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6 RESULTADOS

6.1 Diagnóstico da pesca artesanal na bacia do rio Buba

6.1.1 Atividade pesqueira e ictiofauna

Durante séculos, a pesca no rio Buba, a exemplo do que ocorre em todo litoral guineense, sempre foi praticada pelas comunidades locais. Cada comunidade tinha uma zona de pesca que lhe era tradicionalmente reconhecida, sendo uma atividade de subsistência destinada exclusivamente para o sustento do agregado familiar. A atividade pesqueira era desenvolvida de forma diversificada com emprego de instrumentos muito rudimentares como as lanças e armadilhas. Nos primórdios das pescarias já se utilizavam também as redes, embora com uma frequência muito baixa comparada aos dias atuais (IUCN, 2011).

As pescarias na bacia do rio Buba ocorrem a seu montante e se desenvolvem em várias zonas entre as quais se destacam as localidades de Batambali, Brandão, Buba, Bubatumbo, Darsalam, Empada, Fulacunda, Farancunda, Míssira, Nimputo, Ponta Tinta, Saol, Sibidjan, entre outros. As expedições pesqueiras são realizadas na maré baixa e não tem um período definido para saída das embarcações, uma vez que as operações de pesca podem ocorrer durante o dia ou noturnamente.

Na área de estudo atuam pescadores que operam parcialmente durante o ano, ou seja, quase todos têm a agricultura como atividade complementar a pesca e vice-versa. A época de maior intensidade de pesca ocorre nos meses de novembro

a abril, sendo dezembro o mês mais ativo. O período chuvoso (maio a outubro) costuma ser dedicado à atividade agrícola e coincide com a principal época de reprodução de várias espécies de peixes, o que contribui significativamente para a renovação dos estoques. Diferente das Ilhas de Cabo Verde, por exemplo, onde a pesca ocorre durante todo o ano, desde que as condições do mar a permitam, uma vez que as zonas de pesca são mais escassas e a baixa precipitação quase não permite a agricultura (UICN, 2011).

Durante a época das chuvas a atividade pesqueira é condicionada por vários fatores naturais tais como os trovões e ventos fortes, principalmente nos meses de setembro e outubro. Os pescadores são desprovidos de meios de comunicação de longo alcance (Barco-Terra-Barco), e quando há pouca visibilidade o raio das suas atividades fica limitado. Conforme o relato dos sujeitos da pesquisa, o rendimento das capturas tem registrado, nos últimos anos, uma diminuição tanto na quantidade como no tamanho dos indivíduos, fato que pode estar relacionado com a sobrepesca devido a invasão dos pescadores alóctones e ao uso de certas artes de pesca proibidas.

A simplicidade dos engenhos de pesca, as modestas embarcações, a limitada capacidade de conservação do pescado ou a reduzida acessibilidade aos meios tecnológicos mais sofisticados contribuem, de certo modo, para moderar as capturas da pesca artesanal e, portanto, manter o equilíbrio das populações de peixes. Da mesma forma, na maioria das comunidades costeiras todos os meios de pesca eram tradicionalmente proibidos durante a época das chuvas, período considerado de reprodução dos peixes. Os canais secundários do rio, considerados como sagrados, eram igualmente protegidos. Essas práticas tradicionais também permitiam limitar a pressão sobre as populações de peixes durante o período crítico da reprodução, garantindo assim a renovação dos estoques. A gestão da pesca artesanal no rio Buba atualmente é baseada em certas regras. Dentre as principais normas estão a regulamentação das artes de pesca, zoneamento e o período de repouso (defeso) instituído para a espécie Spyraena afra.

Quanto à divisão de trabalho relativa a atividade (TABELA 2), nos primórdios os homens se dedicavam essencialmente à pesca, enquanto as mulheres se ocupavam da coleta de moluscos e alguns crustáceos para a alimentação do agregado familiar, além de processamento do pescado. Nos dias

atuais percebe-se uma mudança principalmente na ocupação das mulheres. Estas estão cada vez mais envolvidas no aspecto econômico da atividade (processamento, transformação, e comercialização do pescado).

Tabela 2 – Divisão de trabalho entre homens e mulheres nos principais grupos associativos.

Localidade Homens Mulheres Homens Mulheres Nº Membros Faixa etária Homens Atividade principal Mulheres

Buba 35 35 18-65 20-65 Pesca Agricultura Caça Beneficiamento do pescado Comercialização Batambali 35 50 21-64 19-60 Agricultura Pesca

Extração de mel

Idem

Brandão 40 41 25-75 30-65 Agricultura Pesca Beneficiamento do pescado Darsalam 273 170 18-60 20-60 Agricultura Pesca

Caça Beneficiamento do pescado Produção de sal Fulacunda 21 44 30-65 25-59 Pesca Agricultura Extração de óleo de palma e mel Beneficiamento do pescado Comércio

Lamane 55 67 18-60 18-60 Agricultura Pesca Beneficiamento do pescado Artesanato Míssira - - 18-70 18-75 Pesca Agricultura Extração de mel Idem Fonte: Projeto Rias do Sul/CIPA, 2014.b

Por toda a extensão da bacia do rio Buba existem cerca de quinze grupos de organizações associativas, dentre os quais pescadores, mulheres transformadoras de pescado e comerciantes. Estes grupos de homens e mulheres se distinguem pelo fato de serem altamente organizados funcionalmente. Contam com a participação permanente dos seus associados por meio da boa vontade e empenho. Com os recursos financeiros próprios, na maior parte das vezes, tendem a ser mais eficientes e mais capazes de alcançar seus objetivos do que as outras modalidades de grupos associativos.

O beneficiamento, tarefa desempenhada exclusivamente pelas mulheres tem sido a principal atividade de agregação do valor ao pescado. Quando o produto não for consumido fresco, é tratado, segundo os métodos de conservação local, que podem variar em função das condições meteorológicas do local e da época.

Uma das técnicas mais utilizadas pelas mulheres é a combinação da salga e secagem, processo que consiste em adição de sal ao peixe seguida da exposição ao sol, que pode durar dias. Outra técnica de processamento do pescado é a defumagem; processo em que os peixes são dispostos em cima de uma estrutura feita de tijolo e revestida de concreto. O recinto dessa estrutura é alimentado geralmente por uma fonte de energia de origem vegetal, que libera fumaça em direção ao pescado. Todo processo pode durar horas ou dias dependendo do tipo de pescado; alguns subprodutos do pescado são sujeitos a um tratamento típico (FIGURA 16).

Figura 16 – Processamento do pescado no rio Buba, por meio das técnicas de salga, secagem e defumação.

Fonte: Elaboração própria a partir de dados da pesquisa, 2017.

De acordo com o Projeto Rias do Sul/CIPA (2014b), pelo menos 68 espécies de peixes são capturadas pela pesca nesse ecossistema, sendo 38 de valor econômico (QUADRO 11). Quanto à abundância de espécies, as famílias com maior ocorrência são: Haemulidae e Mugilidae com 4 espécies cada, e a família Sciaenidae representada por 3 espécies.

Quadro 11 – Composição da ictiofauna do rio Buba, de acordo com as espécies mais capturadas pela pesca, para o ano de 2013.

Fonte: Projeto Rias do Sul/CIPA (2014b).