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CAPÍTULO I – ENQUADRAMENTO TEÓRICO

2. Bem-estar

2.1 Bem-Estar Subjetivo e Bem-Estar Psicológico

O bem-estar tem sido abordado de forma diferente de autor para autor, uma vez que uns o associam à ausência de perturbações (Langer, Gesten & McCarthy, 1986) e outros ligam-no a aspetos positivos (Ryff & Keyes, 1995). Há, portanto, duas perspetivas em Psicologia, relativamente ao bem-estar pessoal: a hedónica e a eudaimónica (Keyes, Shmotkin, & Ryff, 2002; Peterson, Park & Seligman, 2005; Ryan & Deci, 2001; Waterman, 1993).

O tema é ainda pouco coeso e organizado, na medida em que está rodeado de várias abordagens (Ryan & Deci, 2001; Ryff & Singer, 1998). No entanto, Galinha (2008) distingue duas fases na clarificação e organização do conceito de bem-estar, considerando que, numa primeira fase este estava ligado a conceitos económicos, em oposição a um certo bem-estar global e como um todo, nos anos 60. Apesar de partilhem o mesmo objeto de estudo, os conceitos de “Bem-Estar Subjetivo” e “Bem- Estar Psicológico” possuem orientações teóricas (Ryan & Deci, 2001; Lent, 2004), origens e percursos distintos (Novo, 2005b).

A primeira perspetiva, denominada por Bem-Estar Subjetivo, iniciou-se em meados do século XX, como parte de uma tendência científica que pretendia quantificar a qualidade de vida cada vez mais preocupada com a subjetividade (Keyes et al., 2002) e quando se procuravam indicadores de qualidade de vida para monitorar mudanças sociais com vista à implantação de políticas sociais (Land, 1975). Esta abordagem resulta de uma perspetiva hedónica, caracterizada pela felicidade e ausência de problemas e que permite apurar o quão satisfeito ou feliz o indivíduo se sente e centra-se na identificação do nível de felicidade e de satisfação dos indivíduos, identificando as condições que lhe estão associadas (Ryff, 1989a); Lent, 2004; Novo, 2005a; Siqueira & Padovam, 2008), mas “Happiness, however, has not been the only indicator of positive psychological functioning […]” (Ryff, 1989a, p.1070).

Mais ligado às dimensões afetivas e cognitivas da avaliação subjetiva que cada um faz da sua própria vida e das suas experiências, o Bem-Estar Subjetivo pretende compreender a dimensão afetiva (nomeadamente os afetos positivos e os afetos negativos) e a dimensão cognitiva (como a satisfação com a vida) da avaliação subjetiva que o sujeito faz de si e da sua vida (Diener, Such, Lucas, & Smith, 1999; Diener, 1994; Ryff, 1989a, 1995; Keyes et al., 2002; Kim-Prieto, Diener, Tamir, Scollon, & Diener, 2005; Galinha & Ribeiro, 2005; Novo, 2005b; Fernandes, 2007;

Ramalho, 2008; Galinha, 2008; Deci & Ryan, 2008; Siqueira & Padovam, 2008; Souza et. al, 2012). O trabalho desenvolvido por Diener (1984) é um marco na tentativa de sistematizar o conceito de Bem-Estar Subjetivo (Machado & Bandeira, 2012).

A investigação acerca do Bem-Estar Subjetivo aconteceu a par e em articulação com o conceito de Bem-Estar Psicológico. Partiu de uma base construída a partir dos anos 60 e privilegia a vertente emocional (Novo, 2005a; Novo, 2005b). Ryff (1989a) considera que o modelo de Bem-Estar Subjetivo é limitativo e tem pouco fundamento teórico, pois exclui aspetos importantes do funcionamento positivo e o bem-estar é mais do que apenas a Satisfação com a Vida e a Felicidade e pelos seus estudos terem negligenciado a tarefa essencial de definir a estrutura básica do bem-estar no âmbito psicológico (Ryff, 1989a; Ryff & Keyes, 1995).

Outra corrente, conhecida como Bem-Estar Psicológico, uma perspetiva eudaimónica, iniciou o seu trabalho empírico na década de 80, assente em teorias anteriores das psicologias clínica, do adulto e do desenvolvimento, enfatizando o potencial do indivíduo para uma vida cheia de significado e de autorrealização. Ambas as teorias incorporam valores humanistas que elevam a capacidade humana para examinar o que faz com que a vida seja algo bom (Keyes et al., 2002).

O Bem-Estar Psicológico é um construto baseado na teoria psicológica e agrega conhecimentos da psicologia do desenvolvimento, da psicologia humanista e da saúde (Machado & Bandeira, 2012). A conceção de bem-estar é feita de modo abrangente, como o resultado de processos cognitivos, afetivos e emocionais, descrevendo dimensões da vivência psicológica subjetiva, nomeadamente a relação da pessoa consigo mesma, com a vida atual e passada, a definição de objetivos, natureza e qualidade da relação que estabelece com o meio intersubjetivo e social (Novo, 2005b). Para Novo (2005a) a felicidade é vivida de maneira diferente pelos indivíduos, dependendo da época, mostrando-se como uma motivação e um critério para o bem- estar, dependendo da avaliação que cada um faz da sua vida, dependendo das suas experiências emocionais, positivas e negativas, de acordo com os seus valores, necessidades, expectativas e crenças.

O Bem-Estar Psicológico surgiu como crítica à fragilidade dos pressupostos que sustentam o Bem-Estar Subjetivo (Siqueira & Padovam, 2008). Assim, Ryff (1989a) apontou várias críticas ao Bem-Estar Subjetivo, como por exemplo a ausência de fundamento teórico, avaliação exclusiva de felicidade e satisfação como objetivos fundamentais e universais do ser humano, a felicidade e a satisfação são avaliados

apenas com base nos critérios pessoais e subjetivos, o caráter quase absoluto da interpretação do Bem-Estar Subjetivo, por ser entendido como um indicador de vida bem sucedida, como se esta não se alterasse ao longo do ciclo vital e invariável relativamente aos vários contextos. A autora considera também que as medidas de Bem-Estar Subjetivo são utilizadas em função das necessidades de investigação, mais do que de um questionamento teórico. Foram estas críticas que se tornaram os pontos de partida para o Bem-Estar Psicológico de Ryff (1989a).

The premise of this study is that there has been particular neglect at the most fundamental level in this realm, namely, the task of defining the essential features of psychological wellbeing. It is argued that much of the prior literature is founded on conceptions of well-being that have little theoretical rationale and, as a consequence, neglect important aspects of positive functioning. An alternative conception, based on the integration of several theoretical domains, is presented. Once operationalized, this formulation is then contrasted with indicators of well-being from the past literature to assess whether theory-guided conceptions define new dimensions of positive functioning not evident in prior empirical research (Ryff, 1989a, p.1069).