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Neste capítulo são apresentadas as impressões obtidas a partir do trabalho de campo. Para isto, foram de importância essencial as entrevistas realizadas com alguns dos atores que tomaram parte na história da ATAM, assim como e-mails e conversas telefônicas, que auxiliaram o esclarecimento de dúvidas que surgiram posteriormente às entrevistas.

No momento atual, em que estão sendo realizados esforços para reativar a associação, torna- se muito importante visualizar o cenário atual nas TAM para avaliar as possibilidades de progresso nessa retomada. Para isto, foram identificados alguns fatores chaves relacionados ao processo histórico e que ajudam no entendimento deste cenário.

Entre os fatores que pareceram contribuir positivamente, e que estão em consonância com aqueles relativos à formação de clusters apresentados na seção 2.2, podemos destacar: a iniciativa local de empresários para formar uma associação com vistas ao desenvolvimento turístico e seu empenho na sua operacionalização; o engajamento do poder local; a concomitância com políticas federais e estaduais com o mesmo objetivo; a criação de um ministério alguns anos depois do início da associação; o potencial turístico da região; a parceria com SENAC e SEBRAE; e o empenho pessoal de algumas pessoas que se tornaram peças-chave no funcionamento da associação.

Do mesmo modo, podemos destacar outros fatores que interferiram negativamente no progresso das atividades da ATAM. Entre eles: a existência de conflitos entre os membros da iniciativa privada; decepção com a liderança; a ausência de auto-financiamento da associação; má adequação do modelo de gestão adotado; o conflito e a dispersão causados pela criação de outra associação na região, com objetivos semelhantes; e a baixa capacitação técnico-

gerencial do setor público local. Estes pontos serão explorados mais detalhadamente, por acreditarmos serem merecedores de atenção, de forma a contribuir na execução de novas iniciativas.

A questão da liderança foi um dos primeiros pontos de enfraquecimento da associação. O líder27, uma pessoa da própria região, atuante, que deu a idéia da criação da Associação, mobilizou os integrantes e criou o nome para ela, logo se afastou da região, para assumir cargo na administração estadual em Belo Horizonte, em outubro de 1999. Assim, não pôde acompanhar, nem fazer parte diretamente dos trabalhos da associação. Isto gerou, em médio prazo, desânimo e desconfiança entre os membros que, na ausência de seu líder, se viram desnorteados e sem motivação para continuar algo que o próprio idealizador havia deixado de lado. Em alguns momentos de crise, a figura do líder, que poderia ter continuado como conselheiro, fez falta para tomar decisões estratégicas.

A ausência do líder gerou espaço para o florescimento de conflitos, que começaram a surgir no segundo ano de existência da associação e estavam relacionados à questões de poder. Alguns membros começaram a sentir-se preteridos em relação a outros e começaram a surgir discordâncias e desconfianças acerca das ações da associação.

A presença da ATAM em uma feira de turismo28 aconteceu por conta do patrocínio em dinheiro de um dos membros. Por outro lado, a própria maneira como isto foi realizado, deixou descontentes outros membros que passaram a não participar, achando que a associação

27 Este líder seria Manoel Costa, hoteleiro da região das TAM, primeiro Secretário de Turismo de MG e atual Secretário de Desenvolvimento Regional.

estava privilegiando alguns membros em detrimento de outros, o que acirrou ainda mais os conflitos pessoais.

Por outro lado, a própria nomeação deste líder à Secretaria Estadual de Turismo gerou uma acomodação das Prefeituras da TAM, que se sentiram privilegiadas por terem um representante no governo estadual. Essa acomodação contribuiu para a lentidão do processo de fortalecimento do CTTAM, já que o poder local entrou em compasso de espera, aguardando ações e recursos em seu favor, acreditando que o seu líder iria privilegiar a região.

Como isso não aconteceu, o afastamento das Prefeituras foi tornando-se cada vez maior, inclusive com a supressão das contribuições mensais, que consistiam na principal fonte de renda da ATAM.

A falta de recursos foi crucial. Sem ter como sustentar uma estrutura operacional mínima, a associação não teve como concretizar os seus objetivos. O seu financiamento foi planejado para contar com contribuições mensais das prefeituras, que por motivos diversos foram se tornando inadimplentes. Por mais que fossem sete municípios contribuintes, o contexto político-econômico é o mesmo, assim como as carências e dificuldades. Assim, durante o ano eleitoral de 2000, houve um esvaziamento da participação do Poder Público na ATAM, comprometendo as bases financeiras da associação. Diante deste contexto marcado pela falta alternativa de recursos, pode-se considerar que as resultantes diretas desse processo geraram uma crise financeira.

Uma organização que pretende representar interesses coletivos de uma região deve garantir sua autonomia para poder estar minimizar a dependência por parte de financiadores. Uma das formas de garantir esta autonomia é a auto-suficiência financeira, que deve ser estabelecida de

forma transparente para que fiquem claras as origens dos recursos. Isso evitaria também uma captura política da ATAM pelas prefeituras financiadoras.

O modelo de gestão adotado também não foi bem sucedido. O consultor que elaborou o PDDT e formatou o modelo de gestão, pretendia ser convocado para assumir a condução da associação. Isto pode ser confirmado ao examinarmos o modelo de gestão proposto: presidência, vice-presidência, conselho executivo e conselho fiscal. O consultor ocuparia a presidência, com caráter executivo, e os demais associados ocupariam os conselhos e vice- presidência. Como não foi isso o que sucedeu, a estrutura organizacional logo se mostrou inadequada, e o próprio conselho executivo tentou minimizar essa deficiência criando o cargo de secretário executivo. No entanto, como esta função não estava prevista anteriormente, não foi adequadamente formatada, e a pessoa que assumiu a função acabou sobrecarregada com todas as funções executivas da associação.

Existem relatos nas atas de assembléia geral e do conselho executivo relatando a má conduta e eficiência desta secretária executiva, que também não possuía experiência gerencial ou executiva para exercer adequadamente a função. A própria associação sofreu de uma falta de direcionamento, já que o instrumento que serviria para orientar as suas ações, o PDDT, não o fazia, devido à sua falta de identidade com os atores locais.

Após todos estes contratempos, a associação foi se enfraquecendo, seus associados foram perdendo o comprometimento e os resultados foram se tornando cada vez mais escassos. A partir daqui, uma espiral descendente de desânimo, frustração e decepção se formou, tornando cada vez mais difícil o seu funcionamento.

Além destes fatores internos à associação, outros aspectos externos, relacionados ao programa de governo em curso, merecem ser destacados por terem influenciado a própria mobilização para a formação da associação.

Algumas entrevistas relatam a participação dos municípios das TAM nas oficinas do PNMT. No entanto, a participação foi restrita à primeira fase, de sensibilização. As oficinas, que aconteceram regionalmente, reunindo os municípios da região Sul de Minas Gerais, promoveram o interesse imediato em relação ao turismo. No entanto, ao invés de procederem à realização da segunda fase, os representantes das TAM optaram por se antecipar na realização do Plano Diretor, contratando um consultor para isto. Aqui temos dois aspectos interessantes. O primeiro é o fato de que durante o programa de municipalização, a percepção da região se sobressaiu, antecipando uma diretriz do PRT que viria a ser implementado alguns anos depois. O segundo aspecto foi a contratação de um consultor que não possuía qualquer vínculo com a região para elaborar um plano que seria o objeto de trabalho da fase três do PNMT. O objetivo do PNMT era que cada comunidade se envolvesse na formulação do seu Plano Diretor, para permitir a construção de um vínculo que garantiria sua adequação e implementação.

O papel do Plano Diretor, pelo PNMT, era que ele fosse um canal de expressão do município, uma afirmação de sua cultura, de seus atrativos e de sua população. Todos eram convidados a participar, dos mais simples aos empresários e acadêmicos. A própria linguagem do Plano deveria ser simples para permitir o acesso de qualquer pessoa.

Buscava-se evitar justamente o que aconteceu: a realização de um Plano por uma pessoa totalmente externa, sem identificação com a comunidade local. O resultado disto, verificado nas TAM, é a existência de um Plano Diretor de Turismo que permanece na obscuridade, um

calhamaço de palavras técnicas e formais, mal formatado, nada convidativo à leitura. O texto aborda, diversas vezes, a visão sistêmica do turismo, que embora correta, não é relevante à realidade local das TAM, pois tira o foco da discussão e apresenta uma realidade distante, uma macro-visão de um turismo local.

A experiência de mobilização e criação da ATAM causa mobilização entre as pessoas que participaram da experiência, e isto pode ser verificado pela clareza das memórias dos entrevistados, mesmo passados 6-8 anos. Uma opinião é comum: todos os entrevistados concordam que a região tem grande potencial turístico, porém está mal estruturada para explorá-lo e o funcionamento da ATAM é vital para isso. Por outro lado, a experiência fracassada desmotivou principalmente os participantes do setor privado, que viram seus esforços empenhados em vão. Entre o setor público, o fracasso não representou frustração, foi encarado como o desdobramento natural de um projeto envolvendo integração entre os setores público e privado.

Este foi, possivelmente, o motivo que fez o poder público assumir a condução da retomada da ATAM. Na ausência dos empresários da região e diante dos estímulos oferecidos pelos governos federal e estadual para o desenvolvimento do turismo, os prefeitos sentiram-se estimulados a reinvestir nesta área. Como o pré-requisito para a participação nos programas oferecidos era a organização regional, foi natural o retorno à estrutura adormecida da ATAM. O seminário realizado em Passa Quatro29 confirma esta tendência, mostra o interesse do município em ver reativada a associação.

A iniciativa privada coloca-se a favor desta mobilização, já que percebe claramente os benefícios que isto poderá trazer à região. No entanto, sente-se receosa em participar ativamente, devido aos resultados da experiência anterior, na qual teve participação forte.

Além do fator institucional, um elemento subjetivo também teve impacto na articulação dos prefeitos. Conforme depoimento obtido mais tarde na pesquisa de campo, os atuais prefeitos possuem uma enorme afinidade pessoal, quando se reúnem mais “parecem uma turma de velhos amigos da escola”. Esta afinidade transpõe filiações partidárias, que são as mais diversas entre os prefeitos, e tem favorecido o entendimento e a reunião entre eles. Segundo o prefeito de Passa Quatro “hoje nós, prefeitos que integramos esta região estamos mais unidos do que nunca. Como os lendários Mosqueteiros, adotamos a filosofia do ‘um por todos, todos por um’. Não obstante, estamos tendo total respaldo dos governos estadual e federal. Vislumbro, portanto, com muita satisfação o sucesso das TAM acreditando que desta vez funcionará de vez” 30.

A interação entre os prefeitos permitiu que outras soluções também fossem discutidas em conjunto, como a destinação do lixo das cidades, por meio da formação de um consórcio para coleta e tratamento, e da assinatura de acordo para a realização de mutirão entre os municípios da associação, disponibilizando o intercâmbio de máquinas, equipamentos e pessoal.

O último fato relativo à ATAM foi seu reconhecimento como Circuito Turístico pela SETUR MG, o que abre um leque de possibilidades para o turismo na região, oferecidos pelo governo estadual. No entanto, estas possibilidades precisam ser aproveitadas, e a atuação do poder público é essencial, já que ele deve atuar como interlocutor entre governo estadual e

comunidade. Isto é preocupante, porque apesar dos anos que se passaram e dos programas de sensibilização para o turismo, pouco foi feito para aumentar a capacitação do corpo de funcionários das Prefeituras, que muitas vezes ainda têm dificuldades em acessar on-line o sistema informacional das esferas de governo superiores, onde ficam disponibilizadas informações sobre apoios e outros programas.

A consciência sobre o turismo também merece ser desenvolvida. Em uma das visitas à região, foi possível verificar a alegria e o entusiasmo de três prefeitos com a liberação de uma verba pelo Ministério do Turismo para a construção de um portal com o nome da região nos acessos pela Via Dutra. Os prefeitos acreditavam que o portal faria enorme diferença na atração de turistas, ignorando o fato da condição das estradas de acesso, e da própria sinalização nas cidades, ambos muito precários. É preciso continuar o processo de sensibilização iniciado pelo PNMT, para auxiliar no entendimento correto de como se desenvolve a atividade turística, evitando ações dispendiosas e improdutivas.

O CTTAM continua possuindo características que permitem o seu ótimo desenvolvimento. É preciso empenho para encarar de frente os erros do passado e iniciar esta nova fase com as devidas modificações que permitam seu funcionamento eficaz, com o apoio de todos os segmentos da comunidade local.

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