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A Auto-Estima, o Auto-Conceito e a Relação com as Marcas na Literatura

CAPÍTULO 2. REVISÃO DE LITERATURA

2.4. O Estudo da Auto-Estima

2.4.5. A Auto-Estima, o Auto-Conceito e a Relação com as Marcas na Literatura

A literatura do Comportamento do Consumidor Infantil tem utilizado também a noção de auto-conceito e a sua relação com as marcas e, tal como na psicologia, aponta o período entre a infância e a adolescência como essencial para esta relação, seja pelo aumentar do número de marcas associadas, seja pela profundidade dessa relação, a qual

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se torna mais complexa na adolescência, período em que às marcas começam a ser atribuídas características de personalidade (Chaplin e John, 2005a). Desta forma as marcas começam a partir dos 10-11 anos a ser essenciais na formação da identidade da criança (Rodhain, 2006).

A partir desta relação entre o auto-conceito e as marcas, vários autores, mais dedicados à investigação com crianças, têm tentado analisar relações como, por exemplo, quando é que emergem no consumidor fenómenos como o reconhecimento do valor simbólico dos produtos e o materialismo (Belk, Mayer, Driscoll, 1984; Elliot e Leonard, 2004; Chaplin e John, 2005b, 2007), o desenvolvimento de preferências e de relação com as marcas (Bahn, 1986; Achenreiner e John, 2003; Chaplin e John, 2005a; Rodhain, 2006), ou mesmo a utilização das crianças como expressão do auto-conceito alargado dos pais (Cross, 2002). A Tabela 2.1 apresenta um resumo dos principais estudos realizados com crianças, os temas tratados e idades analisadas.

No que concerne o reconhecimento do valor simbólico dos produtos, Belk, Mayer e Driscoll (1984) verificaram que ele já existe nas crianças do 4º ano e que é crescente com a idade (no seu estudo compararam crianças entre o 4º e o 6º anos). Achenreiner e John (2002) consideram que o simbolismo associado ao consumo apenas é percebido pelas crianças a partir dos 12 anos, desenvolvendo-se a partir dessa idade. Segundo as autoras, a explicação para este facto residia no desenvolvimento cognitivo das crianças de modo que, enquanto que as mais novas (8 anos) apenas utilizavam características perceptuais para associarem as marcas, as mais velhas (a partir dos 12 anos) já utilizavam associações conceptuais ou simbólicas, devido a encontrarem-se na fase das operações formais. No entanto, a explicação para esta disparidade entre os dois estudos, pode estar simplesmente no tipo de estímulo utilizado. Enquanto que o primeiro estudo apresentou as marcas nos próprios produtos, mostrando etiquetas ou os próprios logótipos, o segundo estudo escreveu o nome das marcas ao lado da foto do produto, o que reduz a possibilidade de a criança reconhecer a relação entre a marca e o produto já que, como sabemos, a aprendizagem das marcas é feita, em primeiro lugar, através de pistas visuais (Macklin, 1996).

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Tabela 2.1 – Resumo dos Estudos sobre Valor Simbólico dos Produtos e Materialismo na Literatura do Comportamento do Consumidor Infantil

Estudo Ano Produtos Tema Composição da Amostra

Belk, Mayer e Driscoll

1984 Jeans, Sapatos, Bicicletas e Videojogos

Valor simbólico dos

produtos versus idade, sexo e classe social 4º e 6º anos (9-11 anos) Bahn 1986 Cereais e Bebidas Desenvolvimento de percepções e preferências pelas marcas 4-5 anos e 8-9 anos Achenreiner e John 2002 Jeans e Sapatilhas

Relação das crianças com as marcas e nível de

consciência das marcas. Extensão de marcas versus idade

8, 12 e 16 anos

Elliot e Leonard

2004 Sapatilhas Valor simbólico dos

produtos em classes sociais desfavorecidas

8-12 anos

Chaplin e John 2005a Cereais, bebidas, doces,

roupa, restaurantes,

hobbies

Relações das crianças com as marcas

3º, 7º, 8º, 11º e 12º anos (8-9, 12-13 e

16-18 anos) Rodhain 2006 Roupa Relações das crianças com

as marcas

10-11 anos Wooten 2006 Roupa Valor simbólico dos

produtos reconhecido pela ridicularização

18-23 anos

Chaplin e John 2007 Vários e também não-

produtos

Relação entre materialismo e auto-estima

8-18 anos

Decorrente do reconhecimento do valor simbólico atribuído aos produtos, o

materialismo é muitas vezes estudado na literatura do comportamento do consumidor

infantil e adulto, sendo definido como “a importância que o consumidor atribui às suas posses” (Belk et al., 1984: 291). Chaplin e John (2007) verificaram que o materialismo nas crianças está intimamente relacionado com a auto-estima da criança. Assim, no seu estudo com crianças entre os 8 e os 18 anos, comprovaram em primeiro lugar a queda da auto-estima por volta dos 12 anos, tal como é referida na psicologia (Rosenberg, 1979), e verificaram que essa queda era simultânea com um aumento do materialismo.

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O seu estudo demonstrou também que, na mesma faixa etária, se houver um esforço para promover o incremento da auto-estima da criança, isso se reflecte numa redução do seu nível de materialismo (Chaplin e John, 2007).

No seu estudo, Belk, et al. (1984), concluíram também que a distinção que as crianças fazem do valor simbólico do produto é diferente consoante a classe de produto, sendo superior nas bicicletas e nos sapatos versus os jeans e videojogos. Por este motivo não devemos assumir como equivalentes produtos que aos olhos dos adultos são idênticos, pois podem ser diferentes para as crianças, como foi o caso do estudo de Achenreiner e John (2002) que considerou serem equivalentes jeans e sapatilhas quando vemos pelo estudo de Belk et al. (1984) que não o são. Chaplin e John (2005a) num estudo com crianças entre os 8 e os 18 anos verificaram que de todas as categorias de produtos, as roupas são o tipo de produto em que a associação entre auto-conceito e as marcas é mais natural e espontânea (das diversas categorias por eles utilizadas foi a única onde as crianças fizeram menções espontâneas de marcas para se definirem).

No mesmo sentido, Bahn (1986) verificou que a forma como as crianças desenvolvem preferências por marcas (e.g. o número de dimensões que utilizam na sua análise) é diferente, dentro da mesma categoria de produto, para diferentes níveis etários. Os estudos da altura utilizavam normalmente, para distinguir os produtos, dois tipos de dimensões – se o produto era para utilização pública ou privada e se era um bem de primeira necessidade ou um bem de luxo8 –, e Bahn (1986) mostrou que dois produtos de utilização privada e de primeira necessidade podem revelar comportamentos distintos (no caso bebidas e cereais).

Para além da variável idade, o estudo de Belk et al. (1984) constatou que as crianças de

classe social mais elevada conferiam uma carga simbólica mais elevada aos produtos,

quando comparadas com as crianças de classes mais baixas. Verifica-se também que as crianças de classes sociais mais desfavorecidas tentam utilizar as marcas como forma de esconderem a sua ascendência humilde (Elliot e Leonard, 2004) e que embora tenham ########################################################

8 Esta classificação era utilizada nos diversos estudos sobre influência, decorrente do trabalho pioneiro de

# :;# um menor conhecimento sobre marcas, utilizam normalmente as de maior notoriedade na sua faixa etária.

Relativamente à variável sexo, Belk et al. (1984) afirmam que as raparigas atribuem uma carga simbólica superior aos rapazes para todas as categorias de produtos (no entanto a relação encontrada na variável sexo foi a mais fraca das três, face à idade e à classe social). Rodhain (2006), pelo contrário, verificou que as raparigas consideram-se, e são consideradas pelos rapazes, como menos preocupadas com as marcas, especialmente nas marcas desportivas.

Outra relação também analisada muitas vezes é entre a posse dos bens e o reconhecimento do seu valor simbólico. No estudo de Belk et al. (1984), as crianças que possuíam as marcas realizavam julgamentos mais fortes do que as que não possuíam, o que poderá indicar que a experiência com o produto/marca é um factor relevante para que a criança reconheça o status que esse produto/marca confere ao seu utilizador (a este propósito ver também Chaplin e John, 2005a). Por este motivo são muitas vezes identificados comportamentos de rejeição e ridicularização das pessoas que não possuem determinadas marcas ou produtos, sendo este um sinal extremo do valor simbólico atribuído aos produtos (Wooten, 2006).

Numa outra linha de raciocínio, Cross (2002) verificou que, mais do que analisar a forma como a criança apreende por ela própria os valores simbólicos dos produtos e a noção de materialismo, devemos ver o processo pelo qual os pais introduzem a criança no mundo comercial das marcas, e a forma como os adultos se sentem gratificados, pelo prazer que as crianças retiram do acto de consumo, fenómeno a que o autor designou como sendo as crianças “Valves of Desire” dos pais (Cross, 2002: 442). Rodhain (2006) também investigou o papel dos pais e educadores mas em sentido contrário e verificou que quando estes se abstêm da sua função educativa, é que ocorrem as maiores pressões para que as crianças utilizem as marcas no seu processo de identificação e construção do Eu.

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