sistemas agroflorestais (SAFs) através da associação Cooperafloresta, do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) do Governo Federal financiado pela Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB) e de feira local; e a última tem como principal fonte de renda a realização de consultorias pelo entrevistado e por sua esposa. Ademais, na época das entrevistas todas as famílias possuíam alguma fonte de renda secundária como aposentadorias, comercialização de palmito pupunha, bolsa família, bolsa de monitoria agroflorestal, comercialização de plantas medicinais para empresas e “empreitadas” conforme se pode visualizar na Tabela 1 a seguir.

Tabela 1 – Fontes de renda, produção agrícola e destino da produção dos pequenos produtores rurais em 2009

Famílias Fontes de renda

(em ordem de importância)

Produção agrícola para

comercialização Destino da produção

Produtor 1

comercialização de folhas secas de maracujá-doce duas aposentadorias comercialização de palmito pupunha maracujá-doce Centroflora-Natura comercialização através da associação de produtores Cooperafloresta Produtor 2

comercialização de folhas secas de maracujá-doce comercialização de palmito pupunha maracujá-doce palmito pupunha Centroflora-Natura comercialização através da associação de produtores Cooperafloresta Produtor 3

comecialização de produtos da horta comercialização de produtos de SAFs

bolsa de monitoria agroflorestal

diversas hortaliças ervas aromáticas palmito pupunha e de palmeira real frutos variados comercialização através do PAA comercialização através da associação de produtores Cooperafloresta comercialização através de feira local Produtor 4 comercialização de produtos da horta comercialização de produtos de SAFs

diárias como pedreiro bolsa família diversas hortaliças palmito pupunha banana mel comercialização através do PAA comercialização através de feira local Produtor 5 consultorias comercialização de plantas medicinais duas aposentadorias

comercialização de licores e doces

goiaba banana

Natura e outras empresas comercialização através da Família do Vale Cooperativa Agroecológica

Fonte: Entrevistas realizadas com pequenos produtores rurais do Vale do Ribeira entre fevereiro de 2009 e fevereiro de 2010.