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5. RESULTADOS E DISCUSSÃO

5.4. Avaliação da Produção de Sólidos no Sistema

O coeficiente de produção de biomassa é um parâmetro cinético importante, que correlaciona a produção de sólidos (SSV) com a utilização do substrato orgânico (DQO removida), mas, na prática, sua determinação mostra-se difícil. HENZE & HARREMOËS (1983) apud CHERNICHARO (1997) apresentam os seguintes coeficientes de produção de biomassa para organismos anaeróbios, determinados a 35oC: bactérias acidogênicas (0,15 gSSV/gDQO), arqueas metanogênicas (0,03 gSSV/gDQO), e população combinada (0,18 gSSV/gDQO).

Neste experimento, considerando-se tratar de um “circuito fechado”, com a recirculação de todo o volume de lixiviado drenado dos reatores de RSU, após tratamento no reator UASB, e inoculação da digestão dos RSU com toda a massa de lodo biológico excedente, sem a manutenção do teor de umidade ou alguma outra contribuição ao balanço de massa do sistema, a única possibilidade de redução do teor de matéria orgânica consiste na conversão dos compostos orgânicos complexos (DQO particulada) em outros mais simples (AGV), e estes, por sua vez, em metano e dióxido de carbono (Figura 5.37).

LIBÂNIO (2002)

Figura 5.37: Balanço de massa no sistema de tratamento integrado dos RSU e do chorume.

Portanto, uma vez que a degradação da matéria orgânica está intrinsecamente relacionada à síntese celular dos microrganismos decompositores, pôde-se estimar o coeficiente de produção de biomassa na linha de tratamento integrado se considerados o incremento do teor de sólidos suspensos voláteis (Figura 5.14) e o decaimento da DQO filtrada (Figura 5.9), após o início dos procedimentos de correção do pH para favorecimento da atividade metanogênica:

O valor estimado do coeficiente de produção de biomassa (Y ≅ 0,03 gSSV/gDQO removida), correspondente ao crescimento dos SSV na linha 3 (Figura 5.14) após a correção do pH, é igual ao valor preconizado na literatura para as arqueas metanogênicas (HENZE &

HARREMOËS, 1983 apud CHERNICHARO, 1997).

Através da regressão linear de pontos amostrais correspondentes à evolução temporal da massa de sólidos totais no lodo biológico de um reator UASB, submetido a diferentes cargas orgânicas afluentes, OLIVA et al. (1996) sugeriram a adoção de uma taxa de produção de sólidos igual a 0,025 gST/gDQOafluente.

Por fim, considerando-se também as demais observações simultâneas referentes ao acentuado incremento da produção de biogás (item 5.3), redução da DBO, DQO filtrada e da razão DBO/DQO (item 5.2.1); além da constatação do aumento dos teores de sólidos suspensos voláteis e diminuição da concentração de sólidos dissolvidos voláteis (item 5.2.2) e de ácidos graxos voláteis (item 5.2.4), é correto afirmar que a correção do pH do lixiviado dos reatores experimentais da linha 3, de cerca de 5,5 até 7,5, propiciou o desenvolvimento da população de organismos metanogênicos.

Diferentemente, nada se pode afirmar quanto ao crescimento da biomassa no interior do reator UASB, haja visto que não se procedeu ao descarte periódico do lodo biológico. A determinação do perfil de sólidos, com a amostragem do lodo em três diferentes níveis (torneiras 1, 8 e 12) e análise da concentração de sólidos totais (voláteis e fixos), evidencia a simples manutenção da massa de sólidos quando da inoculação do reator (Figura 5.38).

Figura 5.38: Evolução do perfil de sólidos no reator UASB, determinado nas 4 fases de operação do sistema integrado (linha 3).

Ironicamente, se considerado o interesse no uso do lodo biológico excedente para inoculação da digestão dos resíduos sólidos urbanos aterrados, a baixa taxa de produção de biossólidos em reatores anaeróbios, atribuída por diversos autores como um das vantagens da estabilização da matéria orgânica por via anaeróbia, não pode ser apontada como um fator positivo no tratamento do lixiviado de aterros sanitários, pelo menos durante a fase inicial de operação dos aterros, quando uma maior quantidade de inóculo seria benéfica.

A inoculação da digestão dos RSU com lodo biológico, seja através da recirculação de parte do chorume tratado, ou simplesmente, com a recirculação de lodos concentrados, minimiza os

inconvenientes com o transporte, estabilização e disposição final do lodo. Uma vez que o seu destino são as próprias células de aterramento, o transporte do lodo consubstancia-se no carreamento destes sólidos junto à fase líquida que retorna por bombeamento, enquanto que a estabilização e disposição final do mesmo dar-se-ão no interior do aterro, que funciona como um verdadeiro biodigestor.

Contudo, a caracterização físico-química do lodo biológico não pode ser negligenciada e, dentre as maiores preocupações concernentes ao seu uso ou disposição final, pode-se citar os elevados teores de metais pesados.

A remoção de metais no chorume bruto, tratado biologicamente, pode ocorrer através da formação de sulfetos metálicos, por processo anaeróbio, ou de hidróxidos metálicos, por via aeróbia (HAMADA et al., 2000). Entretanto, por vezes, faz-se ainda necessário uma maior remoção de metais pesados, empregando-se usualmente a precipitação química entre outras alternativas de tratamento físico-químico.

Neste experimento, efetuaram-se determinações de metais no lodo do reator UASB em duas oportunidades: quando do preenchimento do reator UASB com o lodo biológico excedente produzido por outro reator UASB tratando esgoto doméstico, e ao final dos primeiros 140 dias de operação do sistema, após a correção do pH do chorume afluente ao reator. A Figura 5.39 apresenta os teores de metais pesados determinados em três pontos distintos ao longo do perfil de lodo do reator UASB.

Figura 5.39: Avaliação das concentrações de metais pesados no lodo biológico em diferentes níveis do reator UASB, no início e término do período de monitoramento.

Pode-se observar que para todos os elementos analisados, à exceção do cálcio e do manganês, houve um acréscimo em suas concentrações após 140 dias de operação. Tal fato pode ser explicado pela formação de precipitados insolúveis, notadamente os sulfetos metálicos, que ficam retidos junto à biomassa em suspensão (item 5.2.5.2).

As concentrações iniciais de metais pesados aferidas no lodo biológico do reator UASB são da mesma ordem daquelas determinadas em lodos de esgotos sanitários por outros autores, apresentadas na Tabela 5.14.

Tabela 5.14: Comparação entre os teores de metais pesados em amostras do lodo biológico do reator UASB tratando chorume, após 140 dias de operação, e aqueles referenciados em alguns outros trabalhos, relativos ao lodo de esgoto sanitário.

Metais Pesados (mg kg-1) Referência

Ni Cr Cd Cu Mn Zn Ca Mg Al Presente estudo (1) 340 101 <5 626 943 2000 73000 12000 27000 Miyazawa et al., 1996 (2) 81 125 <2,5 401 - 1340 - - - Tsadilas et al., 1995 (2) 77 103 4,1 101 - 137 - - -

Tan, 1995 80 250 - 800 - 3000 - - -

(1) – Média ponderada das concentrações de metais pesados no lodo, correspondente aos diferentes trechos do reator UASB (torneiras 1, 6 e 11)

(2) – Trabalhos referenciados por ANDREOLI et al. (1999).

Ademais, verificou-se também que as concentrações de metais no lodo do reator UASB, após 140 dias de operação, à exceção do níquel, não são proibitivas com relação à sua aplicação na agricultura (Tabela 5.15), uma vez que seus valores são menores que os limites máximos recomendados por ANDREOLI et al. (1999). Entretanto, seu emprego dependerá ainda da avaliação dos efeitos cumulativos, das características químicas do solo e de outras especificidades da cultura agrícola em questão.

Tabela 5.15: Avaliação da possibilidade de reciclagem do lodo biológico do reator UASB.

Elemento

Concentração determinada no (1) Lodo Biológico do reator UASB

(mg/kg matéria seca)

Valor Limite (2)

p/ Reciclagem na Agricultura (mg/kg matéria seca)

Cd <5 20

Cu 626 1000

Ni 340 300

Pb - 750

Zn 2000 2500

Hg - 16

Cr 101 1000

(1) – Análise do lodo biológico após 160 dias de operação.

(2) – Valores recomendados por ANDREOLI et al. (1999).