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Atendimento Educacional Especializado: possibilidade de acesso ao

2 CURRÍCULO E EDUCAÇÃO ESPECIAL EM CONTEXTO: ASPECTOS

2.2 CURRÍCULO: DIÁLOGOS COM A EDUCAÇÃO ESPECIAL

2.2.2 Atendimento Educacional Especializado: possibilidade de acesso ao

Ao buscarmos a história e a legislação da área da Educação Especial, o tema AEE vem sendo tangenciado e anunciado em suas mais diferentes configurações. O nosso interesse pela temática surgiu quando, em meados de agosto de 2010, chegamos à escola, lócus de nossa pesquisa, um pouco tímida ainda, tentando sentir o ambiente, observando, conhecendo os atores que estavam em cena. Em nosso segundo dia de pesquisa na escola, conversamos com alguns professores, explicando, nessa conversa informal, que nosso interesse estava diretamente relacionado com a escolarização dos sujeitos com deficiência, TGD e altas habilidades/superdotação. Informamos que esse foi um dos motivos pelo qual

aquela escola havia sido escolhida, pois ela possuía um quantitativo de 12 alunos que pertenciam ao grupo citado. Nesse momento, a intérprete de Libras começa a conversar e destaca que, na escola, existe uma sala de recursos multifuncionais que atende a esses alunos no contraturno. Mostra-nos o ambiente, destaca algumas ações e fala sobre atendimento educacional especializado e as inúmeras dúvidas que ela, as colegas e a escola têm sobre o AEE. Ouvimos as informações e nos inquietamos, pois essa questão não era o tema que estava a priori para ser investigado, mas, naquele espaço-tempo, apresentava-se como uma demanda do contexto da pesquisa e merecia nosso olhar atencioso. Nessa direção, buscamos estudar e aprofundar nosso conhecimento sobre a temática.

Assim, destacamos os seguintes textos que inicialmente buscamos: Dias (2010), a revista “Inclusão: Revista da Educação Especial” (BRASIL, 2010), fascículos publicados pela Secretaria de Educação Especial e os documentos orientadores e normatizadores citados.

Nossa discussão inicia-se por entender o direito à educação dos sujeitos público- alvo da Educação Especial e a contribuição do AEE, pela via do currículo, para garantia desse direito. Desse modo, temos presenciado, nos diferentes ambientes escolares, a dificuldade de implementar o direito à educação aos alunos com necessidades educacionais especiais por deficiência, TGD e altas habilidades/superdotação, visto que, sem termos ambientes, práticas pedagógicas e currículo que possibilitem a inclusão, esse direito é negado a esses alunos. Cury (2008) argumenta que o acesso ao conhecimento sistematizado é condição para a cidadania. Assim, de maneira geral, esse acesso (direito à educação) não tem sido garantido e temos negligenciado o básico a esses sujeitos.

Assim, entendemos que

A educação das crianças está diretamente relacionada com a cidadania, e, quando o Estado garante que todas as crianças serão educadas, este tem em mente sem sombra de dúvida, as exigências e a natureza da cidadania [...]. O direito à educação é um direito social de cidadania [...]. Basicamente, deveria ser considerado não como o direito da criança freqüentar a escola, mas como o direito do

cidadão adulto ter sido educado [...]. A educação é um pré-requisito necessário da liberdade civil (MARSHALL, 1967, p. 73).

Concordamos com Bobbio (2004, p. 62) quando afirma que: “[...] deve-se ter a preocupação inicial de manter a distinção entre teoria e prática, ou melhor, deve-se ter em mente, antes de mais nada, que a teoria e a prática percorrem duas estradas diversas e a velocidades muito desiguais [...]”.

Nesse sentido, o proposto na legislação (teoria) e o efetivado (prática) nos ambientes escolares têm percorrido velocidades diferentes e têm proporcionado muitas vezes o não acesso ao conhecimento e, consequentemente, o descumprimento do direito à educação.

Assim, temos vivido um momento histórico em que parece se garantir o acesso à escola, mas as condições de permanência têm sido negligenciadas. Justamente pelo fato de que o texto proposto na legislação e a efetivação dele percorrem velocidades desiguais, uma vez que os sistemas de ensino demandam tempo em se adequar às novas “regras”, nesse ínterim, esse direito é negligenciado e, muitas vezes, mesmo depois de efetivada a legislação, continua se negando por outras razões que não discutiremos neste momento. Vivemos, portanto a tensão entre ter conquistado direitos, inclusive na legislação, e a dificuldade de implementá-los (PERONI, 2009).

Dias (2010) trabalhou a questão do direito à educação dos alunos com deficiência, TGD e altas habilidades/superdotação pela via de compreender as contribuições e tensões do atendimento educacional especializado como dispositivo para trabalhar o conhecimento desses sujeitos. Assim, Dias (2010, p. 136) ressalta que

[...] o atendimento educacional especializado complementar é um direito dos alunos com deficiência e um dever do Estado, em termos da oferta do serviço. [...] apenas o acesso a esse atendimento não garante o exercício desse direito. Portanto, é preciso um empenho coletivo para que o discurso educacional se transforme em práticas coerentes e alinhadas e em resultados qualitativos para os alunos. Só assim estaremos garantindo a educação como direito social, público, subjetivo e ainda prioritário.

A temática sobre o atendimento educacional especializado está presente nos debates atuais, ao pensarmos o campo da Educação Especial. Nesse sentido, a

organização do “VI Seminário Nacional de Pesquisa em Educação Especial” propôs para o ano de 2011, como temática central “Prática pedagógica na Educação Especial: multiplicidade do atendimento educacional especializado”. Assim, os debates se deram em torno do tema. Destacamos que os textos de Kassar (2011), Prieto (2011a), Brizzola (2011), Jesus (2011), Baptista (2011), Tezzari (2011), de modo geral, discutiram a temática do AEE a partir da legislação e suas configurações bem como da história da Educação Especial.

Nesse sentido, a função e as atribuições do professor do AEE foram aspectos enfatizados em boa parte dos textos. Baptista (2011, p. 5) chama a atenção para esse profissional e seu saber-fazer a partir da sala de recursos multifuncionais:

[...] a compreensão de que o trabalho do educador especializado devesse ser aquele de exclusivo atendimento direto ao aluno por meio do domínio de técnicas, instrumentos e linguagens específicas; a crença de que, além dessas características, seria de se esperar que o profissional responsável pela educação especial devesse atuar em diferentes frentes, na assessoria e formação de colegas, como segundo docente em uma mesma sala de aula que o professor regente de classe, no acompanhamento de famílias, como possível interlocutor com equipes externas à escola que se envolvem em atendimentos dirigidos ao aluno com deficiência.

Outro aspecto que apareceu com frequência foi o lócus de realização do AEE, sendo reconhecido o espaço da sala de recursos multifuncionais. Lunardi (2011, p. 5) sugere:

A sala de recursos multifuncionais se caracteriza como um serviço especializado de natureza pedagógica com o auxílio de materiais específicos e equipamentos tecnológicos, que apoiam e complementam o atendimento educacional realizado nas classes de ensino regular, mediante a necessidade do cumprimento do estabelecido nos documentos oficiais para a educação.

Magalhães (2011), ao fazer um resgate histórico da Educação Especial, destaca a história das “classes especiais” e nos alerta para cuidado que precisamos ter para que as atuais salas de recursos multifuncionais não sejam caracterizadas de modo semelhante ao que ocorreu anteriormente. Vejamos o trecho:

O que ocorreu com as classes especiais no Brasil é de conhecimento público e, graças ao esforço dos pesquisadores de várias universidades, as pesquisas foram, gradativamente, mostrando que a

‘modalidade de atendimento classe especial’ criou uma lógica de exclusão na escola (era a ‘sala dos doidinhos’), além de diversos problemas que vão da formação de professores, ao modo como a escola significou esta classe, um ‘depósito’ de alunos para desafogar problemas da rede regular de ensino. É importante não esquecer que isto ocorreu e como isto ocorreu (MAGALHÃES, 2011, p. 8).

Nessa direção, Kassar (2011, p. 3) também destaca as complexidades que envolveram as classes especiais. Para a autora, os principais “problemas” relacionados com esse espaço, são:

1. Nelas estavam matriculadas crianças cujos diagnósticos eram questionáveis; 2. Essas classes serviam como uma forma de exclusão camuflada da escola pública, visto que a elas eram encaminhados principalmente filhos das camadas mais pobres da população; 3. O ‘especial’ do atendimento resumia-se à infantilização e à lentidão das atividades propostas; 4. Muitas vezes, as crianças eram segregadas de todos os outros espaços e atividades escolares; 5. Havia um distanciamento extremo entre as atividades praticadas nesses espaços e o cotidiano escolar, de modo que aquelas eram organizadas sob um enfoque clínico.

Esses foram alguns aspectos que percebemos após visitação ao conhecimento acumulado, que nos permitiu vislumbrar sobre a temática e a complexidade presente. Depois de elencar a temática do AEE como fundamental no diálogo entre currículo e Educação Especial, no próximo item, tentaremos estabelecer algumas conexões entre os campos.

2.2.3 Currículo e Educação Especial: conexões possíveis a partir da teoria