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AUTOBIOGRAFIA, CONFISSÕES E MODERNIDADE

No documento – PósGraduação em Letras Neolatinas (páginas 34-44)

2 PROBLEMAS TEÓRICOS: DA AUTOBIOGRAFIA À AUTOFICÇÃO

2.1 AUTOBIOGRAFIA, CONFISSÕES E MODERNIDADE

Em termos literários, a passagem da época moderna à pós-moderna significou a busca de novas formas literárias que demonstrassem as novas configurações sociais e culturais. As relações entre o homem e o mundo, a natureza crítica da ficção e os elementos a ela vinculados se converteram em solo fértil para narrativas que mesclam realidade e ficção na construção de novas subjetividades. A autoficção constitui uma estratégia literária capaz de sugerir a identificação irônica do autor com o narrador, transgredir a autobiografia e a referencialidade do nome próprio, uma vez que imita e subverte o pacto autobiográfico proposto por Philippe Lejeune (1975). Por se tratar de uma estratégia relativamente recente, os teóricos discutem ainda se a autoficção seria um gênero autônomo ou uma categoria em formação.

Independente da concepção adotada, é importante ressaltar que proposta autoficcional reforça a ideia da fragilidade identitária e a produtividade da confusão autor/narrador/protagonista. Seu centro de discussão é a confusão entre a pessoa real e o personagem escritor, a figura pública. A autoficção induz a reflexão sobre os limites entre o referente e sua representação literária, em outras palavras, ficção e realidade.

Antes de iniciar o estudo da autoficção é necessário revisar e compreender os alguns dos problemas teóricos acerca da autobiografia, gênero com o qual compartilha procedimentos. O debate sobre o ato autobiográfico está orientado em diversas direções porque são muitos os problemas teóricos que o tema confronta tais como a referencialidade, o

estabelecimento do pacto entre autor e leitor, recuperação do passado e a estruturação do eu. Todos esses estudos buscam apoio em ciências como a história, antropologia, psicologia e filosofia para desenvolver sua argumentação e garantir sua validade. Por isso, convém comentar brevemente as principais propostas que tentam responder às indagações acerca desse tipo de escrita e que consideramos pertinentes a nossa análise. Em seguida, vamos observar a teoria de Lejeune por ser aquela o ambiente propício para o desenvolvimento da autoficção.

O primeiro grande modelo de obra autobiográfica surge na Idade Média, século IV, com a obra Confissões (AD 397 ou AD 398) de Santo Agostinho. Embora teóricos não tenham chegado a um consenso sobre o objetivo do escrito ou a existência de um elemento unificador, é possível perceber diversos temas conectados entre si através de toda a obra. A finalidade original poderia ser descrever a conversão de Agostinho do maniqueísmo ao cristianismo católico. Outra teoria aponta para a possibilidade da obra ser a breve história das origens do monacato africano. Entretanto, há aqueles que defendam com a razão o reconhecimento da atuação da graça divinal na salvação alma humana e, com isso, a utilização de episódio da própria vida para ilustrar a postura teológica.6

Confissões é amplamente estudada por destacar as complexas relações entre o indivíduo e a sociedade, demasiado problemática ainda hoje, mesmo que o interesse se estenda somente ao reconhecimento de sua vida ilustre em uma antropologia teológica que não oferece a um leitor mais curioso informações biográficas bastante relevantes. Adquire simbolismo porque seu conteúdo expõe a eterna disputa entre a vida terrena e a espiritualizada, a constituição interior do ser humano e a constituição externa da sociedade. Ainda que não proporcione uma autobiografia na acepção contemporânea da palavra, Santo Agostinho contempla pontos fundamentais que serviram de base para o desenvolvimento da autobiografia como gênero literário.

Antes de comentar as teorias sobre a autobiografia vamos tentar localizá-las dentro de uma linha evolutiva que compõe a palavra. O empenho em estabelecer traços constitutivos da autobiografia faz com que muitos autores se dediquem ao seu estudo. Assim, seus pontos de vista e, consequentemente, suas conclusões são diferentes quanto aos problemas levantados pelo gênero. No ensaio Problemas teóricos de la autobiografia, como aponta a postura crítica de Loureiro (1991), são variados os recursos aos quais recorrem os teóricos para justificar a

6 Cf. STREFLING, Sergio Ricardo. A atualidade das Confissões de Santo Agostinho. In: Telecomunicação,

Porto Alegre, v37, nº 156, págs 259-272, junho de 2007. Disponível em: http://revistaseletronicas.pucrs.br/fefid/ojs/index.php/teo/article/viewFile/2707/2058. Acesso:17/01/2011.

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capacidade cognitiva da autobiografia. Como apoio para sua argumentação W. Dilthey recorre a História; Georges Gusdorf, Antropologia; Phillipe Lejeune, ao Direito, Elizabeth Bruss se fortalece nas Teorias da Linguagem e Paul Eakin se baseia na Psicologia para estabelecer diálogos entre as ciências, a fim de explicar as articulações do sujeito como o mundo, a referencialidade, a constituição do sujeito, a expressividade e etc.

No ensaio citado, Loureiro segue uma linha da investigação e comenta os críticos e as teorias das três etapas que correspondem à formação do vocábulo autobiografia: autos, bios e

grafé. A primeira etapa contemplada é bios que diz respeito a reconstrução da biografia e releitura da experiência, não apenas considerando os dados, mas na interpretação do entorno no qual está inserido o autobiografado. O foco está na relação entre texto e história. A etapa seguinte, autos, está centrada na conexão entre o texto e o sujeito, logo a questão fundamental será entender de que maneira o sujeito é representado pelo texto e se essa representação é realmente possível. Nesta fase, o estudo da autobiografia prioriza elaboração que o autor faz dos fatos no momento em que escreve. A etapa grafé observa a linguagem e o sujeito, reforçando a ideia de que é impossível captar a totalidade do ser.

Loureiro menciona W. Dilthey como responsável pela inauguração da etapa bios, pois seu postulado elevou a autobiografia como base fundamental para compreender o processo histórico de organização da experiência e modos de interpretação da realidade histórica. No entanto, há tendências díspares no entendimento e interpretação dos problemas suscitados pela autobiografia. No início dos estudos acerca do gênero autobiográfico, a ênfase foi a reconstrução da vida e devido a isso as leituras e interpretações das obras autobiográficas eram realizadas de modo comparativo. Exatidão e sinceridade foram palavras-chave para investigar em fontes externas ao texto autobiográfico e em que medida ele era uma representação do momento histórico.

Buscava-se encontrar a interseção entre aquilo que era narrado e os elementos externos ao texto, ou seja, comprováveis fora do texto. O objetivo era compreender e reconstruir um dado momento histórico, perceber e conhecer, através do texto, os valores e as condições sociais de desenvolvimento do homem.

Em 1956, Georges Gusdorf desloca a base da discussão e a autobiografia passa a ser entendida como uma leitura da experiência. Uma vez que, se não é possível reconstruir o passado tal qual ocorreu, tampouco há a possibilidade de alcançar objetividade. O estudioso observa que ao eu que vivencia a experiência é acrescentado um segundo eu criado pela experiência da escrita e conclui que o mote da autobiografia deve ser: “Crear, y al crear ser creado.” (GUSDORF apud LOUREIRO,1991,p.3)

Na linha evolutiva do estudo da autobiografia, autos não prioriza o fato passado, mas elaboração do autor no momento da escrita. A linguagem é mediadora entre autor, texto e leitor e esse fator nos leva a tentar entender em que medida ela serve não só como instrumento para o sujeito, mas também como parte fundamental para sua construção. A memória funciona como elemento fundamental no diálogo entre passado e presente na atribuição de sentido.

Na etapa bios, há rupturas nas estruturas que tem o texto como história e o autor como proprietário e portador de uma visão privilegiada. O leitor passa a ser um intérprete e não receptáculo. Neste ínterim, surgem os trabalhos de Phillipe Lejeune e Elizabeth Bruss que valorizam a atuação do leitor e que versam sobre a necessidade de dar uma definição e reunir características gerais do gênero. Ambos insistem na coincidência nominal entre autor, narrador e personagem essencial e peculiar na identificação da autobiografia. Também no decorrer desta etapa, Olney chama atenção para autocriação do autobiógrafo no momento também destacando a necessidade da participação do leitor.

A etapa grafé trata dois problemas: a linguagem e o sujeito. De um lado, linguagem cria uma relação paradoxal, pois é através dela que o homem transmite sua experiência e, ao mesmo tempo, o torna consciente de que a palavra não capta a totalidade do ser. Outra questão é o desdobramento do eu, como narrador e objeto narrado. Dessa forma, o texto autobiográfico, ao invés de reproduzir ou criar uma vida, na realidade, leva à desapropriação. O texto não responde às indagações do sujeito e cria novas.

Paul de Man é um dos grandes expoentes dessa etapa. Sua teoria sustenta que os obstáculos clássicos das teorias provêm do equívoco daqueles que consideram a biografia como produto mimético de um referente. Para o crítico, autobiografia não é um gênero, mas uma forma de textualidade que possui uma forma do conhecimento e da leitura.

Conforme Georges Gusdorf, autobiografia é um gênero literário que surge como produto tardio do ocidente a partir do Renascimento. O homem desse período, consciente de sua individualidade, procura dar conta de si mesmo tendo em mente seus atos e suas motivações internas. Esta visão entende que o ato autobiográfico é resultado de preocupações metafísicas e que, por isso, está associado à doutrina cristã de exame da consciência que defende a confissão e consequente liberação da culpa.

O valor dado ao estudo do autobiográfico assume a perspectiva histórica e antropológica para o estudioso. Acerca da posição teórica de Gusdorf, Betina Pacheco acrescenta que , o autobiógrafo recorda sua vida lhe outorga transcendência histórica quando

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toma a si mesmo como modelo, medida e valor expostos no texto sem desconhecer as “implicações psicológicas” (op. cit, p.40).

A busca do ser humano no interior de si remete ao mito de Narciso, que para a psicanálise é capital na formação da individualidade infantil. No espelho, a criança começa a esboçar o aspecto essencial da identidade que é separar interior e exterior. “Da mesma forma, a autobiografia se torna o espelho em que a pessoa reflete sua própria imagem.”(GUSDORF, 1991, p. 11, tradução nossa) Os valores históricos se antepõem aos

valores literários no sentido de que os primeiros exigem objetividade e os últimos traduzem um estilo em particular. A interseção entre ambos os valores é o veículo que conduz a busca de si e é ali que a crítica deve indagar sobre seus significados.

Do ponto de vista literário, a autobiografia pode ser considerada como obra de arte e edificação do eu, que implica por um lado uma confissão voluntaria de ser fiel à verdade e por outro, uma autojustificativa. Ao reconstruir e decifrar a unidade de uma vida ao longo do tempo a memória permite recapitular experiências. A apresentação dos fatos passados é feita no presente. Isso traz novos significados, diferentes do momento em que aconteceu. Ou seja, uma “segunda” leitura da experiência. Os obstáculos encontrados pela autobiografia são de ordem psicológica(a seleção de detalhes e deformação da memória) e ética da imparcialidade. A constituição do autobiografar deve ser mensurada desde o ponto de vista artístico, por conseguinte, mais importante que a função histórica e objetiva.

A pertinência da classificação de textos em gêneros literários deve ser, para todos os efeitos, uma ferramenta para auxiliar no melhor aproveitamento das leituras e facilitar seu entendimento. O estudo e agrupamento dos textos não pode ser um critério rígido e inflexível uma vez que a uma mesma estrutura podem ser atribuídas várias formas e funções. No estudo

Actos literários, Elizabeth Bruss leva em consideração a dificuldade da condição da autobiografia devido à multiplicidade de formas nas execuções individuais e a reconhece como gênero representativo tanto em continuidade como em ruptura. As perspectivas de continuidade e ruptura são observáveis na história literária com a queda no uso da epístola e da apologia como gêneros independentes. Ambas foram assimiladas pela autobiografia. Da mesma forma, o realismo do romance burguês despojou da autobiografia o uso da primeira pessoa como perspectiva de enunciação.

Bruss considera que o ato autobiográfico está condicionado pelas escolhas do autor e do leitor quanto ao estilo, ao tema e às funções do texto. Reunidas essas características, que são definidas pelo contexto de realização do ato, cada época reflete sua concepção de

autobiografia e permite estabelecer as expectativas do receptor em relação à obra. Dessa forma recorre à linguística para aproximar a funcionalidade da linguagem e a literatura.

As ações de afirmar, ordenar, prometer e perguntar são realizadas por intermédio da linguagem em contextos determinados. A literatura possui também um sistema de ações cumpridas pelos gêneros, daí que num ato literário devem ser identificados papéis e propósitos dentro de uma comunidade de leitores e escritores. Tendo em vista que os gêneros literários são variáveis, para que haja autobiografia, é necessário reunir alguns traços genéricos regidos pelas regras e convenções. Baseada neste fator Bettina Pacheco afirma:

“Sin olvidar que los géneros son variables y que el acto autobiográfico se realizará siempre dentro de su naturaleza continua a la vez cambiante. De ahí que en nuestro tiempo y continuidad literaria se pueda considerar a la autobiografía como un género autónomo con sus funciones específicas, sobre todo porque puede distinguirse de otros actos ilocutórios” (PACHECO, 2001, p. 50)

Se a autobiografia pertence ao sistema simbólico que configura nossa concepção de literatura e cultura, é necessário estabelecer regras gerais para as funções que os textos podem assumir que, de acordo como o estudo de Bruss são: o autobiógrafo representa o duplo papel de ser responsável pela criação e organização de seu texto e ser tema do mesmo; aquilo que afirma no texto tem valor de verdade ainda que se possa comprovar ou duvidar de sua autenticidade; independente da recepção ou credibilidade que o leitor conceda ao texto, o autobiógrafo dará a entender que crê naquilo que afirma.

Neste prisma, o ato autobiográfico está determinado pelo meio no qual se realiza, pela comunidade literária e tradição cultural no qual se inscreve. Ainda que recebam tais delimitações, autores e leitores de autobiografia contribuem para sua renovação do ato, pois não há apenas novas obras mas também novas formas de lê-las. A autora completa sua reflexão contrastando as autobiografias de John Bunyan, Boswell, Thomas de Quincey y Vladimir Nabokov por serem de diferentes períodos históricos e pela articulação do ato literário com as atitudes e esperanças dos autores e que provocam conceitos e interpretações distintos sobre o ato autobiográfico.

A conclusão do estudo é que, ao analisar a linguagem adotada nos textos autobiográficos, podemos compreender melhor o ambiente no qual foram produzidas as obras. Elementos como o uso de determinadas pessoas gramáticas, títulos, as formas como os autores buscavam envolver o leitor são índices que marcam as posições frente a discursos e interpretações em uma época, definem atos de escrita e leitura.

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Em contrapartida, Paul de Man confere à autobiografia uma posição de menor valor em relação à tragédia e à comédia e entende como limitantes algumas das posturas teóricas adotadas, principalmente as que a elevam à categoria de gênero literário. Seu posicionamento está baseado na dificuldade de definições teóricas que a seu ver são ainda experimentais. A teoria da autobiografia está marcada por uma série de interrogações e aproximações problemáticas.

Outro fator relevante na discussão proposta por Paul de Man é que a infrutífera distinção entre autobiografia e ficção. Para o estudioso, não é a vida que produz a autobiografia, mas a autobiografia que produz a vida. O interesse do autobiógrafo não é ser veraz, mas demonstrar que a totalidade é impossível. Se partimos da ideia de que o autor está limitado pelos recursos e pela tradição escritural da época e da sociedade na qual está imerso, é possível que projeto autobiográfico seja definitório para sua vida. Dessa forma, “la autobiografía no es un género o un modo, sino una figura de lectura y entendimiento que se da, hasta cierto punto, en todo texto.” (Op. cit., p. 114)

Nesta ótica, o problema da autobiografia está relacionado à linguagem e significação. A linguagem entendida como figura, metáfora ou prosopopeia, não é mais que uma representação, por conseguinte, não corresponde à realidade. Ao reelaborar as experiências vividas, evocadas pela memória, o autor cria ficções e confere novos e significados diferentes daqueles que os fatos tiveram no momento em que foram vivenciados.

No processo de recuperação da vida, paralelamente, revela e oculta a face do autor. Paul de Man parece admitir que autobiografia é composta por elementos que não obedecem a realidade ou verdade dos fatos, por isso, é uma figura. Uma figura é uma imagem construída pelo autor, considerando a visão e o juízo que faz de si mesmo. Ao mesmo tempo, desfigura porque é uma imagem distorcida que não corresponde à pessoa real.

Paul John Eakin afirma que a postura de Paul de Man se soma àquelas que versam sobre problemas de identidade do eu que escreve. Dada a impossibilidade de existir um sujeito autônomo e transcendente, surge a posição extrema da morte da autobiografia. Sua argumentação parte da revisão teórica Paul de Man. Compartilhando da ideia de que é legítima a recriação do eu através da linguagem, ele adere à noção contemporânea de que o sujeito autobiográfico e a linguagem estão mutuamente unidos na construção simbólica. O autor destaca ainda Elizabeth Bruss e sua identificação entre o eu e a autobiografia como estruturas linguísticas análogas.

A proliferação e o interesse acadêmico pela autobiografia não significa que se tenha alcançado um consenso sobre esse tipo de escrita. Os ensaios de Philippe Lejeune ao longo de

30 anos de investigação, além de prova de reflexão e pesquisa, são formas de legitimar o gênero que foi tido como literatura menor. A teória tem a virtude de tentar fixar pautas precisas de leitura e escrita para distinguir obras biográficas, autobiográficas, romances e casos intermediários. A proposta de Lejeune se distingue daquelas que qualificam a autobiografia como uma forma de ficção ou que decretam sua impossibilidade, haja vista que não há sujeito estável, unificado ou introspecção verdadeira.

O primeiro livro de Philippe Lejeune dedicado ao tema data de 1971,

L‟autobiographie en France. Além de um inventario de textos autobiográficos com o objetivo

de compreender seu funcionamento, a obra busca legitimar o gênero. Com a mesma finalidade, Le pacte autobiographique, seu ensaio mais conhecido, se torna um texto fundamental para todo e qualquer estudo sobre o tema. O rigor e a busca pela neutralidade traduzem a preocupação com o objetivismo acadêmico.

Em “O pacto autobiográfico”(2008), conforme sua teoria, o delinear da fronteira entre gênero autobiográfico e ficção está baseado na relação leitor e ato de leitura, ou seja, Philippe Lejeune tem como base a perspectiva do leitor para estabelecer o caráter contratual do gênero autobiográfico. A definição de autobiografia da qual parte o autor põe em jogo elementos pertencentes a quatro categorias diferentes e somente o cumprimento de todas elas qualifica uma autobiografia. A definição e suas características são:

“Narrativa retrospectiva em prosa que uma pessoa real faz de sua própria existência, quando focaliza sua história individual, em particular a história de sua personalidade.

1- Forma da linguagem- a) narrativa, b) prosa.

2- Tema tratado- vida individual, história de uma personalidade.

3- Situação do autor: identidade do autor (cujo nome remete a uma pessoa real) e do narrador.

4- Posição do narrador- a) identidade do narrador e do personagem principal; b) perspectiva retrospectiva da narrativa.” ( LEJEUNE, 2008, p.14)

O corpus analisado por Lejeune parte das autobiografias clássicas, aquelas que são a maioria do gênero, compostas por textos em primeira pessoa (Eu). A condição primordial para que um texto seja lido como autobiográfico é que autor-narrador-personagem sejam identificados pelo leitor como a mesma pessoa, independente da forma gramatical a partir da qual emita seu discurso (Eu, Tu, Ele). É importante advertir que, embora não se tenha relatos escritos inteiramente em segunda pessoa (Tu), esse tipo de narrativa marca a diferença entre o sujeito da enunciação e o sujeito do enunciado, que será tratado como destinatário da narrativa. A proposição do estudioso chama a atenção para as distintas consequências geradas

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pelo uso da terceira pessoa (Ele) como efeitos de contingencia, desdobramento ou distanciamento.

Quando englobamos ao texto o nome do autor, passamos a dispor de um critério textual geral, que será uma questão profunda no estudo lejeuniano. A expressão pacto remete à ideia que o gênero autobiográfico é contratual porque é um acordo implícito entre autor e leitor que determina o modo e os efeitos atribuídos a um texto. Assim, este tipo de texto é ao mesmo tempo uma forma de leitura e um tipo de escrita. Neste estudo são apresentados quatro

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