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4. BRASIL: UMA DIAGNOSE DO CENÁRIO ATUAL

4.2 FATORES DA INEFICIÊNCIA BRASILEIRA NA REALIZAÇÃO DE

4.2.2. Baixo engajamento do setor privado

tecnológico. A nosso ver, ainda carece no ordenamento brasileiro de utilização do Direito para criar uma instituição específica voltada ao fim de estimular de maneira eficiente a aquisição de tecnologia estrangeira (através da dotação de funções, disponibilidade de linhas de créditos e/ou benefícios específicos), assumindo o Estado esse papel. O engajamento do setor privado e produtivo deve ser respaldado por uma política que de fato o atraia, claramente trazendo benefícios e vantagens para o incremento da participação dos particulares.

inovação desde então. As atividades que as empresas empreendem para inovar são de dois tipos:

P&D (pesquisa básica, aplicada ou desenvolvimento experimental); e outras atividades não relacionadas com P&D, envolvendo a aquisição de bens, serviços e conhecimentos externos. A mensuração dos recursos alocados nessas atividades revela o esforço empreendido para a inovação de produto e processo e é um dos principais objetivos das pesquisas de inovação.

Considerando a relevância do PINTEC para a mensuração da participação do setor privado na promoção de P&D, buscando-se aprofundar na análise de como é empregado o baixo montante que a iniciativa privada aloca nessa atividade, necessário se faz apresentar a metodologia adotada pela pesquisa, no que se refere às categorias de atividades levantadas44. Tal análise, como veremos a seguir, nos permite chegar a uma outra conclusão, ainda que não otimista para o alcance de uma trajetória tecnológica efetiva pelo Brasil: no Brasil, as empresas inovam mais em processos do que em produtos (novidades), o que também explica a baixa produção de Propriedade Intelectual no nosso país, e, consequentemente, as baixas taxas de produção de inovação tecnológica.

São estas as categorias de atividades utilizadas pela PINTEC: (i) atividades internas de P&D – compreende o trabalho criativo, que objetiva o aumento de conhecimento e por consequência desenvolvimento de novas aplicações, tais como produtos ou processos novos ou tecnologicamente aprimorados. Nessa categoria, realiza-se P&D através da elaboração de desenhos, a construção e o teste de protótipos e de instalações-piloto, incluindo-se o desenvolvimento de softwares que representem um avanço tecnológico ou científico; (ii) aquisição externa de P&D – consiste na aquisição, pela empresa, das atividades listadas no item acima, uma vez que são realizadas por empresas ou instituições tecnológicas; (iii) aquisição de outros conhecimentos externos – compreende os acordos de transferência de tecnologia e licenças de direitos de exploração de direitos de Propriedade Intelectual (abordados em outro capítulo dessa pesquisa); (iv) aquisição de software – compreende a aquisição de software (de desenho, engenharia, de processamento e transmissão de dados, voz, gráficos, vídeos, para automatização de processos etc.), adquiridos para implementar produtos ou processos novos ou tecnologicamente aperfeiçoados, excluídos aqueles registrados como atividades internas de P&D; (v) aquisição de máquinas e equipamentos – consiste na aquisição de máquinas/ equipamentos/ hardware, para a implementação de produtos ou processos novos

44 In Manual de Instruções - Pintec 2014: instruções para o preenchimento do questionário. Rio de Janeiro: IBGE, 2015. Disponível em: http://www.pintec.ibge.gov.br , Acesso em 08 de fev. de 2020.

ou tecnologicamente aperfeiçoados; (vi) treinamento – capacitar o desenvolvimento de produtos ou processos tecnologicamente novos ou significativamente aperfeiçoados, que guardem alguma relação com as atividades inovativas da empresa. Admite-se a aquisição de serviços técnicos especializados; (vii) introdução das inovações tecnológicas no mercado – comercialização, diretamente ligadas ao lançamento de produto tecnologicamente novo ou aperfeiçoado. Inclui-se a realização de pesquisa e teste de mercado, bem como a publicidade para o lançamento. Não contempla a criação de redes de distribuição de mercado para as inovações; e (viii) projeto industrial e outras preparações técnicas para a produção e distribuição – procedimentos e preparações técnicas para efetivar a implementação de inovações de produtos ou processos. Compreende a construção de plantas e desenhos voltados a procedimentos, especificações técnicas e características operacionais necessárias à implementação de inovações de processo ou de produto, para registro final do produto e para o início efetivo da produção, excluindo-se ensaios e testes contidos em atividades internas de P&D.

A tabela abaixo demonstra a alocação daquilo que foi empregado pelas empresas participantes, por categoria. O setor industrial com maior taxa de inovação – eletricidade e gás (36,4%), frente aos setores industriais e de serviços, empregou a grande maioria dos dispêndios na aquisição externa de P&D. Nos três setores, constata-se um baixo percentual na realização de atividades internas de P&D – último e necessário passo na execução de uma efetiva trajetória tecnológica, capaz de efetivamente gerar inovação e desenvolvimento tecnológico. No setor industrial, apenas 15% das empresas participantes realizaram atividades internas de P&D.

Figura 22: Importância atribuída às atividades inovativas, pelas empresas que implementaram inovações de produto ou processo, por setores de atividades Brasil - período 2014-2017

Fonte: IBGE (PINTEC, 2017)

Historicamente, as pesquisas demonstram uma postura reativa das empresas brasileiras – ainda não estimuladas suficientemente a inovar, optando por buscar a adequação/modernização nos processos produtivos, em prejuízo da busca pelo fomento e desenvolvimento das atividades internas de P&D.

Figura 23: Proporção de investimentos das empresas em processos e produtos

Fonte: IBGE (PINTEC, 2017)

A figura acima demonstra uma retórica em edições do PINTEC – a percepção de uma taxa de inovação de produtos bem abaixo da taxa de inovação de processos. Nesse sentido, contata-se o modestíssimo investimento alocado pelo setor privado na realização de atividade de P&D. Em 2003, a taxa foi de 0,53%, ao passo que em 2017 (mais que uma década depois), tal número subiu apenas 0,14 pontos percentuais, atingindo a taxa de 0,67%. Segundo dados da FINEP, isso representa pouco menos da metade da baixa alocação de recursos em P&D pelo poder público (cerca de 1,27%)45.

A figura 23 (acima), trazida também na edição de 2017 do PINTEC, demonstra que o setor privado nacional, ao passo de inovarem pouco, opta por adquirir conhecimento externo, ao despeito de buscar a realização do desenvolvimento interno. Ademais, destina-se pouco para a aquisição do conhecimento, ainda que externo, fato que resulta e corrobora a ineficiência do processo de catching-up da economia nacional. Ao adquirir-se pouco conhecimento (ainda que pronto e já testado), a primeira fase da trajetória tecnológica já é afetada, por certo inviabilizando a persecução das demais, quais sejam, a assimilação do conhecimento adquirido, inviabilizando um futuro aprimoramento.

Antonio Buainan e Roney Souza (2019) identificam que a baixa taxa de inovação no Brasil resulta “de alguns traços estruturais, quase genéticos, da economia brasileira, associados a um conjunto de déficits que caracterizam o Brasil” (BUAINAN; SOUZA, 2019, p. 93). Tais autores indicam dois elementos estruturantes como não estimulantes à inovação na cultura econômica nacional: uma acomodação pragmática e um ambiente macroeconômico não favorável. Como acomodação pragmática evidenciam uma postura voltada a não assumir os riscos inerentes à inovação, limitando-se a buscar a modernização “via aquisição de máquinas e equipamentos, treinamento de pessoal e consultoria técnica” (BUAINAN; SOUZA, 2019, p.

94).

Para eles, historicamente optou-se, ao invés de assumir os riscos de buscar atividade concretamente voltadas à inovação – realização de P&D, por acumular capacidades de enfrentamento de crises – econômicas e institucionais, reiteradamente presentes no contexto histórico-econômico nacional, conotando a incerteza que sempre permeou a exploração da atividade econômica pelos particulares. As empresas nacionais inovam pouco, limitando-se a

45 Disponível em http://www.finep.gov.br/noticias/todas-noticias/5533-investimento-em-p-d-impacta-9-no-crescimento-economico-diz-presidente-da-finep-na-fgv. Acesso em 03 de fev. de 2020.

incorporar novidades de processo, ou de produtos que já estão em uso nos mercados nacional e internacional, o que representa, em última análise, uma inovação endógena.

Quanto ao ambiente macroeconômico, indicam como elementos desfavoráveis e não estimulantes os seguintes: (i) mera aparência de estabilidade econômica – frequência de momentos de crise e instabilidade, gerando constantes oscilações cambiais, que afetam as políticas de importação e exportação: ora privilegia-se o mercado doméstico incentivando-se importações, ora acredita-se nas vantagens de substituição de importações por exportações; (ii) instabilidade institucional – em que pese termos atingido a marca de mais de três décadas sem a ruptura do modelo constitucional, “vive-se um quadro de confusão e instabilidade institucional que atinge fortemente o funcionamento da economia” (BUAINAN; SOUZA, 2019, p. 94). Evidenciam tal assertiva citando as constantes alterações nos marcos regulatórios e, por consequência, nas políticas econômicas importantes, tais como constantes alterações e redefinições de sobre níveis de investimento (incentivos aos particulares e destinação da receita pública); (iii) inadequação dos modelos institucionais até então adotados. Os autores questionam a eficiência dos modelos adotados como adequados e suficientes para favorecem a inovação. Indicam que “no Brasil, em muitos casos relevantes, a inadequação é a regra, e apesar das mudanças visando modernizar a legislação (Lei de Inovação, Marco Legal de CT&I), muitos obstáculos continuam vigentes e criando dificuldades para o funcionamento do sistema de inovação” (BUAINAN; SOUZA, 2019, p. 95).

Por fim, (iv) o custo Brasil – elevadas taxas de juros (bem superiores às médias adotadas por países inovadores), complexidade do sistema tributário, oneração excessiva dos investimentos em P&D e elevados custos de importação, fatores que dificultam e desestimulam a busca efetiva pelo desenvolvimento tecnológico, resultando no aumento do risco de inovar.

Outro número trazido pelo PINTEC 2017 que demonstra o baixo interesse do setor privado nas iniciativas governamentais de estímulo à inovação pode ser encontrado na figura abaixo, que indica um baixíssimo número de empresas nacionais que implementaram inovações com apoio do governo.

Figura 24: número de empresas que implementaram inovações com apoio do governo, por tipo de apoio, 2017.

Fonte: PINTEC, 201746.

Em abril de 2021, foi noticiada uma ação conjunta entre a Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial – ABDI (criada por meio da Lei n. 11.080, de 30 de dezembro de 2004, e regulamentada pelo Decreto n. 5.352, de 24 de janeiro de 2005, para apoiar o desenvolvimento industrial brasileiro; atualmente, a Agência tem como missão executar programas e projetos voltados à transformação digital do setor produtivo e assim contribuir com o processo de digitalização da economia nacional) e o IBGE, para uma reformulação no PINTEC trienal e a então adoção da Pesquisa de Inovação Semestral (PINTEC Semestral).

O objetivo é traçar o retrato da inovação no Brasil, ao levantar informações referentes ao investimento empresarial em Ciência, Tecnologia e Inovação (CT&I) no país. Os dados, quando divulgados, irão subsidiar a implementação, aperfeiçoamento e monitoramento de políticas públicas e estratégias das empresas. O planejamento consiste na realização de sete levantamentos em 50 meses de trabalho, prazo de vigência do Acordo de Cooperação Técnica (ACT) assinado entre a ABDI e o IBGE. Até a conclusão da presente pesquisa, não se tem conhecimento da publicação da primeira análise de tal documento.

A boa cooperação entre instituições de pesquisa públicas e empresas é também apontado pelo GII como elemento fundamental ao desenvolvimento tecnológico de uma nação. Assim, passaremos a tratar do terceiro e último fator da ineficiência para a execução da inovação em

46 Disponível em https://www.ibge.gov.br/estatisticas/multidominio/ciencia-tecnologia-e-inovacao/9141-pesquisa-de-inovacao.html?=&t=destaques , Acesso em 03 de fev. de 2022

nossa economia, passaremos a tratar da carência estratégica do sistema de propriedade intelectual adotado pelo Brasil.