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Este capítulo traz uma análise descritiva sobre a classe batalhadora, como estamos chamando, grupo aqui composto por Diná, Lidiane, Rafaela e Ruth, mulheres entre 27 e 35 anos. Elas são, respectivamente, técnica em gestão, manicure, assistente administrativa e vendedora de telemarketing. Três delas residem na região metropolitana de Porto Alegre e uma em bairro periférico da capital, conforme apresentado nos perfis, apresentados logo abaixo, neste capítulo.

Tal como no capítulo anterior, a segunda seção é dedicada a um panorama da vida das entrevistadas em foco, também buscando ressaltar suas opiniões, anseios e sentimentos. A explanação indica elementos que permitem uma compreensão dos modos de vida desse grupo. A terceira seção versa sobre consumo de mídia, no passado e no presente, salientando o papel dos meios em suas trajetórias. Aspectos relativos a memórias e representações de telenovelas encerram o capítulo. O objetivo é identificar características do consumo e usos de telenovela desse grupo de batalhadoras para posterior comparação.

7.1 QUEM SÃO

Diná tem 27 anos, é negra, não tem filhos e é casada há um ano. Começou a frequentar a igreja evangélica por influência do marido, quando ainda namoravam, e tem se tornado cada vez mais envolvida com a religião e os cultos. Mora com o marido em Guaíba, na região metropolitana de Porto Alegre. É técnica em gestão em empresa pública de transportes, na capital. É graduada em Relações Públicas pela PUCRS, com bolsa ProUni, e, antes, fez um curso técnico em administração.

Nasceu em São Lourenço do Sul, no sul do estado, e se mudou com a mãe para Porto Alegre aos três anos de idade. Ainda criança, mudou-se para Guaíba, por questões relativas ao custo de vida e à segurança. Seus pais possuem ensino fundamental incompleto. Conheceu seu pai quando tinha sete anos de idade, e não tem uma relação próxima com ele, que é motorista de ônibus. Sua mãe é empregada doméstica aposentada e se mudou para São Lourenço depois que a filha casou, com o marido, com quem está há 10 anos, e que é pedreiro. Tem dois irmãos por parte de pai, mas apenas os conhece através do Facebook.

Estudou sempre em escola pública. Já fez dois anos de curso de línguas. A casa onde mora com os pais é própria. Tem carro, ano 1996. Seus lazeres preferidos são tomar

chimarrão na orla do lago Guaíba e jantar com amigos. A renda familiar é de R$ 3,5 mil, sendo que ela e o marido, que é motorista de ônibus, recebem o mesmo salário.

Ao se apresentar, afirma: ―Eu sou uma relações públicas, eu sou uma pessoa bem comunicativa, eu me considero muito versátil, assim, eu acho que eu consigo... não tenho dificuldade pra me ambientar, de chegar num espaço e ter que lidar com pessoas diferentes, isso pra mim é tranquilo.‖

Lidiane tem 29 anos, é branca, não tem filhos, é solteira e não namora. Católica de batizado, mas não é praticante e nem concorda com as doutrinas da igreja, ―acho uma hipocrisia até‖. Até o final de 2013 morava em Porto Alegre, no bairro Jardim Leopoldina. No início de 2014, mudou-se para Viamão, onde construiu uma casa no mesmo terreno em que mora o pai e a irmã. É manicure e depiladora em salão de beleza localizado no bairro Bom Fim. Possui curso profissionalizante nas duas áreas e frequenta congressos e workshops anualmente. ―Eu acho isso importante, pra gente tá sempre se reciclando, aprendendo coisas novas, pra poder oferecer pro cliente, esse é o diferencial, porque na nossa área tem muita concorrência.‖

Nasceu em Porto Alegre, viveu durante a infância e a adolescência em Viamão, e passou a morar sozinha em Porto Alegre aos 18 anos. Seus pais se separaram quando ela tinha nove anos, ela ficou vivendo com a mãe, mas desde a separação dos pais passou a ter muitos desentendimentos com a mãe. Está há 11 anos sem ver ou falar com ela. Sua mãe possui o ensino fundamental incompleto e é diarista. Seu pai nunca estudou, mas sabe ler e escrever, e ―faz conta como ninguém‖. É pedreiro. Tem uma irmã mais velha que trabalha em telemarketing como recupera de crédito de veículos.

Estudou sempre em escola pública. A casa onde mora é própria, ficou pronta após sete anos de construção. Não tem carro. Seu lazer preferido é ficar em casa com a família ―fazer um churrasco, tomar uma cerveja‖. Sua renda é de cerca de R$ 2 mil.

Apresenta-se da seguinte maneira: ―Eu sou muito, eu me considero muito esforçada, trabalhando bastante pra ter, pra conseguir ter uma vida um pouco melhor [...]. Eu gosto de trabalhar, gosto bastante mesmo, pra mim chegar a ter a clientela que eu tenho hoje, [...] eu tive que fazer certas renúncias e me dedicar muito.‖

Rafaela tem 32 anos, é branca, não tem filhos, e está noiva. É católica não praticante. Mora em Gravataí, região metropolitana de Porto Alegre, com a mãe, duas irmãs e uma sobrinha. Em outra casa no mesmo terreno, mora a outra irmã, seu marido e sua filha. Durante

a pesquisa, atuava como assistente administrativa fiscal em uma indústria automotiva, mas recentemente foi transferida para trabalhar no setor de Recursos Humanos da empresa, aproximando-se da Psicologia, área em que cursa graduação.

Nasceu e sempre viveu em Gravataí. Seus pais se separaram há sete anos, mas ele ainda tem contato constante com a família. Seus pais possuem o ensino fundamental incompleto. Ambos são comerciantes, cada um mantém um minimercado em casa. Suas três irmãs têm ensino médio completo, a mais velha ainda possui curso técnico em contabilidade, mas Rafaela é a primeira a cursar o ensino superior na família. ―Eu sou a primeira das minhas irmãs a tá fazendo faculdade. [...] Eles [seus pais] ficaram super felizes, porque eles sonhavam também com isso.‖

Cursou o ensino fundamental em escola pública e o ensino médio em escola particular com bolsa de estudos parcial. A casa onde mora com a família é própria, o terreno foi adquirido em 1986, mas a casa ficou pronta dez anos depois. Não tem carro. Seu lazer preferido é ficar com o namorado assistindo a filmes. Seu salário é de R$ 2 mil e a renda familiar, incluindo seus rendimentos, é de R$ 4.400.

Em suas palavras, apresenta-se da seguinte forma: ―Tenho 32 anos, moro em Gravataí, trabalho em Porto Alegre e estudo em Cachoeirinha, tô fazendo faculdade de psciologia, tô no segundo semestre, tenho uma família bem grande, que eu amo muito, moram todos comigo, exceto o meu pai, [...] convive diariamente com nós‖. Fala ainda sobre o noivo, que na época ainda era namorado: ―Tenho um namorado muito querido. Eu comecei a namorar há quase 3 meses e tá me fazendo um bem enorme, assim, tá completando a minha vida.

Ruth, 35 anos, é branca, tem dois filhos e já foi casada três vezes, ―casado em termos, nenhum dos três casamentos foi no papel‖. Seu segundo marido faleceu após um ano casados. ―Quero continuar solteira, não quero casar mais. [...] Ah não, três casamentos e um funeral é demais pra uma pessoa‖. Considera que não tem religião, conta que foi batizada na igreja católica, já frequentou a igreja luterana e simpatiza com a doutrina espírita. Mora em Porto Alegre, no bairro Vila Nova, com a filha de 14 anos. O filho de 18 anos vive com um padrinho de Ruth, que ela considera um pai, especialmente depois que o seu faleceu. É vendedora de telemarketing de uma empresa de telecomunicações, oferecendo pacotes de TV, internet e telefonia para possíveis clientes. Iniciou o curso de Direito em 2012, mas até agora conseguiu cursar dois semestres, pois com frequência precisa trancar a faculdade, por falta de tempo ou por economia – no caso dela, os dois estão diretamente relacionados, pois quanto mais tempo trabalha, maior é o número de vendas e maior seu rendimento mensal.

Nasceu em Porto Alegre e viveu a maior parte de sua vida em Cachoeirinha. Quando adulta, também morou em Gravataí e em Santa Catarina, nas cidades de Curitibanos e Joinville. Seus pais se separaram quando ela era adolescente, conforme ela, o principal motivo foi o alcoolismo dele. Seu pai, que faleceu de câncer alguns anos atrás, possuía ensino fundamental incompleto. Sua mãe possui ensino médio completo. Tem dois irmãos, um tem ensino superior completo e outro está concluindo o ensino médio por EJA. Ruth já fez diversos cursos profissionalizantes, como técnico em administração, técnico em secretariado, operador de caldeira e manicure, pois, como não conseguia fazer faculdade, devido ao custo, buscava abrir outras oportunidades de trabalho.

Sempre estudou em escola pública. Em 2013, comprou um apartamento, por meio de financiamento para 20 anos. Não tem carro. Seus lazeres preferidos são ir ao cinema, fazer churrasco com os amigos e assistir a filmes com os filhos. Seu salário é de cerca de R$ 2,5 mil, com variações significativas de um mês para outro, visto que recebe conforme sua produtividade.

Ao se apresentar, afirma: ―Falar de mim é complicado. Eu gosto bastante de trabalhar, gosto de sair... Gosto de estudar, mas agora tranquei a faculdade por causa da compra do apartamento. Falar da gente é difícil... Mas eu sou uma pessoa comunicativa, gosto de conversar.‖ Também fala sobre a família: ―E família é tudo de bom né? É bom saber que eu posso contar tanto com o meu pai quanto com a minha mãe quanto com toda a minha família, todos eles sempre me apoiam em todos os quesitos, às vezes puxam a orelha daqui, eu não gosto, mas dos meus pais, assim, eu não posso reclamar, eles são maravilhosos.‖

7.2 MODOS DE VIVER

Conforme pesquisadores da ―nova classe média‖ apontam, duas características importantes desse grupo se referem à problemática que relaciona trabalho e tempo, especialmente através de longas jornadas de trabalho, muitas vezes conciliadas com os estudos (FLEURY, 2013). Entre as mulheres batalhadoras deste estudo, encontramos essa realidade. Rafaela concilia o trabalho como assistente administrativa, no qual cumpre 40 horas semanais, com a faculdade de psicologia à noite e sábado pela manhã. Sai da indústria onde trabalha, em Porto Alegre, às 17h30 e vai para a faculdade em Cachoeirinha, onde sua aula inicia às 19h15. ―Se eu vir pra casa, eu gasto mais uma passagem, não vale a pena. Eu vou prali, se eu chego cedo eu aproveito pra ler alguma coisa, porque tem muita leitura né?‖. Ruth também dividia seu tempo entre emprego e curso superior, mas agora, como em várias

ocasiões, trancou a faculdade pela falta de tempo e pela necessidade de economizar, especialmente em 2013, quando adquiriu casa própria. No caso de Ruth, a relação entre tempo e rendimentos é clara, visto que ganha conforme sua produtividade, na venda de pacotes de TV por assinatura, telefonia e internet.

Lidiane pretende concluir o ensino médio e cursar o ensino superior em breve – afirma que agora que concluiu a construção de sua casa terá mais tempo e dinheiro para se qualificar. Por enquanto, dedica cerca de 10 horas diárias, seis dias por semana, ao trabalho como manicure. ―Bem corrida, tô sempre atrasada.‖ Começa a trabalhar às 10h e chega a sair às 22h. Obviamente, mais tempo no salão à disposição das clientes significa uma renda maior. Ela não possui carteira assinada, e, assim, não tem nem mesmo um salário mínimo garantido.

Diferentemente das três, Diná cumpre suas oito horas diárias de trabalho, sem necessidade de hora-extra, e vai para casa descansar até o dia seguinte. Essa é sua realidade desde 2012, quando ingressou, via concurso público, em seu emprego atual. Antes disso, porém, chegou a precisar conciliar curso técnico (último semestre), faculdade (primeiro semestre) e trabalho. Ela nunca pôde se dedicar plenamente ao curso superior.

Diná participa de cultos na igreja na quinta-feira e no sábado. No fim de semana, gosta de ficar em casa. ―Eu sou bem preguiçosa, eu gosto de ficar na cama, olhando televisão, dar uma descansada.‖ Rafaela tem o sábado à tarde para namorar. ―Eu procuro aproveitar pra namorar um pouquinho, pra não perder o namorado.‖ E complementa: ―Até quando eu comecei a estudar eu pensei ‗bom, eu acho que agora é que eu não vou namorar mesmo‘, porque dificilmente tu vai arranjar alguém que tenha paciência, ainda mais homem, às vezes é meio machista, mas não, ele me apoia bastante.‖ No domingo, faz leituras e trabalhos para a faculdade.

Lidiane conta que até sua casa ficar pronta, no início deste ano, dedicava sua folga do trabalho, no domingo e na segunda, à casa em construção. Ela ajudava com algumas tarefas e cuidava da limpeza, atenta para que aquilo que já estava pronto não fosse estragado. ―Atualmente eu não faço nada além de trabalhar na minha casa, nada.‖ Conta que, por seu pai ser pedreiro, aprendeu algumas coisas. ―Eu meto a mão na obra, tô com o pé todo sujo de tinta, [...] eu vou fazendo o que dá, é uma economia também se eu não precisar pagar uma pessoa pra fazer aquilo. As coisas que eu posso fazer eu faço, eu pinto, as coisas todas de pintura da casa fui eu que fiz.‖ De modo semelhante, Ruth também estava reservando o tempo livre – que praticamente se resume ao domingo, pois costuma trabalhar aos sábados – para a reforma do apartamento, que concluiu antes de se mudar, no final de 2013. Seu lazer preferido é participar de churrascos na casa de amigos.

Lidiane é a única que dá destaque às atividades domésticas em seu relato. Expõe que após chegar do trabalho, por volta das 22h, costuma arrumar algo em casa, ―se quiser‖, já que mora sozinha e decide o que precisa ou não fazer.

Lidiane e Ruth trabalham desde os 16 anos, quando ainda não haviam concluído o ensino médio. Ruth voltou, poucos anos depois, a estudar, com o apoio do marido. Lidiane até hoje sonda um retorno aos estudos, porém isso ainda não se concretizou. Ambas citam a separação dos pais como importante para o abandono dos estudos. A separação dos pais de Ruth e o abandono da escola ocorreram no mesmo ano, em parte por entrar em uma fase ―rebelde‖, e também porque a situação financeira ficou pior em casa. Além disso, ela engravidou em seguida. A separação dos pais de Lidiane aconteceu quando ela estava com nove anos. Desde então, tinha problemas de relacionamento com a mãe e aspirava conquistar sua independência para poder sair daquela disputa que se travou entre pai e mãe pelo controle da filha.

Rafaela começou a trabalhar após concluir o ensino médio. Embora desejasse cursar o ensino superior, não tinha condições financeiras de pagar uma faculdade. Novamente, a separação dos pais aparece como significativa, nesse caso, especialmente porque a renda familiar diminuiu após seu pai sair de casa. Ela explica que o minimercado da família passou a ser atendido apenas pelas mulheres, aumentando o número de assaltos e diminuindo os lucros. Apesar de a situação econômica em casa não ser confortável, a ajuda financeira de Rafaela não seria essencial. No entanto, a família tampouco poderia pagar uma faculdade para ela. Assim, o caminho foi começar a trabalhar. Após mais de 10 anos trabalhando no comércio, ela conseguiu dois empregos consecutivos em indústria automotiva, sendo o segundo aquele no qual está desde 2011, e que permitiu que ela tivesse meios de pagar seus estudos.

Por último, Diná pôde se dedicar aos estudos até a conclusão do ensino médio, e, depois, interessada em se qualificar, fez um curso técnico, que conciliava com o trabalho. Diná conta que a faculdade não era nem mesmo um sonho para ela, pois a via como algo distante de sua realidade. ―Eu nem pensava, pra mim era tranquilo... ‗Ah tá, quem sabe um dia eu tente UFRGS‘. Mas ‗ah, vou fazer um curso técnico, acho que vai me dar uma formação legal‘. Nem fazia parte dos meus planos ter um ensino superior, não tava nem triste, decepcionada, porque eu não contava com aquilo.‖ Durante a graduação, que não precisou pagar já que recebia bolsa, sempre trabalhou, para conseguir se manter e ajudar a mãe.

Nesse sentido, a análise de Souza (2010) versa sobre a relação entre trabalho e estudo para as chances de futuro dos jovens ―batalhadores‖.

A necessidade do trabalho se impõe desde cedo, paralelamente ao estudo, o qual deixa de ser percebido como atividade principal e única responsabilidade dos mais jovens como na ‗verdadeira‘ e privilegiada classe média. Esse fator é fundamental porque o aguilhão da necessidade de sobrevivência se impõe como fulcro de vida de toda essa classe de indivíduos. Como consequência, toda a vida posterior e todas as escolhas – a maior parte delas, na verdade, escolhas ‗pré-escolhidas‘ pela situação e pelo contexto – passam a receber a marca dessa necessidade primária e fundamental. (SOUZA, 2010, p. 51).

Entre as entrevistadas, fica claro que não lhes é dada a oportunidade de dedicação plena e exclusiva ao estudo, que, na classe média, certamente incluiria a graduação, percebida como ―o mínimo‖ pelas informantes daquele grupo.

No que se refere às memórias da escola, Rafaela é, entre as quatro batalhadoras, a que se refere a lembranças mais positivas, apesar de a recordação que destaca tratar de sua timidez em aula.

Eu lembro que eu gostava de estudar. Eu lembro claramente a primeira série, [...] como eu era tímida, eu olhava assim, o professor escrevia no quadro as letras, e eu sabia mas eu tinha vergonha de falar, e ficava quieta e não falava nada, tanto que no meu boletim fala alguma coisa assim, tentando incentivar que eu falasse. [...] Mas sempre fui uma boa aluna, tanto no primeiro quanto no segundo grau, eu era uma das alunas que tirava as melhores notas. [...] Era uma das mais inteligente eu não vou te dizer, mas talvez uma das mais esforçadas, que aí fazia com que eu tirasse uma das melhores notas. Sempre foi assim, eu sempre me dediquei muito. (Rafaela)

A volta aos estudos recentemente significou uma conquista para Rafaela e sua família. ―Pude recomeçar agora a estudar, antes tarde do que nunca né? [...] Eu sou a primeira das minhas irmãs a tá fazendo faculdade. [...] Eles [os pais] ficaram super felizes, porque eles sonhavam também com isso.‖

Diná, Lidiane e Ruth destacam recordações boas e ruins. Ruth conta que sempre gostou de estudar, mas, nem por isso, as experiências na escola foram apenas positivas. ―Eu era bem baixinha, eu usava óculos e as pessoas mexiam comigo. Eu nunca fui uma pessoa, assim, popular, eu sempre fui mais quieta e fui de ficar com os bolinhos mais reprimidos [...]. Mas eu gostava, sempre gostei de ir à aula. Sempre gostei de estudar.‖

As principais lembranças da escola, para Diná, referem-se às mudanças de colégio, que aconteceram várias vezes devido a mudanças de cidade ou bairro. Conta que até hoje não gosta de mudanças de nenhum tipo. Todavia, diz que não tinha dificuldade para fazer amigos, e cita um exemplo buscando comprovar isso, o prêmio de melhor amiga da turma ao final do curso de graduação. Também se orgulha em contar que recebeu o prêmio pela melhor média de notas durante todo o curso.

Lidiane é a única que relata que não gostava de estudar – e é também a única que não completou o ensino médio. ―Não era uma coisa que eu amava, nunca foi, não vou mentir pra ti, eu nunca amei estudar. Eu até tentei voltar a estudar um tempo atrás… mas eu não tenho paciência, não tenho.‖ Conta que quer concluir o ensino médio e que tem planos de cursar uma faculdade, na área de Cosmética. ―Tenho essa vontade, embora não seja muito chegada, não tenha essa paciência, mas...‖

Pela descrição de Lidiane, o que mais a incomodava era o ambiente de brigas, entre colegas e entre alunos e professores. ―Na minha época já tinha muita briga, aluno não respeitava professor, dava muita confusão, isso eu não gostava não, acho que por isso até que eu acabei, não tinha muito fundamento pra mim tá ali pra ver aquelas palhaçadas.‖

O que Lidiane aponta como causas para a desistência da escola em seu caso específico – a falta de paciência para os estudos e para a palhaçada das brigas na escola – está relacionado às condições que dificultam o êxito escolar de forma estrutural. De um lado, a falta de paciência pode ser entendida como a disciplina para o estudo que não foi incorporada efetivamente por ela, que também não desenvolveu uma relação afetiva com o conhecimento e a escola. São princípios que vêm do princípio, ou seja, da família (ROCHA; TORRES, 2009), em seu caso, constituída por pais praticamente analfabetos que também não aprenderam verdadeiramente as razões para estudar e a melhor maneira para fazê-lo. Por