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CAPÍTULO 4: O TRABALHO DO ASSISTENTE SOCIAL NA ATENÇÃO BÁSICA

4.3 Resultados e Discussões

4.3.1 O Trabalho do Assistente Social na Atenção Básica em Saúde em Sergipe

4.3.1.5 Atendimentos aos Usuários

A compreensão sobre o perfil dos atendimentos e acompanhamentos auxiliou na caracterização do modo de trabalho do assistente social direcionado aos usuários, que é um dos pilares da atuação dos assistentes sociais na saúde, conforme os Parâmetros do CFESS (2010) para essa área do Serviço Social.

Com o objetivo de caracterizar o trabalho do referido profissional junto aos usuários, identificou-se nessa categoria sobre as variáveis quanto ao público-alvo, faixa etária, tipo de demanda e local de atendimento.

Em relação aos atendimentos é importante sinalizar primeiramente, que de acordo com o Código de Ética, o assistente social tem como princípio norteador, o “exercício do Serviço Social sem ser discriminado/a, nem discriminar, por questões de inserção de classe social, gênero, etnia, religião, nacionalidade, orientação sexual, identidade de gênero, idade e condição física” (CFESS, 2012). Nesse sentido, o público-alvo do trabalho do assistente social na atenção básica em saúde em Sergipe (gráfico 16) são todos os usuários de saúde. Contudo, entre 2015 a 2019, ficou evidente que as mulheres foram à maioria (16%). Em seguidas foram às crianças (11%), a comunidade em geral (11%), idosos (9,4%) e homens (8,60%).

Gráfico 16: Público Atendido pelo Assistente Social na APS em Sergipe (2015 a 2019)

Fonte: MS/DESF. Sistema de Informação em Saúde para a Atenção Básica (SISAB). Acesso em: abr. 2020. Com base nesses dados, evidenciou-se que a diferença entre homens e mulheres, no que se refere aos atendimentos e acompanhamentos pelo Serviço Social da atenção básica, teve como resultado uma variação que representou praticamente o dobro (7,4%) de um

público para outro. Essa constatação remonta a uma tendência apontada por Gomes, Nascimento e Araújo (2007, p. 565) de que a “presença de homens nos serviços de atenção primária à saúde é menor do que a das mulheres”. Também os autores Alves et al. (2011) afirmaram que na APS a maior procura pelos serviços de saúde é feminina. Embora não seja o foco desse estudo, convém destacar que a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem busca reduzir essa diferença no país (BRASIL, 2008).

Outro critério associado à constatação sinalizada no gráfico 16 remonta ainda ao fato de que as mulheres são mais expostas ao contexto da condição de pobreza e vulnerabilidade social e, por isso, procuram mais pelo atendimento na atenção básica a saúde. Para Melo (2005, p. 3) as questões de gênero e classe “[...] incidem com maior peso na vida das mulheres que as tornam mais vulneráveis com a relação à pobreza”. Também o estudo de Costa, et al. (2005), deixou evidente a existência de uma sobre-representação10 feminina na pobreza, ou seja, de uma presença maior de mulheres entre os mais pobres. Um exemplo disso foi que a Organização das Nações Unidas (ONU) noticiou em 2016 que, “as mulheres foram às principais beneficiárias das políticas sociais para a redução da pobreza no Brasil nos últimos anos”.

Nesse contexto, a saúde da mulher foi abordada e analisada pelo Protocolo da Atenção Básica específico para esse tema, publicado pelo Ministério da Saúde no ano de 2015, que estruturou a orientação no seguinte sentido: “os profissionais da Atenção Básica devem estar atentos e preparados para apoiar a mulher e sua família, para reconhecer condições de risco e vulnerabilidade física, psíquica e social, e para utilizar os recursos das redes de saúde e intersetorial [...] (BRASIL, 2016). Diante disso, refletiu-se que o fato das mulheres serem o público mais constante nos atendimentos do trabalho do assistente social na APS, para além da tendência histórica de serem mais cuidadosas e participativas, tem vinculação também com os impactos do sistema capitalista que atinge sobretudo, os mais vulneráveis.

Em relação à faixa etária mais atendida, constatou-se no gráfico 17, que entre as mulheres foi predominante a variação entre 30 aos 39 anos (24%). Já entre os homens, essa faixa etária foi de 50 a 59 anos (16%). Trata-se, portanto, de um público adulto e em idade economicamente ativa segundo classificação do IBGE (2010). Esse perfil encontrado não seguiu a mesma linha da pesquisa publicada no ano 2019, sobre as condições de trabalho de

10 O termo sobre-representação é utilizado pelos referidos autores de maneira vinculada a predominância da

condição de pobreza entre mulheres ou de famílias mantidas somente por estas. De acordo com Costa, et al (2005, p. 7): “O Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), por exemplo, aponta uma sobre- representação das mulheres entre os pobres no Relatório de Desenvolvimento Humano de 1995, e afirma que 70% dos pobres no mundo eram mulheres”.

assistentes sociais da área da saúde, que afirmou que: “o público atendido pelo serviço social é majoritariamente composto de crianças, idosos, pessoas com algum tipo de enfermidade ou deficiência, drogadição, perda de poder familiar, violência doméstica, conflito com a lei, dentre outros, [...]” (LOURENÇO et al., 2019, p. 163).

Gráfico 17: Faixa Etária dos Usuários Atendidos por Assistentes Sociais na APS em Sergipe (2015 a 2019)

Fonte: MS/DESF. Sistema de Informação em Saúde para a Atenção Básica (SISAB). Acesso em: abr. 2020. Quanto ao tipo de atendimento prestado aos usuários, o gráfico 18 apontou para as demandas específicas / consultas no dia (53%), como as mais recorrentes.

Gráfico 18: Tipos de Atendimentos do Assistente Social na Atenção Básica em Saúde em Sergipe

Em seguida, foi prevalecente, no trabalho do referido profissional, as demandas específicas para escuta inicial e orientação (17%) e consultas agendadas / programadas para cuidados continuados (17%).

Segundo Brasil (2013, p. 33) a demanda específica / consulta no dia, refere-se aquelas desempenhadas “[...] no mesmo dia em que o usuário busca o serviço, de caráter não urgente”. Assim, o fato desse tipo de demanda ter recebido os maiores registros no banco de dados, comunica sobre o trabalho do assistente social com o acolhimento das demandas. Na visão de Sousa (2004, p. 59) para o “assistente social, uma de suas atribuições no exercício da abordagem individual é o acolhimento do usuário”. E é um critério previsto na Política Nacional de Humanização.

Outro tipo de constatação vista a partir do gráfico 18, foi sobre o atendimento as demandas específicas para escuta inicial e orientação (17%). Esse dado está relacionado ao anterior, pois no contexto da atenção básica a saúde, o processo de atendimento das demandas por parte do Serviço Social, tem início com a escuta e acolhida dos usuários. Segundo entendem Chupel e Mioto (2010, p. 50) “como postura profissional, o acolhimento é visto como uma diretriz e, nesta acepção, receber, escutar e tratar de maneira humanizada os usuários e suas demandas é o pressuposto de uma postura baseada no acolhimento”.

Sobre os tipos de demandas de saúde (gráfico 19), o sistema de informação em saúde para a atenção básica (SISAB) classificou a atuação do profissional em 22 modalidades de problema/condição de saúde. Contudo este estudo classificou quatro como mais recorrentes.

Gráfico 19: Principais Demandas para o Atendimento do Assistente Social na Atenção Básica em Saúde em Sergipe

Nessa perspectiva, de acordo com o gráfico 19, quatro problemas / condição de saúde, foram mais constantes em termos de registros no SISAB, vinculados ao trabalho do assistente social na atenção básica em saúde em Sergipe: puericultura (8078), saúde sexual e reprodutiva (6119), saúde mental (8979) e reabilitação (15018).

Com base no gráfico 19, pode-se entender que a reabilitação foi à conduta mais freqüente (total: 15018) no período analisado. A reabilitação trata-se de um processo de cuidados com a pessoa com deficiência. No âmbito da APS essa condição recebe o tratamento da equipe multidisciplinar da qual o assistente social integra, contribuindo com o acolhimento necessário para um progresso no quadro de saúde do indivíduo em reabilitação. O contato do referido profissional com os indivíduos nessa condição, ocorre a partir do acolhimento as demandas específicas, por meio de um escuta inicial, além de uma prestação de cuidados continuados que vão orientar o usuário do serviço de saúde e viabilizar o acesso deste aos seus direitos, inserindo-o na rede de atenção básica a saúde e conectando-o as políticas sociais.

Entre os profissionais de nível superior que possuem competências no campo da reabilitação, incluem-se terapeutas ocupacionais, fisioterapeutas, fonoaudiólogos, psicólogos e assistentes sociais. Esses profissionais contribuem para a melhora ou manutenção da funcionalidade das pessoas na interação com o seu ambiente por meio de intervenções diversas, como exercício físico, educação em saúde, acolhimento e aconselhamento, adaptações no ambiente e disponibilização de tecnologias assistivas. Tais medidas, portanto, pressupõem que a reabilitação pode ser configurada por práticas multidisciplinares e multiprofissionais, com variada população assistida em função de múltiplas condições clínicas e funcionais (MELO, 2019, p. 17).

Quanto ao local onde o assistente social atende o usuário, no gráfico 20, os resultados no período analisado nessa pesquisa foram de 86%, para o espaço da UBS. “Esse dado segue a constatação afirmada nas diretrizes do NASF (2010, p. 10) de que: “a atuação das equipes ocorre no território, principalmente, nas unidades básicas de Saúde [...].

Conforme dispõe a PNAB (2017): “art. 6º [...]. Parágrafo único. Todas as UBS são consideradas potenciais espaços de educação, formação de recursos humanos, pesquisa, ensino em serviço, inovação e avaliação tecnológica para a RAS”. Nesse sentido é um espaço onde o cidadão tem a oportunidade de dialogar sobre a promoção de saúde, prevenção, de doenças e qualidade de vida e direitos, sendo, sobretudo um espaço de cidadania.

De acordo com Carrapato, Souza e Santos (2014, p. 3):

As Unidades Básicas de Saúde são as “portas de entrada” para o SUS, e a atuação profissional do serviço social nas mesmas é voltado a descobrir todas as possibilidades de ação, já que o campo de expressões da questão social apresenta

concretas desigualdades, onde os direitos sociais são constantemente ameaçados, inclusive o direito a saúde e à vida.

Gráfico 20: Local de Atendimento (2015-2019)

Fonte: MS/DESF. Sistema de Informação em Saúde para a Atenção Básica (SISAB). Acesso em: abr. 2020. Os espaços das unidades básicas de saúde (UBS) estão situados nos territórios de saúde, junto aos sujeitos que integram a comunidade. Também tem a finalidade de acolher a realidade, as condições de vida, sendo um ponto de apoio para receber as vulnerabilidades e as potencialidades das condições dos indivíduos, bem como o contexto e a dinâmica do cotidiano local. Portanto, trata-se de um espaço técnico que possibilita ao assistente social vivenciar a dimensões constitutivas da profissão: teórico-metodológica, técnico-operativa e ético-politica, bem como conhecer e intervir na realidade.

Em relação ao vínculo do profissional direto com o usuário, sinalizam Silva e Krüger (2018, p. 279), que este contato surge “de forma espontânea (interna e externa), pois os indivíduos buscam por atendimento direto ou são encaminhados pelos mais diversos setores da unidade ao Serviço Social”. Essas demandas espontâneas tendem a se apresentar associadas à cobrança de respostas imediatas e burocráticas, sendo este um desafio para o assistente social, uma vez que o referido profissional deve buscar ultrapassar a barreira da imediaticidade das demandas, por meio da reflexão e análise da totalidade dos fatos com o escopo de construir respostas que transcendam a burocratização e não reproduzam a lógica capitalista no processo de trabalho com modelos engessados de respostas as demandas sem o viés crítico e político, que tolhem a capacidade de construção de formas de enfrentamento ao processo de desestruturação e contrareformas a política de saúde. Por isso é importante as respostas profissionais seguirem na direção sócioeducativa para conscientizar a comunidade

de saúde da capacidade que possuem para romper com a alienação, desejada pelo capitalismo, por meio da luta por garantias de saúde com qualidade, como um direito de todos.

Os atendimentos ao usuário como ações específicas de demandas ao assistente social na atenção primária “devem ser precedidas de encaminhamento por parte da eSF, com discussões e negociação a priori entre os profissionais responsáveis pela situação” (MARTINI; DAL PRÁ, 2018, p. 126). Então, o atendimento direto ao usuário corresponde a uma atuação de natureza conjunta e coletiva, devendo ser objeto de atuação de toda a equipe.

Os parâmetros do CFESS (2010) revelam que o atendimento direto aos usuários ocorre em todos os espaços de atuação profissional e em todos os níveis de saúde, sendo composto por ações que funcionam de maneira interdependente e complementares: “as ações socioassistenciais, as ações de articulação interdisciplinar e as ações socioeducativas.” (CFESS, 2010, p. 42). Tais ações são classificadas como essenciais para o funcionamento do processo de trabalho do assistente social na saúde, uma vez que norteiam as intervenções desse profissional com foco na interdisciplinaridade e no fortalecimento da coletividade. Para tanto, orienta o referido documento do CFESS, que o assistente social deve atentar-se para que suas ações sejam pautadas na investigação da realidade, para planejar suas intervenções de modo a envolver e estimular a participação da população no engajamento dos processos e no controle social na saúde. Além disso, documento do CFESS indica também que as ações sócioassistenciais do Serviço Social na saúde devem seguir a direção sócioeducativa como medida das suas práticas de trabalho com os usuários dos serviços em todos os níveis de atenção a saúde.