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Conceitua-se o ativismo judicial como uma forma de amparo aos direitos fundamentais realizada pelo sistema judiciário, isto é, quando um direito fundamental é ameaçado pela falta do amparo de uma lei, há a necessidade de o Poder Judiciário inovar em prol da causa, a fim de que seja garantida a efetivação daquele direito (FERREIRA, 2017, p. 1).

Segundo Ferreira (2017, p. 1),

O Ativismo Judicial pode ser definido como o papel criativo dos Tribunais ante a insuficiência da norma jurídica em se fazer abranger em todos os casos que chegam ao Judiciário como também de ampliar a interpretação dos dispositivos legais gerando precedente jurisprudencial tendo como origem um caso em concreto. Neste sentido o ativismo é uma atitude do magistrado em face de lei lacunosa ou que não produza efeitos completos na efetivação dos direitos e garantias fundamentais. Porém, não há como falar sobre ativismo judicial sem antes entender o fenômeno do neoconstitucionalismo.

Assim, em meados de 1949, começava, na Europa, a chamada

reconstitucionalização, que mudou de forma significativa as interações entre a Constituição e as instituições públicas (BARROSO, 2005, p. 1).

No Brasil, as discussões sobre o novo Direito Constitucional ocorreram no ano de 1988, simultaneamente à proclamação da atual Constituição da República. Assim, o país saía

de um regime autoritário e entrava em uma nova fase, onde os governantes estariam obrigados a respeitar as leis e os direitos fundamentais por ela dispostos (BARROSO, 2005, p. 1).

A respeito das mudanças trazidas com a nova Constituição, comenta Barroso (2005) que

Sob a Constituição de 1988, o direito constitucional no Brasil passou da desimportância ao apogeu em menos de uma geração. Uma Constituição não é só técnica. Tem de haver, por trás dela, a capacidade de simbolizar conquistas e de mobilizar o imaginário das pessoas para novos avanços. O surgimento de um sentimento constitucional no País é algo que merece ser celebrado. Trata-se de um sentimento ainda tímido, mas real e sincero, de maior respeito pela Lei Maior, a despeito da volubilidade de seu texto.

Portanto, antes o país possuía leis vazias, sem real força normativa, por conta do estrito vínculo tido com o regime autoritário, assim, segundo Barroso, “coube à Constituição de 1988, bem como à doutrina e à jurisprudência que se produziram a partir de sua

promulgação, o mérito elevado de romper com a posição mais retrógrada” (2005, p. 1).

A nova Constituição trouxe outros mecanismos que possibilitaram a ampliação (ou flexibilização) da interpretação das leis, bem como trouxe, consigo, novas ações voltadas à proteção de preceitos constitucionais, como explica Barroso (2005, p. 1), ao citar a ação declaratória de constitucionalidade e a arguição de descumprimento de preceito fundamental como exemplos.

E é em meio a essa nova teoria constitucional que surge a importância do papel do Supremo Tribunal Federal na interpretação extensiva das normas, que se faz cada vez mais necessária à medida em que a sociedade evolui (BARROSO, 2005, p. 1).

Assim, segundo Egger, “com fundamento no discurso dos direitos fundamentais e na ideia de democracia inclusiva, através de decisões criativas e interpretações expansivas das normas constitucionais, o STF vem ultimamente intervindo nas escolhas políticas do Executivo e do Legislativo” (2017, p. 34).

Esse fenômeno ficou conhecido, no Brasil, como “ativismo judicial”.

Porém, o termo “ativismo judicial” surgiu muito antes, mais precisamente em

meados do ano de 1947, nos Estados Unidos, quando o historiador e crítico social Arthur M. Schlesinger Jr. produziu um artigo para a revista Fortune, onde comentava sobre a maneira de agir da Suprema Corte dos Estados Unidos no período de 1933 a 1937, em que o país passava pela implementação de uma série de programas para apoiar àqueles que foram atingidos pela Grande Depressão instaurada na época (DIAS, 2016, p. 1).

Assim, existiam duas linhas de atuação que a Suprema Corte Norte Americana seguia na época do new deal. Segundo Dias (2016, p. 1),

A primeira linha entendia que a Suprema Corte podia desempenhar um papel de efetivação de políticas para a promoção do bem-estar social com bases nas concepções políticas dos juízes; e a segunda linha que defendia, basicamente, o oposto, pregando uma postura de autocontenção judicial, deixando as políticas públicas aos poderes eleitos pelo povo. A opção pela primeira linha foi intitulada de ativismo judicial.

Muito embora o termo já tenha sido usado em outras oportunidades, no decorrer dos anos, a sua essência principal continua sempre a mesma, qual seja, a de que o Poder Judiciário deverá interferir quando um direito fundamental for ameaçado por omissão da lei (DIAS, 2016, p. 1).

A aplicação do ativismo judicial no Brasil possui respaldo na Carta de Outubro. Ferreira (2017, p. 1), ensina que,

A Carta de Outubro prevê em seu artigo 102 como órgão de cúpula do Poder Judiciário o Supremo Tribunal Federal, formado por onze ministros, que é em sua essência a última corte a se posicionar sobre uma questão, de onde emana a última palavra, ou seja, a quem compete a decisão final. Nos últimos anos alguns casos emblemáticos e difíceis têm chegado a apreciação do pretório excelso, situações que exigem uma reflexão profunda e a ponderação de princípios constitucionais visando a melhor solução ao caso concreto, o Juiz em face do princípio do non liquet, não pode se furtar a decidir no processo judicial ao qual tem competência, acontece que em muitas situações não há disponível um dispositivo jurídico que contemple uma solução possível em sua totalidade, neste sentido não é razoável um magistrado ser apenas um “soldado da lei” de forma a se restringir ao que nela está previsto de maneira a ser um mero aplicador da norma.

Assim, quando o autor se refere aos “casos emblemáticos”, faz referência direta a

julgamentos que ocorreram no Brasil e tiveram grande repercussão social, como, por exemplo, os julgamentos acerca da união estável entre casais do mesmo sexo, da ficha limpa, da pesquisa com células tronco, etc. (DIAS, 2016, p. 1).

O ativismo judicial, então, é visto como uma atitude tomada pelo sistema judiciário, na qual (no Brasil) o Supremo Tribunal Federal exerce uma interpretação constitucional extensiva, para poder alcançar aquilo que foge a sua competência (EGGER, 2017, p. 35).

Contudo, essa nova flexibilização interpretativa trazida pelo neoconstitucionalismo traz a ideia de quebra da tripartição de poderes, como explica Ferreira (2017, p. 1), ao afirmar que

[...] ao utilizar do ativismo em suas decisões o juiz de certa forma inova no ordenamento jurídico de forma a se aproximar de um fator sensível que é a separação dos poderes, seria deste modo segundo uma parte da doutrina uma extrapolação da competência do Poder Judiciário que não possui a função típica de legislar [...].

Além disso, outros problemas como a legitimidade dos juízes para decidirem no âmbito político (ausência de democracia), não permitindo que seja analisada a vontade

popular, o perigo de politização do judiciário, bem como a já citada interferência em outros poderes, levam vários outros autores a recomendarem um uso moderado desse instrumento para evitar episódios de insegurança jurídica (SALOMÃO, 2017, p. 1).

Em contrapartida, Salomão (2017, p. 1) traz dois dos principais pontos positivos do uso do ativismo judicial. São eles:

a) a proteção contramajoritária, quando o Judiciário guarda e garante os direitos da minoria que não lograria obtê-la no Parlamento; e b) a imposição de condutas ou abstenções ao Poder Público em atuação proativa, no papel de guardião das políticas públicas que envolvam direitos fundamentais.

Portanto, ainda que seja algo em favor dos direitos fundamentais, o ativismo judicial é um instrumento delicado, que deve ser manipulado de forma contida, merecendo ser avaliado em observância a questões já resolvidas (SALOMÃO, 2017, p. 1).

4 O ESTADO DE COISAS INCONSTITUCIONAL NO TOCANTE ÀS PENITENCIÁRIAS BRASILEIRAS

Os problemas que cercam o sistema prisional brasileiro estendem-se ao longo dos anos e afetam diretamente os direitos fundamentais do cidadão, conforme demonstra o primeiro capítulo deste trabalho. Fatores como a falta de estrutura dos presídios, a mistura de presos de diferentes graus de periculosidade, bem como os elevados níveis de reincidência culminaram na falência da chamada ressocialização (SARMENTO, 2015, p. 1).

Sobre as questões que abrangem o sistema prisional, comenta Sarmento que As prisões brasileiras – que já foram descritas pelo Ministro da Justiça, sem nenhum exagero, como “masmorras medievais” – são, em geral, verdadeiros infernos dantescos, com celas superlotadas, imundas e insalubres, proliferação de doenças infectocontagiosas, comida intragável, temperaturas extremas, falta de água potável e de produtos higiênicos básicos. Homicídios, espancamentos, tortura e violência sexual contra os presos são frequentes, praticadas por outros detentos ou por agentes do próprio Estado. As instituições prisionais são comumente dominadas por facções criminosas, que impõem nas cadeias o seu reino de terror, às vezes com a cumplicidade do Poder Público. Faltam assistência judiciária adequada aos presos, acesso à educação, à saúde, à seguridade social e ao trabalho. O controle estatal sobre o cumprimento das penas deixa muito a desejar e não é incomum que se encontrem, em mutirões carcerários, presos que já deveriam ter sido soltos há anos. Há mulheres em celas masculinas e outras que são obrigadas a dar à luz algemadas.

Neste cenário revoltante, não é de se admirar a frequência com que ocorrem rebeliões e motins nas prisões, cada vez mais violentos (2015, p. 1).

Assim, princípios como o da dignidade da pessoa humana acabam lesados. Porém, as violações não são exclusividade com relação à Constituição Federal, uma vez que tratados internacionais e a própria Lei de Execução Penal também sofrem por conta do quadro caótico instaurado no sistema prisional. Portanto, Sarmento (2015, p. 1) explica que

não faltam normas jurídicas garantindo o respeito aos direitos humanos dos nossos presos. O que tem faltado ao Estado brasileiro, nos seus diversos poderes e instâncias federativas, é a mínima vontade política para transpor do papel para a realidade a promessa constitucional de garantia da dignidade humana do preso. É que os presos constituem um grupo particularmente impopular na sociedade brasileira, o que desestimula o sistema político e a burocracia estatal a “levarem a sério” os seus direitos.

O estigma atrelado ao cidadão preso, segundo o autor, leva as engrenagens políticas e judiciais (em sua maioria) a ignorar as violações frequentes dos direitos já citados (SARMENTO, 2015, p. 1).

Contudo, o Supremo Tribunal Federal possui prerrogativas que podem ajudar a superar esses problemas. Segundo Sarmento (2015, p. 1),

Há muito o que o STF pode fazer nesta questão, com base na Constituição. É importante, por exemplo, fixar de uma vez por todas a possibilidade de imposição jurisdicional de prestações positivas ao Estado nesta área, afastando as objeções de ofensa à separação dos poderes, à discricionariedade administrativa e à reserva do possível. Afinal, os direitos fundamentais de uma minoria não podem ficar sujeitos aos juízos políticos dos governantes de plantão, especialmente quando está em jogo a garantia do mínimo existencial.

Portanto, a incapacidade política em ater-se a essas questões, pode ser suprida por ações diretas do STF, uma vez que é histórica a proteção que o referido órgão exerce às minorias marginalizadas (SARMENTO, 2015, p. 1).

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