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Avanços e limitações no campo de compreensão

4 TABULAÇÃO, ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS

4.1 TEMAS DE LEITURA RECORRENTES NA COMUNICAÇÃO ELETRÔNICA

4.2.1 Síntese panorâmica das pesquisas sobre compreensão

4.2.1.1 Avanços e limitações no campo de compreensão

Com o exame das investigações do processo de compreensão, ficaram evidentes muitos avanços. Contudo, existem muitas limitações nas pesquisas. A esse respeito, Cain, Oakhill e Bryant (2004, p. 31, tradução nossa38) destacam que, ―Infelizmente, nosso conhecimento da única contribuição que essas diferentes habilidades e processos proporcionam ao desenvolvimento da compreensão leitora é (está) limitado, porque a maioria da pesquisa nesse campo tem-se focado em um único componente da habilidade.‖ A compreensão textual envolve diversas habilidades e processos cognitivos, funcionando em conjunto, conforme se destacou na seção 2.2 e 2.3 da dissertação. Contudo, muitos a

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―Unfortunately, our knowledge of the unique contribution that these different skills and processes make to reading comprehension development is limited because the majority of work in this field has focused on a single component skill.‖ (CAIN; OAKHILL; BRYANT, 2004, p. 31).

investigam, por exemplo, por meio do estudo de um componente-processo-habilidade isoladamente.

Para avaliar a compreensão, ainda há muita discrepância no aparato metodológico. Alguns pesquisadores utilizam testes Cloze, outros questionários de múltipla escolha, ou testes de reconto. Uns utilizam textos narrativos, outros informativos. Alguns textos são pequenos; outros grandes. Alguns trabalhos são longitudinais; a maioria dos demais não o é. Algumas investigações trabalham com amostras expoentes. Outras são estudos de caso. Todos esses aspectos enumerados são fatores que podem incidir diretamente na coleta de dados e, consequentemente, na interpretação deles. A natureza do teste acaba por determinar que faceta da compreensão se está avaliando/investigando. Como destacado, a compreensão textual não envolve somente uma habilidade nem apenas um processo cognitivo. Assim, resultados podem ser tendenciosos ou equivocados. Portanto, muitas vezes, é difícil aproximar as pesquisas pelas suas conclusões. É insuficiente considerar apenas os resultados. Tem-se de entender como se chegaram a eles.

De outra perspectiva, quando se aborda a avaliação da compreensão leitora, a maioria dos testes foca em tarefas que, na verdade, avaliam o produto da compreensão e não a compreensão em si. Flores (2007) cita, como exemplos dessas tarefas, os questionários de múltipla escolha (perguntas objetivas), relatos (recontos), testes Cloze. Por outro lado, há os protocolos verbais (relatório oral; verbalização; vocalização) e imageamento cerebral (DTIs; EEGs; ERPs; fRMIs; MEGs; MRIs; rTMSs). Com eles, atenção passa do produto para o processo de compreensão. Desse modo, precisa haver maior atenção e clareza na construção de bateria de testes para investigar a leitura e compreensão.

As pesquisas que focaram o estudo da neurobiologia da leitura, isto é, áreas cerebrais que se envolvem no processo de construção da significação textual, destacaram a participação significativa do hemisfério direito na compreensão textual. As pesquisas, com auxílio de métodos neurofisiológicos e cognitivos de pesquisa mais avançados, comprovam que os dois hemisférios cerebrais trabalham conjuntamente. Desde 1990, tem-se comprovado a participação ativa do hemisfério direito no processamento linguístico, principalmente em nível de discurso (SCHERER, 2009). Sousa e Gabriel (2012) ressaltam que o hemisfério esquerdo responsabiliza-se pelo processamento de ordem lexical, semântica e sintática. O hemisfério direito responsabiliza-se pela integração de informações textuais (proposições) com as que o leitor já tem armazenadas (conhecimento prévio), contribuindo com o processo inferencial e compreensão da linguagem conotativa. Destaca-se que o hemisfério esquerdo se responsabiliza por tarefas mais especializadas, como a decodificação e a significação literal,

ao passo que o direito se engaja com tarefas mais gerais – significação contextual e interpretação de metáforas, ironias (BARETTA; FINGER-KRATOCHVIL, 2010).

Em relação às pesquisas discutidas em torno de fatores externos que se relacionam à compreensão em leitura, como situações socioeconômicas da família do leitor (classe social e renda familiar) e condições de escolas públicas versus particulares, confirmam o que Morais (2013) categoricamente afirma: há muitas implicações ao se nascer e desenvolver-se em uma família pobre econômica e culturalmente. Ou seja, o estatuto social inferior relaciona-se diretamente com a competência e habilidade do leitor perante tarefas de leitura. A estimulação precoce e apoio familiar influenciam no desenvolvimento cerebral da criança. O apoio e o cuidado da mãe já predizem o volume dos hipocampos. E, como se sabe, são essas estruturas cerebrais as responsáveis pela consolidação do armazenamento de informações na memória (IZQUIERDO, 2002). Em situações de pobreza, há estresse. E esse estado afeta consideravelmente a aquisição e a manutenção de informações, isto é, a aprendizagem (memórias). Além desses aspectos, Morais (2013) afirma que, no processo de aquisição da linguagem, os pais têm papel extremamente relevante. Linguisticamente, os filhos são seus reflexos e da comunidade social em que se inserem. Pais com melhores condições financeiras possuem maior nível de escolaridade. Assim, ao interagirem com seus filhos por meio da fala, utilizam vocabulário mais preciso e com diversidade de itens lexicais.

Acerca dos diferentes níveis de compreensão, as pesquisas apontaram a modalidade de escola (pública, particular) e suas condições, recursos familiares (incentivo à leitura, à cultura, investimento em materiais, livros), gênero textual, contexto de leitura (impresso, informatizado), nível de escolaridade como as principais variáveis relacionadas.

Em relação às pesquisas desenvolvidas com a finalidade de promoção da compreensão leitora, observou-se que muitas desenvolveram e testaram projetos que lidaram com estratégias de leitura. Igualmente, outras pesquisam comprovaram a eficiência da utilização da tecnologia no processo de ensino-aprendizagem da leitura, bem como no letramento. A esse respeito, Finger-Kratochvil (2009) destaca que há a necessidade de mudanças no processo de ensino-aprendizagem, principalmente pensando-se na formação de leitores estratégicos e no processo de letramento, o qual requer o ensino de habilidades tradicionais (texto impresso), mas também alternativas (hipertexto).

Outro argumento dos pesquisadores para a utilização das TICs no processo educacional é que elas, muitas vezes, funcionam como instrumento motivacional. Sabe-se que muitos fatores se relacionam direta e indiretamente com o sucesso na leitura (compreensão). Um desses fatores é o emocional (ALLIENDE; CONDEMARÍN, 2005 [1978]). Sabe-se que

os estados de ânimos (sonolência, tédio, estresse) e emoções (tristeza, nervosismo, ansiedade) são reguladores da memória (IZQUIERDO, 2002). E se a memória não está em seu funcionamento regular, não há aprendizagem.

Em suma, muito acerca da compreensão leitora está sendo (mais bem) esclarecido. O avanço nos campos da ciência e da tecnologia propiciam novas possibilidades de investigação do processo de compreensão, analisando-se onde e que partes cerebrais se envolvem na codificação de proposições textuais e o que ocorre na mente do leitor, assim como estudos sobre processos cognitivos e habilidades que compõem a compreensão. De outra perspectiva, constatam-se lacunas. Muitas investigações compartilham resultados sobre a compreensão em geral, quando, na verdade, apenas são sobre um dos componentes dela. De toda forma, o progresso do conhecimento no campo de leitura foi comprovado.

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