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CAPÍTULO 4 AHE TIJUCO ALTO E A SADIA QUALIDADE DE VIDA

4.1. BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO RIBEIRA DE IGUAPE

A Bacia Hidrográfica do Rio Ribeira e o Complexo Estuarino Lagunar de Iguape, Cananéia e Paranaguá, denominada Vale do Ribeira, possui uma área de 2.830.666 hectares (28.306 km2), sendo 1.119.133 hectares no Estado do Paraná e 1.711.533 hectares no Estado de São Paulo. (REDE..., 2007).

No contexto do Plano Nacional de Recursos Hídricos (BRASIL, MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE, 2007) a Bacia Hidrográfica do Rio Ribeira de Iguape está inserida da Região Hidrográfica Atlântico Sudeste. A região do Atlântico Sudoeste é uma das áreas de maiores demandas hídricas do país, por outra banda, apresenta uma das menores disponibilidades hídricas.

É preciso ter em conta que a Ecorregião Ribeira do Iguape, assim como a Mata Atlântica, extrapolam os limites da Região Hidrográfica Atlântico Sudeste, pois engloba, além da Bacia de drenagem do Rio Ribeira do Iguape, o litoral sul paulista (PNRH, 2007). Assim, a região está inserida em dois biomas considerados pela Constituição Federal como Patrimônio Nacional: Mata Atlântica e Zona Costeira, conforme o art. 225, § 4 da CF/1988:

A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-grossense e a Zona Costeira (grifo nosso), são patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente inclusive, quanto ao uso dos recursos naturais. (grifo nosso). (BRASIL, 1988, art. 225).

No que diz respeito a Lei da Mata Atlântica (Lei n 11.428, de 22 de dezembro de 2006), o art. 6 , dispõe que:

(...) a proteção do Bioma Mata Atlântica têm por objetivo geral o desenvolvimento sustentável e, por objetivos específicos, a salvaguarda da biodiversidade da saúde humana, dos valores paisagísticos, estéticos e turísticos, do regime hídrico e da estabilidade social. (BRASIL, 2006, art. 6).

Tomando por base o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro (Lei n 7.661, de 16 de maio de 1998), o seu art. 2 nomeia dentre seus objetivos a utilização racional da Zona Costeira de forma a contribuir para elevar a

qualidade da vida de sua população, e a proteção do seu patrimônio natural, histórico, étnico e cultural.

Esta é uma situação peculiar, uma região protegida, por diversos documentos jurídicos, de diferentes ditames e territórios protegidos. Neste contexto estão inseridos, também, os sítios arqueológicos tombados e territórios quilombolas, caiçaras e ribeirinhos. A Lei que instituiu o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (Lei n 9.985, de 18 de julho de 2000) sabiamente, prevê em seu art. 26, indicativos para harmonização e compatibilização de áreas protegidas em uma mesma região. Vejamos:

Quando existir um conjunto de unidades de conservação de categorias diferentes ou não, próximas, justapostas ou sobrepostas, e outras áreas protegidas públicas ou privadas, constituindo um mosaico, a gestão do conjunto deverá ser feita de forma integrada e participativa, considerando-se os seus distintos objetivos de conservação, de forma a compatibilizar a presença da biodiversidade, a valorização da sociodiversidade e o desenvolvimento sustentável no contexto regional. (BRASIL, 2000, art. 26). Lembramos que as áreas de Unidades de Conservação, exceto as Áreas de Proteção Ambiental e Reservas Particulares do Patrimônio Natural, devem possuir zona de amortecimento e quando conveniente, os corredores ecológicos. Não há quaisquer referências dos cuidados com estas áreas nos documentos analisados.

A Política Nacional de Recursos Hídricos, neste diapasão, determina, dentre suas diretrizes, a integração da gestão das bacias hidrográficas com a dos sistemas estuarinos (art. 3 , VI, da Lei n 9.433, de 1997).

O Conselho Nacional de Recursos Hídricos criou recentemente a Câmara Técnica de Integração da Gestão das Bacias Hidrográficas e dos Sistemas Estuarinos e Zona Costeira. (Resolução do CNRH n 51, de 18 de julho de 2005). A integração do sistema é complexa, pois envolve uma ampla articulação vertical e horizontal entre a gestão ambiental e hídrica, com vários questionamentos ainda não elucidados Poderia um município costeiro vetar o projeto na área ambiental por considerá-lo inadequado ao interesse local? Por

sua vez, como se daria a integração de um Comitê de Bacia Hidrográfica Federal (no caso da Bacia do rio Ribeira inexistente) com o Comitê de Bacia Estadual paulista do Litoral Sul? Esse poderia vetar o projeto?

São questões já previstas em normas, mas ainda não efetivadas, vejamos a seguir:

A Competência dos Municípios:

art. 30. Compete aos Municípios:

I – legislar sobre assuntos de interesse local; Articulação União e Estados:

art. 4 da Lei n 9.433, de 1997: A União articular-se-á com os Estados tendo em vista o gerenciamento dos recursos hídricos de interesse comum. Veja o Ministério Público, dentre suas recomendações quanto ao AHE de Tijuco Alto, indicou nos considerado de suas recomendações:

CONSIDERANDO que, tanto da análise técnica anteriormente empreendida pelo IBAMA (sobretudo o Parecer Técnico n 001/97 e Parecer Técnico n 68/2003-COAIR/CGLIC/DILIQ/IBAMA referentes ao primeiro licenciamento), quanto da necessária compatibilização da legislação incidente na espécie – a que instituiu a Política Nacional do Meio Ambiente, a Política Nacional de Recursos Hídricos, a Política Agrícola, e as leis que disciplinam o regime das concessões, permissões e autorizações de serviços públicos e utilização de bens públicos – resulta que o Estudo de Impacto Ambiental e respectivo RIMA a ser apresentado pelo empreendedor no curso do presente licencimento ambiental deve considerar a bacia hidrográfica do

Rio Ribeira de Iguape, o Complexo Estuarino Lagunar de Iguape- Cananéia-Paranaguá, e as diversas bacias hidrográficas encaixadas entre esta e o Oceano Atlântico (grifo nosso), genericamente denominada

Vale do Ribeira, com área de 2.830.666 há (28.306 Km2) abrangendo as regiões sudeste do Estado de São Paulo e leste do Estado do Paraná, como área de influência direta e indireta da UHE Tijuco Alto, estando tal exigência, além do que, em conformidade com o artigo 5 da Resolução CONAMA 001/86;

É cediço que este alerta do “parquet”, se não observado, poderá ensejar uma Ação Civil Pública contra todos os envolvidos: Poder Público (gestores hídricos e ambientais), bem como o empreendedor.

O RIMA (2005, 34-35) atual fez as seguintes considerações a respeito da área de influência do empreendimento, notamos que não foram considerados os argumentos acima levantados:

O Termo de Referência estabelecido pelo IBAMA solicitou a definição dos limites da área geográfica a ser direta e indiretamente afetada pelo empreendimento. .As áreas são, portanto: Área de Influência Direta – AID: área sujeita aos impactos diretos da implantação e operação do empreendimento. A delimitação dessa área considerou as características sociais, econômicas, físicas e biológicas dos sistemas estudados e das particularidades do empreendimento. Compreende os municípios de Ribeira e Itapirapuã Paulista, no estado de São Paulo, e Adrianópolis, Cerro Azul e Doutor Ulysses, no Paraná para o meio socioeconômico e parte desses municípios (a parte da bacia hidrográfica cujos rios correm para o reservatório) para os meios físico e biótico (parte dos componentes da natureza que não têm vida e os que têm vida). Essa área tem um compartimento menor, próprio, uma subdivisão que é chamada Área Diretamente Afetada - ADA, que é constituída pela área do reservatório e mais uma faixa de 100 metros ao redor do mesmo. Área de Influência Indireta – AII: área real ou potencialmente ameaçada pelos impactos indiretos da implantação e operação do empreendimento, abrangendo os ecossistemas (biótico e não biótico) e o sistema socioeconômico que podem ser impactados por alterações ocorridas na AID.Área de Abrangência Regional – AAR: ao considerar o potencial hidrelétrico de mais três empreendimentos ao longo do rio Ribeira, delimita-se toda a área que seria impactada caso houvesse a construção dessas usinas. A essa área se deu o nome de Área de Abrangência Regional. A AAR compreende a bacia hidrográfica do rio Ribeira de Iguape até a cidade de Registro, excluindo o rio Juquiá, já que esse rio já conta com hidrelétricas e tem um comportamento diferente do Ribeira.

No que tange aos aspectos do meio ambiente cultural, é preciso destacar a tutela constitucional dos artigos 215 e 216.

Art. 215. O Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais.

§ 1 O Estado protegerá as manifestações das culturas populares, indígenas e afro-brasileiras, e das de outros grupos participantes do processo civilizatório nacional.

(...)

Art. 216. Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem:

(...)

II – os modos de criar, fazer e viver; (...)

IV – as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais;

V – os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico.

§ 1 O Poder Público, com a colaboração da comunidade, promoverá e protegerá o patrimônio cultural brasileiro, por meio de inventários, registros, vigilância, tombamento e desapropriação, e de outras formas de acautelamento e preservação. (BRASIL, 1988, art. 215-216).

Como se vê, a integridade destes bens culturais e sua interface com os sistemas ecológicos transpassam a unidade espacial da Bacia Hidrográfica. Necessário se faz uma gestão integrada mais holística para que em nome da Prevenção, Participação Pública e Precaução todos os impactos possam ser avaliados.

Assim, entendemos que ao determinar a área de influência de um projeto, que ao menos seja considerado em sua de influência indireta estas interfaces indicadas. Embora algumas normas ainda careçam de efetividade, como é o caso do art. 4º da Lei da Política Nacional de Recursos Hídricos, em nome da sustentabilidade jurídica deve-se integrar estudos de impacto ambiental. Este dispositivo determina que a União articule-se com os Estados, tendo em vista o gerenciamento dos recursos hídricos de interesse comum.