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Da atenção básica a alta complexidade: aproximações quanto a atuação do Assistente Social

3 SERVIÇO SOCIAL E SAÚDE: a atuação de assistentes sociais nas unidades de transplante

3.1.1 Da atenção básica a alta complexidade: aproximações quanto a atuação do Assistente Social

A área da saúde sempre absorveu o maior número de profissionais de Serviço Social, principalmente após a elaboração do novo conceito de saúde que considerava também os aspectos biopsicossociais (DAL PRÁ; MARTINI, 2018).

Com o Sistema Único de Saúde as possibilidades de atuação dos(as) assistentes sociais se ampliaram permitindo a categoria trabalhar com educação e promoção da saúde, planejamento/orçamento, gestão, capacitações, regulação, ouvidorias, sistemas de informação, vigilância em saúde, saúde do trabalhador, controle social, entre outras áreas (KRUGER, 2010). Contudo, as contradições

presentes no processo de racionalização/reorganização do SUS também trouxeram demandas que expressavam a tensão entre as ações tradicionais da saúde e as novas proposições do SUS, determinando o âmbito de atuação do(a) assistente social.

Tido como um marco nas duas primeiras décadas de SUS, o processo de municipalização despertou a necessidade de alocar profissionais mais próximos aos(as) usuários(as) e os processos de planejamento e gestão, de modo que ampliou o mercado de trabalho das profissões de saúde na esfera municipal, entre as quais está o Serviço Social (KRUGER, 2010). A reforma do Estado na política de saúde e o crescimento das demandas aos serviços de saúde aumentaram a contratação de assistentes sociais em todos os níveis de atenção, sendo maior na média21 e alta complexidade22 (DAL PRÁ; MARTINI, 2018).

De acordo com Nogueira (2005), como citado por Dal Prá e Martini (2018):

Esse fato expressa as contradições do SUS e sua racionalidade hegemônica, tendo em vista que a política de saúde, mesmo tendo como uma de suas principais diretrizes a centralidade na Atenção Primária em Saúde (APS) e, dentro desta, a Estratégia de Saúde da Família (ESF), implantada nos anos de 1990, tem a maior parte dos assistentes sociais trabalhando nos serviços de média e alta complexidade; ou seja, apesar de a trajetória da profissão na saúde ter possibilitado a aquisição de conhecimentos que qualificaram o profissional para atuar na equipe de saúde como articulador do recorte do social (NOGUEIRA, 2005) e de serem abertos novos espaços de atuação depois do SUS, possibilitando a prática em trabalho multiprofissional, interdisciplinar e intersetorial, a atuação do Serviço Social nas últimas décadas permanece centrada na atenção hospitalar (DAL PRÁ; MARTINI, 2018, p. 119-120).

É com base nessas informações que objetiva-se refletir sobre a inserção de assistentes sociais na Atenção Primária em Saúde – APS, bem como nos serviços de média e alta complexidade.

Embora o Serviço Social tenha forte tradição e legitimidade na área da saúde, suas atuações foram restritas em âmbito municipal e na atenção básica. Uma realidade alterada pela municipalização proporcionada pelo SUS, tendo em vista a

21 “A média complexidade ambulatorial é composta por ações e serviços que visam atender aos

principais problemas e agravos de saúde da população, cuja complexidade da assistência na prática clínica demande a disponibilidade de profissionais especializados e a utilização de recursos tecnológicos, para o apoio diagnóstico e tratamento” (BRASIL, 2009, p.52).

22 “É definido como de alta complexidade o conjunto de procedimentos que, no contexto do SUS,

envolve alta tecnologia e alto custo, objetivando propiciar à população acesso a serviços qualificados, integrando-os aos demais níveis de atenção à saúde (atenção básica e de média complexidade)” (BRASIL, 2009, p.52).

aproximação das necessidades sociais com as necessidades de saúde, explicitadas através de demandas reprimidas. Embasado por esse contexto a categoria atua na gestão e no planejamento, ocupando espaços de coordenação na operacionalização de programas de tratamento, promoção e prevenção da saúde destinada a classes populacionais específicas (KRUGER, 2010).

Iniciativas desse tipo colocam profissionais na Estratégia de Saúde da Família – ESF, bem como se ampliam por meio dos Núcleos de Apoio a Saúde da Família – NASF. Desse modo, crescem as possibilidades de desenvolvimento de trabalhos multiprofissionais, interdisciplinares e intersetoriais junto a ESF e ao NASF, ao qual se pode citar como exemplo as relações intersetoriais onde se faz necessária uma articulação com a área da Assistência Social por meio do CRAS para condicionar o Programa Bolsa Família, atenção à população idosa, proteção às vítimas de negligencia e violência, tratamento de dependentes químicos, entre outros (KRUGER, 2010).

Kruger e Moscon (2010, p. 92) em seu relato de experiência como Residente Multiprofissional em Saúde da Família, nos anos de 2008 e 2009, revelam um pouco das necessidades de saúde que encontraram durante essa jornada:

[..] as necessidades de saúde por acesso apareceram de várias formas, sendo as mais prevalentes: a demora do agendamento de consulta com especialistas na atenção secundária; a dificuldade e a demora na marcação de exames necessários para elucidação de diagnóstico e inexistência de um fluxo com relação à realização de cirurgia de laqueadura e vasectomia.

Outras necessidades apresentadas tem relação com o contexto do município como um todo, das quais se destaca: usuários(as) que buscam atendimento em outros bairros, em virtude do bairro de sua residência não dispor de tal atendimento; serviços inviabilizados por infraestrutura; Equipes de Saúde da Família incompletas; consultas com especialista na atenção secundária que é marcada, mas o(a) usuário(a) não sabe como chegar no local, não tem dinheiro ou outro motivo o impossibilita de ir; a demora para marcar e realizar exames e consultas especializadas na atenção secundária, entre outras demandas que refletem a falha existente no complexo burocrático construído para organizar os serviços prestados (KRUGER; MOSCON, 2010).

A Atenção Básica junto a Vigilância em Saúde tem o potencial de promoção, prevenção e de educação em saúde de modo que possibilita aos(as) usuários(as) terem acesso aos serviços ofertados pela rede antes de adoecerem. Desse modo, a atenção básica funciona como porta de entrada do SUS, possibilitando que o(a) usuário(a) quando necessitar chegar aos serviços de saúde de média e alta complexidade tenham um diagnóstico precoce que viabilize tratamentos resolutivos e não somente paliativos (KRUGER, 2010).

O trabalho de assistentes sociais consiste na defesa do Sistema Único de Saúde articulado ao projeto de Reforma Sanitária, tendo o Projeto Ético-político como norteador da intervenção profissional (RAMOS, 2006). Conceito que não é diferente para a média e alta complexidade, onde a categoria exerce um papel importante na efetivação do cuidado integral em saúde e na participação social, tendo em vista o conhecimento que possui nesses âmbitos.

A média e alta complexidade exige a execução de um trabalho interdisciplinar, com a equipe voltada para a problematização e reflexão acerca das ações de saúde. Os(as) assistentes sociais tem o papel fundamental de trabalhar em busca da garantia do acesso as condições necessárias para efetivação dos direitos sociais durante a internação e após a alta hospitalar dos(as) sujeitos(as) sociais.

O Serviço Social executa seu primeiro contato com os(as) usuários(as) e seus familiares através do acolhimento e da realização da Entrevista Social, momento onde são estabelecidas as relações de aproximação que embasarão todo o trabalho interventivo a ser executado posteriormente, de acordo com as necessidades e demandas apresentadas. Como destacam Chupel e Mioto (2015):

Pode-se dizer que, para o Serviço Social, o acolhimento é parte integrante do processo interventivo dos assistentes sociais. Ele congrega três elementos que agem em concomitância: a escuta, a troca de informações e o conhecimento da situação em que se encontra o usuário. Objetiva o acesso a direitos das mais diversas naturezas, bem como a criação de vínculo e a compreensão de elementos para fundamentar uma futura intervenção. É o momento de aproximação com o usuário, que demanda exigências quanto ao conhecimento, desde a utilização da entrevista até dos fundamentos teórico-metodológicos, ético-políticos da profissão, bem como das normativas do campo da saúde e da rede de proteção social, a fim de melhor atender as necessidades do usuário de forma resolutiva e com vistas ao cumprimento do princípio da integralidade (CHUPEL; MIOTO, 2015, p.37).

Diariamente o(a) assistente social faz uso do censo hospitalar, documento que lhe permite ter acesso ao nome do(a) usuário(a), idade, tempo e motivo da internação. O uso deste documento mapeia a visita aos leitos, que são realizadas para efetivar tal ação, identificar demandas, articular encaminhamentos de acordo com a necessidade posta por cada situação particular e/ou coletiva. Cabe ao Serviço Social orientar acerca das rotinas hospitalares, possibilidades de acesso aos serviços prestados pela unidade/hospital e da rede de proteção social (CABRAL, et al, 2017).

A saúde requer de seus profissionais um trabalho voltado para o estudo do social como ponto de partida que conduz ao resultado das demandas apresentadas por cada usuário(a) que acessa aos serviços desta área. É importante o conhecimento da conjuntura; a investigação da realidade social individual e coletiva de cada usuário(a), estabelecida mediante o vinculo conquistado através do primeiro contato; estudo de caso como base para levantamento das demandas e estudo das intervenções, bem como a execução dessas respeitando os direitos, limites e até estabelecendo os deveres que cada um tem na efetivação da garantia do direito de acesso aos serviços de saúde.

Contudo, vale ressaltar que o trabalho das equipes de saúde, em especial dos(as) assistentes sociais, depende de fatores que interferem diretamente na execução de suas ações, podendo inclusive causar o adoecimento destes profissionais. Estes fatores estão ligados a estrutura, condições de trabalho, nível hierárquico principalmente no que diz respeito a relação com os médicos e a chefia, além da alienação desenvolvida por um sistema voltado para os números e não para as condições sociais e de saúde.

Desse modo, o Serviço Social tem seu trabalho voltado para a luta em favor da garantia dos direitos sociais e de saúde, resistindo às alienações do sistema, articulando com as equipes, intervindo nas condutas desrespeitosas e desenvolvendo seu trabalho segundo as competências profissionais e atribuições prvativas23 estabelecidas pelo Código de Ética da profissão.

23

A Lei de Regulamentação indica atribuição privativa como “prerrogativas exclusivas” da prática profissional dos assistentes sociais e competência como “capacidade para apreciar ou dar

resolutividade a determinado assunto, não sendo exclusivas de uma única especialidade profissional,

mas a ela concernentes em função da capacidade dos sujeitos profissionais” (Iamamoto, In: CFESS, 2012, p. 37).

3.2 AS ESPECIFICIDADES DA ATUAÇÃO DE ASSISTENTES SOCIAIS NAS