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4 A POSIÇÃO DE DESTAQUE DOS MUNICÍPIOS NA FEDERAÇÃO BRASI –

4.5 A autonomia municipal brasileira

A grande autonomia usufruída pelos municípios coloniais brasileiros, no entanto, deu-se mais pela necessidade e de autodefesa e espontaneidade de criação do que, propriamente, de uma concessão metropolitana. A Coroa Portuguesa, muito embora houvesse expedido Ordenações também válidas em nosso território (Afonsinas - 1446, Manuelina – 1521, e Filipinas), tinha suas atenções voltadas para outros rumos – leia-se Espanha, Inglaterra e África e Índia – somente intensificando seu poderio, e conseqüente tolhimento e fiscalização das cidades brasileiras, em fins do século XVIII.

Diversos doutrinadores eram ferrenhos críticos da necessidade da autonomia municipal na Federação, afirmando ser característica, antes, do regime unitário. Neste, o Estado, cioso de suas prerrogativas e do poder que se acha concentrado ou absorvido nos seus órgãos centrais, procura extinguir os movimentos ou as reivindicações destinadas à desconcentração da autoridade política, fazendo a descentralização administrativa para não desconcentrar o poder político, orientação que tem sido a tônica em todos os Estados simples. Toda vez que um país é politicamente centralizado, a sua administração será, necessariamente, descentralizada, haja vista

atuação do princípio das compensações.203 Para Francisco Campos, a administração local era a mesma administração estadual, provida de órgãos especiais.204

Para Levi Carneiro, “a autonomia municipal foi sendo, cada vez mais, uma

aspiração federativa, mínimo do federalismo, que o próprio Império, unitarista, não podia repelir, com o qual transigia – e que, por isso mesmo, a República não deixaria de

consagrar. Não se tornou uma idéia monárquica”. 205

A autonomia municipal exsurge, assim, como princípio constitucional sensível, haja vista ser pressuposto material (ou de fundo), para a decretação de intervenção federal no Estado-Membro agressor, desde que o Chefe do Ministério Público Federal ingresse com uma representação no Supremo Tribunal Federal ( Ação Direta de Inconstitucionalidade Interventiva ), e este dê provimento à ação ( pressuposto formal ), ordenando ao Presidente da República sua ulterior decretação, haja vista tratar- se de competência material exclusiva da União. Sensível porque, quando afetado, gera sensível forte desequilíbrio na Federação, que instigaria a aludida supressão temporária de autonomia do ente regional. É o disposto no artigo 34, VII, b, da Constituição Cidadã. Mesmo o artigo seguinte deste Texto Magno, que estatui a Intervenção Estadual, justifica a autonomia municipal, somente excetuada nos exaustivos comandos constitucionais

A inclusão dos entes locais no rol de componentes da federação brasileira é, entretanto, tema controverso na doutrina. Nenhuma nação federal ousou tanto, nem mesmo os Estados Unidos da América Norte, berço do federalismo. José Afonso da Silva, por exemplo, traz pelo menos quatro motivos para rechaçar tal inclusão. Diz, inicialmente, que não existe federação de municípios, mas sim, de estados; ainda, os municípios não são criados por lei federal, mas estadual, de acordo com os períodos regulamentados por lei complementar federal; não sofrem Intervenção Federal, a não ser quando se localizam em Territórios Federais, sofrendo, por conseguinte, Intervenção Estadual; suas leis são controladas diretamente em sua constitucionalidade a partir de um tribunal de justiça estadual; e o mais importante, não há participação dos mesmos na

203 CAMPOS, Francisco. Direito Constitucional. Livraria Freitas Bastos. Rio de Janeiro: 1956, pp. 509- 510.

204

Idem, p. 508.

formação da vontade nacional, pois não possuiriam representantes diretos criando leis nacionais, a exemplo do Senado, que a rigor, representa os estados-membros.

Não obstante tais argumentos, sua autonomia constitucional é vista com plenitude, a despeito de não existir um Poder Judiciário próprio, municipal, o que não afetaria seu autogoverno, por se tratar de questão de controle, não havendo real prejuízo aos munícipes, que contam com a prestação jurisdicional, tanto federal quanto estadual, onde suas seções ou comarcas, respectivamente, assentam-se em, pelo menos, um município. Reconhece, finalmente, que, ao menos formalmente, é inegável a participação dos municípios na organização político-administrativa da República Federativa do Brasil.

Salutar, assim, a idéia de Celso Basto, para quem “a regra de ouro poderia

ser a seguinte: nada será exercido por um poder de nível superior desde que possa ser cumprido pelo inferior. Isso significa dizer que só serão atribuídas ao governo federal e ao estadual, aquelas tarefas que não possam ser cumpridas senão a partir de um governo com esse nível de amplitude e generalização. Em outras palavras, o município prefere ao Estado e à União. O Estado, por sua vez, prefere à União”. 206

4.5.1 A Intervenção nos Municípios

Integrantes ou não de um Estado Federal, haja vista sempre possuírem alguma autonomia, mesmo numa realidade unitária, os entes locais podem sofrer um excepcional controle, suspendendo sua autonomia, para o restabelecimento da normalidade. Numa Federação como a brasileira, a situação é ainda mais complexa, eis que os municípios possuem envergadura constitucional, sendo integrantes da formação do Estado, com competências próprias e autonomia plena, asseguradas pela Lei Maior. Assim, a própria Constituição Federal dispõe, em seu texto, o mecanismo da Intervenção. Não será a mesma, todavia, federal, mas sim, estadual, por questões de prática constitucional. Da mesma forma que o Supremo Tribunal Federal é incapaz de

206

Cf. BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional. 20ª edição, atualizada. Editora Saraiva. São Paulo: 1999, p. 285.

controlar a constitucionalidade as leis municipais em sede de controle concentrado207, apenas estaduais e federais, por razões de volume processual insuportável, a União não teria condições de intervir em mais de cinco mil municípios. Do contrário, tanto o STF quanto a União, não teriam outra ocupação que não fosse apreciar tais pedidos, inviabilizando suas atividades constitucionais prementes.

Outrossim, no Brasil, cabe aos Estados-membros, a partir de pressupostos matérias pré-estabelecidos na Carta Magna208, intervir nos Municípios localizados em seu âmbito, a exceção dos municípios porventura localizados em Territórios Federais, que, obviamente, sofrerão a constrição por parte da União. Como, por enquanto, não há Territórios no País, essa possibilidade fica na teoria, até que os mesmos sejam instituídos (art. 18, §2º, CF). É de competência exclusiva do Governador estadual decretar a Intervenção, decreto que deverá conter a amplitude, o prazo e as condições de execução, podendo, ainda, nomear interventor, medida que será submetida à Assembléia Legislativa para ulterior deliberação.