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4. ESTUDOS DE CASO: ÁREAS DE VULNERABILIDADE SOCIOAMBIENTAL

4.1 ASPECTOS METODOLÓGICOS

Nesta pesquisa utilizam-se métodos de investigação ou de procedimento “histórico”, englobando o “estudo de caso”. De acordo com Marconi e Lakatos (2003, p. 106), “os métodos de procedimento seriam etapas mais concretas da investigação, com finalidade mais restrita em termos de explicação geral dos fenômenos e menos abstratas”.

Marconi e Lakatos (2003, p. 106) destacam que muitas vezes são necessários mais de um método para a compreensão do fenômeno. Dessa forma, o uso concomitante dos métodos “histórico” e de “estudo de caso” auxiliam no aprofundamento das questões a serem abordadas, contribuindo para uma visão interdisciplinar.

Nesse sentido, pretende-se analisar as ações efetuadas pelos órgãos públicos em áreas de vulnerabilidade socioambiental e, para tanto, o Programa de urbanização de favelas foi escolhido para aprofundar a questão.

O “método histórico” auxiliará na compreensão dos avanços e impasses ocorridos ao longo das décadas nas políticas públicas de habitação e urbanização de favelas. Devido à complexidade do tema, as dificuldades enfrentadas para atuar nessas áreas irregulares e as limitações do Programa de Urbanização serão aprofundadas para propiciar o seu entendimento.

Para Marconi e Lakatos (2003, p. 107), o método histórico auxilia a compreensão dos fenômenos, pois “preenche os vazios dos fatos e acontecimentos, apoiando-se em um tempo, mesmo que artificialmente reconstruído, que assegura a percepção da continuidade e do entrelaçamento dos fenômenos”.

A metodologia de “estudo de caso” foi escolhida para analisar dois assentamentos localizados no município de Curitiba, de forma a proporcionar o aprofundamento da pesquisa, uma vez que serão investigadas detalhadamente as políticas implantadas nas duas áreas e seus resultados. É levado em conta os limites acarretados pela intervenção e a necessidade de integrar as ações de urbanização a outras políticas de forma a tornar mais efetiva a melhoria de condição de vida de seus moradores, o acesso à moradia e o direito à cidade.

Conforme Yin (2001, p. 21), o método de estudo de caso, além de possibilitar a compreensão de fenômenos sociais complexos, propicia,

(...) uma investigação para se preservar as características holísticas e significativas dos eventos da vida real - tais como ciclos de vida individuais, processos organizacionais e administrativos, mudanças ocorridas em regiões urbanas, relações internacionais e a maturação de alguns setores.

Além disso, de acordo com Yin (2001, p. 54), a necessidade de fazer uso da teoria, além do estudo de caso, “não apenas representa uma ajuda imensa na

definição do projeto de pesquisa e na coleta de dados adequados, como também torna-se o veículo principal para a generalização dos resultados do estudo de caso”.

Dessa forma, a política habitacional e urbana implementada pelo Governo Federal, bem como as políticas implementadas pelos municípios, com ênfase nas políticas adotadas pela Prefeitura de Curitiba, darão o embasamento necessário para avaliar se a estrutura proposta pelo Programa é adequada para melhorar a vida de seus moradores no que tange a aspectos ambientais, socioeconômicos, de habitabilidade e de integração com a cidade, e como essas políticas foram implantadas nas áreas selecionadas entre os anos de 1980 e 2014.

Com a finalidade de compreender como o Programa de urbanização de favelas foi implantado no município de Curitiba, foram selecionadas duas áreas em que os processos de regularização urbanística e fundiária foram implantados ou estão em andamento: Vila Torres e Vila Parolin. Justifica-se a escolha das duas áreas pelo fato de serem núcleos antigos e já consolidados na cidade, a Vila Torres surgiu em meados da década de 1960 (COHAB-CT, 1991) e a Vila Parolin por volta de 1955 (COHAB-CT; CURITIBA, 2007), por terem recebido diversos investimentos da Prefeitura ao longo das décadas, pela existência de moradias precárias margeando o rio Belém, ou seus afluentes, e pela localização próxima à região central (COHAB-CT, 1991; COHAB-CT; CURITIBA, 2007; CURITIBA; COHAB-CT; IPPUC, 2007).

Assim, por se considerar a existência de condições de vulnerabilidade socioambiental nas duas áreas, esse aspecto torna-se bastante relevante para a escolha. Conforme verificado no Plano Municipal de Regularização Fundiária em Áreas de Preservação Permanente (CURITIBA; COHAB-CT; IPPUC, 2007, p. 111), as duas áreas são consideradas como ocupações irregulares, estão inseridas na sub-bacia do rio Belém, e apresentam condições de vulnerabilidade socioambiental, uma vez que os dois núcleos possuem domicílios precários situados em área de preservação permanente (APP).

A Vila Torres está sujeita à inundação e a Vila Parolin, além de estar sujeita à inundação também possui domicílios situados próximos às torres de alta tensão. Outra condição de vulnerabilidade pode ser verificada pelo fato de parte de seus moradores trabalharem com coleta e reciclagem de resíduos sólidos (BERLATTO, 2008; SANTANA, 2011).

Neste sentido, estabelecer uma relação entre o espaço urbano e o meio ambiente, bem como seus processos condicionantes, como a vulnerabilidade socioambiental e a segregação socioespacial, ampliará a visão sobre o fenômeno da favela, reforçando o entendimento sobre o alcance, limites e contradições presentes no Programa de urbanização de assentamentos irregulares.

Assim, o esclarecimento sobre o porquê, muitas vezes, da intervenção não mudar significativamente a vida de seus moradores se faz profundamente necessária. De acordo com Bueno (2000, p. 344), a urbanização em si não pode ser vista como geradora de emprego e renda, “a prioridade de um projeto de urbanização é fazer obras para melhorar a acessibilidade e o saneamento da comunidade e, consequentemente, a sua qualidade de vida urbana”. Ou seja, outras ações do governo são necessárias para que a condição de vida de seus habitantes possa ser melhorada. Quais seriam? A ação local poderia modificar esses processos relacionados à existência de um meio ambiente urbano marcado pela desigualdade?

Esse meio ambiente urbano, marcado pela desigualdade, de acordo com Maricato (2013, p. 50-51),

(...) reflete as relações sociais além de participar ativamente de sua reprodução. Nesse sentido, é objeto e agente de permanências e mudanças sociais. É influenciado pelas relações sociais tanto quanto as influencia. É impossível esperar que uma sociedade como a nossa, radicalmente desigual e autoritária, baseada em relações de privilégio e arbitrariedade, possa produzir cidades que não tenham essas características.

Portanto, é fundamental investigar, além das políticas relativas à urbanização e regularização das duas áreas, quais são as outras ações promovidas pelos órgãos públicos relativas aos aspectos sociais, ambientais, educativos e de geração de emprego e renda, bem como, averiguar quais as ações, planos ou legislação implementadas dificultam ou auxiliam a integração dos assentamentos à cidade formal.

De forma a compreender as ações e políticas implantadas nos locais selecionados, verificar-se-á qual o partido de política pública ou tipologia utilizado, ou seja, se foi adotada a política de remoção, reurbanização ou urbanização e se a intervenção pode ser considerada gradual (ou parcial) ou integrada. Essa análise inicial é importante para compreender de que forma foi pensada a política, se a ação

proposta foi efetivada e qual a fonte dos recursos (municipal, estadual, federal ou ainda, internacional).

Além disso, a pesquisa está embasada na documentação teórica, proveniente de autores consagrados, artigos científicos, teses e dissertações e em documentos disponibilizados pela Prefeitura de Curitiba, Companhia de Habitação Popular de Curitiba (COHAB-CT) e Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (IPPUC). Os mapas de áreas inundáveis serão sobrepostos aos mapas de áreas irregulares e regularizadas, ambos fornecidos pelo IPPUC, utilizando-se a ferramenta de geoprocessamento com o intuito de demonstrar quais partes das áreas estão sujeitas a inundações e, assim, constatar o processo de vulnerabilidade socioambiental.

Utiliza-se também o Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil, realizado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) e Fundação João Pinheiro (FJP). O Atlas apresenta o Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM), e possibilita a busca por dados e sua espacialização a partir de diversos indicadores para cada uma das Unidades de Desenvolvimento Humano (UDH). Os dados apresentados foram extraídos dos Censos do IBGE de 2000 e 2010. A Vila Torres e Vila Parolin foram transformadas em Unidade de Desenvolvimento Humano, o que favorece a consulta aos dados do IBGE a partir de diversos indicadores propostos pelo Atlas como demografia, educação, renda, trabalho, habitação e vulnerabilidade.

Igualmente serão aplicados nos dois núcleos metodologias e parâmetros propostos por Bueno (2000) e Denaldi (2003), produto de análises realizadas a partir de experiências de urbanização implantadas em diferentes cidades do Brasil. As metodologias propostas propiciam que se verifique a efetividade dos projetos e obras de urbanização implantados nos assentamentos, bem como a integração desses assentamentos com o entorno, a partir de determinados indicadores e parâmetros.

Os indicadores possibilitam que se monitore a implantação dos projetos e obras de urbanização, de forma a garantir a consolidação dos mesmos e sua replicabilidade para outros núcleos (DENALDI, 2003). Os parâmetros permitem que se avalie como o processo de urbanização foi efetuado, quais os resultados urbanísticos e socioambientais, além das condições de habitabilidade e melhoria de

qualidade de vida de seus moradores (BUENO, 2000). As autoras propõem uma metodologia que pressupõe resultados nos seguintes campos:

Abrangência de atendimento (número de favelas urbanizadas e percentuais da população municipal de favela atendida); Regularização fundiária (número de favelas com regularização concluída e número de famílias atendidas); Cobertura das favelas urbanizadas por serviços de manutenção e controle urbano; Melhoria das condições de habitação (acesso a moradia adequada); Recuperação urbanística e ambiental da favela e cidade; Democratização da gestão municipal – setor habitacional (...) (DENALDI, 2003, p. 66).

Desses aspectos, detalha-se no QUADRO 2 os indicadores e parâmetros considerados essenciais para uma efetiva urbanização de favela. Além disso, utilizamos no indicador 4 o que as autoras denominam como “Grau de integração da política habitacional com a política urbana e ambiental” para estabelecer a relação interdisciplinar existente nos trabalhos de urbanização. Verifica-se ainda que a metodologia das respectivas autoras foi adequada com o intuito de se analisar dois núcleos localizados próximos à região central de Curitiba.

Os parâmetros terão como base, além das observações in loco e entrevistas com moradores e técnicos das COHAB-CT, informações fornecidas pela Prefeitura de Curitiba, COHAB-CT e pelo Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil. Os indicadores “habitabilidade”, “infraestrutura”, “integração urbana e ambiental” e “relação com outras políticas públicas” serão os principais indicadores para analisar a vulnerabilidade socioambiental existente nos estudos de caso. A análise do processo de segregação socioespacial será realizada a partir dos indicadores de “infraestrutura urbana”, “integração urbana e ambiental” e “relação com outras políticas públicas”. O parâmetro “participação popular” é importante para que se verifique o envolvimento da comunidade no processo de urbanização, bem como a relação de pertencimento da comunidade com a cidade e o meio ambiente.

De modo a garantir que o protocolo de “estudo de caso” tenha confiabilidade (YIN, 2001), além de visitas a campo nas duas áreas selecionadas, também serão feitas entrevistas com representantes, moradores e técnicos da COHAB-CT. As entrevistas nas respectivas áreas foram feitas com moradores e representantes, de modo a mesclar as opiniões. A seleção de entrevistas com técnicos da COHAB-CT esteve relacionada à atuação dos profissionais nas áreas em período anterior ou atual.

INDICADORES PARÂMETROS

1. Habitabilidade Condição; localização e densidade da habitação.

2. Infraestrutura Pavimentação e calçamento das vias; existência e condição do saneamento ambiental (redes de abastecimento de água; esgotamento sanitário; drenagem e coleta de resíduos sólidos); energia elétrica e iluminação pública.

3. Infraestrutura urbana Mobiliário urbano (placas de ruas, bancos, lixeiras, entre outros); paisagismo; oferta de equipamentos públicos (escola, creche, UBS, entre outros); acesso ao transporte público e equipamentos de lazer (praças, quadra de esportes, entre outros).

4. Integração urbana e ambiental

Integração com outros bairros e com o restante da cidade; enfoque na sub-bacia hidrográfica como unidade de planejamento e projeto; recuperação e tratamento paisagístico de fundo de vale; lançamento e tratamento de esgotos; seleção, reciclagem e destino final dos resíduos sólidos.

5. Relação com outras ações e políticas promovidas pelo poder público nas áreas

Regularização fundiária, educação, emprego e renda.

6. Participação popular Averiguar se houve participação da população nas tomadas de decisão antes e durante as intervenções e como a comunidade se organiza. QUADRO 2 - INDICADORES E PARÂMETROS A SEREM APLICADOS NA VILA TORRES E VILA PAROLIN

FONTE: Bueno (2000) e Denaldi (2003). Elaborado pela autora (2015).

O questionário efetuado com os representantes e moradores das áreas selecionadas pretende investigar, a partir da percepção dos próprios moradores, como se deu o processo de urbanização dos núcleos e sua integração com a cidade, bem como verificar qual o nível de participação dos moradores em todas as etapas. Averígua-se também quais as críticas e sugestões e demandas da população visando a melhoria de condição de vida.

Em relação aos técnicos da COHAB-CT, investiga-se a visão dos técnicos em relação à implantação do Programa de Urbanização de Favelas, limites e críticas, bem como a percepção que os mesmos têm em relação à melhoria da qualidade de vida dos moradores das áreas selecionadas, o acesso à moradia e o direito à cidade.

Em posse de todas essas informações, é possível elaborar um quadro confiável sobre como se desenvolve o processo de urbanização na Vila Torres e na

Vila Parolin, o grau de mudança e impacto na qualidade de vida dos moradores, e a integração desses núcleos à cidade.