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CAPÍTULO 3 – A REDE E-TEC NA INSTITUIÇÃO INVESTIGADA

3.3 A implementação do Curso de Meio Ambiente no âmbito da Rede e-Tec –

3.3.1 Avaliação do Projeto Pedagógico

Segundo Veiga (2003, p.271)

O Projeto Político Pedagógico visa à eficácia que deve decorrer da aplicação técnica do conhecimento. Ele tem o cunho empírico-racional ou político administrativo. Neste sentido, o projeto político pedagógico é visto como um documento programático que reúne as principais idéias, fundamentos, orientações curriculares e organizacionais de uma instituição educativa ou de um curso.

Veiga (2003) discute os diferentes significados que podem ser atribuídos ao Projeto Político Pedagógico (PPP): como inovação regulatória ou técnica; e como ação emancipatória ou edificante.

A inovação regulatória ou técnica caracteriza-se pelo caráter normativo da ciência reguladora, que hora possibilita um processo de mudança fragmentado, limitado e autoritário e, de outro, impossibilita uma articulação potencializadora entre o ser, o saber e o agir (VEIGA, 2003, p.269). Assim, nesses processos prevalece a padronização em detrimento da

inovação, que acaba sendo absorvida pelas lógicas preexistentes e pelos quadros de referência reguladores (ibidem).

A implementação de um curso a distância pode ser encarada como um processo de inovação no IMR por vários motivos. Primeiro, por ser um processo completamente novo em uma instituição tradicional e consolidada na oferta de cursos técnicos presenciais. Segundo, por requerer a organização de um sistema educativo diferenciado, organizado através de uma plataforma virtual, abrangendo um público diferenciado e uma noção de tempo e espaço equivalentes a essa modalidade.

Segundo Veiga (2003, p.270), ao mesmo tempo em que a inovação regulatória tem como objetivo trazer mudanças no sistema educacional, este " 'novo' só adquire sentido a partir do momento em que ele entra em relação com o existente". Sendo assim, a autora considera que essa inovação resulta em uma "rearticulação do sistema, visando à introdução acrítica do velho no novo" (ibidem).

Como consequência, o Projeto Político Pedagógico é organizado de forma técnica, visando a elaboração de um documento e não de um projeto envolvendo dimensões políticas e socioculturais importantes para o desenvolvimento do curso. Nesse caso, o processo de produção coletiva é deixado de lado (VEIGA, 2003, p.271).

Segundo o coordenador do curso de Meio Ambiente à distância, o Projeto Político Pedagógico foi elaborado por uma pedagoga, aluna do coordenador geral do Programa:

Foi uma pedagoga, aluna do (coordenador geral do programa) que fez o projeto a distância [...] Quando eu entrei no projeto, o projeto já estava pronto. O que eu fiz ao longo do tempo foi corrigir, inserir bibliografia, mudei alguma coisa na grade em função de material que estava ou não disponível na época. Só isso que eu fiz. Mas a elaboração não fui eu, por isso que prefiro não falar sobre o projeto. (Coordenador de Curso)

Não houve, portanto, envolvimento dos professores no processo de construção, o que é confirmado pelos professores:

Não, eu não participei do processo de elaboração, mas ele ficava disponível para todos os professores consultarem. Ele ficava bem à disposição. (Professor 3)

O Professor 2 deixa evidenciada a falta de participação do corpo docente, tanto no processo de elaboração do projeto pedagógico, quanto nas mudanças realizadas ao longo do

processo:

"da elaboração não... cheguei a ter acesso... Ler a grade de matérias... ler os objetivos... as habilidades... competências... relacionados às minhas disciplinas... mas a participação veio já pronta e definida como que seria, entendeu? carga horária da matéria, o que teria, visitas... todas essas decisões mudaram ao longo do processo... mas eu pouco participei delas ali, entendeu?" (Professor 2)

O Professor 1 só conheceu o projeto pedagógico durante um curso de especialização realizado:

[...] engraçado você entrar num projeto e não ter conhecimento do projeto político... Mas eu não tive... Tive contato depois, quando eu tive a necessidade de fazer a especialização.. Ai eu fui ler, pegar ele parte por parte, fazer uma análise geral. (Professor 1)

Em um sentido oposto à inovação regulatória, Veiga (2003) explica o significado de inovação emancipatória ou edificante e sua relação com o Projeto Político Pedagógico.

A inovação emancipatória ou edificante é de natureza ético-social e cognitivo- instrumental, visando à eficácia dos processos formativos sob a exigência da ética. A inovação é produto da reflexão da realidade interna da instituição referenciada a um contexto social mais amplo. (...) Inovação e projeto político-pedagógico estão articulados, integrando o processo com o produto porque o resultado final não é só um processo consolidado de inovação metodológica no interior de um projeto político-pedagógico construído, desenvolvido e avaliado coletivamente, mas é um produto inovador que provocará também rupturas epistemológicas. Não podemos separar processo de produto. (VEIGA, 2003, p.275)

No caso de cursos a distância, torna-se ainda mais importante construir um Projeto Político Pedagógico pautado no significado de inovação emancipatória ou edificante, já que é necessária a ruptura epistemológica com o modelo presencial. O fato de o PPP estar voltado para o modelo presencial produz um efeito ineficiente e inadequado para as especificidades da educação a distância, como foi ressaltado pelo Professor 1:

É um documento, mas ele não relata as dificuldades do projeto, principalmente organizacionais, de comunicação interna, ele não define às vezes. Ele tem um direcionamento de função, do tutor, do coordenador e do coordenador pedagógico, mas na prática, tem lacunas que o projeto não cobre. Então ele precisa ser atualizado, ele precisa ser retificado em algumas coisas, e colocado dentro de uma necessidade mais próxima do real, porque ali para mim, tem algumas coisas voltadas ainda para o modelo presencial. Ele se baseou em algumas coisas que é do presencial e que às vezes não atendem plenamente as necessidades da educação a distância. (Professor 1)

O Professor 1, no trecho acima, também afirma a necessidade de atualização do Projeto de acordo com as adequações realizadas ao longo no curso. Para esse entrevistado, o

Projeto Pedagógico elaborado no início do curso, tornou-se defasado em relação às práticas pedagógicas e organização temporal, como pode ser confirmado no trecho abaixo:

Ah, ele está defasado já. Ele tem várias páginas, é até bem cansativo. Ele foi feito de acordo com o modelo inicial, às vezes muito pretensioso para o que seria o curso. Uma organização também que extrapolou também o fazer [...] ele imaginou como deveria ser uma distribuição de pontos, uma organização de provas até de tempo de organização desses cursos, que na verdade no inicio a gente ministrava cada módulo em três meses. Aí foi uma demanda dos próprios professores, a gente viu que estava atropelando a semana de interação, fechamento de notas com o início de outra disciplina, então era muito corrido e na educação a distância você tem o maior gasto de tempo na preparação, antes da disciplina começar você tem que deixar tudo pronto. Então ali ficou muito tumultuado, você fechar uma disciplina e começar outra. (Professor 1)

A posição do professor demonstra a defasagem do PPP e do processo desencadeado durante o período letivo. Os aspectos referentes ao curso, na modalidade à distância foram ressaltados em suas especificidades e também em termos da falta de tempo hábil para sua execução.

Garrido e Schmeler (2006, p.2) consideram que o Projeto Político Pedagógico para Educação a Distância deve expressar as concepções epistemológicas que o fundamentam, as bases teóricas que orientam a relação entre ensino e aprendizagem, assim como os seus desdobramentos em práticas docentes. Por isso, precisa ser desenvolvido em uma perspectiva interdisciplinar.

Desenvolver um Projeto Político Pedagógico em uma perspectiva interdisciplinar significa que além de uma construção coletiva, este documento precisa conter a integração ente os conteúdos a serem desenvolvidos, os recursos utilizados para ensiná-los e o papel de cada profissional neste processo. Assim, esses projetos devem ter uma identidade própria que atenda às especificidades do curso e, ao mesmo tempo, estar em constante atualização (LUZZI, 2007).

O trabalho de Silva et al (2014), teve como objetivo mapear e analisar os Projetos Pedagógicos (PPCs) de Cursos Técnicos de Nível Médio Subsequentes da Rede e-Tec Brasil, em termos do atendimento aos ordenamentos legais vigentes na época para esse nível e modalidade e às orientações de documentos norteadores para EaD. Os resultados da pesquisa referenciada mostraram que "a maioria dos Projetos não observam os ordenamentos legais e as orientações específicas para a modalidade a distância na estruturação formal dos PPCs

(SILVA ET AL, 2014, p.1182).

Deste modo, observa-se a tendência dos projetos pedagógicos dos cursos técnicos a distância reproduzirem os documentos do presencial com pequenas mudanças, o que é um equívoco e prejudica a execução das atividades de forma adequada, como ilustraram as falas dos entrevistados.