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196 atestado por vária correspondência, publicada e inédita), é provável que a família do editor da & etc detenha,

para além de outros papéis, um conjunto de materiais epistolares a ele endereçados, certamente clarificando a longa relação dos dois.

Na morte de Pacheco, Silva Tavares escreveu “Requiem para um inimigo” (Público, 7 de Janeiro de 2008, p. 6). Neste artigo dá ideia das atribulações por que terá passado a relação dos dois:

“[…] Do editor que ele foi (sem recursos financeiros, mas com pontaria de conhecedor, a sua Contraponto cumpriu-se como aventura intelectual à revelia de negócios e oportunismos) só uma palavrinha: reconhecimento. Neste ponto, não posso deixar de ter sido seu amigo (por ele conheci Cesariny e Herberto), eu, que lá perdi agora – e como o lamento! – um dos meus mais ferozes e dedicados inimigos. Por admirações mútuas, por ciúmes, por amores, por dissonâncias existenciais. Não estou só. Ao perder um tal inimigo, mais desamparadas ficam as ronceiras letras portuguesas que inundam escaparates de supermercados. «A crítica - eis a razão da nossa permanência», frase de António Maria Lisboa que o Pacheco chamou sua para a contracapa da Crítica de Circunstância que me honrei de publicar e a PIDE sacou, num ápice. Estará, na circunstância, tudo dito, que é nada.”

TEXTOS DE GUERRILHA 2.ª SÉRIE

Como diz a Luís Amaro na carta 67, Pacheco pretendia fazer um volume mais “gordo” da segunda série de Textos de guerrilha. Em entrada no diário de 23 de Janeiro de 1981 escrevia: “Não posso incorrer em estúpidas ilusões em relação ao sonhado volume”, que pretendia ser “O repositório de uma vida (quase), de uma geração e uma época. Tenho de apanhar o Luís [Alves] distraído; fazer-lhe ver, depois, as vantagens que podem tirar de tal besteira, para ele (cacau) para mim (cacau, algum; cabotinice super. Cf. Mailer)” (entrada de 30 de Janeiro de 1981). Para isso havia um projecto sumário de quase 50 textos, onde se incluía uma carta a Jaime Salazar Sampaio (s.v.), e se meditava noutros tantos títulos (“do Lobo Antunes, da Lídia Jorge gostaria de falar, nem que fosse num artigo colectivo, género “Eixo Invisível”, v.g.).

TCHEKOV, ANTON (1860-1904)

Anthon P. Tchekhov foi um escritor e médico russo, que se notabilizou sobretudo como contista e dramaturgo. Enquanto médico, empreendeu campanhas contra a fome e a epidemia de cólera. Escreveu contos e novelas, tendo-se voltado para o teatro em 1887, onde se celebrizou. É responsável pela incorporação de um certo realismo no teatro russo, sendo de destacar da sua produção dramática Ivanov (1887), A gaivota (1896), O Tio Vânia (1899), As Três Irmãs (1901) e O Cerejal (1904).

É mencionado nesta correspondência a propósito de uma edição Contraponto de obras de Tchekov, traduzidas por Luiz Pacheco, também se mencionando reparo feito à edição da Portugália Editora (1963) de Os Tzibukine, tradução de Maria Eugénia Cunhal (s.v.).

Sobre a tradução na edição da Portugália – e como já tinha dito a Amaro na carta 11 – disse que teria nalguns contos “procurado obter um pouco mais de emoção (mesmo forçando, talvez, a habitual continência tchekhoviana”, também lhe parecendo o título “Dor” pouco acertado, acabando porém por dizer que o trabalho da tradutora resultara “num louvável contributo para o melhor conhecimento, entre nós, da obra ficcionista de Anton Tchekov” (supl. “Portas do Sol” do Correio do Ribatejo de 27 de Julho de 1963, 9). A tradução foi reeditada em 1996, tendo Pacheco projectado a inclusão de um texto complementar com o título “Como se traduz do Russo”, segundo o diário de Abril de 1996.

TERRA, JOSÉ (Prozelo, Arcos de Valdevez, 24 de Maio de 1928 – Paris, a 18 de Janeiro de 2014)

José Terra, pseudónimo de José Fernandes da Silva, foi um poeta e professor português, formado em Filologia Clássica pela Universidade de Lisboa. Professor no ensino secundário, também em Lisboa, é em 1957 nomeado leitor de Português na Faculdade de Letras de Aix-en-Provence (França). José Terra foi depois professor desde 1984 até à jubilação, na Sorbonne – Universidade de Paris III. Foi co-fundador da revista Árvore (1951-53), com António Luís Moita, António Ramos Rosa, Raul de Carvalho e Luís Amaro, assim como da revista Cassiopeia (1951-1955). Tem estreia poética com Canto da Ave Prisioneira (1949). É referido neste conjunto na carta 64 porque estaria interessado em adquirir Pacheco versus Cesariny (s.v.) através de pedido de Amaro a que Pacheco não terá conseguido aceder. Pacheco enviou-lhe, contudo, exemplares de O Libertino (s.v.) e de Comunidade. Mais tarde, na carta 65, é mencionado numa altura em que Pacheco se encontrava em Vila Nova de Cerveira, lembrando-se que aí tinham passeado Amaro e Terra.

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TORGA, MIGUEL (Vila Real, 1907 – Coimbra, 1995)

Miguel Torga é o pseudónimo de Adolfo Rocha, poeta, ensaísta, dramaturgo e ficcionista. Ainda em Trás- os-Montes, cedo abandonou a candidatura ao seminário, tendo passado a puberdade no Brasil (1920-1925) e completado o liceu em Coimbra, cidade onde também completou o curso de Medicina (1928-1933). Fundador da revista Presença, de que cedo se viria a afastar, estreia-se em poesia com Ansiedade (1928). É em 1934 que Adolfo Rocha perfilha o nome literário Miguel Torga (A Terceira Voz). Em 1938 e 1941 publica dois livros apreendidos pela PIDE (O Quarto Dia, Contos da Montanha). Em 1960 foi proposto pela Universidade de Montpellier para Nobel da Literatura, tendo sido candidato novamente em 1978. Sobre Miguel Torga, Luiz Pacheco escreveu profusamente, apesar da “juvenil idolatria por ele” (Memorando, p. 275), o mais das vezes com palavras duras. De Torga condenou o aburguesamento e a postura reacionária, pós-25 de Abril, e sobretudo as lamentações na diarística, sendo que, na perspectiva de Pacheco, se tratava de um autor consagrado já na ditadura e não propriamente de um perseguido político durante a totalidade do regime salazarista, como pela leitura dos livros que compunham o Diário (1941- 1993) se poderia inferir. Os volumes deste criticará em diversos artigos, assim como na correspondência, nomeadamente a Pedro da Silveira, considerando “as notas e poemas dos 16 volumes do Diário […] cada vez mais infelizes, nem outra coisa seria de esperar” (inédito datado de 25 de Outubro de 1993).

A propósito de um encontro com Miguel Torga disse:

“Deteve-se à minha beira, fez um pião rapidíssimo, quase se perfilou. Sorriso jovial, resplendoroso. Entabulámos um breve diálogo, eu jogando tudo numa reverente diplomacia, ele presidencial, mas cheio de bonacheirice. […] E abala todo contentinho, besuntado de vaidades mil. Também mais feliz eu, por ter encontrado, finalmente, não o telúrico inacessível bonzo mas uma pessoa igualzinha, nas suas humanas fraquezas, ao criador dos Novos Contos da Montanha, dos Bichos” (Memorando, p. 17).

Dizia a 25-01-79 a Laureano Barros ter tido “uma grande paixão pelo Torga que, se lendo agora, para me experimentar, alguns livros dele antigos confirmei: é um grande escritor português e uma personalidade rara. Mas escreve bem também o Salazar; grande e espantoso bicho humano, também ele era” (George, 2017: 154-155).

TORRES, ALEXANDRE PINHEIRO (Amarante, 27 de Dezembro de 1923 – Cardiff, 3 de Agosto de

1999)

Alexandre Maria Pinheiro Torres foi um poeta, romancista e ensaísta português. Foi também professor catedrático de Literatura Portuguesa, Brasileira e Africana de Língua Portuguesa na Universidade de Cardiff, na Grã-Bretanha (1976-1999). Estreia-se como poeta com Novo Génesis (1950) e como romancista com A Nau de Quixibá (1977). É igualmente autor de antologias como Antologia da Poesia Trovadoresca Galego-Portuguesa, (1977) ou Antologia da Poesia Portuguesa do Século XII ao Século XX (2 vols., 1977). Pertence à chamada segunda geração neo-realista portuguesa. Tornaram-se célebres, no início dos anos 60, as polémicas que assumiu em defesa deste movimento em jornais e revistas como Jornal de Artes e Letras, Seara Nova, Diário de Lisboa, Jornal de Notícias.

É Alexandre Pinheiro Torres quem em 1970 Luiz Pacheco compara a Jean Genet, em texto com título “Luiz Pacheco ou o burlador de Braga «magíster artium eroticarum»” (incluído em Textos Malditos, pp. 155-164 e em O Libertino, pp. 67-75). A crítica foi publicada no suplemento literário do Diário de Lisboa. Apesar de ter sido censurada, uma carta de Pinheiro Torres à Censura, numa altura em que era professor universitário em Cardiff, ameaçando tornar público o caso nos jornais ingleses, levou a que o texto tivesse saído sem cortes.

Note-se ainda que Pinheiro Torres publicou uma crítica a Comunidade, “A Comunidade de Luiz Pacheco ou a Justificação da Família como Instituição Natural (melhor: uma parábola = pérola atirada aos porcos)”, Diário de Lisboa, supl. literário, 14 de Janeiro de 1971, pp. 7-8.

ULISSEIA EDITORA

Editora fundada em 1946 por Luís Reis Santos, especialista em investigação e crítica de arte. Este cede a quota a Joaquim Figueiredo de Magalhães (s.v.), sócio da Édipo, em 1948. Figueiredo Magalhães assume a gerência da Ulisseia após dissolução da Édipo, em 1954 (Medeiros, 2010: 79). A editora conta por esta altura entre os membros do conselho de leitura nomes como Branquinho da Fonseca, Casais Monteiro,

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