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4 ADOLESCÊNCIA E A CONSTRUÇÃO DA AUTONOMIA MORAL

4.4 Autonomia

AUTONOMIA

3- Os pais devem sempre considerar as explicações dos filhos. 7- Cabe aos pais tomar as decisões pelos filhos.

13- Os filhos, quando autorizados pelos pais, devem ter suas próprias experiências.

21- Os pais devem ajudar os filhos a refletirem sobre as suas ações ao invés de lhes dar ordens. 25- Nem sempre um pai deve oferecer escolhas aos seus filhos.

27- Os pais devem sempre permitir que seus filhos busquem soluções para os seus próprios problemas. 29- Cabe aos pais darem soluções para as situações difíceis pelas quais passam seus filhos.

32- Não se pode sempre ouvir os filhos.

33- Os pais devem acatar as opiniões dos filhos.

34- Os pais devem substituir os “longos sermões” por poucas palavras.

“A autonomia é um poder que se conquista de dentro e que só se exerce no seio da cooperação”. (Piaget, 1932/1994). Para ser autônomo, dessa, forma, é necessário que a pessoa tenha as suas próprias experiências. Se as relações com os pais são tão autoritárias que os adolescentes necessitam ser autorizados pelos primeiros para o que quer que desejem fazer, fica vedada a essência da construção da autonomia: a ação do sujeito.

Pensando na autonomia como troca de pontos de vista entre pais e filhos, pode parecer redundante dizer sobre a necessidade de que os pais se disponham a ouvir seus filhos. Essa é a atitude essencial nas relações de cooperação: o ouvir o outro. Parece, entretanto, ser uma dificuldade inerente a todas as relações interindividuais: ouvir e legitimar o pensamento e o sentimento alheio.

Piaget afirma que: “a personalidade implica em cooperação; a autonomia da pessoa opõe-se ao mesmo tempo a anomia, ou ausência de regras e a heteronomia, ou submissão às regras impostas do exterior. Neste sentido, a pessoa é solidária com as relações sociais que mantém e produz”. (Piaget, 1964/1986, p.66 e 67).

Que tipos de relações os pais mantêm com seus filhos? Costumam dar ordens, ou ajudam os seus filhos a refletirem sobre as suas ações? Como o fazem? A educação parental se baseia em longos sermões? Interessante que, para a grande maioria dos adolescentes as ordens definitivas e os sermões são atitudes completamente ignoradas. A capacidade de raciocínio abstrato lhes traz a possibilidade de questionamentos. Segundo Elkind (1975, p.109):

(O adolescente) vê agora muitas alternativas às diretivas paternas e repugna-lhe aceitar essas sem discussão. Quer saber não apenas qual é a posição dos pais, mas também o porquê dessa posição, e está pronto a debater as virtudes da alternativa paterna em comparação com a escolhida por si e seus companheiros.

Portanto, os pais que negligenciam ou ignoram a explicação dos filhos estão caminhando no sentido contrário a autonomia deles, e ao desconsiderarem as opiniões de seus filhos, negam na verdade a nova construção de raciocínio dos mesmos, como se dissessem aos adolescentes: parem já com essa idéia estapafúrdia de querer ser adulto. Os pais perdem dessa forma, a oportunidade sem igual de acompanhar, valorizar e promover esse desenvolvimento psicológico, pois segundo Kamii e Declark (1991, p. 39), “os mais importantes fatores para o desenvolvimento da autonomia das crianças são: oportunidade de trocar pontos de vista com outras pessoas e a possibilidade de tomar decisões”.

Na fase da adolescência, o jovem está buscando a construção da sua personalidade, enquanto a construção de um eu que se percebe diferente dos outros. Especialmente em relação aos pais, o jovem busca intensamente essa separação, na medida em que, durante a infância o “eu” dos pais representou para ele um ego ideal. Cabe aos pais serem então cooperadores com essa construção, afinal, o objetivo máximo dela é exatamente a inserção do jovem no mundo adulto, ou seja, quando os pais definitivamente cumprem o seu papel de educadores para com o mundo, entregando-lhes um recém-chegado saudável e com boas intenções para com esse mundo. (Arendt, 1964/2005).

Doravante, ele (adolescente) não apenas descobrirá os limites que separam o seu eu do de outra pessoa, mas aprenderá a compreender a outra pessoa e a ser compreendida por ela. Assim a cooperação é realmente um fator na criação de... um eu que se consolida sobre normas de reciprocidade e discussão objetiva e que sabe como submeter-se a elas, a fim de fazer-se respeitado. (Hoffman, 1975/1978, p.11)

Portanto, oferecer oportunidades de escolhas aos filhos e permitir-lhes que busquem soluções para os seus próprios problemas, são atitudes coerentes com o adulto que quer cooperar com o seu jovem, ciente de que ele não é mais uma criança e, de que, nessa fase do desenvolvimento já se compreende como “um igual” em relação aos seus pais. Realmente, cabe aos pais acompanhar as tomadas de decisões de seus filhos, orientá-los, aconselhá-los até, enfim, trocar pontos de vista, todavia, jamais tomar as decisões por eles.

Assim, a autoridade adulta, se bem que constituindo, talvez, um momento necessário na evolução da moral da criança, não basta para constituir o senso de justiça. Este só se desenvolve na proporção dos progressos da cooperação e do respeito mútuo, de

início, cooperação entre as crianças, depois cooperação entre crianças e adultos, na medida em que a criança caminha para a adolescência e se considera, pelo menos em seu íntimo, igual ao adulto. (Piaget, 1932/1994, p.239)

Segunda La Taille (2007, p.13-14) a autonomia, para a moralidade, está ligada a dois sentidos: à questão da liberdade e à questão da autoridade. Conforme suas palavras:

É autônomo quem goza de liberdade, seja porque suas ações não são decorrentes de uma forma de poder exterior ao sujeito, seja porque não é irremediavelmente determinado por forças internas sobre as quais a vontade não exerce influência nenhuma. [...] É autônomo quem legitima regras, princípios e valores morais sem referência a uma fonte que o transcende, sem referência, portanto, a figuras ou instâncias de autoridade.

Portanto, o caminho para a construção da autonomia moral dos adolescentes pressupõe a liberdade e a ausência da autoridade, e cabe mesmo aos pais buscarem uma nova forma de interação com os jovens. O resultado dos conflitos entre pais e filhos na adolescência deve promover a reconstrução de relações fundamentadas na reciprocidade e na mutualidade.

É por isso que, ao lado do respeito primitivo do inferior pelo superior, ou respeito “unilateral”, acreditamos poder distinguir um respeito “mútuo”, para o qual tende o indivíduo quando entra em relação com os seus iguais, ou quando os seus superiores tendem a tornar-se seus iguais. O elemento quase material do medo, que intervém no respeito unilateral, desaparece então progressivamente em favor do medo totalmente moral de decair aos olhos do indivíduo respeitado: a necessidade de ser respeitado equilibra, por conseguinte, a de respeitar, e a reciprocidade que resulta desta nova relação basta para aniquilar qualquer elemento de coação. A ordem desaparece no mesmo tempo para tornar-se acordo mútuo, e as regras livremente consentidas perdem seu caráter de obrigação externa. A razão torna-se, desde então, livre para construir seu plano de ação na medida em que permanece racional, isto é, na media em que sua coerência interna e externa está salvaguardada, à proporção em que o indivíduo consegue situar-se numa perspectiva tal que as outras perspectivas concordem com ela. Assim está conquistada a autonomia, além da anomia e da heteronomia.(Piaget, 1932/1994, p. 284)

A citação é extensa, mas guarda em si, um resumo dos conceitos apresentados nesse capítulo, conceitos esses, que nortearam a elaboração do instrumento, objetivo desse estudo. A citação também demonstra que, embora se tenha buscado explanar individualmente a respeito de cada um dos construtos, tendo como objetivo fundamentar teoricamente os itens que os representam, tais assertivas não são excludentes entre si, mas pelo contrário, conforme se expõe na teoria, os fatores respeito, obediência, justiça e autonomia são complementares e se desenvolvem no sujeito de modo concomitante. A interação desses fatores tem como resultado final a construção da autonomia moral do adolescente.

5- SOBRE A CONSTRUÇÃO DE INSTRUMENTOS DE AVALIAÇÃO