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Bases de poder dos professores, a autoridade docente e a relação educativa

CAPÍTULO II – ENQUADRAMENTO TEÓRICO

2. Bases de poder dos professores, a autoridade docente e a relação educativa

No dia-a-dia de uma escola constata-se que os professores são muito questionados e solicitados para resolverem, ajudarem, aconselharem ou dirigirem assuntos, opiniões, problemas e/ou pessoas. Têm de lidar constantemente com a diversidade de assuntos ao longo do seu dia de trabalho. Assim, Amado (2000) refere que nas escolas as relações de poder entre os vários intervenientes influenciam-se mutuamente. Os professores interagem com todos os intervenientes da comunidade educativa a qualquer hora e minuto exigindo destes inúmeras formas de agir, lidando de uma forma continuada com diversos tipos de poder.

Espelage (2013, p.51) corrobora esta ideia quando afirma que “Nunca será de mais lembrar que a disciplina na escola se estrutura em torno das relações de poder dos intervenientes (professores, alunos, funcionários, etc.).” A mesma autora concluiu que “Por isso se afirmou que a questão da disciplina é eminentemente educacional e política, muito antes de ser uma questão técnica.”

A panóplia de intervenientes com quem o professor tem de lidar no seu dia-a-dia e a diversidade de ações a que o professor está sujeito e que leva a que este exerça diferentes tipos de poder foi alvo de estudo por parte de diferentes autores. Formosinho (1980, pp. 301-328) dedicou-se à analise dos diferentes tipos de poder dos professores e caraterizou seis tipos:

· Poder normativo: onde se pressupõe que o professor exerça influência sobre os alunos, através da utilização de normas e remetendo para valores consensuais e definidos por Lei.

· Poder cognoscitivo: traduz-se na capacidade que o professor detém e exerce sobre o aluno pelo facto de dominar e transmitir um conjunto de saberes especializados.

· Poder físico: a superioridade física.

· Poder pessoal: baseia-se nas características afectivas, temperamentais e de personalidade do professor, sendo uma das leis nucleares da relação educativa.

· Poder autoritativo: está subjacente ao facto de o professor estar oficialmente investido de uma função que implica que seja obedecido.

· Poder material ou remunerativo: é exercido sobre o professor e remete para a possibilidade de o docente receber recompensas materiais e financeiras.

Matias em (2007) a propósito da tipologia dos poderes de Formosinho (1980) em As bases do poder do professor coloca a tónica em dois tipos de poder quando nos diz que “os professores têm tudo a ganhar se investirem no seu poder cognoscitivo e no seu poder relacional”. O mesmo afirma que “Os professores podem ter mais poder do que o que têm ou imaginam. Porque o poder não é do reino do dar, nem sequer

do ter. É do reino do interagir, do influir, do conquistar. O poder é relacional.” Nesta linha defende o mesmo autor que o professor deve criar “Criando pontes com os pais e os actores/autores locais. Mediatizando localmente a sua acção educativa e cívica. Assumindo uma postura profissional de responsabilidade perante os (in)êxitos dos seus educandos e de exigência crítica.”

O estudo de Silva e Neves (2006) apresenta-nos resultados que indicam uma linha de pensamento idêntica à de Matias Alves. Este estudo pretendeu avaliar em que medida a interação sócio afetiva entre aluno e professor permite explicar diferentes níveis de indisciplina. Os seus resultados indicam que os comportamentos de indisciplina em sala de aula são o resultado da interação entre as disposições sócio afetivas dos alunos para as práticas dos professores. Assim, diferentes relações de poder podem explicar diversos níveis de indisciplina.

Outro autor que se dedicou à análise comportamental e interrelacional entre crianças, jovens e professores foi Daniel Sampaio. Este autor (1996, p. 14) considera que "é útil que o professor tenha bem presente a importância dos aspectos relacionais com os seus alunos. Se o professor continuar a valorizar apenas a sua função de instrução (transmitir conhecimentos), é mais provável que os conflitos disciplinares apareçam." Se o professor valorizar o aspecto bilateral do processo ensino-aprendizagem valorizando mais o aspeto relacional conferindo importância aos interesses dos alunos, no sentido de respeitar a sua personalidade terá, como nos diz Perrenoud (2008, p.79) “uma relação, o mais positiva possível, mesmo com os alunos que o desconcertam, o decepcionam, o incomodam ou simplesmente com os quais ele sente não ter qualquer afinidade”.

O poder normativo referido por Formosinho é inerente ao desempenho da atividade docente. Segundo Postic (1990, p. 147), o docente deve no primeiro dia de aulas estabelecer "de uma forma explícita as regras de ordem, de trabalho, determinando a actuação que todo o aluno deve ter em tal situação”. O poder de definir as regras de trabalho e de convívio na sala de aula, de dar diretivas precisas quanto aos comportamentos esperados, de procurar o equilíbrio entre rigidez e flexibilidade, a definição que para cada regra devem estar estabelecidas as consequências do seu

incumprimento, são premissas que devem ser partilhadas aos alunos desde o início do ano escolar, só assim é conferido o poder ao professor para aplicar as medidas corretivas adequadas à situação como a advertência ou a ordem e saída da sala de aula ou a medida disciplinar sancionatória de repreensão registada.

Outro autor que à semelhança de Formosinho se dedicou a caraterizar o poder do professor foi Amado ( 2001, pp. 128-131) que por sua vez concentra as bases do professor sobre três tópicos que considera fundamentais:

· a lei e costume, na qual o professor se apresenta como um mandatário do Estado, concedendo-lhe uma capacidade coerciva e normativa com vista ao controlo da vida na escola, na aula e à obtenção dos objetivos educacionais.

· o conhecimento na qual o professor tem o poder de ensinar e de avaliar · as qualidades pessoais, esta é uma base de poder constituída pelas

características da personalidade docente. Este é um poder segundo Sampaio (1995, p. 229) “que não tem sequer a possibilidade de não ser exercido, e que é transmitido aos alunos através das atitudes e do comportamento, não só durante as aulas como durante todo o tempo em que estamos presentes na escola, pela forma como nos relacionamos espontaneamente”. As qualidades pessoais do professor devem ser baseadas “na simpatia, na capacidade de respeitar o aluno, no bom senso em acções e atitudes, na disponibilidade para ouvir, compreender e ajudar” (Amado, 2001, pp.130- 131).

O professor tem autoridade sobre vários aspetos da vida dos alunos, nomeadamente, sobre os conhecimentos que os alunos devem adquirir, a avaliação, o seu comportamento, a sua forma de falar e de se relacionar. Por isso Teixeira ( 1993) refere que “ser Professor é, indubitavelmente ter um poder muito forte já que a ação que o Professor exerce sobre os Alunos é, salvo casos excepcionais, extremamente relevante”. Não se deve, contudo ignorar o poder dos alunos quando não querem realizar a tarefa. No entanto, alguns estudos realizados, confirmam que, na opinião dos alunos, o uso do poder pessoal dos professores é mais referido

do que o uso do poder cognoscitivo, daí que de acordo com Formosinho (1980, p. 312) “os alunos valorizam precisamente, em abstracto, mais as qualidades humanas dos professores que as profissionais”